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Psicologia, Saúde & Doenças

versión impresa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.17 no.3 Lisboa dic. 2016

https://doi.org/10.15309/16psd170318 

Hospitalização de pessoas idosas: espiritualidade, risco de dependência, quedas e readmissão

Hospitalization of the elderly: spirituality, risk of dependence, risk of falls and readmission

 

Gorete Santos1, Liliana Sousa2, & Pedro Sá Couto3

1Enfermeira no Hospital Infante D. Pedro, EPE, 3810-005 Aveiro, Portugal. e-mail: gorete_@hotmail.com;

2Departamento de Ciências da Saúde, Universidade de Aveiro, 3810-193 Aveiro, Portugal. e-mail: lilianax@ua.pt;

3Centro de Investigação e Desenvolvimento em Matemática e Aplicações (CIDMA) Departamento de Matemática (DMAT), Universidade de Aveiro, 3810-193 Aveiro, Portugal. e-mail: p.sa.couto@ua.pt

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

Este estudo adota a perspetiva da pessoa idosa (≥65 anos) analisando a influência da hospitalização, em três momentos (admissão, alta e 6 a 12 meses depois), nas variáveis: in/dependência funcional; risco de quebra de cuidados; risco de quedas; espiritualidade. Com base nessas variáveis, organizou-se um modelo preditivo de óbitos. A amostra compreende 250 participantes, 50,4% do sexo feminino. Administrou-se o EASYcare e a Escala da Espiritualidade. Os principais resultados indicam que: i) na admissão, os participantes são mais independentes, ii) na alta e follow-up, são mais dependentes; iii) na admissão, o risco de rutura de cuidados é menor, por comparação com a alta; iv) no follow-u, o risco de queda é menor, enquanto na alta é superior. Os dados sugerem a alta é o momento mais crítico, emergindo alguma recuperação no follow-up. O modelo preditivo de óbitos sugere que os factores protectores de falecimento entre admissão e alta são rendimentos suficientes e ausência de apoio social; os factores de risco de falecimento entre alta e follow-up são idade e risco de queda elevado; os factores protectores de falecimento entre admissão e follow-up são antecedentes clínicos do foro cardíaco.

Palavras-chave: idosos; qualidade de vida; hospitalização; mortalidade

 

ABSTRACT

This study adopts the perspective of the elderly people (≥ 65 years old) to examine the influence of hospitalization at three moments (admission, hospital discharge, and follow-up 6 to 12 months later) in the variables: in/dependence; risk of breakdown in care; risk of falls; spirituality. Based on these variables was organized a model predictive of death. The sample comprised 250 participants, 50.4% were female. The EASYcare and Spirituality Scale were administered. The main results are: i) in admission the participants are more independent; ii) in discharge and follow-up are more dependent; iii) in admission the risk of rupture care is lower compared with the discharge; iv) at follow-up the risk of falling is lower, while on discharge is higher. Data suggest that discharge is the most critical moment, emerging some recovery at follow-up. The predictive model of death suggests: protective factors of death between admission and discharge are medium income and lack of social support; risk factors of death between discharge and follow-up are age and high risk of falling; protective factor of death between admission and follow-up is clinical history of cardiac problems.

Keywords: older persons; quality of life; hospitalization; mortality

 

A hospitalização em todas as idades é vivida com ansiedade, que tende a aumentar na velhice pela associação à diminuição da qualidade de vida (QV) e ao aumento de probabilidade de dependência funcional, risco de quedas, reinternamento hospitalar e mortalidade (Eliopoulos, 2005). A literatura refere que em cerca 34% a 50% das pessoas idosas vai aumentar a dependência funcional ao longo da hospitalização (Kamasaki & Diogo, 2007). A dependência funcional nas pessoas idosas tende a aumentar na alta e fase posterior do internamento hospitalar (Ponzetto et al., 2003). Este aumento tem sido associado a vários fatores, que conjugam as alterações normativas do envelhecimento, com elementos da hospitalização como: o repouso no leito ou imobilidade; interação medicamentosa; polimedicação; procedimentos de diagnóstico; procedimentos médicos e de enfermagem (Boyd et al., 2009; Hoogerduijn 2011; Kamasaki & Diogo, 2007). Um internamento hospitalar nos últimos 12 meses aumenta 4 vezes o risco de reinternamento nas pessoas idosas (Kamasaki & Diogo, 2007). Este ciclo tende a aumentar o número de readmissões hospitalares (Graf, 2006), pois a hospitalização associa-se a novas incapacidades ou agrava as pré-existentes. Os fatores de risco de readmissão hospitalar são: incapacidade funcional, gravidade da doença, co-morbidades, polimedicação e idade avançada (Campbell, Seymour, & Primrose, 2004; Franchi et al., 2013). Os doentes idosos tendem a ter internamentos mais prolongados, com superior morbilidade e mortalidade nos meses seguintes, sendo que ao final de 6 meses a taxa de mortalidade tende a ser superior a 20% (Ponzetto et al., 2003). As principais causas de morte em Portugal são doenças do aparelho circulatório, respiratório e neoplasias (Nicolau, Machado, Falcão, & Nunes, 2008). Os fatores de risco de mortalidade nas pessoas idosas são: sexo (masculino); idade (a probabilidade aumenta com a idade); hospitalização; dependência funcional; deficit cognitivo; estilos de vida (como tabagismo, sedentarismo); isolamento social; falta de suporte familiar; baixo nível socioeconómico; e auto-percepção de saúde frágil (Ponzetto et al., 2003).

