SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.12 número1Vulnerabilidade dos adolescentes às dst/aids: ainda uma questão de gênero?Qualidade de vida e indicadores de ansiedade e depressão de pacientes com cancro colo-rectal índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças v.12 n.1 Lisboa  2011

 

Cuidar de idosos com demência em instituições: competências, dificuldades e necessidades percepcionadas pelos cuidadores formais

Ana L. Barbosa1, Joana Cruz1, Daniela Figueiredo2,3, Alda Marques2 e Liliana Sousa1,3

 

1 Secção Autónoma de Ciências de Saúde da Universidade de Aveiro, Aveiro, Portugal

2 Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro, Aveiro, Portugal

3 Unidade de Investigação e Formação sobre Adultos e Idosos, UNIFAI, Porto, Portugal

 

Contactar para E-mail: anabarbosa@ua.pt

 

RESUMO

O crescente número de pessoas com demência coloca novos desafios às instituições de terceira idade e aos cuidadores formais. Cuidar de idosos demenciados está pois associado a elevados níveis de stress e insatisfação laboral, devido à grande dependência e frequentes distúrbios comportamentais que acompanham a doença. Este estudo visa identificar as competências, necessidades e dificuldades que advêm da prestação formal de cuidados a pessoas com demência. Foram realizadas duas entrevistas de focus group a 15 cuidadores formais de uma Instituição na região central de Portugal (Aveiro). Os resultados obtidos sugerem a necessidade de desenvolver programas integrados em instituições e destacam conteúdos que podem ser utilizados na melhoria da qualidade dos cuidados prestados aos utentes e no bem-estar dos idosos e dos seus cuidadores.

Palavras-chave:competências, cuidadores formais, demência, dificuldades, idoso.

 

Caring of institutionalized elderly with dementia: skills, difficulties and needs perceived by formal caregivers

ABSTRACT

The growing number of people with dementia brings new challenges to institutions and formal caregivers. Caring for elderly with dementia is associated with high levels of stress and work dissatisfaction, due to the high dependency and behavioural disorders that often accompany the disease. This study aims to identify the skills, needs and difficulties that arise from the formal care of the elderly with dementia. Two focus group interviews with 15 formal caregivers were carried out in an institution in the central region of Portugal (Aveiro). The results suggest the need to develop integrated programs in institutions and highlight contents that may be used to improve the quality of care provided and to promote patients and caregivers’ well-being.

Keywords: dementia, difficulties, competences, elderly, formal caregivers.

 

Dada a sua etiologia neurodegenerativa, a demência está associada ao envelhecimento humano, com uma prevalência mundial que duplica a cada 4-5 anos a partir dos 65, passando de 1,5% nesta idade para os 30-40% aos 85 anos (Wimo, Winblad, Aguero-Torres, & von Strauss, 2003). Estima-se que, mundialmente, existam 24 milhões de pessoas com demência, número que tenderá a duplicar a cada 20 anos (Ferri et al., 2005).

Os idosos com demência perdem progressivamente as suas capacidades cognitivas e motoras, originando, em estados mais avançados da doença, um elevado sentimento de sobrecarga na família. Esta situação leva à necessidade de institucionalização das pessoas idosas ( Schulz et al., 2004) . Segundo Kuske et al. (2009), cerca de 60% das pessoas institucionalizadas em países industrializados apresenta um quadro demencial. O esperado aumento da prevalência de utentes com esta doença coloca novos desafios às instituições de terceira idade, particularmente aos cuidadores formais (Kuske et al., 2007). Cuidar de idosos demenciados está associado a elevados níveis de stress, sobrecarga física (Rolland et al., 2007) e insatisfação laboral nos cuidadores formais, devido à grande dependência e frequentes distúrbios comportamentais (agitação, deambulação, discurso repetitivo, agressão verbal e física) que acompanham a doença (Davison, McCabe, Visser, Hudgson, & George, 2007; Kuske et al., 2009). Em Portugal, como em outros países europeus (Kuske et al., 2007), os cuidados a idosos demenciados são prestados em lares de idosos convencionais, por pessoas com baixa escolaridade e pouca formação especializada.

