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Psicologia, Saúde & Doenças

Print version ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.18 no.3 Lisboa Dec. 2017

https://doi.org/10.15309/17psd180315 

Depressão, ansiedade e suporte familiar para mães na primeira hospitalização dos filhos

Depression, anxiety and family support for mothers during the first hospitalization of children

Daniela da Silva Melo 1 & Giana Bittencourt Frizzo 2

 

1Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Serviço de Psicologia, Porto Alegre/RS – Brasil.(danisilvamelo@gmail.com)

2Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Psicologia, Porto Alegre/RS – Brasil (gifrizzo@gmail.com)

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

O presente estudo teve por objetivo compreender os aspectos emocionais e relacionais envolvidos nas mães diante da primeira hospitalização de um filho. Foi realizado um estudo de caso coletivo. A amostra foi composta por 4 mães de crianças que estavam em sua primeira hospitalização. Os instrumentos utilizados foram uma ficha com dados sócio demográficos, inventários para avaliar depressão, ansiedade e percepção de suporte familiar e uma entrevista semi estruturada. A análise dos dados foi realizada a partir da análise de conteúdo qualitativa da entrevista, que foram triangulados com os resultados dos inventários quantitativos. Os resultados apontaram que as mães lidam de maneira diferente com a hospitalização de seus filhos, apesar de sempre ser considerada uma situação com sofrimento envolvido e com alterações na dinâmica familiar.

Palavras-chave: hospitalização infantil, família, aspectos emocionais

 

ABSTRACT

This study aimed to understand the emotional and relational aspects involved in mothers facing the illness and first hospitalization of a child. One collective case study was conducted. The sample consisted of four mothers of children who were in their first hospitalization. The instruments used were a form with sociodemographic data, Inventory to assess depression, anxiety and perception of family support and a semi-structured interview. Data analysis was performed from the qualitative content analysis of the interview, which were triangulated with the results of quantitative inventories. The results showed that mothers deal differently with the hospitalization of their children, although always be considered a situation with suffering involved and changes in family dynamics

Keywords: infant hospitalization, family, emotional aspects

 

A partir de 1990, os familiares foram inseridos oficialmente no contexto de hospitalização pediátrica através do Estatuto da Criança e do Adolescente, conforme está descrito no Capítulo I, Art. 12, que garante a “permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente” (Brasil, 1990). Contudo, uma revisão integrativa realizada por Albuquerque, Morais, Macedo, Vieira e Souza (2013), constatou que estudos relacionados a famílias no cenário hospitalar pediátrico, produzidos a partir de 1999, revelaram ser necessária uma maior sensibilização por parte dos profissionais da saúde que ainda veem este familiar como informante da criança.

Essa afirmação foi corroborada pelo estudo de Figueiredo, Gomes, Pennafort, Monteiro e Figueiredo (2013), que, a partir de uma pesquisa descritiva e qualitativa realizada com mães que estavam vivenciando a hospitalização do filho em um hospital de Fortaleza, concluiu que há necessidade de os profissionais da saúde oferecerem maior atenção para as mães acompanhantes das crianças, envolvendo o binômio mãe e filho para promover o cuidado humanizado.

Um estudo exploratório descritivo com abordagem qualitativa, realizado em um hospital universitário no sul do Brasil com 15 familiares acompanhantes de crianças hospitalizadas, constatou que a situação de adoecimento e consequente hospitalização provoca uma ruptura da criança com o seu ambiente e a família percebe a estranheza causada pelo adoecimento, alterando suas percepções e emoções. Recomendou-se a humanização do ambiente hospitalar, incorporando a família no cuidado à criança, pois a presença do familiar pode auxiliá-la em uma melhor aceitação e adaptação da condição de adoecimento e hospitalização (Gomes et al., 2013).

Estudos apontam para a importância do funcionamento psicossocial dos pais para a saúde física e mental das crianças, pois as atitudes destes frente à doença, principalmente durante a hospitalização, podem influenciar no impacto da doença e na adesão ao tratamento do filho (Commodari, 2010; Marcelli & Cohen, 2010). Entretanto, a reação dos pais frente a uma hospitalização muitas vezes pode ser de ansiedade, o que, além de gerar sofrimento, pode dificultar que eles ajudem a criança a lidar melhor com a situação de doença (Silva, Sampaio, Ferreira, Ximenes & Pinheiro, 2010).

A situação de adoecimento de uma criança pode fazer com que as famílias sintam-se angustiadas, apreensivas, podendo desenvolver processos psicopatológicos como resultado das mudanças que a hospitalização acarreta no cotidiano da criança e da família (Nicola et al., 2014). Uma pesquisa de Santos, Oliveira, Barbosa, Siqueira e Peixoto (2013), realizada com acompanhantes de crianças que estavam hospitalizadas e que participaram de um grupo de apoio em um hospital em Goiana, concluiu que a situação de adoecimento e hospitalização de uma criança comprometia também a saúde física e mental do acompanhante.

Já o estudo realizado em um hospital universitário de Porto Alegre que teve como objetivo avaliar os sintomas de depressão e ansiedade materna, através dos Inventários Beck de Depressão e de Ansiedade, em mulheres que tiveram seus filhos internados na unidade de pediatria, constatou que 30,7% dessas mulheres apresentaram depressão e 32%, ansiedade. Segundo o estudo, as mulheres que estavam em situação de maior vulnerabilidade social apresentaram depressão e ansiedade com maior frequência (Guidolin & Célia, 2011).