As quedas têm impacto negativo na vida dos idosos, aumentando o risco de lesões, em hospitalização, institucionalização ou morte (Ribeiro, E. Souza, Atie, A. Souza, & Schilithz, 2008; Rodrigues, 2012). Aproximadamente 28% a 35% das pessoas com 65 anos ou mais sofrem uma queda por ano; este número aumenta para 32% a 42% nas pessoas com 70 anos ou mais (WHO, 2007). A etiologia das quedas na velhice é multifatorial, sendo exacerbada por algumas doenças crónicas e limitações sensoriais (Paula, Fonseca, Oliveira, & Rozenfeld, 2010).

A hospitalização e as readmissões hospitalares/institucionalizações constituem um período de vulnerabilidade e a espiritualidade têm demonstrado ser um bom mecanismo de coping (Pinto & Pais-Ribeiro, 2007; Santos & Sousa, 2013; Siqueira, Cordeiro, Perracini, & Ramos, 2004). Em Portugal, não foram encontrados estudos sobre hospitalização e QV. Contudo, a pesquisa internacional mostra que, principalmente na velhice, na sequência de um internamento hospitalar tende a ocorrer diminuição da perceção de QV, associada à perda de capacidade funcional e maior prevalência de co-morbilidades (Siqueira et al. 2004). A definição mais consensual de QV é a da OMS, também utilizada no Programa Nacional para a Saúde das Pessoas Idosas (DGS, 2004, p.6): “perceção individual da posição na vida, no contexto do sistema cultural e de valores em que as pessoas vivem e relacionada com os seus objetivos, expectativas, normas e preocupações. É um conceito amplo, subjetivo, que inclui de forma complexa a saúde física da pessoa, o seu estado psicológico, o nível de independência, as relações sociais, as crenças e convicções pessoais e a sua relação com os aspetos importantes do meio ambiente”. Nesta definição prevalece a subjetividade (perspetiva individual), multidimensionalidade (várias componentes). Nesta definição prevalece a ideia de subjetividade, multidimensionalidade, incluindo umas positivas e outras negativas (para uma “boa” qualidade de vida é necessário a presença de alguns elementos e a ausência de outros), envolvendo influência de fatores internos e externos (por exemplo, estilo de vida). É pertinente conhecer a influência da hospitalização na QV das pessoas idosas, para melhor planear os serviços e recursos durante o internamento, respondendo melhor às necessidades e características destas pessoas.

Este estudo adota a perspetiva da pessoa idosa (≥65 anos) para analisar a influência da hospitalização, considerando três momentos (admissão, alta e 6 a 12 meses depois), nas seguintes variáveis: in/dependência funcional; risco de quebra de cuidados; risco de quedas; espiritualidade. Em termos específicos: i) caracteriza e compara essas variáveis nos três momentos; ii) estabelece um modelo de preditivo de mortalidade baseado nessas variáveis e em variáveis sociodemográficas e clínicas (idade, sexo, rendimento, apoio social, diagnóstico/motivo de internamento e antecedentes clínicos). Os resultados permitirão elaborar recomendações para promover a QV das pessoas idosas durante e após a hospitalização.

 

MÉTODO

Foi adotada uma metodologia quantitativa, de características descritivas, comparativas e correlacionais. Este estudo foi aprovado pelo Conselho de Ética (nº 762/CA) do Hospital Infante D. Pedro, E.P.E., em 14 Outubro de 2009.

Participantes

Na admissão a amostra compreende 250 participantes, 50,4% do sexo feminino. A média (M) etária é de 79,6 anos com um desvio-padrão (DP) de 7,6; 59,6% residentes em meio urbano. Quanto ao estado civil, 49,2% são casados e 44,4% são viúvos. Observa-se que 41,6% vive em casal, 39,2% em família e 6% estão institucionalizados. A maioria dos participantes está aposentada (62,0%). Em relação ao rendimento: 70% indica ser “suficiente”; 26,4% refere que “não chega para as necessidades. Verifica-se predomínio de baixa escolaridade, sendo a média de 2,4 anos de escolaridade (DP=2). Em relação ao diagnóstico clínico ou motivo de internamento, categorizados de acordo com os aparelhos do corpo humano, observa-se: 36,8% do aparelho respiratório; 18,8% com multipatologias; 14,4% do aparelho neuro-hormonal; 11,6% do aparelho circulatório. Quanto aos antecedentes clínicos: 44% - mulitpatologias; 21,6% - aparelho circulatório; 9,2% antecedentes clínicos relevantes. Em relação ao apoio social: 85,2% - sem apoio; 7,2% - lar de idosos; e 6,8% – apoio domiciliar.

Na alta a amostra compreende 182 participantes (72,8%); o decréscimo ocorreu porque 13,2% (n=33) faleceram, 9,6% (n=24) ausentaram-se do serviço sem reinquirição, 3,2% (n=8) foram transferidos de serviço e 1,2% (n=3) recusaram responder. O tempo médio de internamento foi 10 dias (DP=3,9), variando entre 3 e 25 dias.

