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Psicologia, Saúde & Doenças

Print version ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.11 no.2 Lisboa  2010

 

Reacções parentais ao diagnóstico perinatal de anomalia congénita do bebé

Implicações para a intervenção dos profissionais de saúde

 

Ana Fonseca & Maria Cristina Canavarro

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Portugal.

Unidade de Intervenção Psicológica (UnIP) da Maternidade Daniel de Matos dos Hospitais da Universidade de Coimbra, Portugal.

 

Contactar para E­mail: ana.fonseca77@gmail.com

 

Resumo

A notícia de um diagnóstico de anomalia congénita do bebé no período perinatal reveste-se de um impacto emocional significativo para os pais, constituindo um desafio para a actuação dos profissionais de saúde. O objectivo deste trabalho é delinear implicações para a intervenção dos profissionais de saúde, tendo por base uma reflexão sobre a investigação existente acerca das reacções parentais ao diagnóstico de anomalia congénita do bebé. A investigação empírica descreve reacções parentais iniciais semelhantes à resposta de luto (choque, tristeza, ansiedade, culpa e raiva), num processo gradual de adaptação, geralmente conducente à restituição do equilíbrio emocional. Verificam-se também algumas especificidades, em função do momento em que o diagnóstico é conhecido. Da reflexão sobre estes resultados, emergem algumas orientações para a actuação dos profissionais de saúde, nomeadamente no que respeita à comunicação do diagnóstico, à necessidade de uma equipa multidisciplinar coordenada que proporcione um contexto seguro de prestação de cuidados e à relevância de intervenções psicossociais com estas famílias.

Palavras-­chave: Anomalia congénita do bebé; diagnóstico pré-natal; diagnóstico pós-natal; reacções parentais; intervenção dos profissionais de saúde; intervenção psicossocial.

 

Parental reactions to perinatal congenital anomaly diagnosis of the baby: Implications for the intervention of health professionals

Abstract

The communication of a congenital anomaly diagnosis of the baby during the perinatal period has a significant emotional impact for parents, being a challenge for the intervention of health professionals. The aim of this paper is to outline implications for the intervention of health professionals, based on a reflection on existing research about parental reactions to the diagnosis of congenital anomaly of the baby. Empirical research describes initial parental reactions similar to mourning response (shock, sadness, anxiety, guilt and anger), in a gradual process of adaptation, often leading to recovery of emotional well­being. There are also some specific features, depending on when the diagnosis is known. From the reflection on the research results presented, some guidelines for different health professionals emerged, particularly as regards the communication of the diagnosis, the need for a coordinated multidisciplinary team that provides a safe context of care, as well as the relevance of psychosocial interventions with these families.

Keywords: Congenital anomaly of the baby; prenatal diagnosis; post­natal diagnosis; parental reactions; health professional’s intervention guidelines; psychosocial intervention.

 

O diagnóstico de anomalia congénita no bebé tem um impacto significativo ao nível da saúde pública, pelo seu efeito negativo na qualidade de vida das crian­ças afectadas e dos seus familiares, e pelos serviços médicos, sociais e educa­cionais requeridos para melhorar o seu bem-estar (Euro­Peristat Project, 2008). O impacto do diagnóstico de anomalia congénita no bebé é também visível em vários domínios familiares (e.g., financeiro, social, profissional), pelo que o con­fronto com esta notícia é, para os pais, um período particularmente desafiante e exigente, com possíveis implicações a nível emocional (Seligman & Darling, 2007).

O reconhecimento deste impacto coloca em aberto a necessidade de os pro­fissionais de saúde considerarem como foco da sua intervenção, quer a criança com anomalia congénita, quer o bem-estar e as necessidades individuais dos seus pais, adequando, para isso, diferentes aspectos da prestação de cuidados a estas fa­mílias. Para isso, necessitam de (re)conhecer a diversidade de reacções parentais à notícia de um diagnóstico de anomalia congénita do bebé, bem como a sua va­riabilidade em função, por exemplo, do momento em que o diagnóstico é conhe­cido.

Segundo o nosso conhecimento, a literatura nacional nesta área é escassa; assim, partindo de uma revisão aprofundada da literatura empírica sobre as reacções paren­tais ao diagnóstico de anomalia congénita do bebé, o objectivo deste trabalho é deli­near um conjunto de implicações para a intervenção dos profissionais de saúde e de Saúde Mental neste contexto.

Dada a multiplicidade de investigações sobre esta temática, optámos por ex­cluir aquelas que se focam na experiência de perda subsequente à interrupção da gra­videz por diagnóstico de anomalia congénita, pelas características particulares que lhe estão subjacentes; e aquelas cujo foco principal são variáveis individuais/interpes­soais específicas (e.g., estilos de coping) com influência na diversidade da resposta parental à notícia do diagnóstico, por se afastarem do principal objectivo deste tra­balho.