A situação de doença, hospitalização e procedimentos médicos ameaçam o sistema familiar, seus papéis e seus canais de comunicação (Romano, 1999), o que pode precipitar mudanças no relacionamento de seus membros exigindo a necessidade de ajustes e adaptações da dinâmica da família, visando um novo equilíbrio (Favarato & Gagliani, 2008; Gomes et al., 2014; Silva, Collet, Silva, & Moura, 2010;). Um estudo recente, realizado por Santos e colaboradores (2014), teve como objetivo compreender a vivência das mães acompanhantes de crianças em um hospital público da Bahia. Através de entrevistas semi estruturadas, realizadas com 11 mães, o estudo constatou que tanto a doença como a hospitalização ocorrem de maneira abrupta e que a família necessita de uma reorganização para lidar com tal situação.

De acordo com a teoria sistêmica familiar, a família é sujeita à mudança interna, que provém de mudanças evolutivas nos seus próprios subsistemas, e também à pressão exterior, proveniente das exigências para se adaptar às instituições sociais significativas, que tem impacto sobre os membros familiares. Para responder a essas exigências a posição dos membros da família necessita de uma transformação constante, de maneira que possa crescer enquanto o sistema familiar mantém continuidade (Minuchin, 1982).

Minuchin (1982) ainda refere que deveria ser dado o rotulo de patologia a famílias que aumentam a rigidez de seus padrões transacionais e barreiras em face ao estresse e evitam ou resistem a qualquer exploração de alternativas e que a estrutura da família deve ser capaz de se adaptar quando as circunstâncias mudam. A existência continuada da família, como um sistema, depende da extensão suficiente de padrões, de acessibilidade de padrões alternativos e da flexibilidade para mobilizá-los quando necessário. Como a família precisa responder às mudanças internas e externas, ela deve ser capaz de se transformar de forma que possa atender às novas circunstâncias sem perder a continuidade que proporciona um esquema de referência para seus membros.

Para a teoria sistêmica familiar, a principal tarefa psicossocial da família no mundo ocidental, o qual está em constante modificação, é a de apoiar seus membros (Minuchin & Fischman, 1990). Por conta disso, o suporte social é considerado como uma forma de relacionamento interpessoal, grupal ou comunitário, que oferece ao indivíduo um sentimento de proteção e apoio capaz de propiciar redução de estresse e bem estar psicológico. A família é a fonte primária da identidade de um indivíduo e esta é crucial para o enfrentamento de crises, que geralmente acarretam ansiedade, raiva, depressão, culpa e que abalam a identidade familiar. Apesar de as famílias terem papéis e funções, o seu principal valor são os relacionamentos, que não são substituíveis (Carter & McGoldrick, 1995).

Apesar de haver um grande sofrimento causado pelo adoecimento de um membro da família e sabendo-se da importância que tem para uma criança o acompanhamento familiar efetivo para o tratamento de uma doença, encontraram-se poucos estudos realizados pela psicologia a respeito da temática. O presente estudo tem como objetivo compreender os aspectos emocionais e relacionais envolvidos na hospitalização de um filho.

 

MÉTODO

Participantes

Participaram do estudo 4 mães, com idades entre 19 e 29 anos, cujos filhos estavam hospitalizados. As crianças tinham idades de zero a dois anos, 2 meninos e 2 meninas. Todas as mães residiam com o pai da criança. Duas das participantes não tinham outros filhos, das outras duas, apenas uma não vivia com seu outro filho. Em relação a escolaridade, uma haviam completado o ensino fundamental, duas o ensino médio e uma tinha nível superior incompleto. Três participantes tinham vínculo empregatício, uma era proprietária de seu próprio negócio e uma estava desempregada. Foram critérios de inclusão que a mãe tivesse idade superior a 18 anos de idade, que fosse a primeira hospitalização da criança, que ela fosse a principal cuidadora da criança durante o período de hospitalização, que a criança não apresentasse um diagnóstico prévio de doença crônica e/ou alguma síndrome. O tempo da hospitalização ou a gravidade da enfermidade não foram considerados como critério de inclusão ou exclusão.

Delineamento

Foi utilizado um delineamento de estudo de caso coletivo o qual não visa a saturação, mas sim compreender cada caso, examinando também as semelhanças e particularidades entre eles (Stake, 1994). Com este intuito, os quatro casos foram estudados, por análise de conteúdo qualitativa, com modelo misto, isto é, as categorias foram previamente definidas mas novas categorias também emergiram a partir da análise do material (Laville & Dionne, 1999) e os inventários foram triangulados com os dados da entrevista (Henwood & Pidgeon, 2010).

A partir da metodologia utilizada, a amostra foi interrompida por cotas, em que é pré determinado a necessidade de ser contemplado algumas características secundárias dos elementos amostrais, considerando os critérios de inclusão (Fontanella, Ricas & Turato, 2008).

Aspectos Éticos

Somente após o projeto de pesquisa ser aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital de Clínicas de Porto Alegre que foi iniciada a coleta de dados. Por se tratar de uma investigação envolvendo seres humanos, foram assegurados os aspectos éticos de pesquisa, obedecendo a Resolução Número 466/12 do Conselho Nacional de Saúde – CNS (Brasil,2012). Antes de cada indivíduo aceitar fazer parte da pesquisa, foi explicada a finalidade da mesma, sendo fornecido um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e somente após assinado foi realizada a entrevista e aplicados os instrumentos.