Na última década a literatura tem evidenciado o desenvolvimento de programas de formação para os cuidadores formais, que se centram sobretudo na informação e aquisição de conhecimentos e competências em relação à situação da demência, mas desvalorizam o stress e a sobrecarga emocional destes cuidadores. Para além deste facto, verifica-se ainda que o conhecimento acerca das necessidades de saúde e de reabilitação da população com demência em Portugal é insuficiente. A reabilitação destes indivíduos contempla a estimulação cognitiva, a estimulação multi-sensorial e a intervenção motora. No entanto, quer a formação dos cuidadores relativamente a aspectos da reabilitação que podem ser empregues na prestação dos cuidados, como a própria intervenção junto dos idosos com demência são escassas. Assim, é necessário formar os cuidadores formais com competências que lhes permitam adequar os cuidados às necessidades dos idosos e, simultaneamente, diminuir a sobrecarga subjacente ao acto de cuidar. Neste sentido, alguns autores sublinham que programas que integram a informação e o suporte emocional são os mais eficazes na melhoria das competências dos cuidadores formais e da qualidade dos cuidados prestados (Davison et al., 2007).

As intervenções psico-educativas na doença crónica caracterizam-se por integrar o apoio educativo e o suporte emocional, em programas estruturados, breves e multidisciplinares (Sousa, Mendes, & Relvas, 2007). A componente educativa oferece informação sobre a doença e a vertente de suporte permite a obtenção de orientações concretas para reduzir o stress resultante do impacto da doença, ajudar a gerir emoções e a usar estratégias mais eficazes de resolução de problemas. A eficácia da abordagem psico-educativa às famílias cuidadoras é reconhecida: reduz o stress familiar; aumenta o sentido de competência e auto-estima dos cuidadores (Sousa et al., 2007); reduz a ansiedade e sintomas depressivos e tem um impacto positivo no funcionamento psicológico destas pessoas (Coon, Thompson, Steffen, Sorocco, & Galagher-Thompson, 2003; Hébert & Schulz, 2006). Contudo, esta abordagem tem sido pouco estudada nos cuidadores formais, apesar do seu potencial para melhorar o conhecimento e aceitação da doença pelos cuidadores, ampliar o seu repertório de estratégias de gestão de stress e melhorar a expressão de ideias e de emoções (Morano & Bravo, 2002). Por outro lado, aspectos da reabilitação destes utentes que podem aumentar a qualidade dos serviços prestados e a melhoria do bem-estar dos cuidadores formais e dos idosos têm sido pouco contemplados nesta abordagem.

Assim, a abordagem psico-educativa, associada a uma abordagem de reabilitação, focalizada na maximização das capacidades do idoso com demência e na interacção idoso-cuidador é determinante para a promoção e manutenção da mobilidade, da funcionalidade e da estimulação dos idosos (Oswald, Gunzelmann, & Ackermann, 2007), e para a diminuição da sobrecarga física e psicológica dos cuidadores formais (National Collaborating Centre for Mental Health [ NCCMH], 2007 ). Para além disto, estes programas integrados, de apoio psico-educativo e de reabilitação, permitem construir, junto com os profissionais e no seu ambiente de trabalho, um projecto com o qual se identifiquem e no qual possam aumentar os seus conhecimentos e competências. Esta abordagem integrada é considerada fundamental, pois permite responder às necessidades dos idosos e cuidadores, contribuindo para a melhoria do bem-estar de ambos e para a prestação de cuidados de qualidade ( NCCMH, 2007 ).

O estudo pretendeu recolher informação acerca das competências, dificuldades e necessidades sentidas pelos diferentes profissionais que prestam cuidados a pessoas com demência em instituições com a valência de lar. Este conhecimento é fundamental para o desenvolvimento de programas integrados de reabilitação e apoio psico-educativo, que vão ao encontro das expectativas dos profissionais e que proporcionem informação e apoio adequados, promovendo assim a melhoria da qualidade dos cuidados prestados aos utentes e o bem-estar de idosos e cuidadores.