A literatura empírica na área em apreço organiza-se, sobretudo, pelo mo­mento em que o diagnóstico de anomalia congénita do bebé foi conhecido (pré ou pós-natal). Neste contexto, optámos por apresentar os estudos de acordo com o momento do diagnóstico para, posteriormente, apresentarmos investigações que comparam as reacções parentais ao diagnóstico de anomalia congénita no bebé, em função do momento em que este é conhecido. As principais conclusões dos estu­dos serão objecto de reflexão, com vista a desenvolver orientações para a inter­venção dos profissionais de saúde, que serão sistematizadas no último ponto deste trabalho.

 

Reacções parentais ao diagnóstico de anomalia congénita no bebé no período pré-natal

A realização de diagnóstico pré-natal (DPN) é percebida, pelas mulheres, como um dos acontecimentos mais emocionalmente significativos durante a gravidez, a par da descoberta da gravidez e do momento do nascimento (Lee, 1995). O conjunto de técnicas de DPN, cuja utilização é cada vez mais difundida, possibilita a detecção, no período pré-natal, de um vasto leque de anomalias congénitas. A sua difusão e in­tegração nas rotinas pré-natais resultaram, com frequência, numa antecipação do ti­ming do diagnóstico, do período pós-natal para o período pré-natal (Bijma, Heide, & Wildschut, 2007). O diagnóstico pré-natal de anomalia congénita no bebé surge fre­quentemente de forma inesperada, por vários motivos: pelo enraizamento da ideia geral, fruto dos avanços da Medicina, de que gravidez é um processo sem desvios ou complicações; pela frequente inexistência prévia de sintomas sinalizadores de que algo não estava bem com o bebé; e, também, pela progressiva construção parental de uma representação idealizada de um bebé saudável, perfeito e bonito (e.g. Kowalcek, Mülhoff, Bachmann, & Gembruch, 2002; Seligman & Darling, 2007).

De forma geral, as investigações, utilizando uma metodologia qualitativa, re­portam um forte impacto inicial da notícia de um diagnóstico de anomalia congénita do bebé, durante o período pré-natal.

São descritas reacções de choque, trauma e ruptura com a concepção prévia do mundo após a notícia do diagnóstico (Lalor & Begley, 2006; Mitchell, 2004), que têm subjacente a perda das expectativas prévias de um bebé saudável; quando o diag­nóstico é conhecido através de um procedimento não invasivo de DPN como a eco­grafia, acresce a isto a ruptura com a percepção positiva associada a este procedimento, habitualmente encarado como uma forma de conhecer o bebé, e não como uma técnica de diagnóstico (Lalor & Begley, 2006).

Com frequência, são também descritas reacções iniciais de negação, descrença e alienação do mundo; frustração, raiva ou irritabilidade; e culpa, tristeza ou luto (Chaplin, Schwitzer, & Perkoulidis, 2005; Petrucelli, Walker, & Schorry, 1998). O contraste entre sentimentos de medo e de alívio é também referenciado no estudo de Petrucelli e colaboradores (1998); este alívio parece decorrer da possibilidade de identificação de um problema para o qual anteriormente já existiam suspeitas, e/ou da inexistência de outras malformações que impliquem consequências mais graves para o bebé. Estas reacções são semelhantes às que caracterizam a resposta de luto após uma perda, o que vai ao encontro da conceptualização do diagnóstico de ano­malia congénita do bebé como um dos tipos de perda que podem ocorrer no período perinatal (Rolim & Canavarro, 2001).

Após as reacções iniciais, os sentimentos mais comummente experienciados pelos pais, durante o período final da gravidez, parecem oscilar numa ambivalência entre esperança e medo, sofrimento e confiança, optimismo e pessimismo; contudo, uma minoria de pais relata uma experiência subsequente da gravidez traumatizante e debilitante, marcada por irritabilidade e isolamento (Chaplin et al., 2005). Jones, Statham e Solomou (2005) identificaram três dimensões predominantes da vivência materna da gravidez, após a notícia do diagnóstico: ambivalência, expressa em dú­vidas sobre a decisão de continuar a gravidez e em sentimentos de protecção e rejei­ção do bebé; incerteza associada ao prognóstico do bebé; e perda, quer de um bebé saudável, quer do seu papel central na gravidez. Relativamente a este último aspecto, os autores esclarecem que, por exemplo, as recomendações médicas de repouso que impossibilitam as mães de participar activamente nos preparativos para a chegada do bebé, ou a perspectiva de que os primeiros cuidados ao bebé poderão ser presta­dos numa unidade de cuidados neo-natais, podem contribuir para que as mulheres percepcionem que o seu papel face ao bebé é diminuído.

Na literatura empírica, dois estudos merecem destaque por apresentarem duas propostas de compreensão da adaptação materna a um diagnóstico de anomalia con­génita no bebé no período pré-natal.

O primeiro, conduzido por Lalor, Begley e Galavan (2009), foi inovador pela sua natureza prospectiva, contemplando três momentos de avaliação (pós-diagnós­tico, previa e posteriormente ao nascimento). Os resultados obtidos descrevem um processo de adaptação materna ao diagnóstico pré-natal de anomalia congénita do bebé numa sequência de quatro estádios/etapas, não sendo desprezada a sua natureza cíclica.