O follow-up (6 a 12 meses após a alta) envolve 127 participantes (50,8% da amostra inicial); esta diminuição deveu-se a: 36 falecimentos; 15 não reuniam condições para responder (problemas cognitivos); e não foi possível contactar 4. Nesta fase, a amostra tem 54,3% participantes do sexo feminino. A média etária é de 76,4 anos (DP=7,4), 61,4% residentes em meio urbano. Quanto ao estado civil, a maioria é casada: 54,3%. A maioria encontra-se reformada (63,8%). Em relação ao rendimento: 72,4% refere ser “suficiente” e 3,1% afirma “sobrar algum dinheiro”. Verifica-se o predomínio de baixa escolaridade, sendo a média de 2,6 anos de escolaridade (DP=2,0).

Quanto aos antecedentes clínicos: 40,9% - com mulitpatologias; 20,5% - do aparelho circulatório; 10,2% sem antecedentes clínicos relevantes. Em relação ao apoio social: 70,9% - sem apoio; 15,7% – apoio domiciliar e 11,8% - lar de idosos.

Nas três fases, a amostra apresenta distribuição similar em todas as variáveis, com exceção da variável “apoio social”: essencialmente vai aumentando a percentagem de participantes com apoio social formal ao longo das fases.

Uma referência aos participantes entrevistados na admissão e que morreram durante o internamento (n=33): média de idade de 76,9 anos; 51,5% a viver em família; 78,8% reformados; 66,7% referiu que os seus rendimentos eram “suficientes” e nenhum referiu “sobrar algum dinheiro”. Quanto ao apoio social: 81,8% - sem apoio; 12,1% - lar de idosos; e 6,1% - apoio domiciliar. Em relação ao diagnóstico: 33,3% - doenças respiratórias; 21,2 % - doenças do aparelho neuro-hormonal; 15,2% - multipatologias. Quanto aos antecedentes clínicos: 45,5% - multipatologias, 27,3% - patologia do aparelho circulatório; 3% sem antecedentes clínicos relevantes.

Em relação aos participantes que faleceram entre a alta e o follow-up (n=36): a média de idade é 80,7 anos (DP=7,6); 63,9 % são do sexo masculino; 80,6% referiu que os seus rendimentos eram “suficientes”; média de 2,6 anos de escolaridade (DP=1,9); e 38,9% viviam em casal. Em relação aos antecedentes clínicos: 47,2% - multipatologias, 22,2% patologia do aparelho circulatório; 11,1% sem antecedentes clínicos relevantes.

Procedimento

Neste estudo foram selecionadas pessoas idosas (≥65 anos) internadas no serviço de Medicina 1, 2 e 3 (serviços que atendem as pessoas idosas) do Hospital Infante D. Pedro, E.P.E. O tamanho da amostra foi determinado após pesquisa sobre o número de doentes com ≥65 anos admitidos no serviço de medicina interna em 2009 (ano anterior à recolha dos dados), através do Gabinete de Gestão de Informação do Hospital. Verificou-se o internamento de 391 pessoas idosas em 2009; uma amostra representativa (Krejcie & Morgan, 1970), incluiria 196 participantes, mas optou-se por 250 participantes, considerando a potencial morte experimental.

Os instrumentos foram aplicados por entrevista à amostra em três fases: admissão, alta e 6 a 12 meses após a alta (follow-up). Na admissão foram aplicados 250 questionários; os doentes eram contactados pela primeira autora que pedia a sua colaboração. Quando os doentes tinham alta clínica, o profissional de serviço contactava a primeira autora que realizava as entrevistas. As entrevistas na admissão e alta decorreram no hospital, sempre em locais que respeitavam a privacidade e após a assinatura do consentimento livre e esclarecido. Tiveram uma duração entre 30/40 minutos e decorreram entre janeiro e agosto de 2010. Após 6 a 12 meses da alta, os participantes eram contactados (por telefone, até o máximo de 3 tentativas; após essas tentativas, o participante era excluído). Esta recolha decorreu até janeiro de 2011. As entrevistas realizaram-se em casa dos participantes e duraram entre 60 e 90 minutos.

Instrumentos

No estudo utilizou-se: i) questionário socioeconómico e clínico (sexo, idade, escolaridade, profissão anterior à reforma, local de residência, diagnóstico ou motivo de internamento, data de internamento no serviço, tipo de apoio social recebido); ii) três pontuações do EasyCare (Elderly Assessment System, Sistema de Avaliação de Idosos; versão portuguesa) independência, risco de rutura de cuidados e risco de quedas (Sousa, et al., 2009); iii) Escala de Avaliação da Espiritualidade (Pinto & Pais-Ribeiro, 2007).

