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Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.15 no.1 Lisboa mar. 2014

https://doi.org/10.15309/14psd150123 

Validação da Escala de Conceito de Boa Morte

Validation of the scale concept of good death

 

Joana Jordão, & Isabel Leal

ISPA – Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

De forma a permitir o conhecimento sobre a conceção de uma boa morte, a presente investigação pretende validar a escala de conceito de boa morte da autoria de Schwartz, Mazor, Rogers, Ma, e Reed, G. (2003) para a população portuguesa. A amostra de conveniência replica o estudo original, sendo constituída por 100 participantes, 32 % homens, com uma idade média de 23,30 anos. Considerado aceitável o valor de KMO (0,671) prosseguiu-se com a análise fatorial exploratória, indicando a existência de três fatores. O total de variância explicada pelos três fatores é de 59,9 %, em que o primeiro fator denominado Controlo explica 25,8 %, o segundo fator designado Esperança explica 17,9 % e o terceiro fator explica 16,2% sendo denominado por Encerramento. A análise de consistência interna revelou índices aceitáveis para o primeiro fator (a =0,79) e para o segundo fator (a = 0,69). A Escala de Conceito de Boa Morte para a população portuguesa apresenta uma estrutura de 11 itens, avaliando os domínios de Controlo, Esperança e Encerramento do conceito.

Palavras-Chave - Validação, Escala, Boa Morte

 

ABSTRACT

In order to allow the knowledge about the conception of a good death, this research aims to validate the scale concept of good death authored by Schwartz, Mazor, Rogers, Ma, e Reed, (2003) for the Portuguese population. The convenience sample replicates the original study, constituted by 100 participants of which 32% are men with an average age of 23.30 years. Considering acceptable KMO value of (0, 671), we proceeded with an exploratory factor analysis, indicating the existence of three factors. The total variance explained by these three factors is 59.9%, where in the first factor designated Control explains 25.8%, the second factor designated Hope explains 17.9% and the third factor designated Closure explains 16.2%. The internal consistency analysis revealed acceptable levels for the first factor (a = 0, 79) and for the second factor (a = 0, 69). The Concept of Good dead scale for the Portuguese population is based on a structure of 11 items assessing the areas of Control, Hope and Closing of the concept.

Key-Words - Validation, Scale, Good Death

 

Morrer é um ato pessoal e público, limitado por experiências, expetativas, acesso a recursos, circunstâncias e contexto social. Uma vida longa e uma boa morte são apoiadas pelo aumento do conhecimento científico sobre o envelhecimento e sobre a biologia, bem como pela possibilidade de acesso a médicos, hospitais e cuidados paliativos de qualidade (Schenck, & Roscoe, 2009). A sociedade encontra-se cada vez mais focada em garantir uma boa morte (Emanuel & L. Emanuel, 1998) e desde o aparecimento dos Cuidados Paliativos que a ideia de boa morte é vista como conceito essencial (Walters, 2004). A investigação realizada até aos dias de hoje identifica atributos que constituem uma boa morte. Os atributos podem variar consoante a perspetiva do paciente, dos familiares e dos profissionais de saúde, sendo-lhes comuns o alívio da dor e do sofrimento, o estar ciente da morte, a aceitação do momento da morte, a aceitação e autonomia, manter a esperança “viva”, a preparação para a “partida” e decidir onde se deseja morrer (Granda-Cameron, & Houldin, 2012). A comunicação e a abertura entre pacientes e profissionais de saúde (Lokker, Zuylen, Veerbeek, Van Der Rijt, & Van Der Heide, 2012), a consciência da morte, a manutenção de sentido, manutenção de auto congruência, a participação na própria morte, estar em paz com os entes queridos (Sinclair, 2011), o ter controlo, conforto, a presença de um sentimento de conclusão, reconhecimento do valor do paciente, confiança nos prestadores de cuidados, reconhecer que a morte é iminente, crenças e valores honrados, carga minimizada, relações otimizadas, a adequação da morte, o deixar uma herança à família e assistência à família (Kehl, 2006). Os valores culturais e crenças de origem religiosa da família e dos pacientes têm também um papel significativo (Granda-Cameron, & Houldin, 2012), assim como as condições de qualidade de vida, o bem estar psicológico, o suporte social e a espiritualidade, que contribuem para uma boa morte (Leung, et al., 2010).