De acordo com os autores, a notícia do diagnóstico abala as expectativas ma­ternas de que tudo está bem com o bebé (estádio inicial), originando reacções de cho­que, medo, pânico, sofrimento e tentativa de fuga da realidade (segundo estádio); algumas mulheres chegam a experienciar curtos períodos de descrença ou de expec­tativa de que tenha existido um erro no diagnóstico efectuado. O terceiro estádio – procura de significado para o diagnóstico de anomalia congénita no bebé –, no qual as mães são confrontadas com a necessidade de adaptação à notícia, caracteriza-se pela ambivalência entre a procura e o evitamento de informação sobre o diagnóstico; pela procura dos determinantes causais da anomalia diagnosticada; e pela necessidade de confrontar e reenquadrar, a um nível mais próximo, expectativas e projectos para a gravidez e, a um nível mais amplo, crenças prévias sobre o mundo (e.g. Mulheres saudáveis têm bebés saudáveis). O processo de construção de significado é idiossin­crático, segundo os autores, e o seu timing dependerá de factores diversos como o prognóstico da anomalia. Finalmente, o último estádio caracteriza-se por um movi­mento para a construção de um novo significado sobre a anomalia fetal e a assunção de uma visão positiva do futuro – estádio de reconstrução (Lalor et al., 2009).

Também Aite e colaboradores (2006) procuraram esboçar um modelo de res­posta emocional materna ao diagnóstico pré-natal de anomalia fetal. Os resultados do estudo sugerem a existência de reacções iniciais de choque e de subsequente des­crença e negação do acontecimento. Seguem-se, durante a gravidez, sentimentos de culpa e tristeza e, menos frequentemente, raiva, medo e preocupação com a possibi­lidade de perder o bebé ou com o risco de outras anomalias. A predominância do medo ao longo da gravidez parece ter subjacente a ameaça que o diagnóstico se cons­tituiu para o sentido de controlo, competência e estabilidade materna. Os resultados evidenciam também que a maioria das mães atinge, ainda durante a gravidez, um es­tádio de adaptação, caracterizado pela flutuação entre a diminuição do sofrimento emocional e restituição do sentimento de controlo da situação, por um lado, e fortes emoções de medo e incerteza, por outro.

Os dois estudos reportam uma sequência de respostas semelhante à notícia do diagnóstico de anomalia congénita, sendo possível estabelecer paralelismos entre al­guns estádios (estádio de reconstrução vs. adaptação). Apesar dos benefícios da iden­tificação deste processo sequencial, atenção deve ser dada àquilo que os próprios autores salientam (Lalor et al., 2009) – a sua natureza cíclica.

As investigações descritas assumem uma natureza predominantemente explo­ratória e apresentam várias limitações metodológicas: reduzido tamanho das amos­tras; foco quase exclusivo na vivência materna, deixando por explorar a experiência paterna de adaptação a um diagnóstico de anomalia fetal; e metodologia de avalia­ção retrospectiva. Apesar disso, os contributos apresentados dão conta de informação relevante para os profissionais de saúde – o confronto com o diagnóstico pautado por emoções mais disruptivas, a que se segue, habitualmente, um período de pro­gressiva adaptação –, da qual podem decorrer implicações importantes, que assu­mem para nós particular interesse no presente artigo e que serão objecto de reflexão noutro ponto deste trabalho.

 

Reacções parentais ao diagnóstico de anomalia congénita no bebé no período pós-natal

Algumas anomalias congénitas são apenas detectadas no momento do nasci­mento, colocando de forma súbita aos pais um duplo desafio. Por um lado, a perda do bebé esperado – perfeito e saudável – e, por outro, o nascimento de um bebé com características e exigências distintas, que pode ser percepcionado como ameaçador (e.g. Messias, Gillis, Sparacino, Tong, & Foote, 1995). Diversas investigações têm sido realizadas, com o objectivo de caracterizar a reacção parental ao diagnóstico de anomalia congénita no bebé, quando este é conhecido no período pós-natal.

De entre elas, destacamos uma investigação pioneira (Drotar, Baskiewicz, Irvin, Kennell, & Klaus, 1975), de natureza qualitativa, que integrou 25 participantes, pais de crianças com diferentes tipos de anomalias congénitas. Apesar da discrepância observada no momento de recolha dos dados (desde poucos dias a treze anos após o nascimento do bebé), os resultados sugerem a ocorrência sequencial de um conjunto de reacções parentais após o diagnóstico. As reacções iniciais de choque (disrupção emocional, choro intenso e desespero) dão progressivamente lugar a um período de negação, pautado pelo desejo de libertação da inevitabilidade do diagnóstico ou de negação do seu impacto. Os resultados apontam ainda para a existência posterior de sentimentos intensos de ansiedade, tristeza e raiva. A progressiva diminuição da reac­tividade emocional negativa experienciada, bem como a crescente percepção de con­forto face à situação e de capacidade de cuidar do bebé caracterizam um período subsequente na trajectória parental, descrito pelos autores como de adaptação e sub­sequente reorganização (Drotar et al., 1975). Pela natureza transversal do estudo, a co-ocorrência de diferentes fases e a sua duração não foram directamente avaliadas.