 

MÉTODO

Participantes

O estudo foi apresentado a um membro da direcção de uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) situada na região central de Portugal (distrito de Aveiro), a quem se solicitou a colaboração para identificar potenciais profissionais interessados em participar. Após este procedimento, os potenciais participantes foram informados acerca da natureza, objectivos e meios pelos quais o estudo seria conduzido, tendo-lhes sido também garantida a confidencialidade das respostas. Aos profissionais que aceitaram participar e que cumpriam os critérios de inclusão no estudo, i.e., trabalhar na instituição, manter contacto directo com utentes com quadro demencial, apresentar discurso coerente e ausência de défice cognitivo, foi-lhes solicitada a assinatura do termo de consentimento livre e informado.

Constituiu-se assim uma amostra de 15 profissionais: 8 auxiliares de acção directa, 1 auxiliar de serviços gerais, 1 técnico de animação sociocultural, 2 técnicos de serviço social, 1 fisioterapeuta, 1 médico e 1 enfermeiro.

A amostra é predominantemente do género feminino (93,3%), com idades compreendidas entre os 45 e os 54 anos, em que a média etária é de 42,93 (DP= 10,75 anos). Relativamente ao estado civil, a maior parte dos elementos é casado ou vive em união de facto (66,67%), e no que se refere às habilitações literárias, 66,66% dos participantes apresenta formação secundária ou de nível superior (Tabela 1).

 

Tabela 1

Caracterização sócio-demográfica dos participantes

 

Procedimentos

A metodologia de recolha de dados utilizada foi a entrevista de focus group. Trata-se de um método que se baseia nas interacções grupais para analisar atitudes, sentimentos, valores, experiências e conhecimentos sobre determinado assunto (Greenbaum, 2000). Esta metodologia tem sido considerada eficaz e adequada para explorar atitudes e necessidades no contexto da prestação de cuidados de saúde (Kitzinger, 1995).

A IPSS onde decorreu o estudo possui dois lares (A e B). Assim, foram realizadas duas entrevistas de focus group no local de trabalho dos participantes, com uma duração média de 45 minutos. Ambas foram orientadas por dois profissionais com experiência na dinamização de grupos e conduzidas a partir de um guião semi-estruturado com questões de resposta aberta sobre: i) competências dos cuidadores formais; ii) dificuldades sentidas na prestação de cuidados à pessoa idosa com demência; iii) expectativas em relação a programas de intervenção integrada de reabilitação e apoio psico-educativo; iv) obstáculos à implementação deste tipo de intervenções.

Os procedimentos na condução das entrevistas exigiram algumas considerações, nomeadamente: o encorajamento à interacção verbal, o reforço de que todas as respostas eram válidas e que não existia respostas certas ou erradas, e a formulação de questões simples, repetindo ou clarificando, para assegurar que todos os elementos compreendiam o que lhes era perguntado.

As entrevistas foram gravadas, transcritas e submetidas a análise de conteúdo por juízes independentes: as autoras. As entrevistas foram lidas 3 vezes. A primeira leitura serviu para obter uma ideia geral da informação como um todo. A segunda leitura teve como objectivo identificar as unidades de informação que correspondiam aos objectivos do estudo e identificar outras que tivessem emergido. A terceira leitura teve como objectivo o refinamento da categorização da informação. Terminado este procedimento, os juízes reuniram-se para analisar os resultados e discutir todas as situações até chegar a um acordo.

 

RESULTADOS

Os participantes envolveram-se em debates activos e identificaram diversos aspectos relativos às suas competências, dificuldades e necessidades, para além de relatarem as suas expectativas e obstáculos acerca de futuras intervenções integradas. Os dados obtidos das duas unidades residenciais, que se apresentam de seguida, foram trabalhados em conjunto, uma vez que não se pretendia comparar resultados.

Competências dos cuidadores

Apesar de não terem formação especializada, os participantes sentem possuir algumas competências na prestação de cuidados a utentes com demência. Trata-se de competências que resultam sobretudo da sua experiência ao longo do tempo e da interacção com os colegas, e que se centram tanto nos cuidados de natureza instrumental como nos de cariz mais emocional.