Procedimento

Após identificar-se as participantes que tinham critério de inclusão, foram encaminhadas para uma sala onde havia condições físicas, com iluminação adequada e livre de barulhos que pudessem distrair ou interromper o preenchimento das escalas e a entrevista. Todos os instrumentos foram aplicados em um único encontro, com duração de, aproximadamente, 40 minutos. A entrevista foi gravada e, posteriormente, transcrita e analisada juntamente com os inventários. As coletas foram realizadas de junho a agosto de 2014.

Material

Foi utilizado uma ficha com questões relacionadas ao perfil sócio demográfico, com o intuito de obter dados referente a escolaridade das mães, idades, vida laboral, religião e da constituição familiar.

O segundo instrumento foi o Inventário Beck de Depressão - BDI-II (Beck, Steer, & Brown, 1996) que consiste em uma escala auto-aplicada, composta por 21 questões, visando quantificar sintomas depressivos. A soma dos escores dos itens individuais fornece um escore total, que por sua vez constitui um escore dimensional da intensidade da depressão, que pode ser classificado nos seguintes níveis: mínimo (até 13 pontos), leve (de 14 a19 pontos), moderado (de 20 a 28 pontos) ou grave (acima de 29 pontos). Este inventário foi validado para a população brasileira por Gorenstein, Pang, Argimon e Werlang (2012), em que o coeficiente de correlação intraclasse desse inventário foi de 0,89 e o coeficiente alfa de consistência interna foi de 0,93. Adotando a SCDI como padrão ouro, o ponto de corte de 10/11 foi o melhor limiar para detectar depressão, alcançando sensibilidade de 70% e especificidade de 87%.

Após utilizou-se o Inventário Beck de Ansiedade – BAI (Beck, Epstein, Brown & Steer, 1988) no qual consiste em uma escala auto-aplicada, composta por 21 questões a qual visa medir os sintomas mais comuns de ansiedade. É utilizada para medir a gravidade do nível de ansiedade do paciente. A soma dos escores dos itens individuais fornece um escore total, que por sua vez constitui um escore dimensional da intensidade da ansiedade, que pode ser classificado nos seguintes níveis: mínimo (até 10 pontos), leve (de 11 a 19 pontos), moderado (de 20 a 30 pontos) ou grave (de 31 a 63 pontos). No que se refere à validade deste inventário para a população brasileira, a análise fatorial exploratória com rotação varimax foi utilizada, e obteve-se solução fatorial capaz de explicar 57,79% da variância total, tendo o instrumento apresentado índices de precisão por alfa de Cronbach entre 0,83 e 0,92, em amostras não clínicas (Cunha, 2001).

O terceiro instrumento utilizado foi o Inventário de Percepção de Suporte Familiar – IPSF – É uma escala auto-aplicada composta por 42 itens. É uma escala Likert, que resulta em um escore total de percepção de suporte familiar, podendo ser avaliada apenas a familiar nuclear ou a constituída. Os escores variam de 0 a um máximo de 84 pontos. A pontuação obtida é transformada em percentil e classificada como baixo, médio baixo, médio alto ou alto. Os fatores do inventário são classificados em: afetivo-consistente, adaptação e autonomia. Quanto maior a pontuação de todas as dimensões desta escala, melhor é o suporte familiar na percepção do participante. O IPSF demonstrou validade baseada na relação com outras variáveis com o questionário de saúde mental de Goldberg, lócus de controle e auto eficácia, depressão, personalidade, qualidade de vida, estilos parentais, suporte social e auto conceito. Quanto à confiabilidade, demonstrou ter índices aceitáveis, variando de 0,78 a 0,91 para as dimensões e 0,93 para a escala total e para teste-reteste variando de 0,78 a 0,97 (Spearman), (Baptista, 2009).

E por último foi realizada uma entrevista semi-estruturada que se tratava de uma entrevista com roteiro com perguntas principais podendo ser complementadas por outras questões que surgirem no decorrer da entrevista (Breakwell, 2010). Foram abordadas questões relacionadas aos sentimentos despertados frente ao adoecimento do filho e a consequente internação do mesmo, o apoio que esta díade estava recebendo da família nuclear e extensa no momento de crise.

 

RESULTADOS

Inicialmente será apresentado o contexto de cada caso e posteriormente os resultados dos Inventários aplicados.

Mãe 1

A mãe estava com 19 anos de idade e tinha apenas uma filha, que estava com 9 meses de idade. A mãe residia com o pai da criança desde o segundo mês de gestação na região metropolitana de Porto Alegre. Seu nível de escolaridade era o ensino fundamental completo e estava desempregada desde o sétimo mês de gestação. A criança estava com 13 dias de hospitalização por meningite bacteriana.