Experiências parentais semelhantes foram documentadas noutros estudos sobre malformações congénitas em geral (Carvalho, Cardoso, Oliveira, & Lúcio, 2006; Pe­tean & Neto, 1998) e sobre malformações específicas, nomeadamente o lábio lepo­rino e fenda palatina (Johansson & Ringsberg, 2004) ou Síndrome de Down (Skotko, 2005). Os resultados da investigação de Johansson e Ringsberg (2004) destacam, de modo particular, a ambivalência dos sentimentos experienciados após o diagnóstico – numa sequência que pode não ser tanto linear, mas cíclica, à semelhança do refe­rido a propósito da adaptação parental ao diagnóstico de anomalia congénita no pe­ríodo pré-natal (Lalor et al., 2009).

Tal como salientado no ponto anterior, também as reacções parentais ao diag­nóstico pós-natal de anomalia congénita no bebé se assemelham às reacções carac­terísticas da resposta de luto por uma perda significativa. Por não corresponder a uma perda “visível”, esta pode não ser reconhecida pelos Profissionais de Saúde e pela so­ciedade em geral, podendo consequentemente representar uma exigência acrescida para estes pais, que se sentem isolados na sua vivência (Rolim & Canavarro, 2001).

Numa outra investigação (Pelchat et al., 1999), foram avaliados os níveis de stress e sofrimento emocional experienciados pelos pais, seis meses após o nasci­mento do bebé. Os autores contrastaram os resultados dos pais de crianças saudá­veis e pais de crianças com diferentes tipos de anomalias congénitas (anomalia cardíaca congénita, síndrome de Down e fenda palatina e lábio leporino corrigido ci­rurgicamente após o nascimento). Os resultados sugerem o impacto significativo, na adaptação parental, de um diagnóstico de anomalia congénita no bebé, sendo esse impacto diferencial em função do tipo de anomalia considerada. Os pais de crian­ças com síndrome de Down ou anomalia cardíaca congénita apresentam, compara­tivamente com os pais de crianças saudáveis ou com fenda palatina e lábio leporino, níveis significativamente superiores de stress em relação à aceitação do bebé, sentem-se significativamente mais ameaçados pela situação parental, percebendo-a como mais incontrolável, stressante e causadora de maior sofrimento emocional. Neste contexto, parecem ser as anomalias congénitas que acarretam risco de pro­blemas de desenvolvimento e/ou sobrevivência para o bebé, aquelas que apresentam maior impacto na adaptação parental, seis meses após o nascimento do bebé (Pel­chat et al., 1999).

Um outro contributo para o estado da arte na área em apreço é oferecido por um estudo recente (Grob, 2008), de cariz retrospectivo e qualitativo, que elucidou acerca do impacto diferencial do diagnóstico de anomalia congénita no bebé, em função da (in)existência de manifestações sintomáticas da anomalia. Partindo de uma amostra de pais de bebés diagnosticados com fibrose quística após o nascimento, o autor sa­lienta que, para os pais cujo bebé apresenta manifestações sintomáticas da anomalia, as reacções de tristeza e de medo co-ocorrem com uma sensação de alívio, eviden­ciando a percepção parental de que a identificação da anomalia pode possibilitar a rea­lização de tratamentos conducentes à melhoria do estado de saúde do bebé. Por outro lado, as reacções dos pais cujo diagnóstico ocorre na ausência de quaisquer sinto­mas são descritas como mais devastadoras e inesperadas; estes pais lidam com a exi­gência acrescida do confronto com a contradição entre um diagnóstico que resulta de um teste efectuado e a realidade de uma criança aparentemente saudável.

Em síntese, os resultados apresentados neste ponto apontam também para a na­tureza processual da adaptação parental ao diagnóstico, bem como para a influência de alguns factores (e.g., tipo de anomalia e suas manifestações) na diversidade das reacções experienciadas, depreendendo-se desde logo a necessidade de uma presta­ção de cuidados diferenciada, em função desses factores. Tal como as investigações do ponto anterior, estas investigações padecem do mesmo tipo de limitações meto­dológicas; esse facto não retira a importância do seu contributo para o estado da arte na área em apreço e para o desenvolvimento de orientações para a prestação de cui­dados neste contexto específico, como discutiremos no último ponto deste trabalho.

 

Reacções parentais ao diagnóstico de anomalia congénita no bebé: o momento importa?

A análise destes estudos sugere a existência de algumas comunalidades nas reac­ções parentais ao diagnóstico de anomalia congénita no bebé, independentemente de este ter sido conhecido no período pré-natal ou após o nascimento. No entanto, alguns autores têm procurado averiguar se o momento em que o diagnóstico é conhecido tem um impacto diferencial nas reacções parentais experienciadas. Os resultados dos estudos existentes não oferecem uma resposta inequívoca a esta questão.