“Eu quando cheguei aqui não tinha formação nenhuma, mas fui aprendendo com as minhas colegas que aqui estavam, que aquele utente não sai da cama, mas tem de ser virado, no mínimo, de duas em duas horas…tem de se dar água bastantes vezes para não ficar desidratado …” [ A1]

“Nós temos pessoas que não têm formação mas como gostam de trabalhar com idosos conseguem manter uma calma, conseguem manter um diálogo com eles, mesmo com os que estão bastante mal, que conseguem, portanto, desbloquear as agressividades.” [B1]

“Pela experiência que eu tenho destes anos, nós vamos um pouco ao encontro para não contrariar, para [as pessoas com demência] não ficarem mais agressivas.” [A2]

“A minha opinião em relação aos quadros mais avançados a nível de demência a melhor técnica é simplesmente desvalorizar a informação que nos é dada, nem é dizer sim nem não... “ [ B2]

“Falo com ele normalmente, reajo a algumas provocações (…) porque enquanto eu estiver a provocá-lo ele está concentrado na minha pessoa, e automaticamente deixa a colaboradora [trabalhar].” [ B2]

Percepção das dificuldades na prestação de cuidados

Os cuidadores identificaram várias dificuldades no trabalho com pessoas com demência, nomeadamente: a interacção com o utente, o desconhecimento da doença, a falta de tempo e de recursos humanos, o impacto emocional e físico, a dificuldade de organização e planeamento de actividades e a interacção com a família dos utentes.

Foi destacado que cuidar de uma pessoa com demência é mais exigente do que cuidar de uma pessoa com limitações de outra ordem, devido sobretudo às dificuldades de comunicação e interacção:

“Com outro utente uma pessoa diz isto ou aquilo, e ele reage intencionalmente àquilo que uma pessoa pede. Neste tipo de situação, não. Posso estar a falar de “alhos” e ele não está a perceber nada do que quero, nunca vai reagir ao meu pedido.” [B2]

“Numa casa onde estão várias situações de doenças, a mais difícil realmente é a demência!” [A3]

“Para mim o mais complicado de lidar com o idoso com o quadro demencial tem a ver com o facto do discurso comunicado não ser entendido por eles. E depois como eles estão sempre na defensiva…” [B3]

Os distúrbios comportamentais próprios da doença, como a agitação e a agressividade, são situações particularmente difíceis para os participantes:

“Há dias que eles estão mais agitados ou mais agressivos e consoante isso tenho mais ou menos dificuldade em lidar com isso” [B2]

“Principalmente na agressividade, quando eles mostram agressividade é como lidar com ela. Que meios podemos utilizar para contornar a situação?” [B4]

“Nós acabámos de os tratar, e eles com aquela teimosia de que ainda não foi feito e que não foi… e depois até insultam!” [A1]

Alguns participantes referem mesmo algum desconhecimento acerca das características da demência, seus sintomas e etiologia, traduzindo-se num sentimento de incerteza relativamente à adequação dos cuidados que prestam:

“Eu estou aqui a trabalhar e ninguém me disse nada como devia trabalhar com essas pessoas, p.e., eu posso dizer uma coisa […] que lhes faz mal […] não temos esse conhecimento que deveríamos ter.” [A2]

“No outro dia aconteceu uma situação com uma pessoa com demência que fala de coisas antigas, como o marido que morreu e não sabe onde está. Quer dizer a gente deve alimentar essa ilusão ou deve dizer não?” [A4]

Para vários elementos, o cuidado a pessoas com quadro demencial constitui um motivo de sobrecarga física e emocional. Expressões como “é muito complicado” e “é preciso muita paciência” foram relatadas com frequência. Sentimentos de impotência e de desgaste são comuns: “E há aqueles dias em que realmente a gente também está sem paciência…não consegue ter ideias, dar a volta, ultrapassar aquela situação.” [A1]. Além disso, manifestam algum receio de ocorrência de lesões físicas associadas ao cuidado a estes idosos: “Se ajudassem… mas às vezes rodam, e no meio do caminho alapam, e tu tens de os segurar, não podes deixar cair… E depois faz-se uma rotura muscular!” [A1]

A “falta de tempo” para executar as tarefas e a falta de recursos disponíveis foram referidos como obstáculos à plena prestação de cuidados: “Porque nós bem queríamos, mas então para isso era preciso uma funcionária para cada utente, para podermos estar sempre ali à altura!” [A4]

Outras dificuldades fazem-se notar ao nível da organização e planeamento de actividades. Alguns elementos consideram impossível “ter as coisas organizadas ao pormenor”, enquanto outros referem não saber “o que fazer” para integrar e/ou estimular estes utentes: “Eu para aquelas pessoas que não falam, acho muito difícil o que posso fazer com elas.” [A2]