A família buscou atendimento de saúde para a criança na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de sua região quando a mãe identificou que a filha estava com febre. Lá foram realizados exames, contudo os resultados não mostraram alterações, então a criança foi liberada pela equipe médica. Em casa a família identificou piora do sintoma, além de perceberem que a criança também estava com falta de apetite, sonolência e com choro intenso. Eles buscaram atendimento em um hospital em sua cidade que, após a triagem, não foi identificado urgência e foi encaminhada novamente para a UPA. A equipe médica da UPA, mais uma vez, referiu que a criança não tinha nada, liberando-as. Porém a mãe se negou a ir embora sem atendimento, pois percebia piora no quadro clínico da filha. Então a criança foi encaminhada para o hospital novamente. Dessa vez recebeu atendimento e após realizar novo exame foi identificado meningite bacteriana e a criança foi transferida para o hospital em Porto Alegre. A mãe entendeu a transferência de hospital como um aspecto positivo, uma vez que considerava que estava indo para um local com mais recurso de saúde e maior qualificação profissional.

A mãe da criança recebeu apoio familiar para buscar atendimento médico. No momento em que percebeu piora do quadro clínico da criança, estava na casa da avó materna da criança. Nas buscas por atendimento médico para a criança, seus pais (avós maternos da criança) foram junto com ela. Seu marido estava trabalhando, porém no momento em que a mãe ligou informando que estava levando a filha para atendimento médico, saiu do seu trabalho e foi ao encontro deles.

Mesmo após a criança ter apresentado piora dos sintomas, tanto a mãe quanto a família foram surpreendidos com a hospitalização. Eles acreditavam que a criança estava com pneumonia e que seria possível realizar o tratamento no domicílio. Eles ficaram assustados com o diagnóstico e com o fato da criança ter que permanecer em isolamento

Mesmo o hospital não tendo estrutura física para acomodar o pai, ele permaneceu em tempo integral, no período de hospitalização da filha, junto da esposa e da criança. A mãe relatou que foi opção dele permanecer e que ela se sentiu apoiada e preferiu que ele estivesse junto.

A mãe relatou a experiência de hospitalização como algo muito difícil, principalmente nos primeiros momentos, em que estavam em um ambiente estranho e novo. A mãe, por não conhecer a rotina da unidade, em um primeiro momento, esteve angustiada por acreditar que não poderia ver a filha, aliviando-se quando foi explicado a rotina do hospital e que a mãe poderia permanecer em tempo integral com a criança, se assim desejasse. Também referiu que a experiência de hospitalização melhorou conforme a criança foi apresentando melhora em seu quadro clínico.

A mãe relatou que conseguia ajudar a criança a passar por esse momento de adoecimento e consequente hospitalização conversando com a filha e estando sempre perto dela. Ela também comentou que não conseguia ir para casa, porém não por falta de apoio, tendo em vista que o pai permanecia junto com a criança também, mas por não conseguir ficar longe da filha naquele momento.

Em relação a sua casa, a mãe não sabia como estava, não tendo ninguém lá desde o dia em que a filha foi hospitalizada. A principal mudança que ocorreu na vida dessa família, de acordo com o relato da mãe, foi que o pai da criança parou de frequentar o trabalho para acompanhar a esposa e a filha no período de hospitalização.

Na época da entrevista, ela acreditava que a filha teria alta em breve, tendo em vista a melhora do quadro clínico criança e o término da medicação. Em um primeiro momento, logo após a alta ela pretendia ir para casa de sua mãe, junto com sua filha e seu marido. Ela relatou que pretendia cuidar mais da filha, pois temia que adoecesse novamente e não desejava passar novamente por essa situação.

A partir da aplicação dos Inventários a mãe obteve leve sintomatologia de depressão e moderado sintoma de ansiedade. Quanto à percepção de apoio familiar constatou-se pontuação médio alto no que se refere a afetividade e consistência de regras familiares e para adaptação familiar, pontuação alta na dimensão autonomia, e pontuação alta na soma geral do instrumento.

A mãe recebeu suporte familiar para lidar com a questão de adoecimento e hospitalização de sua filha, como mostra os instrumentos aplicados. Mesmo com a percepção de suporte alta, ainda assim apresentou moderada ansiedade ao se deparar com tal situação.

Mãe 2

A mãe estava com 29 anos e tinha apenas uma filha que estava com 1 ano e 9 meses de idade. Seu nível de escolaridade era superior incompleto. Morava com companheiro há 9 anos na região metropolitana de Porto Alegre. No momento da entrevista, estava trabalhando como assistente de vendas. Sua filha estava hospitalizada fazia 4 dias, para investigar uma possível alergia medicamentosa.

No dia anterior a hospitalização, a criança foi atendida em um hospital público de sua cidade, entretanto, no dia seguinte a criança teve piora dos sintomas, levando a mãe a buscar novo atendimento médico para sua filha. Primeiro através de convênio, porém, devido ao horário, a clínica estava fechada. Como a família acreditava que a criança necessitava de atendimento, optaram por levar até um hospital público na cidade de Porto Alegre.

A mãe relatou que, mesmo já tendo buscado atendimento e a criança tendo piorado os sintomas, não esperava que houvesse necessidade de hospitalizar. Referiu ter sido impactante quando soube da notícia de que a filha teria que permanecer no hospital.

Quando optaram por levar a criança ao hospital em Porto Alegre, o pai da criança acompanhou a mãe e a filha, permanecendo até o momento da notícia da necessidade de hospitalização. A mãe referiu que, no período de hospitalização, o pai realizou visitas frequentes.