No estudo de Skari e colaboradores (2006), por exemplo, verificou-se que, logo após o nascimento do bebé, o grupo de pais cujo diagnóstico foi conhecido no período pré-natal apresenta, comparativamente ao grupo de pais que conheceu o diagnóstico no período pós-natal, níveis superiores de ansiedade e depressão e maior hiperacti­vação emocional. Estes resultados são semelhantes às seis semanas e aos seis meses após o nascimento do bebé, embora o momento do diagnóstico possua um papel pre­ditor apenas das reacções emocionais dos pais poucos dias após o nascimento. Numa outra investigação que procurou avaliar a influência do momento do diagnóstico nos níveis maternos de sintomatologia ansiosa e depressiva, seis a dez meses após o diag­nóstico de anomalia congénita, os resultados apontam num sentido contrário: uma percentagem significativamente superior de participantes do grupo que conheceu o diagnóstico no período pós-natal apresenta pontuações indicadoras de depressão clí­nica; os níveis de ansiedade não se distinguem em função do momento do diagnós­tico (Rona, Smeeton, Beech, Barnett, & Sharland, 1998). No entanto, esta diferença pode justificar-se pelo facto de este estudo ter uma amostra de participantes exclusi­vamente do sexo feminino, para além de tomar como referência o tempo decorrido desde o diagnóstico, e não o tempo decorrido desde o nascimento do bebé, como no estudo anterior, implicando necessariamente o facto de, aquando da avaliação, estar também em causa a comparação de exigências diferentes de prestação de cuidados, pelas diferenças etárias dos bebés.

De acordo com Nusbaum e colaboradores (2008), o momento em que o diag­nóstico ocorre influencia a percepção parental do grau de controlo e de preparação para lidar com os acontecimentos circundantes ao diagnóstico do bebé. O conhe­cimento pré-natal do diagnóstico associa-se a uma percepção parental de mais tempo para se preparar e ajustar ao diagnóstico antes do nascimento do bebé, bem como a uma percepção de controlo acrescido dos acontecimentos. Por outro lado, os pais cujo diagnóstico apenas foi conhecido no momento do nascimento percepcionam-se como menos preparados e com menor controlo dos acontecimentos. Sa­lientam, no entanto, que as exigências de prestação de cuidados ao bebé com anomalia congénita impõem a necessidade de lidar e de se ajustarem rapidamente à situação.

Os resultados das investigações existentes sugerem também que o momento em que o diagnóstico de anomalia congénita no bebé é conhecido, tem um impacto dis­tinto em função do género dos pais. Por exemplo, os resultados da investigação de Hoehn e colaboradores (2004) evidenciam que enquanto as mães apresentam níveis similares de stress parental, independentemente do timing de conhecimento do diag­nóstico, os pais cujo diagnóstico do bebé ocorreu no período pré-natal apresentam, comparativamente aos outros, níveis superiores de optimismo e níveis inferiores de ansiedade, bem como percepção de menos acontecimentos de vida negativos. As dis­crepâncias nos níveis de stress parental paterno parecem, de acordo com os autores, ter subjacente uma diferença na percepção de controlo da situação. Enquanto os pais que conheceram o diagnóstico no período pré-natal salientaram a oportunidade de planear a forma de lidar com as principais preocupações associadas ao período pós­-parto (e.g., aspectos profissionais ou financeiros, lidar com outros filhos), isso não se verificou com os pais que conheceram o diagnóstico no período pós-natal, a quem acresceu ainda a preocupação com mãe do bebé, muitas vezes ainda internada e a re­cuperar do parto (Hoehn et al., 2004).

Já uma outra investigação que procurou avaliar, em média seis meses após o parto, as reacções de luto e a percepção de sobrecarga (burden) de pais que recebe­ram um diagnóstico de anomalia congénita no bebé, encontrou também um padrão distinto, em função do género, da influência do momento em que o diagnóstico foi conhecido. Por um lado, as mães que conheceram o diagnóstico no período pré-natal apresentam respostas de luto mais intensas e maior percepção de sobrecarga, quando comparadas com as mães que conhecem o diagnóstico após o nascimento. Por outro lado, os pais que conheceram o diagnóstico de anomalia no período pré-natal diferenciam-se dos pais cujo diagnóstico foi conhecido no período pós-natal, apenas pela maior percepção de sobrecarga a nível financeiro (Hunfeld, Tempels, Passchier, Ha­zebroek, & Tibboel, 1999).

Saliente-se que, apesar da operacionalização das variáveis ser distinta nos dois estudos que apontam estas diferenças (Hoehn et al., 2004; Hunfeld et al., 1999), co­nhecer o diagnóstico no período pré-natal parece ter um efeito mais positivo logo após o nascimento, para os pais, e um efeito mais negativo, cerca de seis meses após o nascimento, para as mães.