A dificuldade na interacção com os familiares dos utentes foi salientada, particularmente devido ao pouco envolvimento das famílias na dinâmica institucional e à presença de expectativas díspares:

“Em relação às famílias acho que são muito importantes, e acho que têm de ser mais activas” [B1]

“É difícil eles [os familiares] participarem. […] tentamos […] [convidá-los a] organizar os guarda-fatos, mas são poucas as famílias que querem, que aderem pronto. Umas porque acham que não devem vir, […] outras porque não têm disponibilidade, outras que nem lhes passa na cabeça.” [A3]

“Outra coisa que eu acho que se torna muitas vezes complicado é gerir as expectativas da família […]”. [B3]

Percepção de aspectos positivos na prestação de cuidados

Apesar das dificuldades, os cuidadores formais referiram vários aspectos positivos do seu trabalho com pessoas demenciadas. A manutenção da dignidade e o sentimento de que se está a contribuir para o bem-estar da pessoa com demência foram referidas como as principais gratificações por um dos participantes: “Positivo é sempre, positivo é porque estamos a lidar com humanos!” [B3]

Outros elementos indicaram que cuidar destes utentes constitui uma fonte de aprendizagem e enriquecimento pessoal, permitindo o desenvolvimento de novos conhecimentos e competências: “Ainda nos ensinam algumas coisas!” [A3]

Expectativas dos cuidadores acerca de Futuras Intervenções

A maioria dos cuidadores deseja adquirir mais conhecimentos acerca da natureza da demência e competências para lidar com os comportamentos associados a esta:

“Ter um bocadinho de mais conhecimento sobre a doença, para depois agir e ter atitudes correctas. Vai um bocado ao encontro de saber lidar melhor com as pessoas.” [A2]

“Temos de ter mais conhecimento mais formação, para lidar com estas situações e para nos proteger também.” [A4]

“Em termos de as nossas auxiliares de acção directa lidarem com a agressividade.” [A3]

Procuram também perceber se as estratégias e técnicas que utilizam diariamente na interacção com utente são eficazes e se existem outras abordagens mais úteis:

“ Eu posso-me sentar ao pé de uma pessoa e conversar um bocadinho, mas é uma coisa mínima e a pessoa, se calhar, nem era isso que pretendia. Gostaríamos de ter essa informação para poder fazer mais qualquer coisa.” [A4]

Além disso, esperam receber algum apoio para lidar melhor com o stress, pois: “Não há nada para que se possa ajudar os colaboradores a fazer a gestão do próprio stress.” [B3]

Obstáculos à implementação de intervenções

O tempo surge invariavelmente como o principal obstáculo à participação dos cuidadores formais em intervenções integradas, tendo um dos participantes referido que:

“É muito complicado fazer uma formação de grupo, não podemos tirar as pessoas do trabalho.” [B3]

 

DISCUSSÃO

Interagir com os utentes com demência e suas famílias, gerir os sintomas comportamentais associados à condição demencial e desenvolver actividades que integrem e estimulem estes idosos são aspectos particularmente difíceis para os cuidadores formais. Estas dificuldades parecem repercutir-se no sentimento de sobrecarga física e emocional presente no discurso dos participantes, e já evidenciado em estudos anteriores (Rolland et al., 2007; Sidani, LeClerc, & Streiner, 2009; Singer & Luxenberg, 2003). Reconhece-se que a natureza dos sintomas cognitivos e comportamentais de demência se associa a elevados níveis de sobrecarga e stress nos profissionais (Wood et al., 1999; Debring, McCarty, & Lombardo, 2002; van Weert, Dulmen, & Bensing, 2008). Todavia, a falta de conhecimento acerca da doença e de competências específicas para gerir os seus sintomas e manifestações poderá também ajudar a interpretar estes resultados. Zimmerman et al. (2005), por exemplo, verificaram que a falta de formação adequada se associa a elevados níveis de stress, sobrecarga e insatisfação laboral em cuidadores formais. Além disso, sabe-se que a gestão inadequada dos comportamentos problemáticos leva ao seu agravamento e ao aumento da sobrecarga dos cuidadores formais (Burgio et al., 2002; Cassidy & Sheikh, 2002).

