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Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher

versão impressa ISSN 0874-6885

Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher  no.42 Lisboa dez. 2019

https://doi.org/10.34619/femw-0q97 

ESTADO DA QUESTÃO

Associação Portuguesa de Apoio à Mulher com Cancro da Mama (APAMCM)

Mafalda Pinto Coelho*

* Médica e presidente da direcção da APAMCM.


 

 

 

A Associação Portuguesa de Apoio à Mulher com Cancro da Mama (APAMCM), uma IPSS com fins de saúde, sem fins lucrativos e de utilidade pública, dedica-se à promoção na saúde em oncologia, em especial na mulher com cancro da mama, desde 1999. Nos seus primeiros dez anos de trabalho, a Associação ofereceu uma panóplia de serviços inovadores que não existiam nos centros de saúde, nem em alguns hospitais não especializados. Com o passar dos anos, a saúde pública e privada evoluiu, e parte da oferta clínica da Associação deixou de ser um complemento ao SNS. Assim, em finais de 2018, foi decidido encerrar a clínica, nomeadamente toda a área médica existente, ficando apenas a funcionar o Centro Especializado em Fisioterapia Oncológica (CEFO), criado em 2006 com o objectivo primordial de prestar gratuitamente tratamentos especializados em fisioterapia oncológica/linfologia a utentes com doença oncológica mamária.

Este Centro foi galardoado em 2007 pelo Ministério da Saúde com um Prémio de Boas Práticas em Saúde nas categorias de Qualidade, Atendimento e Acessibilidade, em virtude de oferecer um serviço inovador e muito especializado.

Um diagnóstico de cancro de mama, o mais frequente na mulher, abala de um modo muito evidente a imagem da mulher, para além do medo das consequências físicas dessa evidência. Sabendo que ainda é causa de muitas mortes, a verdade é que o auto-exame e a mamografia são, cada vez mais, um passaporte para a sobrevivência, sendo conhecidas inúmeras histórias de sucesso, apesar da gravidade do diagnóstico.

Ao contrário de outras doenças oncológicas, em que há um ou mais “culpados”, aqui não se conhece uma causa específica. O que a investigação tem permitido é identificar factores de risco, a começar pela idade: sabe-se que a possibilidade de ter cancro da mama aumenta com a idade, sendo menor antes da menopausa e maior depois dos 60 anos; mas também se conhecem vidas bem mais jovens que foram perturbadas com este diagnóstico. Os antecedentes, pessoais ou familiares, também influenciam: o risco aumenta se a mulher já tiver tido cancro da mama ou se tiver na família alguém que já tenha sofrido com a doença, sobretudo a mãe, uma tia ou irmã, e especialmente em idades mais jovens (antes dos 40 anos). A genética é outro dos factores que pesam nesta balança: foram identificadas alterações em determinados genes que aumentam o risco, significando isto que pode ser benéfica a realização de testes genéticos em famílias onde muitas mulheres tiveram a doença; demonstrando a presença das alterações, poderá ser possível adoptar medidas redutoras do risco e melhorar a detecção precoce da doença. Mulheres com uma primeira gravidez depois dos 31 anos, uma história menstrual longa (primeira menstruação precoce e menopausa tardia) ou que não tiveram filhos parecem, igualmente, apresentar uma maior possibilidade de desenvolver a doença.

Estes são alguns dos factores de risco identificados. Muitos deles não podem ser evitados. E, embora correspondam a uma possibilidade acrescida, não constituem uma fatalidade, havendo muitas mulheres que se enquadram neste perfil, mas que não desenvolvem cancro da mama. Aliás, à excepção do envelhecimento, o diagnóstico apanha de surpresa muitas mulheres sem qualquer risco acrescido. Por isso, a detecção precoce do cancro da mama é fundamental, na medida em que aumenta as hipóteses de cura: favorece o prognóstico, a recuperação e a reabilitação, podendo constituir a diferença entre sobreviver ou não. Esta diferença é proporcionada pela vigilância médica anual, completada pelo auto-exame da mama e, a determinada altura, pela mamografia de rastreio.

O auto-exame é, como o nome indica, uma ferramenta ao alcance de todas as mulheres: trata-se da palpação, a realizar uma vez por mês, preferencialmente no fim do período menstrual. Com as suas próprias mãos e respeitando um conjunto de cuidados, pode aperceber-se de eventuais alterações ao tamanho ou aspecto das mamas.