Independência, risco de rutura de cuidados e risco de quedas: EASYCare

O EASYcare é um instrumento de rápida e simples utilização, que avalia múltiplos domínios da QV em pessoas idosas (≥ 65 anos), adotando a sua perspetiva. Globalmente, contempla as seguintes dimensões: aspetos sensoriais, autocuidado, mobilidade, segurança, condições de habitação, situação financeira, atividade física e saúde mental e bem-estar. A partir dessas dimensões (tabela 1) é possível calcular três pontuações: risco de queda (0-8 pontos); risco de rutura de cuidados (envolve risco de reinternamento e institucionalização; 0-12 pontos); independência funcional (0-100 pontos). Valores mais elevados significam maior dependência, risco de queda e rutura de cuidados. Verificamos a consistência interna destas 3 dimensões e obtivemos os seguintes valores de Alpha de Cronbach:,76-independência funcional; ,82 risco de rutura de cuidados; ,74 risco de queda. Este instrumento capta a perceção dos respondentes (Sousa, Galante, & Figueiredo, 2003), não podendo ser aplicado a pessoas incapazes de se expressar (com alterações da linguagem ou alterações cognitivas).

 

 

Escala de Avaliação da Espiritualidade

 Esta escala foi desenvolvida por Pinto & Pais-Ribeiro (2007) para avaliar a espiritualidade na prática clínica. Compreende 5 itens, numa escala de Likert de 4 pontos, variando entre 1 (não concordo) e 4 (plenamente de acordo). Pontuações mais elevadas indicam maior espiritualidade. A escala revelou boa consistência interna (alpha de Cronbach: ,74 - escala global; 0,92 - fator “crenças”; 0,69 - fator “esperança/otimismo”). A análise fatorial confirmatória exploratória para a amostra deste estudo revelou os mesmos fatores; os valores do alpha de Cronbach são também bons: 0,85 - escala global; 0,82 - fator “crenças”; 0,81 - fator “esperança/otimismo”.

Análise Estatística

As variáveis sociodemográficas são apresentadas através da estatística descritiva. Para os resultados da inferência estatística, nas variáveis “estado civil” e “com quem vive” ignoram-se algumas categorias (divorciados, n=3; sozinhos, n=5; viviam em instituição, n=4 e noutras situações, n=2) por terem um número reduzido e não representante da amostra. Efetuou-se uma análise da variância (ANOVA) de dois fatores mistos, para estudar diferenças entre as variáveis do estudo e os três momentos de avaliação, bem como a sua interação, considerando as três pontuações do Easy-care e a Escala da Espiritualidade. Os pressupostos para a aplicação desta ANOVA (normalidade dos resíduos, homogeneidade da variância e o critério da esfericidade) foram cumpridos. Quando o critério da esfericidade não foi cumprido, o desvio da esfericidade foi validado pelo critério de Huynh-Feldt (> 0,75). Para analisar o grau de correlação entre as variáveis em estudo, utilizou-se o teste correlação de Spearman-Rank, com o seguinte critério: >0,19 = muito baixa; 0,20 a 0,30 = baixa; 0,40 a 0,69 = moderada; 0,70 a 0,89 = elevada; > 0,89 = muito elevada. Para analisar o grau de dependência entre os resultados da variável mortalidade (considerando as categorias sobrevivente ou não sobrevivente) em função das variáveis sociodemográficas, foi elaborado um modelo de regressão logística. Este modelo de previsão foi estabelecido para cada período temporal (entre a admissão e alta, entre a alta e o follow-up e entre a admissão e o follow-up). Os testes de ajustamento Hosmer and Lemeshow mostraram um modelo ajustado aos dados e a proporção de variabilidade explicada, avaliado pelo cálculo do Cox e Snell R2 e Nagelkerke R2. Todos os resultados estatísticos foram calculados usando Predictive Analytics Soft Ware (PASW-SPSS) Statistics 18 (IBM Corporation, Armonk, NY), e um p-value inferior a 0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

 

RESULTADOS

Independência, risco de rutura de cuidados e risco de quedas

Os resultados totais evidenciam diferenças significativas (p<0.05) em todas as pontuações do EASYcare, considerando as 3 fases: admissão, alta e follow-up. Na independência, observa-se que na admissão os participantes são mais independentes (M=27,3; DP=24,3), enquanto na alta (M=37,9; DP=27,3) e no follow-up (M=37,2; DP=26,4) são significativamente mais dependentes. Na pontuação de risco de rutura de cuidados também na admissão os participantes apresentam risco menor de rutura de cuidados (M=4,4; DP=2,9), por comparação com a alta (M=6,5; DP=2,7). Na pontuação de risco de queda é no follow-up que os participantes apresentam significativamente menor risco (M=1,9; DP=1,3), enquanto na alta o risco é maior (M=2,9; DP2,0). Analisamos em seguida cada pontuação considerando as variáveis sociodemográficas e clínicas.

Na pontuação de independência apenas nas variáveis “estado civil” [F(2;121)=13,3;p<,001], “com quem vive” [F(2;118)=6,4;p<,001] e “rendimento” [F(1;125)=9,4;p=,003] ocorrem diferenças significativas. Relativamente ao “estado civil”, os viúvos são significativamente mais dependentes em todas as fases do que os casados. Em relação a “com quem vive”, quem vive em família é significativamente mais dependentes em todas as fases; na admissão e no follow-up os mais independentes são os que vivem sozinhos; enquanto na alta os mais independentes são os que vivem em casal. Quanto à variável “rendimento”, quem indica ser insuficiente é significativamente mais dependente em todas as fases. Apenas a interação entre a variável “diagnóstico/motivo de internamento” e as fases do estudo foi significativa [F(7,3;223,5)=4,8;p<,001]; ou seja, existe relação entre o diagnóstico clínico/motivo de internamento e a in/dependência (tabela 2). Observa-se que os participantes que na admissão apresentam diagnóstico do foro neuro-hormonal (inclui AVC) são os mais independentes na admissão, e os mais dependentes na alta e follow-up. Verifica-se uma tendência, não significativa, na variável “apoio social” [F(1,8;222,0)=3,1, p=0,052]; na admissão os participantes mais dependentes têm mais apoio social do que os menos dependentes, mas a diferença diminui ao longo das fases.