Os resultados apontam assim para a necessidade do desenvolvimento de programas de intervenção com os cuidadores formais que visem não só a promoção de conhecimentos e competências específicas no contexto dos cuidados na demência, mas também o desenvolvimento de estratégias que promovam o auto-cuidado e a gestão do stress e sobrecarga emocional.

Os programas psico-educativos têm sido predominantemente utilizados com cuidadores familiares, revelando resultados positivos ao nível do bem-estar e redução da sobrecarga (Coon et al, 2003; Hébert & Schulz, 2006). A reabilitação em idosos com demência tem demonstrado resultados positivos, diminuindo os comportamentos agitados e agressivos, melhorando a comunicação e humor dos pacientes, reduzindo a sobrecarga dos cuidadores, melhorando a interacção entre os cuidadores formais e os pacientes, estimulando a mobilidade, melhorando o equilíbrio e cognição e reduzindo o número de quedas e o declínio funcional (Christofoletti et al. , 2008; Rolland et al. , 2007; van Weert et al , 2008). Alguns aspectos do programa de reabilitação, com a devida formação, podem e devem ser usados pelos cuidadores formais. No entanto, estes programas (psico-educativos e de reabilitação) têm sido aplicados de forma separada, o que promove fragmentação dos cuidados, aumenta o stress dos cuidadores, pacientes e famílias. Assim, integrar estas abordagens e alargá-las ao contexto dos cuidados formais pode ter impactos positivos nos cuidadores, promovendo um ajustamento saudável e funcional às exigências impostas pelos cuidados na demência, nos serviços, aumentando a qualidade dos cuidados prestados e, por conseguinte, nas pessoas com demência.

O número de programas que visam apoiar os cuidadores formais tem aumentado; no entanto, alguns aspectos metodológicos, como o conteúdo da formação, a intensidade e o tempo de formação continuam pouco claros (McCabe et al. , 2007). Evidencia-se a importância de realizar o levantamento das necessidades e expectativas destes profissionais, de forma a desenvolver programas de intervenção integrados, alcançando assim resultados efectivos e motivando os participantes a alterar comportamentos e atitudes.

 

REFERÊNCIAS

Burgio, L. D., Stevens, A., Burgio, K. L., Roth, D. L., Paul, P., & Gerstle, J. (2002). Teaching and maintaining behavior management skills in the nursing home. The Gerontologist, 42 (4), 487-496.         [ Links ]

Cassidy, E. L., & Sheikh, J. I. (2002). Pre-intervention assessment for disruptive behaviour problems: a focus on staff needs. Aging & Mental Health , 6 (2), 166 – 171.         [ Links ]

Christofoletti, G., Oliani, M. M., Gobbi, S., Stella, F., Teresa, L., Gobbi, B., & Stella, F. (2008). A controlled clinical trial on the effects of motor intervention on balance and cognition in institutionalized elderly patients with dementia. Clinical Rehabilitation, 22 (7), 618-626.         [ Links ]

Coon, D. W., Thompson, L., Steffen, A., Sorocco, K., & Gallagher-Thompson, D. (2003). Anger and depression management: Psychoeducational skill training intervention for women caregivers of a relative with dementia. Gerontologist, 43, 678–689.         [ Links ]

Davison, T. E., McCabe, M.P., Visser, S., Hudgson, C., G., & George, K. (2007). Controlled trial of dementia training with a peer support group for aged care staff. International Journal of Geriatric Psychiatry, 22, 868-873.         [ Links ]

Debring, C., McCarty, E.F., Lombardo, N.B. (2002). Professional caregivers for patients with dementia: predictors of job and career commitment. American Journal of Alzheimer's Disease and Other Dementias, 17(6): 357-366.         [ Links ]

Ferri, C., Prince, M.,Brayne, C., Brodaty, H.,Fratiglioni, L., Ganguli, M.,Hall, K., Hasegawa, K., Hendrie, H., Huang, Y., Jorm, A., Mathers, C.,Menezes, P., Rimmer, E., & Scazufca, M. (2005). Global prevalence of dementia: a Delphi consensus study. Lancet, 366 (9503), 2112-2117.         [ Links ]

Greenbaum, T.L. (2000). Moderating focus group: a practical guide for group facilitation. Thousand Oaks, CA: Sage Publications.         [ Links ]