De acordo com a Estratégia para o desenvolvimento do Programa Nacional de Cuidados Paliativos existe a necessidade de realizar um inquérito à população portuguesa que possibilite um conhecimento sobre o que as pessoas pensam sobre a morte digna e quais as expetativas relativamente à própria morte (Serviço Nacional de Saúde [SNS], 2010). Uma avaliação apropriada e feita precocemente sobre o suporte social e a preferência torna-se crucial nos Cuidados Paliativos (Agar et al. 2008).

Existem diversos instrumentos, adaptados ou desenvolvidos em Portugal, que avaliam reações e atitudes (Barros-Oliveira & Neto, 2004) ou que avaliam a qualidade de vida em cuidados paliativos (Ferreira & Pinto, 2008). Apesar da existência destes instrumentos, não existe um que forneça informação sobre a conceção de boa morte de cada um de nós. A sua utilidade verificar-se-á na compreensão do significado clínico de alterações concetuais (Schawrtz, Mazor, Rogers, Ma, & Reed, 2003). De forma a colmatar a ausência de um instrumento que medisse a conceção de boa morte, recorreu-se ao “Concept of a Good Death” de Schawrtz et al. (2003), destinado inicialmente a alunos de cuidados de saúde, teve como objetivo avaliar mudanças do conceito de boa morte ao longo do tempo de formação académica. O trabalho foi desenvolvido com base nos conceitos de Walden-Galusko de 1997 e 1998 (cit. in, Schawrtz et al. 2003), apresentando o conceito de morte tradicional vs morte moderna, incluindo dimensões que são consideradas importantes no fim-de-vida, como exemplo a paz espiritual, a aceitação e a dor. De acordo com os autores, pode ser utilizado em prestadores de cuidados de saúde e em pessoas leigas no contexto de investigação, com a finalidade de melhorar a qualidade de cuidados prestados no fim de vida e ainda, avaliar o impacto do currículo médico no ensino de cuidados paliativos. O instrumento apresenta três domínios, o domínio Encerramento reflete aspetos psicossociais e espirituais de boa morte, estando associado à crença de experiência depois da vida, ao apoio social, às crenças e práticas espirituais. O domínio Controlo Pessoal centra-se nos aspetos físicos da experiência de morte, alerta mental, capacidade de comunicação e controlo de funções corporais. O domínio Clínico representa os aspetos clínicos e biomédicos da experiência de morrer, sendo associado a uma perspetiva de que a morte é um alívio. A medida surge então como fiável e válida no estudo realizado pelos autores, tendo a vantagem de ser breve, de autopreenchimento e podendo ser utilizada numa grande variedade de populações (Schawrtz et al. 2003).

A presente investigação permite o conhecimento sobre a conceção de boa morte e a sua estabilidade temporal, indo de encontro a uma necessária avaliação de pacientes e do seu contexto familiar, de forma a assegurar as necessidades emocionais, espirituais, físicas e sociais, para que seja possível conceder uma resposta adequada (SNS, 2010). O objetivo será realizar um estudo de validação preliminar de uma medida de conceito de boa morte.

 

MÉTODO

Participantes

A amostra é constituída por 100 participantes (68% mulheres e 32% homens), com idades compreendidas entre os 18 anos e os 59 anos (M=23,30;DP=5,91). De forma a obedecer ao critério que presidiu à construção do instrumento original, dos 100 participantes 76% são estudantes de Medicina, (N=12: 1º ano de Licenciatura; N=15: 2º ano de Licenciatura; N=12: 3º ano de Licenciatura; N=17: 4º ano de Licenciatura; N=12: 5º ano de Licenciatura; N=5: 1º ano Mestrado; N=3: 2º ano Mestrado), 8% estudantes de Enfermagem (N=3: 1º ano de Licenciatura; N=2: 2º ano de Licenciatura; N=1: 3º ano de Licenciatura; N=1: 4º ano de Licenciatura), 4% estudantes de Neurociências (N=2: 1º ano de Licenciatura; N=2: 1º ano Mestrado), 4% estudantes de Biologia (N=1: 1º ano de Licenciatura; N=3: 3º ano de Licenciatura) e 8% enfermeiros, com idades compreendidas entre os 18 anos e 59 anos (M=23,30;DP=5,91). Sendo 99% de etnia caucasiana e 100% de nacionalidade portuguesa. Relativamente ao estado civil, 94% são solteiros, 5% casados e 1% divorciados. 55% afirma ter experiência com pacientes em fim de vida e 78% admitem ter experiência com a morte de alguém próximo. 61% são de religião católica, 1% islamista, 1% cristã, e 37% não apresenta religião. Todos os participantes pertencem à zona de Lisboa.