Em relação à pontuação de rutura do cuidado, as variáveis “rendimento” [F(1;125)=17,2;p<,001] e “antecedentes clínicos” [F(5;121)=2,9;p=0,015] apresentam diferenças significativas. No “rendimento” os participantes que referem rendimentos insuficientes apresentam significativamente maior risco de rutura de cuidados em todas as fases, sendo na alta o momento de maior risco. Relativamente aos “antecedentes clínicos”, na admissão são os participantes com antecedentes do foro neuro-hormonal que apresentam maior risco de rutura de cuidados; na alta o maior risco ocorre nos participantes com antecedentes do foro circulatório; no follow-up o maior risco ocorre nos participantes com antecedentes de multipatologias. Quanto à interação das variáveis, não foram encontradas diferenças significativas, com exceção de “com quem vive” [F(2,9;170,7)=2,7;p=0,047]; na admissão os participantes que viviam sozinhos apresentavam maior risco de rutura do cuidado; nas outras fases são os que vivem em família que apresentam risco mais elevado.

No risco de queda, as variáveis com diferenças significativas são: estado civil [F(1;117)=17,7;p<,001], com quem vive [F(2;118)=4,6;p=0,012], rendimento [F(1;125)=17,5;p<,001]. Em termos de estado civil, os viúvos apresentam significativamente maior risco de queda nas três fases (mais elevada na alta). Relativamente a “com quem vive”, os que vivem sozinhos apresentam maior risco de queda na admissão; na alta e follow-up são os que vivem em família que apresentam maior risco. Em relação aos “rendimentos”, o maior risco de queda ocorre nos participantes que consideram os rendimentos insuficientes (valores mais elevados na alta). Em relação a interação das variáveis, apenas “com quem vive” [F(2,7;159,1)=3,9;p=0,005] foi significativa, ocorrendo o mesmo padrão de resultados descrito na pontuação anterior.

Quando comparamos os participantes que faleceram nos dois momentos (alta; follow-up) verificou-se uma distribuição similar nas variáveis sociodemográficas. Na pontuação de independência, os que faleceram entre a admissão e a alta eram menos dependentes (M=38,4; DP=28,26), do que os que faleceram na entre a alta e o follow-up (M=46,1; DP=30,1). Quanto ao risco de rutura de cuidado, os óbitos entre admissão e alta apresentam risco inferior (M=6,2; DP=2,6), quando comparado com os ocorridos entre alta e follow-up (M=7,3; DP=2,8). No risco de queda, os falecimentos entre admissão e alta apresentam risco superior (M=3,3; DP=1,2), por comparação com os óbitos entre a alta e o follow-up (M=3,2; DP=1,7).

Escala de Avaliação da Espiritualidade

Os resultados totais da escala demonstram diferenças estatísticas significativas entre as subescalas (valor superior em crenças, por comparação com esperança) e no total da escala entre as três fases de aplicação do questionário. No global, os participantes apresentam baixa espiritualidade, que diminui entr a fase da admissão (M=2,6; DP=0,5) e a alta (M=2,5; DP=0,5), e aumenta no follow-up (M=2,7; DP=0,4). O mesmo padrão de respostas é observado e significativo nas subescalas: crenças (admissão: M=2,8; DP=0,6; alta: M=2,7; DP=0,6; follow-up: M=3,0; DP=0,5); esperança (admissão: M=2,4; DP=0,6; alta: M=2,3; DP=0,6; follow-up: M=2,5; DP=0,5).

A relação entre as variáveis sociodemográficas e a Escala de Avaliação da Espiritualidade mostra ausência de diferenças estatisticamente significativas, com exceção para a variável “sexo” na subescala “crenças” [F (1,3;125) =1,3;p=0,028]. Na admissão as mulheres apresentam o valor mais elevado (M=2,9; DP=0,5) e no follow-up o valor superior ocorre nos homens (M=3,1; DP=0,6). Quanto à interação das variáveis, não foram encontradas diferenças significativas.

Relação entre pontuações de independência, risco de rutura de cuidados e risco de queda, espiritualidade e idade

São apresentadas as correlações para as pontuações de independência, risco de rutura de cuidados e risco de queda, espiritualidade e idade. A idade apresenta correlação positiva e estatisticamente significativa com a independência (a dependência aumenta com a idade), sendo as correlações moderadas na admissão (r=0,493), alta (r=0,451) e follow-up (r=0,455). No risco de rutura de cuidado, a idade apresenta correlações significativas e positivas (o risco de rutura de cuidados aumenta com a idade), mas fracas na alta (r=0,333) e follow-up (r=0,288). Relativamente ao risco de queda, a idade apresenta correlações positivas significativas (o risco de queda aumenta com a idade), mas fracas na admissão (r=0,125) e moderadas na alta (r=0,406) e follow-up (r=0,376). Quanto à espiritualidade, a idade apresenta correlações significativas fracas e negativas apenas na dimensão esperança nas três fases variando entre r=-0,118 e r= -0,159, ou seja, conforme aumenta a idade diminuiu a esperança.

