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Psicologia, Saúde & Doenças

versión impresa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.15 no.1 Lisboa mar. 2014

https://doi.org/10.15309/14psd150117 

Intervenção psicológica positiva em grupo: forças e virtudes na reabilitação pós-avc

Positive psychological group intervention: strengths and virtues in rehabilitation after stroke

 

Maria Estrela-Dias, & José Pais-Ribeiro

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto

 

RESUMO

O presente trabalho de investigação teve como objetivos: desenvolver uma intervenção psicológica positiva em grupo (IPPG) promotora de forças e virtudes humanas ao nível da funcionalidade nas atividades básicas de vida diária (ABVD) e saúde mental (SM) na reabilitação pós – AVC; compreender e identificar forças e virtudes humanas na reabilitação pós-AVC, a partir de estratégias de intervenção indutoras de emoções positivas e da discussão de temas em grupo; comparar a funcionalidade nas ABVD e a SM na reabilitação pós – AVC, com e sem IPPG. A amostra foi recolhida na Unidade de Cuidados Continuados Integrados de Média Duração de Vila do Conde. Os 18 participantes tinham entre 45 e 85 anos e foram distribuídos pelo grupo de intervenção (GI) e de comparação (GC). Os protocolos de avaliação incluíram: Questionário Sócio-demográfico e Clínico, Índice de Barthel (Wade & Collin, 1988, adaptado à população portuguesa por Araújo, Ribeiro, Oliveira & Pinto, 2007) e Mental Health Inventory-5 (McHorney & Ware, 1995, versão reduzida de 5 itens, adaptada à população portuguesa por Ribeiro, 2001). Os resultados mostram que o GI partilhou medos e desenvolveu forças, mudou a interpretação da situação de reabilitação pós-AVC para um desafio a vencer, tornou-se mais colaborante na fisioterapia e avaliou a IPPG como um momento de aprendizagem e boa disposição. O GI beneficiou da IPPG, ao nível da funcionalidade nas ABVD e da SM, comparativamente ao GC. Este estudo é orientador de futuras investigações ao nível do impacto das virtudes humanas na reabilitação pós-AVC.

Palavras-chave - AVC, funcionalidade, saúde mental, forças e virtudes humanas, estratégias indutoras de emoções positivas

 

ABSTRACT

The objectives of this research work were: to develop a positive psychological intervention group (PPIG) thus promoting human strengths and virtues in terms of functionality in basic activities of daily living (BADL) and post - stroke mental health (MH); to understand and identify the human strengths and virtues in post-stroke rehabilitation, from the intervention strategies that induce positive emotions and the discussion of issues in group; to compare the functionality in BADL and post - stroke MH, with and without a PPIG. The sample was collected in the Medium-term Continuing Care Unit Vila do Conde. The 18 participants were between 45 and 85 years old and were distributed by the intervention group (IG) and the comparison group (CG). The assessment protocols were: the Sociodemographic and Clinical Questionnaire, the Barthel Index (Collin & Wade, 1988, adapted for the Portuguese population by Araújo, Ribeiro, Oliveira & Pinto, 2007) and the Mental Health Inventory – 5 (McHorney & Ware, 1995, a 5 item reduced version, adapted to the Portuguese population by Ribeiro, 2001). The results obtained show that the IG shared fears and developed strengths, changed their interpretation of the post-stroke rehabilitation condition into a challenge they needed to overcome, became more interested in working in physical therapy and assessed the PPIG as a time of learning and good disposition. The IG benefited from the IPPG in terms of functionality in BADL and MH, compared to GC. This study is guiding future research concerning the impact of human virtues during rehabilitation after stroke.

Keywords - stroke, functionality, mental health, human strengths and virtues, strategies inducing positive emotions

 

Embora a taxa de mortalidade esteja a diminuir, o AVC é a primeira causa de mortalidade e de incapacidade (Lopes, 2012).

Para a Organização Mundial de Saúde [OMS], o AVC constitui uma disfunção neurológica aguda, de origem vascular, seguida da ocorrência súbita ou rápida de sinais e sintomas relacionados com o comprometimento de áreas focais no cérebro (OMS, 2003).

Por um lado, os indivíduos pós-AVC podem enfrentar incapacidades, tais como: paralisia dos músculos, rigidez nas partes do corpo afetadas, perda da mobilidade das articulações, dores difusas, problemas de memória, dificuldades na comunicação oral e escrita e incapacidades sensoriais (Skilbeck, 1996). A funcionalidadeé assim uma variável importante para a saúde e está associada à independência, à satisfação com a vida e à qualidade de vida (Ahlsio, Britton, Murray, & Theorell, 1984; Beekley, 2006).

Por outro lado, a restrição no funcionamento físico e cognitivo do indivíduo sobrevivente ao AVC tende a piorar a saúde mental e a ter de viver com um maior número de comorbilidades (Clarke, Marshall, Black, & Colantonio, 2002). Verificam-se alterações psicológicas a nível emocional, tais como ansiedade, depressão, desânimo (Ribeiro, 2005). Além disso, ocorrem alterações nas variáveis de autoreferência, como por exemplo na autoeficácia, no autoconceito, na autoestima e no suporte social, que, sendo consequência das sequelas do AVC, vão afetar o empenho e compromisso na reabilitação (ibd).

O movimento científico da psicologia positiva contribuiu para a independência do modelo tradicional de doença (Snyder & Lopez, 2002).

Pretende-se que os psicólogos contemporâneos adotem uma visão aberta e apreciativa dos potenciais, das motivações e das capacidades humanas (Sheldon & King, 2001), sem nunca ignorar a existência do sofrimento humano, da dor e da doença que são inevitáveis (Seligman, 2002).