No momento de adoecimento e de hospitalização da criança, a mãe acreditava que estava ajudando a filha a passar por essa situação estando junto a ela. Em relação ao período de hospitalização ela referiu como sendo cansativo, porém sentiu alívio quando percebeu a melhora do quadro clínico da criança.

A mãe, até o momento da entrevista, permaneceu no hospital com a filha em tempo integral. Ela relatou que optou em permanecer com a filha, pois era a mãe dela. Elas receberam visitas e os avós se disponibilizaram a ficar com a criança, contudo a mãe referiu que a criança é muito apegada a ela e que não ficaria com outros familiares.

Em relação a sua casa, a mãe disse ter a abandonado e que não sabia como estava. Seu marido estava sozinho, realizando as atividades domésticas. Ela referiu estar interessada apenas na saúde de sua filha. Quanto a sua vida laboral, ela havia iniciado em uma empresa recentemente e acreditava ter perdido o trabalho devido às faltas.

Após a alta hospitalar, a mãe acreditava que os cuidados com a filha necessitariam ser redobrados em relação ao uso de medicações, e que somente ela poderia levar a filha em consultas médicas, pois seria a mais apropriada para saber ao que a filha era alérgica.

Através dos instrumentos aplicados, constatou-se que a mãe apresentava moderada sintomatologia de depressão e leve no que se refere a sintomas de ansiedade. Quanto à percepção de apoio familiar, obteve pontuação alta em todas as dimensões (afetivo-consistente, adaptação, autonomia e total). Mesmo com a percepção de suporte familiar elevado, que foi evidenciado tanto na entrevista quanto no Inventário, a mãe apresentou significativa sintomatologia de depressão. Isso pode ser entendido pelo fato do sofrimento causado da hospitalização da criança e das mudanças causadas na vida dessa familiar diante do adoecimento da filha. Também pode-se pensar que esteja relacionado com a possibilidade de sentimento de culpa da mãe por ela ter administrado a medicação que possivelmente causou a alergia na criança.

Mãe 3

A mãe estava com 29 anos de idade, residia na cidade de Porto Alegre, com seu marido e seus três filhos, que tinham idades de 8, 4 anos e 7 meses. A mãe tinha ensino médio completo. No momento da entrevista estava trabalhando como atendente. O filho que estava hospitalizado era o mais novo e estava fazia 15 dias no hospital devido a bronquiolite.

A mãe procurou por diversos atendimentos na rede pública de saúde em busca de atendimento para seu filho. Primeiro esteve na UPA de sua região, lá ele permaneceu por cinco dias recebendo tratamento. Já em casa, a mãe percebeu piora dos sintomas respiratória na criança e a levou a um hospital, onde ele recebeu medicação, e obteve alta pela equipe médica. Contudo, novamente, a mãe notou que o filho ainda estava doente e, no mesmo dia em que recebeu a alta, ela optou por levá-lo a um outro hospital, no qual ele permaneceu hospitalizado.

No momento em que a mãe percebeu piora dos sintomas do filho, ela e o marido decidiram buscar auxilio no hospital. Eles entraram em contato com os avós paternos da criança que, mesmo residindo em outro município, se dispuseram em auxiliar o casal e foram ao encontro deles. Os avós e o marido ficaram esperando até a criança receber atendimento e a notícia de que iria hospitalizar. Mesmo a família tendo buscado outros locais de atendimento de saúde para seu filho e ele não ter tido melhora, a mãe relatou ter sido surpreendida com a necessidade dele permanecer hospitalizado.

A participante referiu que se sentiu desaminada com o passar dos dias durante o período de hospitalização, pois outras crianças que estavam no mesmo quarto já haviam recebido alta e seu filho ainda não. Porém, a participante referiu que se sentiu aliviada no momento em que percebeu a melhora da criança, relatou que o único momento bom que teve no período que o filho estava hospitalizado foi quando ele voltou a sorrir. Ela acreditava que para ajudar o filho a passar pela situação de adoecimento e hospitalização, era ficar perto, abraçar, beijar e conversar.

Até o momento em que foi realizada a entrevista, a mãe tinha optado por não ir para casa. Durante o período de hospitalização receberam visitas de familiares e amigos. A mãe relatou que sua casa estava fechada e que seu marido e suas filhas foram para a casa de sua sogra. Ela se emocionou ao falar das outras filhas e mesmo recebendo visitas frequentes das crianças, sentia falta delas. As crianças não estavam indo à escola. Ela referiu que a única coisa que não havia mudado com a hospitalização da criança foi o fato do marido seguir trabalhando. Em relação ao seu emprego, não sabia seria aceito o atestado médico do filho e que somente após a alta hospitalar da criança procuraria seu chefe e então veria o que seria feito.

Através dos instrumentos aplicados constatou-se que a Mãe 3 apresentou grave sintomas de depressão e ansiedade, pontuação médio alto para afetividade consistência, médio baixo no que se refere a adaptação, baixo na dimensão autonomia e na soma total do instrumento médio baixo.

A mãe percebia sua família com significativa afetividade e clareza nas regras, porém com pouca adaptação e com sentimentos negativos em relação a sua família além de sentir-se com pouca autonomia, interferindo em suas relações. A partir da entrevista e do resultado dos instrumentos aplicados, percebeu-se, que apesar da mãe ter suporte para lidar com seus outros filhos, no momento em que permaneceu com seu filho na hospitalização, mesmo recebendo visitas frequentes dos demais familiares, ela tinha um significativo sofrimento, com importantes sintomas depressivos e ansiosos.