A análise da correlação contemplou os momentos temporais de aplicação do questionário. Na admissão, as correlações positivas e elevadas ocorreram entre a pontuação de rutura de cuidado e risco de queda (r=0,745, p <0,001; o aumento do risco de queda ocorre com o aumento do risco de quebra de cuidados) e entre as dimensões crença e esperança (r=0,615, p<0,001; o aumento da esperança ocorre com o aumento das crenças). De notar, a existência de correlações negativas e fracas entre a pontuação de independência e as dimensões da espiritualidade (crenças: r=-0,127, p<,001; esperança: r=-0,274, p<,001), ou seja, conforme aumenta a dependência diminui a esperança e as crenças. Nas fases da alta e follow-up, obteve-se um padrão de respostas idêntico, ou seja, correlações positivas e elevadas entre as três pontuações (variando entre r=0,699 e r=0,872, p<,001) e entre as duas dimensões da escala da espiritualidade (variando entre r=0,539 e r=0,675, p<,001). No entanto, as correlações entre as pontuações e a espiritualidade são negativas e fracas (variando entre r=0,089 e r=-0,283, p<,05), com a exceção da correlação entre a escala rutura de cuidado e esperança (r=0,272, p<,05).

Analise multivariada: regressão logística dos óbitos ocorridos

A análise de regressão logística ajustada identificou dependências significativas entre a mortalidade no período entre a admissão e a alta hospitalar (n=227; número de óbitos=33) para os seguintes subgrupos de variáveis sociodemográficas (tabela 3): i) rendimentos suficientes (OR=0,42; IC95%[0,18;0,98]); ii) sem apoio social (OR=0,308; IC95%[0,10;093]; ou seja, ter rendimentos suficientes e não ter apoio social é um fator protetor para a não ocorrência de óbito. No período entre a alta e o follow-up (n=160; número de óbitos=31) foram identificadas as seguintes relações de dependência: idade (OR=1,09; IC95%[1,01;1,18]) e a pontuação de risco de queda (OR=1,56; IC95%[1,04;2,35]); ou seja, ter mais idade e um risco de queda elevados são fatores de risco para a mortalidade neste período. Considerando o período entre a admissão e o follow-up, ou seja, a duração do estudo (n=193; número de óbitos=64), a única variável com impacto significativo são os antecedentes clínicos do foro circulatório (OR=0,367; IC95%[0,10;0,97]), sendo considerado um fator protetor.

 

DISCUSSÃO

Neste estudo, analisou-se a perceção das pessoas idosas (em vez da avaliação profissional), pois a investigação tem vindo a reconhecer os pacientes como os melhores juízes do impacto da doença e hospitalização nas suas vidas (Haywood, Garratt, Jordan, Dziedzic, & Dawes, 2004). Além disso, a perceção das pessoas idosas sobre a sua saúde e dependência apresenta maior poder preditivo em diversos acontecimentos como: hospitalização, mortalidade e declínio funcional, por comparação com a avaliação de informantes secundários, por exemplo, profissionais (Jardim, Barreto, & Giatti, 2010). Este estudo centra a hospitalização de pessoas idosas, um tema ainda pouco explorado, que constitui um evento marcante na velhice, marcando o “estatuto de velho”, em que a alta é acompanhada com frequência por diminuição do estado de saúde (Schimitt, Sands, Weiss, Dowling, & Covinsky, 2010). Começámos por caracterizar e comparar quatro variáveis (in/dependência funcional; risco de quebra de cuidados; risco de quedas; espiritualidade) em três momentos (admissão, alta e 6 a 12 meses depois) associados à hospitalização.

Os participantes são mais independentes na admissão e mais dependentes na alta e follow-up; apesentam menos risco de rutura de cuidados na admissão, e o valor mais elevado na alta (no follow-up o risco mantém-se mais elevado do que na admissão, e ligeiramente inferior à alta); têm maior risco de quedas na alta (similar à admissão) e menos risco no follow-up. Ou seja: a hospitalização parece marcar um momento de aumento da dependência que gradualmente se acentua até ao follow-up; o risco de rutura de cuidado e de quedas aumenta no momento da alta, mas diminui no follow-up; a espiritualidade mantém-se baixa, com valores sempre superiores nas crenças por comparação com a esperança. Assim o maior risco durante e após a hospitalização é a dependência que tem tendência para aumentar na alta e follow-up; ou seja, o declínio pode iniciar-se na admissão e prolongar-se, consistente com diversa literatura (Hoogerduijn, 2011; Kamasaki & Diogo, 2007; Siqueira et al., 2004). Os dados mostram que ter apoio social formal após a alta é superior nos mais dependentes.

O risco de rutura de cuidados tende a baixar no follow-up, indicando a necessidade de apoio aos cuidadores informais, principalmente após a alta para diminuir o risco de reinternamento e institucionalização. O aumento da dependência funcional aumenta o risco de institucionalização (Graf, 2006), pois nem sempre há disponibilidade e/ou capacidade para algum elemento da rede familiar ou informal assumir os cuidados.