Assim, virtudes são características positivas do funcionamento humano e que são valorizadas por representarem um meio para a resolução de tarefas necessárias à sobrevivência da espécie, sendo que os caminhos que conduzem a tais virtudes são chamados de forças (Peterson & Seligman, 2004).

Alguns indivíduos, nos primeiros meses pós-AVC, podem exibir uma enorme capacidade de resistência, relatando altos níveis de emoção positiva quando confrontados com este desafio de saúde (Ostir, Berges, Ottenbacker, Clown, & Ottenbacher, 2008).

Deste modo, se os indivíduos tiverem maiores níveis de emoção positiva, então vão empenhar-se em mais pensamentos, comportamentos e atos volitivos que promovam a sua reabilitação (Dunn & Brody, 2008). Podem também reduzir sentimentos de depressão, reconhecer pequenos ganhos, ganhar esperança na mudança funcional e motivação para continuar com o tratamento ou com o programa de exercícios em casa (Seale, Berges, Ottenbacker, & Ostir, 2010). Além disso, tendem a participar mais em relacionamentos sociais, a ser otimistas quanto ao futuro, a ter mais sucesso no enfrentamento e a sentirem controlo das suas vidas (Ostir, Markides, Peek, & Goodwin, 2001).

Perante uma situação de adversidade é útil manter o sentido de coerência. Ou seja, se os acontecimentos indesejados forem compreendidos pelo indivíduo, então podem ser menos stressantes; se os indivíduos perceberem que têm os recursos necessários (podem ser internos ou controlados pelos outros que têm boas intenções) para lidar ou gerir esses acontecimentos, esses acontecimentos também serão menos stressantes, ainda que indesejados; o significado pode ser encontrado nas piores circunstâncias e certos indivíduos podem estar aptos a encontra-lo, sendo este elemento muito importante para que os indivíduos se mantenham saudáveis (Antonovsky, 1987).

Ao mesmo tempo, ser capaz de reconhecer o seu progresso permite que continue a reabilitação, aumente os níveis de emoção positiva e enfraqueça os efeitos do stresse e emoções negativas que, frequentemente ocorrem logo após o AVC (Fredrickson, Mancuso, Branigan, & Tugade, 2000).

Além disso, o estabelecer uma orientação para o futuro permite aumentar os seus níveis de emoção positiva, sentir-se motivado para agir e realizar mudanças favoráveis após a situação de dependência funcional (Dunn, Elliot, & Uswatte 2009). É, igualmente importante criar e reforçar as expetativas de eficácia pessoal, ou seja, a convicção de que o próprio indivíduo é capaz do comportamento adequado para obter o resultado (Bandura, 1982).

O modelo broaden-and-build das emoções positivas pressupõe que as emoções positivas têm o potencial de conter a excitação automática gerada por emoções negativas e ampliar a atenção, pensamentos e repertórios comportamentais (Fredrickson, 2001). Estudos mostram que aos indivíduos a quem foram pedidas emoções positivas (contentamento e alegria), imediatamente depois de uma situação de stresse, apresentaram recuperação cardiovascular mais rápida (redução dos batimentos cardíacos e da pressão sanguínea) do que aqueles que estavam no grupo de comparação (Fredrickson, 1998).

Por tudo isto, é necessário desenvolver métodos para experimentar mais emoções positivas e mais vezes. Tal, é possível através do desenvolvimento indireto de emoções positivas. Por exemplo:

- O evocar acontecimentos bons. Se o afeto do indivíduo for positivo, verificam-se melhores resultados na saúde física e mental (Pressman, & Cohen, 2005), ou seja: melhorias na recuperação de respostas fisiológicas (Tugade, & Fredrickson, 2004); menor depressão e estratégias de coping que aliviam o stresse (Fredrickson, Tugade, Waugh, & Larkin, 2003);

- O encontrar crescimento pessoal. É preciso relembrar e reinterpretar o passado para dar sentido aos acontecimentos, mesmo aqueles que sejam traumáticos e crescer com eles (Haidt, 2006);

- O avaliar com apreço o já vivido e perdoar. O chamado exercício das três “bênçãos” ou três momentos felizes do dia, desenvolvido por Seligman e seus colegas, mostra que os indivíduos que passam a introduzir esta prática como uma rotina no seu dia-a-dia melhoram os seus níveis de bem-estar (Seligman, Steen, Park, & Peterson, 2005). Quando os indivíduos estão ressentidos e a funcionar mal com a vida, a estratégia para eliminar o negativo das suas vidas terá de ser perdoar (Rivero, & Marujo, 2011);

- O desenvolver um estilo explicativo da realidade positivo. De acordo com o modelo Atenção, Interpretação e Memória (AIM) de Diener e Biswas-Diener (2008), as pessoas mais felizes dão mais atenção ao positivo e gratificante da sua vida (atenção), consideram os acontecimentos neutros como positivos e a adversidade como um meio de crescimento pessoal (interpretação), e recordam mais aspetos positivos da sua vida (memória);

- O explorar crenças espirituais/religiosas. A influência da religiosidade/espiritualidade aparece como possível fator de prevenção ao desenvolvimento de doenças e redução de óbito ou impacto de diversas doenças, sendo portanto um promissor campo de investigação (Guimarães, & Avezum, 2007).

- O relaxamento. As terapias de relaxamento cultivam as emoções positivas de contentamento, ampliando o repertório momentâneo individual do pensamento-ação. Podem derivar do efeito anulador das emoções positivas e construir recursos pessoais que podem mais tarde ser usados como estratégia de coping para melhorar a saúde e bem-estar (Fredrickson, 2000);

- O praticar atividades agradáveis. Aumentando o empenho nas atividades agradáveis, consegue-se diminuir os níveis de depressão (Lewinsohn, & Gotlib, 1995).