Mãe 4

A mãe estava com 28 anos e tinha 3 filhos, de 6, 3 e 1 ano e 5 meses de idade. O filho mais novo era quem se encontrava hospitalizado. Ela era natural da região metropolitana, porém residia no litoral com o companheiro, há três anos, e com a filha de 6 anos. A filha do meio morava com sua mãe. Ela era proprietária de um quiosque na praia. A criança estava hospitalizada fazia 17 dias devido a pneumonia.

No dia anterior à hospitalização, a criança foi levada ao posto de atendimento na rede básica. Ele recebeu atendimento e iniciou o tratamento em casa. A mãe percebeu piora do quadro clínico do filho e o levou novamente ao posto de saúde. Após o atendimento ele foi encaminhado para o hospital da região onde residiam. Porém a criança seguiu com piora do quadro clínico e foi transferida ao hospital da capital por ter mais recursos. A mãe relatou que quando buscou o último atendimento, ela esperava que seu filho iria hospitalizar, pois percebeu que ele não estava bem.

A mãe levou o filho sozinha ao posto de saúde, porém no momento em que recebeu a notícia que ele teria a necessidade de hospitalizar, ligou para seu marido avisando e para toda sua família. A cunhada, que residia na região metropolitana da capital, eventualmente ficava com a criança no hospital para que a mãe pudesse descansar.

Em relação a hospitalização, a mãe relatou cansaço, contudo sentia alívio quando percebia a melhora do filho. Ela acreditava que a maneira como conseguia ajudar o filho a passar por esse momento de adoecimento era cuidando, dando muito amor, carinho e atenção a ele.

No momento em que seu filho necessitou de hospitalização na capital, a família (marido e filha que residia com ela) veio para casa de sua cunhada, na região metropolitana, para ficarem mais próximos. Nesse período sua filha parou de frequentar a escola. Quando o quadro clínico do filho estabilizou seu marido e sua filha retornaram para o litoral. No período em que o marido não estava no litoral, o quiosque que ela é proprietária, ficou fechado, porém quando ele retornou, o reabriu e ficou responsável pelo local.

Antes da hospitalização a criança frequentava a creche, porém o planejamento da mãe em relação aos cuidados após a alta hospitalar, era de contratar uma pessoa para cuidar do seu filho no domicilio, pois a participante temia que ele adoecesse novamente. A partir dos inventários aplicados a mãe não apresentou sintomas depressivos nem ansiosos. Quanto à percepção de suporte familiar, ela obteve pontuação alta nas dimensões afetividade-consistência e adaptação, média alta em autonomia e na soma total do instrumento pontuação alta. Juntamente com a entrevista e com os inventários, a mãe informou receber suporte familiar adequado para lidar com as questões advindas da hospitalização do filho.

No Quadro 1 é possível ver os resultados dos participantes para cada instrumento.

 

 

Resultados dos Inventários

 

DISCUSSÃO

No presente estudo evidenciou-se que quatro participantes buscaram atendimento em outros serviços de saúde antes de recorreram ao hospital em que ocorreu a hospitalização da criança, ficando evidente as lacunas significativas existentes no serviço de saúde e na ação profissional das equipes envolvidas nos atendimentos (Oliveira, Veronez, Marques, Higarashi, & Marcon, 2014).

Mesmo quando as mães perceberam o agravo da saúde de seus filhos e buscaram auxílio médico, três familiares foram surpreendidas com a notícia de hospitalização das crianças, apenas a Mãe 4, imaginava que seu filho poderia hospitalizar. Essa surpresa com a notícia da hospitalização também foi referida no estudo de Santos e colaboradores (2014), em um hospital público na Bahia. As mães relataram surpresa com a internação de seu filho e com a necessidade de permanecer mais tempo que o esperado fora de sua residência, modificando seu cotidiano e ocasionando insegurança acerca do futuro e do que iria acontecer com seu filho a partir daquele momento.

Quando os filhos estão doentes, as mães costumam sentir-se mais seguras acompanhando a criança hospitalizada (Sheneider & Medeiros, 2011). Os achados do presente estudo mostraram que todas as mães, mesmo com a possibilidade de outros familiares acompanharem seus filhos, optaram por permanecer junto a eles por considerarem que a criança ficaria melhor com ela. O estudo de Santos e colaboradores (2011) mostrou que a própria criança costuma eleger a mãe como protetora dentre outros familiares. Foi relatado pelas Mães 2, 3 e 4 que as crianças não ficariam com ninguém, a não ser com elas, corroborando a literatura.

Apesar da hospitalização ocorrer de maneira inesperada e modificar o cotidiano familiar, por outro lado saber que o filho está recebendo uma assistência de qualidade deixa as mães mais serenas (Santos et al., 2014), o que ficou evidente, principalmente a partir das falas das Mães 1 e 4, em que as crianças tiveram que ser transferidas do hospital de origem devido à falta de recurso. Ambas relataram satisfação, pois estavam indo para um local com mais recurso de saúde e maior qualificação profissional. Além disso, todas as quatro mães referiram que, apesar de ter sido difícil receber a notícia de hospitalização, sentiam-se aliviadas, pois a criança estaria recebendo os cuidados necessários naquele momento.