Material

O instrumento utilizado na presente investigação é o “Concept of a Good Death” da autoria de Schwartz, et al., (2003). Pretende medir a importância de determinados componentes do conceito de boa morte através de um conjunto de 17 itens, apresentando uma Escala tipo Likert que varia entre 1 e 4, em que 1 corresponde a “Not necessary”, 2 a “Desirable”, 3 a “Important” e 4 a “Essential”. Apresenta uma pequena instrução “Please indicate how important each of the following is to your conception of a “good death”. O instrumento apresenta três domínios, “Closure”, “Personal Control” e o domínio “Clinical”. O domínio “Closure”é constituído por 9 itens (Item 4 – “That family and doctors follow the person´s wishes”; Item 6 – “That be peaceful”; Item 7 – “That loved ones be present”; Item 8 – “That the person´s spiritual needs be met”; Item 9 – “That the person is sable to accept death”; Item 10 – “That the person had a chance to complete important tasks”; Item 11 – “ That the person had an opportunity to say “good-bye””; Item 12 – “That the person was able to remain at home”; Item 13 – “That the person lived until a key event)). O domínio “Personal Control” é constituído por três itens (Item 15 – “That there be mental alertness until the end”; Item 16 – “That there be control of bodily functions until death”; Item 17 – “That the ability to communicate be present until death”). O domínio “Clinical”, é constituído por 5 itens (Item 1 – “That it be painless or largely pain-free”; Item 2 – “That the dying period be short”; Item 3 – “That it be sudden and unexpected”; Item 5 – “That it occur naturally, without technical equipment ”; Item 14 – “That death occurs during sleep”).

Utilizou-se um questionário sociodemográfico para caraterizar a amostra do presente estudo, sendo pedido os seguintes critérios: Sexo, Idade, Etnia, Nacionalidade, Estado Civil, Formação, Situação Profissional, Experiência com pacientes em fim de vida, Experiência com a morte de alguém próximo e Religião.

Procedimento

Contatou-se Carolyn E. Shwartz, autora da escala original, com o intuito de solicitar uma autorização que visasse a utilização do instrumento no presente estudo. Após várias adaptações e alterações da tradução da escala e retroversão, foi concedida uma licença que permitiu a utilização da escala. A tradução e retroversão enviadas à autora, foram produto do trabalho de júris portugueses, um dos quais bilingue, com o objetivo de assegurar a qualidade da tradução/retroversão. A tradução e retroversão são propriedade intelectual da Fundação DeltaQuest, da qual a autora Carolyn E. Shwartz é presidente e cientista chefe. A tradução e retroversão aceites pela autora apresentam a seguinte estrutura, numa Escala tipo Likert, que varia entre 1 e 4, o 1 corresponde a “Não necessário”, 2 a “Desejável”, 3 a “Importante” e 4 a “Essencial”. A instrução dada para o preenchimento do questionário é a seguinte: “ Por favor assinale com um círculo o quão importante para si é cada um dos seguintes itens, relativamente à sua conceção de boa morte”. Os itens traduzidos resultaram na seguinte versão: Item 1 – “Que seja sem dor ou maioritariamente livre de dor”; Item 2 – “Que o período de morrer seja curto”; Item 3 – “Que seja repentina e inesperada”; Item 4 – “Que a família e médicos sigam os desejos da pessoa”; Item 5 – “Que ocorra naturalmente, sem equipamento médico”; Item 6 – “Que seja tranquila”; Item 7 – “Que os entes queridos estejam presentes”; Item 8 – “Que as necessidades espirituais da pessoa sejam satisfeitas”; Item 9 – “Que a pessoa seja capaz de aceitar a morte”; Item 10 – “Que a pessoa tenha tido a possibilidade de completar tarefas importantes”; Item 11 – “ Que a pessoa tenha a oportunidade de se despedir”; Item 12 – “Que a pessoa tenha podido permanecer em casa”; Item 13 – “Que a pessoa tenha vivido até um evento que considere importante”; Item 14 – “Que a morte ocorra enquanto dorme”; Item 15 – “Que exista lucidez até ao fim”; Item 16 – “Que exista controlo das funções corporais até à morte”; Item 17 – “Que a capacidade de comunicar se mantenha até à morte”.