- O definir objetivos claros e intrínsecos. Os seres humanos são estimulados pelas suas ideias de futuro, daí que o bem-estar seja afetado em larga medida pelo otimismo face ao futuro (Seligman, 1998);

- E, o encontrar significado nos acontecimentos importantes. Os indivíduos encontram significado positivo na vida diária, de diversas formas, por exemplo, reenquadrando acontecimentos adversos através de uma reavaliação positiva, atribuindo valor positivo aos acontecimentos normais e perseguindo e alcançando metas realistas (Fredrickson, 2000).

Deste modo, é necessário identificar e implementar estratégias de intervenção que promovam o florescimento de aspetos virtuosos da natureza humana na reabilitação pós-AVC, sem nunca desvalorizar o sofrimento, junto dos sobreviventes, familiares e equipa multidisciplinar.

Os objetivos principais da presente investigação foram: desenvolver uma intervenção psicológica positiva em grupo (IPPG) promotora de forças e virtudes humanas ao nível da funcionalidade nas atividades básicas de vida diária (ABVD) e saúde mental (SM) na reabilitação pós – AVC; compreender e identificar forças e virtudes humanas na reabilitação pós-AVC, a partir de estratégias de intervenção indutoras de emoções positivas e da discussão de temas em grupo; comparar a funcionalidade nas ABVD e a SM na reabilitação pós – AVC, com e sem IPPG.

 

MÉTODO

Realizou-se um estudo qualitativo utilizando a técnica do grupo focal e a análise de conteúdo. As principais variáveis foram: as forças e virtudes humanas, a funcionalidade nas ABVD e a SM, durante a reabilitação pós-AVC. Realizou-se ainda, um estudo quase-experimental de comparação entre os grupos, de desenho longitudinal.

Participantes

Os 18 participantes apresentavam diagnóstico de AVC, orientação auto e alopsiquica e ausência de patologia psiquiátrica grave diagnosticada. Foram distribuídos de forma equitativa e aleatória pelo grupo de intervenção (GI) e grupo de controlo (GC).

No GC (n=9), os indivíduos apresentavam idades compreendidas entre os 72 e 82 anos (M=78,67; DP=3,24). A maioria era do sexo masculino (55,6%). Quanto ao grau de escolaridade, 66,7% tinha 4 anos de escolaridade, 22,2% não tinha escolaridade e 11,1% tinha mais de 4 anos de escolaridade. Relativamente ao estado civil, 55,6% era casado, 33,3% era viúvo e 11,1% era divorciado. Quanto à situação clínica, 33,3% apresentava AVC isquémico com hemiparesia direita, outros 33,3% apresentavam AVC isquémico com hemiparesia esquerda e 11,1% apresentava AVC hemorrágico com hemiparesia esquerda. Os principais fatores de risco eram hipertensão (66,6%), diabetes (22,2%) e cardiopatia (11,1%).

No GI (n=9) os indivíduos tinham idades compreendidas entre os 45 e 85 anos (M=66,33; DP=13,28). A maioria era do sexo feminino (55,6%). Quanto ao grau de escolaridade, 44,4 % tinha 4 anos de escolaridade, 33,3% não tinha escolaridade, 22,2% tinha mais de 4 anos de escolaridade. No que se refere ao estado civil, 44,4% era viúvo, 22,2% era casado, 22,2% era divorciado e 11,1% era solteiro. Quanto à situação clínica, 55,6% apresentava AVC isquémico com hemiparesia esquerda, 22,2% apresentava AVC isquémico com hemiparesia direita, 11,1% apresentava AVC hemorrágico com hemiparesia direita e 11,1% AVC hemorrágico com hemiparesia esquerda. Os principais fatores de risco eram hipertensão (44,4%), diabetes (22,2%), tabagismo (22,2%) e etilismo (11,1%).

Material

O Questionário Sócio-demográfico e Clínico foram elaborados com o objetivo de recolher os dados sobre a idade, sexo, situação clínica e fator (s) de risco.

O Índice de Barthel (IB) é um instrumento que avalia o grau de independência do indivíduo para a realização de Atividades Básicas da Vida Diária (Wade & Collin, 1988, adaptado à população portuguesa por Araújo, Ribeiro, Oliveira & Pinto, 2007). O estudo das propriedades psicométricas do instrumento revela um nível de fidelidade elevado, isto é, um alfa de Cronbach de 0,96 (Araújo, Ribeiro, Oliveira, & Pinto, 2007). É constituído por 10 itens (higiene pessoal, banho, vestir-se, alimentar-se, mobilidade cama/cadeira, mobilidade subir/descer escadas, mobilidade marcha, eliminação intestinal, eliminação vesical, uso de WC) de resposta “tipo Likert” (pontuação dos itens em 0, 1, 2, 3). Os indivíduos são classificados como: Totalmente dependentes (menos de 8 pontos), Incapacidade grave (de 9 a 12 pontos), Incapacidade moderada (de 13 a 19 pontos) e Independentes (20 pontos).

O Mental Health Inventory-5 é um questionário de auto-resposta, “tipo Likert”, de seis posições (McHorney & Ware, 1995, versão reduzida de cinco itens, traduzida e adaptada para a população portuguesa por Ribeiro, 2001). Avalia 4 dimensões da saúde mental (ansiedade, depressão, perda de controle emocional-comportamental e bem-estar psicológico). A nota total resulta da soma dos valores brutos dos itens que compõem cada dimensão e são os valores mais elevados que correspondem a uma melhor saúde mental. A versão portuguesa exibe características idênticas à versão original, ou seja, verifica-se uma correlação de 0,95 entre o MHI-5 e a versão original de 38 itens. Daí que a versão de 5 itens seja um bom substituto para a investigação e rastreio na avaliação da saúde mental (Ribeiro, 2001).