O surgimento de uma doença exige rapidez para a busca de atendimento médico. Somente quando o filho está no hospital é que a família pensa na organização de suas rotinas. As mudanças ocorrem no cotidiano e também no âmbito familiar e exigem alterações nos relacionamentos (Sheneider & Medeiros, 2011). No presente estudo evidenciou-se as mudanças de organização na rotina das famílias em todos os casos analisados.

De acordo com achados de diversas pesquisas realizadas, uma mudança importante que ocorre quando um filho adoece e necessita hospitalização, é as mães abdicarem de seu trabalho para cuidarem das crianças (Figueiredo et al., 2013; Mendonça, 2009; Sheneider & Medeiros, 2011). No presente estudo, todas participantes que tinham vínculo empregatício, não sabiam se seria aceito o atestado médico do filho e se ainda estavam empregadas.

No que se refere a mudanças nos relacionamentos familiares, foi possível identificar que a maioria das participantes apresentou modificações significativas nas funções familiares, corroborando com a literatura da teoria sistêmica familiar, em que Minuchin (1982) traz que quando um membro da família adoece, suas funções e poderes passam a ser atribuídos entre os outros membros e que nessa situação de estresse a família extensa pode ser chamada para apoiar, guiar ou organizar as novas funções na família. Houve peculiaridades em cada caso, porém todas tiveram o apoio dos maridos para que pudessem acompanhar seu filho no período de hospitalização e também obtiveram o apoio da família extensa.

Outra modificação importante ocorreu nas famílias que residiam com seus outros filhos. As crianças deixaram de frequentar a escola devido ao adoecimento do irmão, por estarem aos cuidados de outros familiares em outros locais que não suas casas, longe da escola. A família extensa também teve alteração em seu papel, tendo em vista que ficaram responsáveis pelos cuidados dos irmãos das crianças que foram hospitalizadas. Diversos estudos apontam que ocorrem mudanças na dinâmica da família com a hospitalização de um membro da família (Gomes et al., 2013, 2014; Santos et al., 2013; Sell, Sell, Nascimento, Padilha, & Carvalho, 2012; Sheneider & Medeiros, 2011;), o que foi corroborado pelo presente estudo.

De acordo com Minuchin e Fischman (1990), a principal função da família é de apoiar seus membros. No presente estudo identificou-se que todas as mães entrevistadas obtiveram algum tipo de rede de apoio de seus familiares no momento do adoecimento do filho, seja no momento em que decidiram buscar ajuda médica às crianças ou mesmo depois de já terem tido o atendimento. Esse dado apareceu tanto no instrumento IPSF como nas entrevistas. A questão do apoio corrobora também os achados do estudo de Figueiredo e colaboradores (2013). Nesse estudo, com mães de crianças hospitalizadas, evidenciou-se que os familiares, mesmo sem ter a possibilidade de visitar a criança no hospital, eram importantes fontes de apoio, pois proporcionavam suporte de outras maneiras, seja estando ao lado dos outros filhos, cuidando da casa ou suprindo a família financeiramente e emocionalmente. O apoio pode ser manifesto através da organização da família (nuclear e/ou extensa) para que o cuidador possa permanecer com a criança doente no hospital (Gomes, Pintanel, Strasburg, & Erdman, 2011), conforme foi relatado pelas mães do presente estudo através da entrevista e confirmado com o instrumento IPSF.

O presente estudo vai ao encontro da literatura que refere que além do sofrimento das mães em relação a doença do filho hospitalizado, as mães também se preocupam com seus outros filhos (Melo, Marcon, & Uchimura, 2010; Santos et al., 2013). A partir das falas das participantes que residiam com outros filhos, ficou evidenciado o elevado sofrimento e o quanto sentiam falta deles.

Conforme o relatado no estudo de Sheneider e Medeiros (2011), algumas das estratégias utilizadas pelos familiares para enfrentar a hospitalização dos filhos são dar muito amor, carinho e atenção ao filho, o que foi relatado por todas as mães do presente estudo. Além disso, o instrumento IPSF também corroborou esse dado, visto que todas mães apresentaram escore alto ou médio-alto na dimensão afetivo-consistente, o que indica uma boa afetividade entre os membros da família.

Sintomas de depressão e suporte familiar parecem estar associados de forma oposta, pois quanto maior a sintomatologia de depressão, pior o suporte familiar percebido (Baptista, 2009). No presente estudo, essa relação ocorreu nas Mães 1, 3 e 4. A mesma relação encontrada ocorre com sintomas de ansiedade e percepção de suporte familiar, isto é, quanto maior ansiedade, menor a percepção do suporte familiar, o que ficou evidenciado nas Mães 2, 3 e 4. Por esse ser um estudo de caráter qualitativo, com poucos casos, ainda assim esses achados podem ser considerados relevantes, pois dão indícios do sofrimento das mães relacionado a falta de percepção de suporte familiar. Novos estudos podem complementar esses resultados.