Hébert, R.S., & Schulz, R. (2006). Caregiving at the End of Life. Journal of Palliative Medicine. 9 (5): 1174-1187.         [ Links ]

Kitzinger, J. (1995). Introducing focus group. British Medical Journal, 311: 299-302.         [ Links ]

Kuske, B., Hanns, S., Luck, T., Angermeyer, M., Behrens, J., & Riedel-Heller, S.G. (2007). Nursing home staff training in dementia care: a systematic review of evaluated programs. International Psychogeriatrics, 19(5), 818– 841.         [ Links ]

Kuske, B., Luck, T., Hanns, S., Matschinger, H., Angermeyer, M., Behrens, J., & Riedel-Heller, S.G. (2009). Training in dementia care: a cluster randomized controlled trial of a training program for nursing home staff in Germany. International Psychogeriatrics, 21 (2), 295-308.         [ Links ]

McCabe, M.P., Davison, T., Visser, S., Hudgson, C., Buchanan, G., & George, K. (2007). Effectiveness of staff training programs to manage behavioural problems of dementia. International Journal of Health & Aging Management , 1(2), 11-23.         [ Links ]

Morano, C. L., & Bravo, M. (2002). A Psychoeducational Model for Hispanic Alzheimer's Disease Caregivers. Gerontologist, 42(1), 122-126.         [ Links ]

National Collaborating Centre for Mental Health (NCCMH). (2007). Dementia A NICE–SCIE Guideline on supporting people with dementia and their carers in health and social care. London: The British Psychological Society and Gaskell.         [ Links ]

Oswald, W. D., Gunzelmann, T., & Ackermann, A. (2007). Effects of a multimodal activation program (SimA-P) in residents of nursing homes. European Review of Aging and Physical Activity, 4, 91-102.         [ Links ]

Rolland, Y., Pillard, F., Klapouszczak, A., Reynish, E., Thomas, D., Andrieu, S., Reviere, D., & Vellas, B. (2007). Exercise Program for Nursing Home Residents with Alzheimer’s Disease: A 1-Year Randomized, Controlled Trial. Journal of American Geriatrics Society, 55, 158-165.         [ Links ]

Schulz, R., Belle, S.H., Czaja, S.J., McGinnis, K.A., Stevens, A., & Zhang, S. (2004). Long-term care placement of dementia patients and caregiver health and well-being. The Journal of American Medical Association, 292 (8), 961-967.         [ Links ]

Sidani, S., LeClerc, C., & Streiner, D. (2009). Implementation of the abilities-focused approach to morning care of people with dementia by nursing staff. International Journal of Older People Nursing; 4: 48–56.         [ Links ]

Singer, C., & Luxenberg, J. (2003). Diagnosing Dementia in Long-Term Care Facilities. Journal of the American Medical Directors Association, 4 (6, Supplement 1), 134-140.         [ Links ]

Sousa, L., Mendes, A. & Relvas, A. (2007). Enfrentar a velhice e a doença crónica. Lisboa: Climepsi.         [ Links ]

van Weert J.C., van Dulmen, A., Bensing, J.M. (2008). What factors affect caregiver communication in psychogeriatric care? In A. M. Visser (Ed.). Alzheimer's disease: new research (pp. 87-117). New York: Nova Science Publishers .         [ Links ]

Wimo, A., Winblad, B., Aguero-Torres, H., & von Strauss, E. (2003). The magnitude of dementia ocurrence in the world. Alzheimer Disease and Associated Disorders , 7, 63-67.         [ Links ]

Wood, S.A., Cummings, J. L., Barclay, T., Hsu, A., Allahymar, A. & Schelle, J. F. (1999). Assessing the impact of neuropsychiatric symptoms on distress in professional caregivers. Aging & Mental Health, 3(3): 241-245.         [ Links ]

Zimmerman, S., Williams, C. S., Reed, P. S., Boustani, M., Preisser, J. S., Heck, E., & Sloane, P.D. (2005). Attitudes, Stress, and Satisfaction of Staff Who Care for Residents With Dementia. Gerontologist, 45(suppl_1), 96-105.         [ Links ]

 

Recebido em 9 de Setembro de 2009/ Aceite em 18 de Outubro de 2010