A distribuição de questionários foi realizada online aos 100 participantes, através do Google Docs, devido à disponibilidade dos estudantes e dos profissionais de saúde. A todos os participantes foi transmitida a informação de que a investigação tratava da adaptação de uma medida de “Conceito de Boa Morte” para a população portuguesa, explicando que, o instrumento era constituído por 17 itens e por um questionário sociodemográfico. Os questionários foram enviados e posteriormente identificados pelos participantes por um código de cinco dígitos definido pelos mesmos. O segundo momento de recolha ocorreu cerca de 10/15 dias após o primeiro momento, tendo sido conciliado com a disponibilidade dos estudantes/profissionais. Para a análise estatística realizada no presente estudo, foi utilizado o Programa PASW – Statistics 18.

 

RESULTADOS

Validade Fatorial do Instrumento

Com o intuito de verificar a estrutura da escala, realizou-se uma análise fatorial exploratória pelo método de componentes principais. Na extração inicial os indicadores estatísticos (análise da variância e método de Cattell) mostraram-se favoráveis à existência de três fatores. Foi realizada uma segunda extração a três fatores, onde foram removidos quatro itens por serem saturados em mais que um fator ou por terem um índice de saturação insuficiente (inferior a 0,40). Foram realizadas mais duas extrações a três fatores, onde foi detetado que o item 10 (na primeira extração) e o item 12 (segunda extração) saturavam em mais que um fator. Na extração final a três fatores, a análise de componentes principais revelou-se adequada aos dados. O critério KMO revelou-se medíocre (KMO=0,67) de acordo com Marôco (2010) e rejeitou-se o pressuposto de esfericidade [X2(55) =336,63; p < 0,0001] no teste de Bartlett, indicando que as variáveis se encontram correlacionadas de forma significativa. O total de variância explicada pelos três fatores é de 59,9%, em que o primeiro fator explica 25,8% e é composto por 5 itens (1, 2, 15, 16, 17), o segundo fator explica 17,9% e é composto por 3 itens (5, 13, 14), explicando o terceiro fator 16,2% e é composto por 3 itens (7, 8, 11). O primeiro fator é denominado “Controlo”, e inclui aspetos físicos da experiência de morrer tais como a capacidade de comunicação, alerta mental, controlo de funções corporais e controlo da dor. O segundo fator é referido como “Esperança”, pois nesta dimensão encontram-se dois itens (5, 13, 14) que nos remetem para momentos importantes, assim como o conforto de uma morte sem sofrimento. No caso do terceiro fator, manteve-se a designação da escala original, “Encerramento”, visto incluir alguns itens dessa mesma dimensão (7, 8, 11. Estes itens refletem os aspetos psicossociais e espirituais de boa morte.

Fidelidade

A análise da consistência interna, avaliada pelo método de alpha de Cronbach, revelou índices aceitáveis, para os dois primeiros fatores; para o primeiro fator observou-se um a =0,79 (correlações inter-itens variam entre 0,19 e 0,71 com uma média de 0,43); para o segundo fator verificou-se um a = 0,69 (correlações inter-itens variam entre 0,34 e 0,52 com uma média de 0,43), no terceiro fator obteve-se um a =0,58 (correlações inter-itens variam entre 0,28 e 0,39 com uma média de 0,32) revelando assim uma fraca consistência interna.

De forma a avaliar a estabilidade do instrumento ao longo do tempo, utilizou-se o Paired-Samples t Test. Verificaram-se diferenças significativas apenas do domínio Esperança (p=0,01). No domínio Esperança a média encontra-se mais elevada no segundo momento (M=2,36; DP=0,71) do que no primeiro (M=2,25; DP=0,73).