Além disso, sabe-se que o funcionamento psicossocial dos pais é importante para a saúde física e mental da criança e que as atitudes dos pais em a relação a hospitalização pode influenciar no impacto da doença e na adesão ao tratamento do filho (Commodari, 2010, Marcelli & Cohen, 2010; Silva et al., 2010 ). Portanto pode-se considerar que o uso de instrumentos psicológicos como os utilizados no presente estudo (BDI, BAI e IPSF) pode ajudar a triar as mães que estejam em sofrimento emocional e necessitariam de algum tipo de intervenção ou apoio psicológico durante a hospitalização dos seus filhos. Tendo em vista os poucos profissionais de psicologia em vários hospitais, fazer entrevistas individuais com as mães pode ser muito difícil, ou até mesmo inviável, e algumas podem inclusive ter dificuldade em sair de perto da criança, como relatado por várias mães do presente estudo. Nesse sentido, a aplicação de tais instrumentos poderia ser de auxílio importante, pois são simples e rápidos de serem aplicados, podem ser aplicados junto ao leito da criança por serem de auto-relato (mesmo que algumas mães eventualmente venham a precisar de auxílio caso a escolaridade seja baixa) e conforme indicado pelos resultados do presente estudo, podem ser fidedignos em triar quais mães precisariam de uma atenção maior por parte dos profissionais.

Assim como no estudo realizado por Guidolin e Célia (2011) em que não foram todas as mães que apresentaram sintomas de depressão e de ansiedade, o presente estudo mostrou que, apesar de todas as mães demonstrarem sofrimento com a hospitalização de seus filhos, elas reagiram de maneiras distintas. Enquanto umas apresentaram maior sintomatologia de depressão, outras mostraram-se com mais sintomas de ansiedade. Isso poderia ser explicado por outras variáveis que não foram contempladas no presente estudo, como personalidade de cada participante, qualidade de relacionamento conjugal, gravidade da doença da criança, situação clínica da criança no momento da entrevista, tempo de hospitalização, problema financeiro, dentre outros eventos estressores que podem ser investigadas em novos estudos.

Os resultados encontrados corroboraram a expectativa inicial de que a hospitalização de uma criança pode trazer sofrimento importante nas mães que acompanham seus filhos no momento de hospitalização e que altera significativamente suas relações familiares.

As famílias, no momento de agravo dos sintomas relataram receber apoio familiar para buscar atendimento e mesmo no decorrer do período de hospitalização, seja recebendo visitas, ou mesmo a família extensa se organizando para lidar com as questões externas do hospital. As mães optaram por ficar com seus filhos no período de hospitalização, assim sentiam-se seguras e percebiam que estavam ajudando as crianças a passarem por esse momento de adoecimento e de estarem hospitalizados.

O sofrimento das mães e as questões relacionadas ao apoio percebido por elas pôde ser evidenciado, além das entrevistas, com a triangulação dos dados (Henwood & Pidgeon, 2010), utilizando dados sócio demográficos, os inventários BDI-II, BAI, IPSF e a entrevista semiestruturada que auxiliou a evidenciar tais dados. Esta investigação foi qualitativa de quatro casos, dessa forma, as conclusões não são passíveis de generalizações (Alves-Mazzotti, 2006), mas ainda podem ser úteis, visto que o delineamento de estudo de casos permite um aprofundamento maior das questões, o que auxilia na elaboração de hipóteses para uma compreensão da problemática estudada (Yin, 1984). Pode-se pensar que são considerações relevantes com relação a dinâmica alterada dessas pessoas que passam por tal situação. Além disso, os resultados sugerem que o uso de alguns inventários pode ajudar na triagem de casos que precisam de apoio psicológico durante a internação da criança.

Embora o presente estudo esteja pautado na teoria sistêmica de família, que historicamente tem realizado inúmeras críticas aos estudos que enfocam apenas a díade mãe-criança (Minuchin, 1985), como as mães do presente estudo referiram preferir ficar como principal acompanhante da criança, algumas não tendo ido para casa ainda durante o período da hospitalização, não foi possível ter acesso aos demais familiares das crianças de todos os casos. No entanto, sugere-se que novos estudos deveriam incluir os demais familiares, tendo em vista que tal situação afeta todo o grupo familiar. Além disso, o presente estudo não considerou algumas variáveis que poderiam ser relevantes como o tempo de hospitalização da criança e a gravidade da doença, por isso, sugere-se que novos estudos poderiam ser realizados considerando tais aspectos.

Diante de todas as rupturas, modificações e sofrimento gerado pela hospitalização de um familiar, fica evidente a importância do acompanhamento do psicólogo hospitalar com os acompanhantes das crianças, independentemente da gravidade da doença da criança, auxiliando essas famílias a lidarem com o sofrimento, com a questão estrutural e adaptações a qual a família vai enfrentar.

 

REFERÊNCIAS

Albuquerque, D. B., Morais, R. C. M, Macedo, I. F., Vieira, R. F. C., & Souza, T. V. (2013). A família no cenário hospitalar pediátrico a partir da década de 1990: uma revisão integrativa. Cogitare Enfermagem, 18, p. 789-95.         [ Links ] doi:10.5380/ce.v18i4.34938

Alves-Mazzotti,A.J. (2006). Usos e abusos dos estudos de caso. Cadernos de Pesquisa, 33, 637-651. doi: 10.1590/S0100-15742006000300007        [ Links ]

Baptista, M. N. (2009). Inventário de Percepção de Suporte Familiar – IPSF. São Paulo, Brasil: Vetor.         [ Links ]

Yin, R. K. (1984). Case study research: design and methods. Londres, Inglaterra: Sage.         [ Links ]

 

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Recebido em 13 de Dezembro de 2015

Aceite em 15 de Maio de 2017

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