O risco de quedas aumenta na admissão, mas pode diminuir no follow-up. A literatura indica que tende a aumentar durante o internamento, principalmente porque os doentes apresentam períodos de desorientação, muitas vezes associada ao corte com as suas rotinas e ambiente de vida (Eliopoulos, 2005; Soares, 1999). Mas pode diminuir no follow-up, com o retorno à vida habitual. Assim, é relevante preparar a pessoa idosa e os seus cuidadores para este risco e para a prevenção de quedas no domicílio.

A espiritualidade apresenta sempre valores baixos e, na esperança, inferiores por comparação com a crença. A literatura sugere que a espiritualidade é uma estratégia adequada de coping perante a hospitalização (Pinto & Pais-Ribeiro, 2007; Santos & Sousa, 2013). Durante a hospitalização (admissão à alta) decorrem neste estudo em média 10 dias, o que pode ser limitado para a pessoa reajustar o sentido e significado da sua vida perante o evento. Contudo, a espiritualidade mantém-se baixa no follow-up, provavelmente porque não existe capacidade para manter esperança perante acontecimentos debilitantes e crónicos (a crença não é acompanhada por um nível de esperança similar). Durante e após a hospitalização, as pessoas idosas precisam de ajuda para readequar os seus objetivos e sentido para a vida, considerando a sua idade e condição clínica. Algumas variáveis sociodemográficas (rendimento, com quem vive, estado civil) e clinicas (diagnóstico/motivo de internamento e antecedentes clínicos) salientam-se como influenciando as quatro variáveis em estudo.

Os participantes que indicam ter rendimentos insuficientes, em todos os momentos do estudo, são mais dependentes, apresentam maior risco de queda e probabilidade de rutura de cuidados. As pessoas com rendimentos insuficientes, em qualquer idade, são mais vulneráveis; por isso, quando são idosos acumulam risco que foram sendo adquiridos ao longo da vida com maior dificuldade em obter melhores cuidados adequados à sua idade e situação clínica (Sousa et al., 2003). Os baixos rendimentos acarretam estilos de vida menos saudáveis, por falta de dinheiro para os obter, mas também porque, por norma, estão associados a menor literacia o que impede as pessoas de se explicarem e saberem como interpretar a informação obtida. Assim, interagem fatores como dificuldade de acesso aos serviços de saúde, cumprimento dos tratamentos e mesmo a possibilidade de cumprir algumas instruções como adaptar aspetos ambientais em casa (WHO, 2007). As pessoas com baixos rendimentos devem ter uma especial atenção dos profissionais no hospital, com reencaminhamentos para cuidados de saúde primários e para serviços sociais que possam acompanhar e ajudar.

Com quem vive é outra variável relevante. Quem vive sozinho, na admissão, é mais independente, mas apresenta maior risco de quedas e de rutura de cuidados; na alta quem vive sozinho mantém-se mais independente. Quem vive em família é mais dependente em todas as fases, e é quem apresenta maior risco de rutura de cuidados e quedas na alta e follow-up. Possivelmente, a opção por viver com a família é já um indicador de fragilidade da pessoa idosa, que tenderá a viver só ou em casal enquanto se mantiver independente e estável. Quando as pessoas idosas vivem com a família, há que apoiar os cuidadores; nos casos em que o idoso ainda não vive com a família, há que se ajudar ambos (pessoa idosa e provável cuidador) a aceitar uma nova situação e saber geri-la. As famílias tendem a optar por cuidar dos seus familiares em casa em vez de institucionalizá-los, por razões económicas ou morais/afetivas. A família é um sistema que pode exercer uma função protetora, diminuindo a vulnerabilidade, diminuindo o risco hospitalização e institucionalização (Inouye, Barham, Pedrazzani, & Pavarini, 2010).

No estado civil verifica-se que os viúvos são mais dependentes e com maior risco de quedas em todas as fases. A viuvez constitui um dos eventos que mais abalam as pessoas idosas, que podem tornar-se mais depressivas e dependentes. Além disso, num contexto de casal há interajuda e reciprocidade, ajudando a que as pessoas se sintam mais capazes. Os viúvos apoiados pela família, mais facilmente se sentem um fardo para os familiares, acrescentando que a reciprocidade tende a diminuir; recebem mais do que dão (Ramos, 2002).

Em relação ao diagnóstico/motivo internamento observa-se que os participantes com diagnóstico neuro-hormonal (inclui AVC) se apresentam mais independentes na alta e mais dependentes na alta e follow-up. Este resultado associa-se especialmente ao AVC, sendo que na admissão, os participantes ainda não têm noção das sequelas; é na alta e especialmente no follow-up que ganham uma perceção mais real de como afeta a limita as suas capacidades funcionais (Sá, 2009). Também esta situação deve começar a ter apoio durante o internamento para que a pessoa idosa e a sua família se adaptem e reajustem em termos de funções e tarefas familiares, mas também procedendo a alguns ajustamentos no seu domicílio.