Uma possível hipótese explicativa para este facto prende-se com o papel distinto que cabe às figuras materna e paterna, enquanto prestadores de cuidados. De forma geral, face aos constrangimentos físicos da mãe, no período imediatamente subse­quente ao parto, o pai é frequentemente o principal receptor da informação clínica e o principal decisor sobre aspectos relacionados com o diagnóstico do bebé; o res­ponsável pela gestão de outros aspectos familiares (e.g., outros filhos, questões eco­nómicas); bem como o principal cuidador da mãe, que se encontra ainda debilitada. Nesse sentido, o conhecimento prévio do diagnóstico permitirá ao pai, uma maior antecipação dos acontecimentos e a consequentemente percepção do seu controlo, como salientam Hoehn e colaboradores (2004). Por outro lado, após a recuperação física do parto, as mães parecem assumir o papel de principais cuidadoras do bebé com diagnóstico de anomalia congénita. Para aquelas cujo conhecimento do diag­nóstico ocorreu no período pré-natal, o choque da notícia, a incerteza e a maior me­dicalização da gravidez podem significar uma vivência mais disruptiva do período subsequente da gravidez (Chaplin et al., 2005; Jones et al., 2005), constituindo-se como um factor de desgaste emocional acrescido, que pode ter repercussões aquando da prestação de cuidados ao bebé, após o seu nascimento.

Apesar de a investigação sobre este tópico apresentar pistas importantes, não é conclusiva, sendo necessária a realização de estudos adicionais, quer para o esclare­cimento dos resultados encontrados, quer para a validação e produção de hipóteses explicativas sobre os mecanismos e/ou processos que podem estar subjacentes ao impacto diferencial do momento do diagnóstico e às suas especificidades em função do género. O esclarecimento deste tópico pode também beneficiar da consideração conjunta de outras variáveis (e.g., tipo de anomalia, forma como é veiculada a infor­mação sobre o diagnóstico).

 

Implicações para a prestação de cuidados aos pais que se confrontam com o diag­nóstico de anomalia congénita do bebé no período perinatal

Ao longo deste artigo, procurámos reflectir criticamente sobre a literatura em­pírica existente no domínio das reacções parentais ao diagnóstico de anomalia con­génita do bebé, quando este é conhecido durante a gravidez ou no período pós-natal. Não obstante a importância dos estudos revistos, algumas limitações podem ser apon­tadas à sua generalidade: i) a natureza predominantemente retrospectiva, com uma larga amplitude no que respeita ao momento de avaliação (desde poucos dias ou meses a vários anos após o diagnóstico); ii) a natureza predominantemente transver­sal, que dificulta a captação de trajectórias e de processos; e iii) a reduzida dimensão de algumas amostras, e a consideração exclusiva, em muitos estudos, da experiência materna, deixando de lado a vivência paterna. A investigação nesta área, procurando ultrapassar as limitações encontradas e procurando responder a outras questões de investigação entretanto formuladas, continua a ser relevante, em termos futuros.

O reconhecimento da diversidade das reacções parentais ao diagnóstico de ano­malia congénita do bebé descrito ao longo desta revisão emerge, por um lado, do abandono de perspectivas deterministas do fenómeno em estudo (que assumiam uma reacção linear entre a notícia do diagnóstico e a perturbação do funcionamento pa­rental; Ferguson, 2002) e, por outro lado, da realização de investigações que, pro­gressivamente, avaliaram não só as reacções parentais negativas, mas aquelas que denotam a adaptação e a restituição do equilíbrio emocional.

A generalidade das investigações sugere que, perante o confronto com o diag­nóstico, e de forma mais ou menos independente do momento em que este é conhe­cido, um acontecimento conotado positivamente – o nascimento de um bebé – passa a ter uma tonalidade emocional predominantemente negativa (reacções de choque e disrupção emocional, a que acrescem sentimentos comuns de ansiedade, tristeza, raiva ou culpa). Para os pais, o diagnóstico constitui uma perda do bebé perfeito e sau­dável, dos projectos e expectativas, mas também do seu papel parental, cuja vivên­cia extravasa a intimidade familiar e passa a ser amplamente partilhada pelos profissionais e contextos de Saúde (Seligman & Darling, 2007).

Por outro lado, os estudos realçam também a ambivalência de sentimentos ex­perienciados pelos pais (numa oscilação entre uma carga emocional negativa e algum optimismo, esperança ou mesmo alívio pela confirmação de um diagnóstico até aí in­certo), num movimento que evidencia a natureza processual da adaptação parental ao diagnóstico, e que é geralmente conducente à restituição do equilíbrio emocional – aquilo que alguns autores designam de adaptação ou reconstrução (Aite et al., 2006; Drotar et al., 1975; Lalor et al., 2009).

A revisão efectuada oferece-nos agora uma oportunidade para reflectir acerca das implicações para a prestação de cuidados aos pais, por parte dos profissionais de saúde e de saúde mental, em situações de anomalia congénita do bebé. Começaremos, neste contexto, por reflectir acerca de algumas implicações gerais e, posteriormente, implicações específicas, em função do momento em que ocorreu o diagnóstico.