Procedimento

Especificamente, foram as seguintes as fases do procedimento:

Fase 1 - Pedido de autorização. Realizou-se o pedido de autorização para a realização do estudo na UCCI de Média Duração de Vila do Conde, no qual constava uma breve explicação dos objetivos do estudo, tendo sido entregue ao Provedor e Diretora Técnica.

Fase 2 - Seleção da amostra. A partir do parecer favorável da administração da UCCI de Media Duração, consultaram-se os processos dos indivíduos que se enquadravam nos critérios de inclusão para o estudo, nomeadamente: diagnóstico clínico de AVC; orientação auto e alopsíquica; e ausência de patologia psiquiátrica grave diagnosticada. A amostra foi sequencial, composta por 18 indivíduos, com idades entre os 45 e 85 anos.

Fase 3 – Consentimento informado. Em seguida, o consentimento informado foi pensado para garantir os direitos, liberdades e garantias dos utentes do sistema de cuidados de saúde, constituindo um importante marco no sistema de saúde (Pais-Ribeiro, 2002). No presente caso, o consentimento informado pressupôs o consentimento voluntário dos participantes. Mas, antes de requerer a aceitação destes, foi transmitido o conhecimento sobre a natureza, duração, e propósito da investigação, bem como do método e dos meios pelos quais iria ser conduzida. Por fim, acrescentou-se a possibilidade dos participantes desistirem, caso tivessem motivos para não continuarem a participar na investigação.

Fase 4 – Pré – teste. Depois, procedeu-se à construção do protocolo e os indivíduos responderam, na presença da investigadora ao: questionário sociodemográfico e clínico; ao IB (Wade & Collin, 1988, adaptado à população portuguesa por Araújo et al., 2007); ao MHI-5 (McHorney & Ware, 1995, versão reduzida de 5 itens, adaptada à população portuguesa por Ribeiro, 2001). Elaborou-se uma base de dados, para posterior tratamento estatístico, através do SPSS, versão 17.0.

Fase 5 – Implementação da IPPG. Na implementação da intervenção, os 18 participantes foram divididos aleatoriamente e de forma equitativa pelo grupo de intervenção e pelo grupo de comparação. Desenvolveu-se um conjunto de sessões realizadas em grupo para beneficiar do valor terapêutico do grupo (Yalom, 1995; Zimmerman,1993). As estratégias de intervenção foram utilizadas com o propósito de induzir emoções positivas, pois as emoções não podem ser incutidas diretamente (Fredrickson, 2000). Decidiu-se usar a técnica do grupo focal com o intuito da interação grupal produzir dados e insights que seriam dificilmente conseguidos fora do grupo (Kind, 2004). A intervenção decorreu numa sala apropriada e os indivíduos estavam sentados em cadeiras, colocadas em círculo, ao longo de 10 sessões, com periodicidade semanal e com a duração aproximada de 45 minutos para cada sessão. Através de uma linguagem simples e adequada explicou-se o objetivo da sessão, apresentou-se o tema de discussão e, as sessões conduzidas pela psicóloga foram baseadas numa perspetiva não diretiva, procurando modelar a confiança, respeito e preocupação pelos outros. Os participantes foram alertados para respeitar as opiniões de todos, de que não existiam respostas certas ou erradas e que todos poderiam expressar a sua opinião. Colocaram-se questões abertas e em grupo os participantes discutiram o tema proposto, de modo a se verificarem categorias de conteúdos relacionados com os aspetos virtuosos da natureza humana, funcionalidade nas ABVD e SM durante a reabilitação pós-AVC. No final da sessão, a investigadora questionou sobre a avaliação da sessão. As sessões foram distribuídas por 3 módulos, com base na literatura (Rivero & Marujo, 2011). Apresenta-se em seguida o quadro com a descrição das sessões (quadro 1).

 

 

Fase 6 – Pós-teste. O pós-teste realizou-se próximo do momento da alta da unidade. Com o auxílio da investigadora, dada a dificuldade na leitura e escrita (secundárias ao AVC) responderam ao Índice de Barthel e MHI-5.

Fase 7 - Tratamento de dados qualitativos (análise de conteúdo). A análise de conteúdo consiste num conjunto de técnicas de análise de comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens (Bardin, 1977). Fez-se a construção das sinopses de cada sessão, isto é, sínteses dos discursos que continham a mensagem essencial da sessão, sendo portanto material descritivo que, atentamente foi lido e sintetizado. No caso do presente estudo, as categorias foram estabelecidas antes. As verbalizações dos participantes foram classificadas segundo três categorias, estabelecidas a priori, partindo dos fundamentos teóricos da psicologia positiva. Para cada uma das categorias foi produzido um texto síntese em que expressava o conjunto de significados presentes nas diversas unidades de análise incluídas em cada uma delas, usando citações diretas dos dados originais. Na fase de tratamento de dados, a investigadora apoiada nos resultados brutos procurou torná-los significativos e válidos. Após a descrição, procurou-se atingir uma compreensão aprofundada do conteúdo das mensagens através da inferência e interpretação. Uma vez que a interpretação foi realizada a partir dos fundamentos presentes na Psicologia Positiva, a análise de conteúdo, presente neste estudo, usou a abordagem dedutiva.

Fase 8 – Tratamento de dados quantitativos (testes não paramétricos). Dada a dimensão reduzida da amostra, os dados recolhidos no pré-teste e pós-teste foram submetidos a testes não paramétricos, com auxílio do SPSS, versão 17.0.