Nos antecedentes clínicos observa-se que o risco de rutura de cuidados na admissão é mais elevado nos pacientes et al com antecedentes de doença neuro-hormonal; na alta o maior risco ocorre em antecedentes circulatórios e multipatologia. Nos pacientes com estes antecedentes clínicos, há que se ajudar a evitar reinternamentos, através de educação para a saúde; e, também, ponderar a possibilidade/capacidade da família cuidar em casa ou encontrar uma alternativa. Estas ações devem envolver a pessoa idosa e sua família, ponderando a sua situação clínica e emocional

As correlações mostram a idade como variável índex, influenciando as outras variáveis (Campbell, Seymour, & Primrose 2004; Eliopoulos, 2005; Franchi., 2013; Kamasaki & Diogo, 2007; WHO, 2007): dependência, risco de rutura de cuidados e risco de queda aumentam com a idade; na espiritualidade, a esperança diminui com a idade. Contudo, a espiritualidade não aumenta com a idade, a esperança diminui; provavelmente diminui a esperança associada a melhor saúde; fica por saber se mesmo assim à capacidade para procurar um renovado sentido para a vida (Pinto & Pais-Ribeiro, 2007).

As correlações mostram que na admissão: i) o aumento do risco de queda ocorre com o aumento do risco de quebra de cuidados, sugerindo que a existência de quedas associadas ao medo de cair pode levar a internamentos hospitalares ou institucionalização; ii) o aumenta a dependência diminui a esperança e as crenças, pois a saúde debilitada não aumenta o coping espiritual, até porque a dependência pode limitar ou suprimir algumas atividades religiosas/espirituais e traduzir-se num futuro incerto e sem significado (Rodrigues, 2012); iii) o aumento da esperança ocorre com o aumento das crenças, isto é, se a relação com o transcendente aumenta, os pacientes conseguem dar sentido à sua vida e aceitando melhor o futuro (Pinto & Pais-Ribeiro, 2007).

Na alta e follow-up, as correlações mostram: i) o aumento da dependência eleva o risco de quedas e de quebra de cuidados, pois a incapacidade funcional limita a mobilidade e aumenta as necessidades de cuidados; ii) o aumento da esperança aumenta o risco de rutura de cuidados, sugerindo que talvez a pessoa sinta esperança por vir a ter um apoio diferente do que tem tido na sua vida.

Procuramos contribuir para estabelecer um modelo de preditivo de mortalidade baseado nas variáveis em estudo. Com o envelhecimento da população, conseguir estabelecer os fatores de risco ou protetores para a ocorrência de óbitos, é importante para desenvolver medidas que ajudem a adiar ou a gerir esse evento da melhor forma. Os dados sugerem que entre a admissão e a alta hospitalar, o fator protetor de óbito é ter rendimentos suficientes (maior probabilidade de ter apoios adequados) e não ter apoio social (quem tem, por norma, apresenta algum nível de dependência). Assim, quem faleceu nesse período era mais independente, apresentava menor risco de rutura de cuidados e maior risco de queda. Entre a alta e o follow-up, os fatores de risco são ter mais idade e risco de queda elevado. A idade é um fator determinante, sendo que as doenças crónicas associadas a risco de queda também são mais comuns (Boyd et al., 2008; Paula et al., 2010; Ribeiro et al., 2008; Rodrigues, 2012). Entre a admissão e o follow-up evidencia-se um fator protetor: antecedentes clínicos do foro circulatório (inclui: hipertensão arterial; insuficiência cardíaca congestiva; enfarte agudo do miocárdio). As doenças do foro circulatório estão entre as principais causas de morte em Portugal (Nicolau et al.), contudo é um antecedente clínico que por norma tem vigilância clínica periódica, nas consultas do Centro de Saúde ou de especialidade.

Como limites do estudo, a metodologia adotada é quantitativa e seria interessante complementar com técnicas qualitativas, que permitissem captar o significado e variação da perceção da qualidade de vida dos participantes na admissão, alta hospitalar e follow-up. Como perspetiva de pesquisa seria relevante recolher o ponto de vista dos profissionais (principalmente médicos e enfermeiros) e dos familiares/cuidadores informais.

Os dados permitem compreender melhor a situação das pessoas idosas quando chegam a um internamento hospitalar, permitindo delinear ações e estratégias que se podem repercutir na alta e posteriormente. O modelo preditivo de óbitos neste grupo etário, considerando a hospitalização é importante para definir estratégias principalmente durante e após o internamento.O estudo aponta para a necessidade de, em termos genéricos, desde a admissão até ao follow-up: i) desenvolver políticas institucionais (com interligação aos cuidados de saúde primários) que favoreçam a independência das pessoas idosas; ii) planear programas de intervenção nos fatores de risco relacionados com dependência, risco de queda e de falha de cuidado; iii) preparar a alta durante o internamento, alertando para alterações e riscos, e ajudando a gerir mudanças; iv) apoiar as pessoas idosas e seus familiares em termos clínicos, emocionais e espirituais; v) informar sobre possíveis alterações a fazer em casa para evitar as quedas; vi) planear a alta envolvendo a pessoa idosa, cuidador informal e familiares mais envolvidos; vii) encaminhar ou informar sobre apoios sociais comunitários; viii) elaborar/encaminhar para programas de reabilitação para a pós-alta; ix) garantir o acompanhamento/vigilância na pós-alta.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido em 18 de Março de 2015/ Aceite em 05 de Dezembro de 2016

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