Em primeiro lugar, parece patente a necessidade de uma prestação de cuidados coordenada entre os diferentes profissionais de saúde, num ambiente que possibilite o estabelecimento de relações com os cuidadores, e onde o impacto emocional de um diagnóstico de anomalia congénita do bebé seja amplamente reconhecido (Ho­dapp & Ly, 2005). Idealmente, a prestação de cuidados deverá ser feita no contexto de uma equipa multidisciplinar especializada, no qual todos os profissionais de saúde estejam despertos para as reacções parentais mais frequentes perante o diagnóstico, mas também para a sua diversidade. No contexto da experiência clínica acumulada na UnIP – Unidade de Intervenção Psicológica da Maternidade Dr. Daniel de Matos (Hospitais da Universidade de Coimbra, EPE), temos comprovado a relevância desta acção coordenada entre os diversos profissionais envolvidos na prestação de cuida­dos a estas famílias, bem como procurado contribuir para a sensibilização destes pro­fissionais, no que respeita às manifestações emocionais e comportamentais associadas à notícia do diagnóstico, e de como actuar em adequação às mesmas.

Em segundo lugar, o reconhecimento de que, independentemente do mo­mento em que o diagnóstico ocorre, as reacções iniciais são de choque e de uma to­nalidade emocional marcadamente negativa (Aite et al., 2006; Drotar et al., 1975; Mitchell, 2004) e que, consequentemente, tornam difícil o processamento e a assi­milação de toda a informação clínica relativa ao diagnóstico. Nesse contexto, na co­municação do diagnóstico, os profissionais de saúde devem procurar, de acordo com as orientações de Spall e Callis (1997) e Marshak, Seligman e Prezant (1999): 1) pre­parar os pais para informação que vão receber; 2) dar, de forma honesta mas empá­tica, a informação chave sobre o diagnóstico – informação adicional poderá ser dada gradualmente; 3) dar a possibilidade, aos pais, de expressarem as suas opiniões e emoções sem receio de rejeição, numa postura de aceitação e não interferência; 4) procurar obter feedback do que foi compreendido pelos pais acerca do diagnóstico, repetindo a informação quando necessário; e 5) mostrar disponibilidade para res­ponder a todas as questões colocadas pelos pais, numa postura de aceitação e com­preensão das suas dúvidas. A forte necessidade de questionamento sentida pelos pais, pode também advir de alguma expectativa de que o diagnóstico seja um erro ou da procura de explicações para o sucedido (Lalor et al., 2009), das incertezas sobre o diagnóstico (Jones et al., 2005), ou ainda, quando o diagnóstico ocorre após o nasci­mento, da inexistência de manifestações sintomáticas da anomalia (Grob, 2008). Cabe aos profissionais de saúde aceitar e normalizar esta necessidade por parte dos pais, respondendo às suas questões e mostrando disponibilidade para esclarecimentos adi­cionais, no futuro. Segundo Statham, Solomou e Chitty (2000) a comunicação acerca do diagnóstico entre os profissionais de saúde que prestam cuidados à família as­sume também particular relevância, assim como pode ser útil fornecer à família in­formação escrita sobre o diagnóstico, seu prognóstico e tratamentos.

Em terceiro lugar, como já referido, o diagnóstico de anomalia congénita no bebé representa, para os pais, não apenas uma perda do bebé saudável (Rolim & Ca­navarro, 2001), mas uma perda do seu papel parental (Jones et al., 2005). Para além do reconhecimento desta perda não “visível”, e não obstante o maior foco colocado na saúde do bebé e na antecipação e planificação dos tratamentos necessários (Stat­ham et al., 2000), os profissionais de saúde devem procurar que os pais não sintam o seu papel parental diminuído (e.g., se for necessário o internamento do bebé, as melhores condições devem ser proporcionadas para favorecer o envolvimento dos pais na prestação de cuidados), para além de ajudar os pais a encontrar um equilíbrio saudável entre as preocupações com a saúde do bebé os outros aspectos do quoti­diano que necessitam de ser geridos (Marshak et al., 1999). Este equilíbrio propor­cionará aos pais a restituição de uma percepção de controlo (ainda que sob aspectos secundários ao diagnóstico), que foi ameaçada pela notícia do diagnóstico (Aite et al., 2006). Não obstante o papel de relevo de todos os profissionais de saúde, os técni­cos de saúde mental são determinantes na restituição parental deste controlo secun­dário. Aliás, no que concerne aos procedimentos de actuação da UnIP, este é um domínio essencial de actuação, quer no que respeita a uma intervenção mais directa com os pais, quer no que respeita à sensibilização e articulação entre os diferentes profissionais para uma adequação do contexto envolvente.

Quando o diagnóstico é conhecido durante a gravidez, a existência de um acom­panhamento obstétrico numa consulta específica, com uma equipa especializada, re­velar­-se­-á benéfica, não só pelo maior domínio e conhecimento de aspectos médicos da gravidez e do desenvolvimento do bebé, como também por se tornar um contexto seguro para os pais, proporcionando-lhes um ambiente de compreensão e empatia para com as suas reacções e emoções. Adicionalmente, o diagnóstico durante a gra­videz acarreta, frequentemente, um maior grau de incerteza (Jones et al., 2005) acerca do prognóstico e dos tratamentos necessários para o bebé. Mesmo que para a equipa médica a situação clínica esteja bem identificada, os pais poderão necessitar de uma maior monitorização da situação clínica do bebé (Aite et al., 2006) e de mais escla­recimentos para conseguirem lidar adaptativamente com a situação.