 

RESULTADOS

Resultados qualitativos

Os dados provenientes do GI foram alvo de uma análise de conteúdo: definição de categorias e subcategorias (pré-estabelecidas), codificação e registo de exemplos ilustrativos de cada categoria e subcategoria identificada. Após a descrição, procurou-se atingir uma compreensão aprofundada do conteúdo das mensagens através da inferência e interpretação. Uma vez que a interpretação foi realizada a partir dos fundamentos presentes na Psicologia Positiva, a análise de conteúdo presente neste estudo usou a abordagem dedutiva.

Acolhimento

Os participantes ficaram a conhecer-se melhor e a perceber que muitas das suas dificuldades em relação ao internamento eram partilhadas. Referiram: “Foi difícil ao início, pensei que não ia aguentar estar longe de casa e da família”; “é muito tempo fora de casa, pensei que estava num Lar de Idosos”; “foi muito rápido o AVC e, agora leva tempo a recuperar”.

Categoria Apreciar o passado

Utilizou-se a estratégia de evocar acontecimentos bons. O primeiro tema de discussão apresentado ao grupo foi apreciar o passado, dando o exemplo de uma recordação antiga muito agradável.

Na subcategoria “Recordações positivas” referiram: “O dia do meu casamento”; “A notícia que ia ser Pai”; “O regresso do meu marido de Angola”; “O nascimento dos meus filhos e depois dos netos”; ” As brincadeiras da minha infância”.

Depois, utilizou-se a estratégia encontrar crescimento pessoal. O tema seguinte de discussão apresentado foi sobre uma vivência difícil que tornou os mais competentes, isto é, que os fez desenvolver forças e virtudes.

Na subcategoria “Conhecer-se positivamente” referiram: “A morte do meu marido. Fiquei sozinha a criar os meus filhos mas, tive coragem e lutei para os criar“; “ A doença da minha irmã. Estive do lado dela e dei-lhe amor e cuidados”; “O meu divórcio. Arruinei muita coisa e aprendi com os erros”.

Em seguida, a estratégia de intervenção foi avaliar com apreço o já vivido e o perdoar. O grupo refletiu sobre a importância de avaliar com apreço o já vivido e conseguir perdoar para o nosso bem-estar.

Na subcategoria “Agradecer e perdoar” referiram: “Agradeço a Deus todos os dias por estar viva. Já perdoei muitas vezes, mas há coisas que não esqueço”; “Não agradeço com palavras, mas antes com um olhar, um gesto, um sorriso e, perdoar só se for alguém da família”.

Categoria Celebrar o presente

Utilizou-se como estratégia de intervenção o estilo explicativo da realidade. O tema de discussão foi relativo a mitos que surgem na 3ª idade.

Na subcategoria “Sentido positivo na adversidade” referiram: “Os idosos gostam de conviver. Serve para rir e distrair mas é preciso ter oportunidade”; “Ter mais idade pode ser igual a ter mais experiência e sabedoria”; “Toda a gente pode adoecer, não são só os velhos. Precisamos de mais ajuda da família e ir ao médico mais vezes para vigiar”; “Estar internado é difícil, mas é a maneira de se recuperar e começar andar e querer voltar para casa ”.

Em seguida, utilizou-se a estratégia de atribuir significado positivo a acontecimentos normais e ainda a estratégia de identificar atividades agradáveis. O tema de discussão foi sobre acontecimentos diários positivos. Embora tenham sentido alguma dificuldade inicial, conseguiram depois enumerar pelo menos um acontecimento positivo desse dia.

Na subcategoria “Acontecimento positivo diário” referiram: “Hoje lanchei com a minha família no salão de chá”; “Gostei de tomar banho de chuveiro”; “Fiz melhor a fisioterapia e senti menos dor”; “Deixei a cadeira de rodas e uso o tripé”; “os terapeutas ajudaram-me muito na sessão”.

Depois, utilizaram-se como estratégias as crenças espirituais ou religiosas e o exercício de relaxamento imagético. O tema de discussão foi sobre crenças religiosas ou espirituais. Fizeram um exercício de relaxamento.

Na subcategoria “Transcendência do Eu” referiram: “Não sou religioso ou praticante, mas sinto que há uma entidade superior”; “Gosto de estar só e falar com Deus, sinto-me em paz”; “Não sei se é Deus, há algo superior que nos ajuda”; “Ajuda-me a acreditar que vou ter forças para continuar o tratamento”; “O relaxamento faz-me sentir mais calmo”; “Com o relaxamento consigo mudar o pensamento por momentos”.

Categoria Acreditar no futuro

Utilizou-se a estratégia estabelecer objetivos claros e verdadeiramente nossos. O tema de discussão sobre os planos para o futuro, isto é, a postura pró-ativa a adotarem após a alta da UCCI de média duração.

Na subcategoria “Postura pró-ativa” referiram: “Tenho de continuar a fisioterapia numa clinica, ainda estou com dificuldades em mexer o braço”; “Preciso de manter a alimentação com pouco sal e não abusar dos doces”; “Agora, vou passar a ir sempre às consultas no hospital”; “Preciso de ir para um centro de dia e depois, à tarde volto para casa”; “Vou ter o apoio domiciliário, enquanto preciso ou ter alguém que cuide de mim”; “Vou fazer obras em casa, preciso de colocar uma base de chuveiro e retirar a banheira”.

Depois, utilizou-se a estratégia de encontrar significado positivo nos acontecimentos importantes. O tema de discussão foi sobre os ingredientes de uma vida com um sentido positivo.