 

DISCUSSÃO

Os resultados mostram que a escala apresenta 11 itens, sendo o item 1 “Que seja sem dor ou maioritariamente livre de dor”, item 2 “Que o período de morrer seja curto”, item 3 “Que ocorra naturalmente, sem equipamento médico”, item 4 “Que os entes queridos estejam presentes”, item 5 “Que as necessidades espirituais da pessoa possam ser satisfeitas”, item 6 “Que a pessoa tenha oportunidade de se despedir”, item 7 “Que a pessoa tenha vivido até um evento que considere importante”, item 8 “Que a morte ocorra enquanto dorme”, item 9 “Que exista lucidez até ao fim”, item 10 “Que exista controlo das funções corporais até à morte”, item 11 “Que a capacidade de comunicar se mantenha até à morte”. Os itens agrupam-se em três fatores, no primeiro fator, denominado por Controlo estão incluídos os itens 1, 2, 9, 10, 11. A designação Controlo deve-se a esta dimensão refletir aspetos físicos da experiência de morrer, tais como o controlo da dor, controlo do período de morrer, o controlo das funções corporais, a capacidade de comunicação e o estado de alerta mental. O segundo fator, denominado por Esperança, é constituído pelos itens 3, 4 e 5. Este fator está relacionado com o usufruir de momentos importantes, assim como o conforto de uma morte sem sofrimento. O terceiro fator, constituído pelos itens 6, 7, 8 denomina-se por Encerramento. Esta dimensão, reflete aspetos psicossociais e espirituais de boa morte. Os três fatores, Controlo, Esperança e Encerramento explicam 59,9% de variância. O primeiro fator (a=0,79) e o segundo fator (a=0,69) apresentam uma consistência interna aceitável, enquanto o terceiro fator (a=0,58) apresenta uma consistência interna inadequada. Os baixos valores encontrados podem ser justificados pelo número reduzido de itens da escala. Perante a verificação dos valores obtidos, pode afirmar-se que a Escala de Conceito de Boa Morte apresenta condições para ser utilizada na população portuguesa (KMO=0,67). Seriam de esperar diferenças significativas quanto à estabilidade do instrumento ao longo do tempo em todos os domínios, mas apenas se observou no domínio Esperança (p=0,01). Neste domínio a média encontra-se mais elevada no segundo momento (M=2,36;DP=0,71) do que no primeiro (M=2,25; DP=0,73) estando o domínio relacionado com o usufruir de momentos importantes e com o conforto de uma morte sem sofrimento. O conceito de boa morte pode mudar com o tempo (Kehl, 2006; Lokker et al. 2012) variando de acordo com a perspetiva de cada um, tornando-se um conceito subjetivo (Granda-Cameron & Houldin, 2012), sendo por isso de esperar diferenças significativas ao longo do tempo. Relativamente ao domínio Controlo e Encerramento a não existência de diferenças significativas pode ser devido à aprendizagem das respostas ou pelo tempo decorrido entre o primeiro e o segundo momento não ser suficiente para as diferenças se fazerem notar.

Com vista aos objetivos da presente investigação, é possível concluir que o instrumento de Conceito de Boa Morte para a População Portuguesa, apresenta uma estrutura de 11 itens, com uma opção de resposta tipo Likert que varia entre 1 “Não necessário” e 4 “Essencial”, avaliando três domínios, o Controlo, Esperança e Encerramento, sendo considerado válido para medir o conceito de boa morte na população portuguesa.

Existem alguns fatores que podem alterar ou influenciar o conceito de morte e de boa morte, devendo estar presentes numa futura investigação. O conceito de morte pode ser influenciado pela cultura, género, pela história pessoal, nacionalidade, fatores socioeconómicos (Schenck & Roscoe, 2008) e pela idade (Oliveira, 2010), sendo o conceito de boa morte influenciado pelo tempo, pela função e pela experiência (Lokker et al. 2012).

As dúvidas quanto à interpretação dos itens são reais, pois alguns sujeitos não compreendem o significado do conceito ou não têm conhecimento suficiente sobre o mesmo. Isto poderá indicar que a equivalência conceptual e semântica não foram alcançadas. Foi notável a pouca aceitabilidade da população perante o tema sobre a morte no momento da entrega do instrumento. Devido à aplicabilidade do instrumento, tal como a autora refere, apresentando a vantagem de ser breve, de autopreenchimento e podendo ser utilizada numa grande variedade de populações (Schawrtz et al. 2003), sugerem-se novos estudos que abordem o tema de conceito de boa morte, tendo em consideração os fatores que o influenciam.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para Correspondência

Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida; Rua Jardim do Tabaco, nº34 1149-041, Lisboa, Portugal; e-mail: joana__jordao@hotmail.com; isabel.leal@ispa.pt

 

Recebido em 9 de Dezembro de 2013/ Aceite em 20 de Março de 2014