Quando o diagnóstico ocorre no momento do nascimento, os pais vêem-se confrontados com a necessidade de dar resposta imediata às exigências da situação clínica do bebé (e.g., tomada de decisão sobre tratamentos), sem que tenham tido oportunidade de integrar e processar toda a informação sobre o diagnóstico. Neste contexto, deverão ser proporcionadas aos pais, ainda durante o internamento, todas as condições institucionais (de tempo e de contexto) para facilitar a integração da informação, o favorecimento da expressão emocional, os processos de tomada de decisão, bem como a gradual restituição do controlo pessoal sobre os aconteci­mentos. Adicionalmente, os profissionais de saúde deverão estar sensibilizados para o facto de os pais poderem necessitar de um tempo particular para iniciar o en­volvimento e a prestação de cuidados ao bebé (sobretudo, por exemplo, quando se trata de uma malformação visível, ou quando existem exigências particulares na forma como os cuidados são prestados). Mesmo não sendo objecto de uma revisão aprofundada neste trabalho, os estudos sugerem reacções parentais diferenciadas em função do tipo de anomalia ou das suas manifestações (Grob, 2008; Pelchat et al., 1999), levantando a possibilidade de estas especificidades serem consideradas na prestação de cuidados aos pais que recebem o diagnóstico pós-natal de anoma­lia congénita do bebé.

Finalmente, os aspectos salientados pela literatura empírica remetem para a per­tinência de intervenções psicossociais conduzidas por técnicos especializados, na promoção da adaptação parental ao diagnóstico do bebé. Desde há vários anos, a UnIP tem prestado acompanhamento psicológico estruturado, em regime de consulta externa e/ou internamento, às famílias que recebem um diagnóstico de anomalia con­génita do bebé, durante a gravidez ou após o nascimento. Actualmente, de acordo com os procedimentos da UnIP, estas situações são, por rotina, objecto de avaliação inicial pelos profissionais de saúde mental. Partindo da avaliação das manifestações emocionais e comportamentais dos pais face ao diagnóstico, e da identificação de possíveis factores de risco e/ou protecção para o desenvolvimento de situações de risco psico-emocional decidir-­se-­á, em conformidade com os pais, o grau de estrutu­ração do acompanhamento psicológico prestado.

No âmbito desta intervenção, são três os objectivos centrais: 1) favorecimento da expressão emocional, validação emocional e integração da notícia do diagnóstico; 2) desenvolvimento de estratégias de coping, processos de tomada de decisão e re­solução de problemas que ajudem os pais a lidar com aspectos associados ao diag­nóstico mas também com as restantes áreas de vida; e 3) proporcionar o confronto com expectativas pré-existentes, adequando-as e integrando-as em novos significa­dos acerca do diagnóstico e da relação com o bebé.

No que respeita ao primeiro objectivo, é no contexto de uma intervenção psi­cossocial que pode ser oferecida, aos pais, a oportunidade para expressar e partilhar sentimentos e percepções acerca do diagnóstico, aspectos importantes para favorecer a validação emocional e a integração do diagnóstico nas suas representações da criança e de si enquanto pais (Lalor et al., 2009). Os estudos aqui revistos antecipam que as percepções e significações parentais (e.g., percepção de controlo sobre os acontecimentos; diagnóstico como ameaça ao sentido de controlo e competência pa­rental) assumem um papel relevante nos sentimentos experienciados pelos pais, face ao diagnóstico; a psico-educação acerca da diversidade de reacções parentais e da re­lação entre cognições, emoções e comportamentos pode beneficiar os pais, restituindo-lhes alguma compreensão sobre o que estão a experienciar.

Outro dos objectivos centrais da intervenção neste contexto consiste no desen­volvimento de estratégias que facilitem o coping com as reacções emocionais e com a incerteza (Aite et al., 2006; Jones et al., 2005) associada ao prognóstico e trata­mentos do bebé (por exemplo, manutenção de um diário, estruturação de rotinas diá­rias, estratégias de gestão de ansiedade), bem como na facilitação de processos de tomada de decisão e de resolução de problemas, quer relativos ao diagnóstico do bebé, quer relativos a outros aspectos da vida familiar (e.g., económicos, profissio­nais, relacionados com outros familiares) (Marshak et al., 1999).

Adicionalmente, e no que diz respeito ao terceiro objectivo, uma intervenção psicossocial adequada poderá proporcionar o confronto com projectos e expectativas prévias e o seu reajuste, assim como com a possibilidade de construção de novos sig­nificados para o diagnóstico. Além disso, pode constituir uma oportunidade para gerir possíveis diferenças individuais de coping com o diagnóstico (Hoehn et al., 2004; Hunfeld et al., 1999), entre os membros do casal, bem como, como referimos ante­riormente, para permitir a identificação de situações de risco psico-emocional, que necessitem de uma intervenção mais específica e individualizada.

 

REFERÊNCIAS

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Este trabalho recebeu apoio da FCT (SFRH/BD/47053/2008)

 

Recebido em 9 de Julho de 2009/ Aceite em 9 Outubro de 2010