Na subcategoria “Sentido de vida (positivo)” referiram: “A família para mim é muito importante”; “A amizade dos amigos”; “Trabalhar naquilo de que gostamos”; “Ter alegria”; “A fé ajuda-nos nos momentos difíceis”; “O humor”; “A saúde”.

Finalização

O tema de discussão foi sobre a avaliação da IPPG. Referiram: “Ajuda-nos a pensar de maneira diferente”; “Fez com que me sentisse bem-disposto”; “Aprendemos uns com os outros”.

Resultados qualitativos

Relativamente aos resultados sobre a funcionalidade e saúde mental dos participantes, antes da intervenção: o grupo de comparação (n=9) apresentou-se totalmente dependente em nas ABVD (M=2,11; DP=2,57) e apresentou valores baixos de saúde mental (M=9,33; DP=4,03) (quadro 2).

 

 

Por sua vez, o grupo de intervenção (n=9) também apresentou-se totalmente dependente nas ABVD (M=2,55; DP=0,88) e com valores baixos de saúde mental (M=7,11; DP=3,58) (quadro 3).

 

 

De modo a investigar a existência de diferenças significativas entre o grupo de intervenção, entre os momentos pré e pós- intervenção, no sentido do aumento dos níveis de funcionalidade nas ABVD e SM, utilizou-se teste de Wilcoxon (alternativa não paramétrica ao teste t-student para amostras emparelhadas).

Os resultados do teste de Wilcoxon verificou-se que o grupo de intervenção melhorou os níveis de saúde mental e os níveis de capacidade funcional. Existe evidência estatística para afirmar que neste grupo o programa de intervenção psicológica positiva em grupo teve o efeito desejado (quadro 4).

 

 

Para investigar a existência de diferenças significativas entre o GI e GC, no momento pós- intervenção, no sentido de o GI apresentar um aumento nos níveis de funcionalidade nas ABVD e SM, não se verificando o mesmo no GC, utilizou-se o teste de Mann-Whitney (alternativa não paramétrica ao teste t-student para amostras independentes).

Os resultados do teste de Mann-Whitney mostram que tanto os níveis de saúde mental como os níveis de capacidade funcional aumentaram no grupo de intervenção relativamente ao grupo de comparação. Existe evidência estatística para afirmar que os níveis de saúde mental e os níveis de capacidade funcional diferem consoante o grupo (quadro 5).

 

 

DISCUSSÃO

O facto de estar limitado nas ABVD, fragilizado psicologicamente, afastado do seu ambiente habitual e dos seus hábitos anteriores requer que o indivíduo sobrevivente ao AVC tenha uma boa capacidade de superação e mudança para enfrentar o desafio da reabilitação.

De acordo com a revisão da literatura, as emoções negativas geram reatividade cardiovascular que podem prejudicar a saúde dos indivíduos e, por isso, torna-se fundamental descobrir maneiras eficazes para regular as emoções negativas, bem como, compreender como e porquê que as emoções positivas contribuem para resultados benéficos na saúde (Fredrickson, 2001).

O modelo broaden-and-build das emoções positivas defende que estas contribuem para o bem-estar psicológico e físico. Servem para diminuir o efeito da excitação fisiológica das emoções negativas, aumentam o repertório individual pensamento-ação e constroem recursos pessoais duradouros (Fredrickson, 2000). As emoções positivas constituem, deste modo, uma importante via de coping eficaze de ajustamento ao stresse agudo e ao stresse crónico (Fredrickson, 1998; 2001).

Os 18 participantes apresentaram como critérios de inclusão para o estudo: diagnóstico clínico de AVC, orientação auto e alopsíquica e ausência de patologia psiquiátrica grave diagnosticada. A amostra foi sequencial, com idades entre os 45 e 85 anos. Foram distribuídos equitativamente e aleatoriamente pelo grupo de intervenção e pelo grupo de comparação.

Neste sentido, desenvolveu-se uma IPPG facilitadora de forças e virtudes humanas, com o intuito de contrariar os problemas resultantes das emoções negativas face à reabilitação pós-AVC, tratar e prevenir dificuldades ao nível da funcionalidade nas ABVD e SM dos participantes.

Com base na literatura desenvolveram-se três módulos (Rivero & Marujo, 2011). Especificamente, as sessões foram desenvolvidas com base em estratégias de intervenção capazes de induzir emoções positivas e discutindo temas em grupo ao longo de três módulos. As estratégias de intervenção foram utilizadas com o propósito de induzir emoções positivas, pois as emoções não podem ser incutidas diretamente (Fredrickson, 2000).

O Módulo I “Apreciar o Passado” foi criado com o objetivo de perceber a forma como o individuo recorda o passado, como se sente grato pelo bom que foi acontecendo na sua vida e como cresceu com a adversidade. Utilizou-se a estratégia de evocar acontecimentos bons, através da recordação de memórias felizes. A perceção sobre o melhor do passado, teve como resultado o reviver e partilhar de acontecimentos e emoções positivas que tornaram as suas vidas felizes. Procurou-se, com isso, favorecer o aparecimento de emoções positivas, uma vez que, estas parecem beneficiar os recursos cognitivos, físicos e sociais que são benéficos para a saúde (Fredrickson, 2000).

Depois, utilizou-se a estratégia encontrar crescimento pessoal, pedindo que relembrassem um episódio difícil da sua vida que os tivesse tornado melhores. Conseguiram mostrar que as vivências do passado (perda, doença ou a distância da família), os transformou positivamente. Identificaram em si e nos outros participantes virtudes como coragem, amor, temperança e transcendência. E, ainda, forças pessoais como perceção de competência e perseverança, bondade e carinho, perdão, humildade, gratidão, esperança e propósito. Assim, considera-se útil o florescimento de virtudes e forças humanas na reabilitação pós-AVC. Virtudes e forças pessoais servem de fatores protetores contra as situações de risco e adversidade (Seligman, 2002).

Em seguida, a estratégia de intervenção foi avaliar com apreço o já vivido e o perdoar, de modo a perceberem o valor terapêutico de tais virtudes. A gratidão foi referida como uma emoção mais fácil de concretizar, ao invés do perdão. Procurou-se com a gratidão e o perdão promover emoções positivas e anular os efeitos das emoções negativas. Isto porque, as emoções positivas permitem a anular os efeitos das emoções negativas e encontrar significados positivos em situações de stresse(Fredrickson, et al., 2000), tal como acontecer na reabilitação pós-AVC.

O Módulo II “Celebrar o presente” foi elaborado com o propósito de treinar a atenção sobre o bom e belo da vida e a serenidade para lidar com a adversidade. Utilizou-se como estratégia de intervenção o estilo explicativo da realidade, mediante o debate em torno de mitos na 3ª idade, o que se refletiu na reinterpretação positiva de acontecimentos. Isto porque, os indivíduos sentem-se mais felizes quando adotam um estilo explicativo da realidade que seja positivo (Diener & Biswas-Diener, 2008).

Reformularam assim alguns mitos, nomeadamente: que é importante perceber que os idosos mantêm interesses e vontade de conviver, simplesmente precisam de ter oportunidade para o mostrarem; que é natural adoecer em qualquer etapa do ciclo da vida, simplesmente nesta faixa etária estão mais sujeitos a adoecer e precisam por isso de maior apoio da família e vigilância médica; que a hospitalização ou a reabilitação pode ser vista como um desafio da vida, em que é preciso lutar e estabelecer objetivos.

Em seguida, utilizou-se a estratégia de atribuir significado positivo a acontecimentos normais, pedindo que enumerassem pelo menos um acontecimento positivo nesse dia. Isto porque, o aumento no empenho de atividades agradáveis, diminui os níveis de depressão (Lewinsohn, & Gotlib, 1995). Assim, reconheceram pequenos ganhos na fisioterapia que os motivou na sua reabilitação, perceberam o valor agradável de estar com a família e o valor terapêutico da equipa técnica.

Depois, utilizaram-se como estratégias as crenças espirituais ou religiosas e o exercício de relaxamento imagético, de maneira a perceberem como tais aspetos poderiam influenciar a sua reabilitação. As crenças espirituais/religiosas revelaram-se úteis no sentido de os ajudar a lidar emocionalmente com as dificuldades sentidas, indo assim ao encontro dos resultados de outros estudos (Guimaraes, & Avezum, 2007). Por sua vez o relaxamento conduziu-os a experiências de contentamento e calma interior que vão no sentido de uma redução ou anulamento do efeito provocado pela excitação emocional negativa, tal como defendido por na hipótese do efeito anulador das emoções positivas (Fredrickson, 2000).

O Módulo III “Acreditar no futuro” foi criado no sentido de estimular ideias de futuro. Foi utilizada a estratégia estabelecer objetivos claros e verdadeiramente nossos, pedindo para traçar os seus objetivos de modo a perceber qual a postura pró-ativa a adotar após a alta. Verificou-se que aceitaram melhor as suas limitações e tomaram consciência da necessidade de serem agentes ativos das suas vidas, estabelecendo assim objetivos. Mostraram-se motivados a desenvolver planos necessários a realizar no momento pós-alta (procuraram na comunidade recursos para beneficiar de apoio domiciliário ou centro de dia; asseguraram a fisioterapia num outro centro clínico) e mudaram em função do que necessitam (aceitaram seguir os hábitos alimentares recomendados; realizaram obras em casa). É, assim importante definir objetivos claros e intrínsecos que estimulem o indivíduo, relativamente ao futuro, de modo a beneficiar o seu bem-estar e otimismo (Seligman, 1998). Acredita-se, que ao estabelecer uma orientação para o futuro estes indivíduos em reabilitação pós-AVC terão maiores níveis de emoção positiva, motivação para a ação e mudanças favoráveis após a situação de dependência funcional, tal como o defendido noutros estudos (Dunn, Elliot, & Uswatte, 2009).

Finalmente utilizou-se a estratégia encontrar significado nos acontecimentos importantes, de modo a identificar os elementos significativos para um sentido de vida positivo. Isto porque, os indivíduos encontram significado positivo na vida diária, reenquadrando acontecimentos adversos através de uma reavaliação positiva e perseguindo e alcançando metas realistas (Fredrickson, 2000). Assim, a situação de reabilitação pós-AVC geradora de stresse e dor passou a ser vista como um desafio e contribuiu para mudanças positivas frente à situação adversa que é a reabilitação pós-AVC.

Os participantes mostraram maior empenho na reabilitação, esperança, significados e emoções positivas como estratégias para a promoção de atitudes saudáveis. Identificaram como elementos importantes para um sentido de vida positivo: a vivência de emoções positivas (alegria, fé, gratidão, perdão, esperança e coragem), o envolvimento com outros (a família e amigos), a descoberta de significado na vida (terem sido pais, terem ajudado outros) e a saúde.

Houve também ocasião para que os participantes do grupo de intervenção preenchessem, antes e após a intervenção, o Índice de Barthel e o Mental Health Inventory-5 para posterior comparação de resultados com o grupo de comparação. Os resultados obtidos, na análise de testes não paramétricos, mostram que o grupo de intervenção apresentou vantagens significativas, comparativamente ao grupo de comparação, em relação aos níveis de funcionalidade nas ABVD e SM. Combinaram-se, assim, abordagens qualitativas e quantitativas no sentido de criar uma visão complementar, isto é, mais abrangente do tema sobre as virtudes e forças humanas na reabilitação pós-AVC, ao nível da funcionalidade nas ABVD e SM.

Os resultados deste estudo mostram-se concordantes com a ideia de que maiores níveis de emoção positiva podem reduzir a tristeza, reconhecer ganhos, ter esperança na reabilitação e motivação para continuar com o tratamento, tal como já outros estudos o tinham referido (Seale et al., 2010).

Acredita-se que a IPPG ao usar as estratégias de intervenção indutoras de emoções positivas tenha conseguido ampliar o repertório individual de pensamento-ação dos indivíduos e construído recursos físicos, cognitivos e sociais que beneficiaram o GI ao nível da sua funcionalidade nas ABVD e SM, comparativamente ao GC.

Deste modo, as principais potencialidades encontradas na IPPG foram:

a) o GI ter mostrado melhores resultados ao nível da funcionalidade nas ABVD e SM, comparativamente ao GC. Considera-se, portanto, que o GI tenha beneficiado da IPPG, devido ao efeito terapêutico das estratégias de intervenção indutoras de emoções positivas (evocar acontecimentos bons; encontrar crescimento pessoal; avaliar com apreço o já vivido e perdoar; desenvolver um estilo explicativo da realidade positivo; explorar crenças espirituais/religiosas; praticar o relaxamento imagético; praticar atividades agradáveis; definir objetivos claros e intrínsecos; encontrar significado nos acontecimentos importantes) pois, segundo o modelo broaden-and-build das emoções positivas, estas ampliam o repertório individual do pensamento-ação dos indivíduos e constroem recursos pessoais duradouros (Fredrickson, 2000);

b) o facto de o GI ter participado num grupo permitiu que se sentissem apoiados e compreendidos, aproveitando assim o valor terapêutico do grupo, tal qual o defendido por Yalom (1995) e Zimerman (1995);

c) considera-se ainda que a discussão de temas, mediante a técnica do grupo focal permitiu a interação grupal, produzindo dados e insights que seriam dificilmente conseguidos fora do grupo (Kind, 2004), logo fazendo crescer em si forças e virtudes humanas capazes de os ajudar a lidar com o desafio da reabilitação pós-AVC;

d) rentabilizar tempo e recursos;

e) poder ser implementada noutro tipo de instituição e com indivíduos com outras incapacidades físicas;

f) favorecer a aceitação de limitações e promover mudanças de prioridades;

g) promover forças e virtudes humanas durante a reabilitação, tais como esperança e coragem.

As principais limitações encontradas, ao longo da IPPG, foram:

a) ser uma amostra de conveniência, não garantindo a representatividade da população;

b) ter um tamanho reduzido a amostra (dada a exigência dos critérios de inclusão) podendo enviesar os resultados e não permitir a generalização e validação das conclusões;

c) ter sido a investigadora a ler e anotar a resposta pretendida (dadas as dificuldades de leitura e escrita) podendo isso ativar o efeito de desajabilidade social.

Consideram-se como sugestões para futuras investigações, as seguintes:

a) aumentar o tamanho da amostra para garantir maior representatividade da população estudada;

b) alargar o âmbito da intervenção a indivíduos com outras incapacidades físicas e que estão em reabilitação;

c) avaliar outras variáveis, pois segundo a literatura existem fatores preditores de sucesso e outros de insucesso na reabilitação (motivação; suporte social e familiar; estado cognitivo; gravidade inicial e extensão do AVC; défice anterior ao AVC);

d) avaliar os efeitos da intervenção após 6 meses da alta, de modo a perceber como se mantém o impacto da IPPG sobre a funcionalidade nas ABVD e SM;

e) incluir a família em novas sessões da IPPG, pois esta constitui um fator preditor de sucesso na reabilitação.

Deste modo, as emoções positivas induzidas na IPPG contrariam os efeitos reduzidos do repertório de pensamento-ação das emoções negativas, como por exemplo, o medo, a ansiedade, a tristeza, a raiva e o sofrimento, ampliando e construindo recursos pessoais duradouros que trataram no presente os efeitos os efeitos da excitação fisiológica resultante das emoções negativas, perante a reabilitação pós-AVC. É assim fundamental fortalecer competências e não apenas corrigir fraquezas, assim como, encontrar formas de induzir emoções positivas para abrir caminhos para a saúde e o bem-estar. As forças e virtudes humanas constituem, deste modo, um importante foco de intervenção na reabilitação pós- AVC. Tal como tem sido defendido nos últimos tempos, a psicologia deverá examinar teoricamente e empiricamente as forças e virtudes humanas da mesma forma rigorosa como faz com os aspetos negativos (Fredrickson, 2000; Seligman, 2002). Considera-se ainda, que se os indivíduos em reabilitação pós-AVC continuarem a desenvolver e a praticar estratégias de intervenção indutoras de emoções positivas, estes não só beneficiarão no momento presente dos benefícios mas também no futuro. Os aspetos virtuosos da natureza humana funcionam como ferramentas valorosas não só para problemas de saúde imediatos, mas também para estabelecer resultados benéficos a longo prazo (Tugade & Fredrickson, 2004).

Concluindo, a IPPG conseguiu induzir emoções positivas e, com isso, mostrar o papel terapêutico dos aspetos virtuosos da natureza humana ao nível da funcionalidade nas ABVD e SM dos indivíduos em reabilitação pós-AVC. Espera-se que este estudo seja orientador de futuras investigações, ao nível do impacto das forças e virtudes humanas durante a prevenção da doença ou reabilitação pós-AVC.

 

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Recebido em 9 de Dezembro de 2013/ Aceite em 20 de Março de 2014