Já a mamografia, exame radiológico a realizar em laboratório, é recomendada anualmente ou a cada dois anos para as mulheres a partir dos 40 anos, sendo que mulheres com um risco aumentado podem necessitar de outra periodicidade, a discutir com o médico. A mamografia é a melhor ferramenta para detectar o cancro numa fase precoce. Não é, no entanto, isenta de erro, tanto podendo acontecer os chamados falsos negativos (não serem detectados tumores já presentes) como os falsos positivos (ser detectada uma anomalia que não se confirma ser cancerígena). Também pode acontecer que o cancro, se for de crescimento rápido, já se tenha metastizado (espalhado) para outras partes do corpo, antes de a mamografia o detectar. Ainda assim, os benefícios são superiores e é vivamente recomendada a realização deste exame.

Fala-se em cancro da mama, mas, na realidade, há mais do que um tipo, consoante a natureza das células em que tiver origem. De uma forma simplificada, distingue-se entre o cancro invasivo, quando as células se estendem à região em volta do foco inicial ou quando alastram à distância, o cancro não invasivo ou in situ, quando as células malignas estão localizadas e limitadas, e ainda o carcinoma inflamatório da mama, um cancro muito agressivo, mas raro. Há ainda outros tipos raros, como os carcinomas medular, mucinoso e tubular, classificações oncológicas que não cabem no seio desta apresentação.

O que é fundamental é procurar apoio clínico o mais cedo possível. Se as suspeitas forem desencadeadas pelo auto-exame, o médico dar-lhes-á seguimento através da realização de uma mamografia. A partir daí serão pedidos exames diversos, nomeadamente uma citologia (aspiração de líquido ou tecido para análise) ou uma biopsia (colheita de uma amostra do nódulo). Se o tumor for confirmado como maligno, o objectivo dos exames seguintes será determinar a extensão e o estádio da doença, de modo a definir o tratamento. E, dependendo das necessidades de cada doente, são várias as hipóteses, de recurso individual ou combinado.

Um dos tratamentos possíveis é a radioterapia: trata-se da aplicação localizada de radiações para destruir as células tumorais. As radiações incidem apenas sobre a área do tumor e são cada vez mais precisas.

Outra alternativa é a quimioterapia, que consiste na administração de medicamentos, sob a forma de injecções ou comprimidos, destinados a destruir as células afectadas e a impedir o aparecimento de novas células cancerígenas. As substâncias utilizadas circulam por todo o organismo, induzindo alguns efeitos secundários: a queda do cabelo é um dos mais frequentes e o mais emblemático, mas é comum uma sensação de mal-estar geral, com enjoo, falta de energia, secura da boca, diarreia ou prisão de ventre.

A hormonoterapia faz também parte do arsenal médico: o objectivo é impedir que as células malignas continuem a receber a hormona que estimula o seu crescimento, mediante a administração de medicamentos que modificam a forma de actuar das hormonas ou com recurso a cirurgia para remoção dos ovários, os órgãos responsáveis pela produção dessas hormonas.

A cirurgia é uma opção terapêutica frequente, dependendo o método usado da fase evolutiva do tumor e da sua localização. Assim, quando é apenas necessário remover o tumor, é realizada uma tumorectomia: aplicada em tumores mínimos, pode envolver a extracção dos gânglios linfáticos das axilas como medida preventiva, após o que se aplica a radioterapia. Já a quadrantectomia também envolve a remoção do tumor, acrescida de uma parte do tecido normal que o envolve e do tecido que recobre o peito abaixo do tumor, mas conservando a mama. A radioterapia é usada como complemento.

Mais radical é a mastectomia, que consiste na remoção da mama. Pode ser simples, ou total, se é removida a mama e, eventualmente, os gânglios linfáticos próximos. Esta é uma opção para tumores difusos, sendo possível manter a pele da mama de modo a facilitar a reconstrução plástica. Pode também ser radical modificada, se for retirada a mama, bem como os gânglios linfáticos das axilas e o tecido que reveste os músculos peitorais. Ou pode ser radical, se, além da mama, forem extraídos todos os músculos do peito, todos os gânglios linfáticos da axila, a par de alguma gordura em excesso e pele. Esta é, no entanto, uma opção utilizada raramente.

E depois do cancro?

Perante uma mastectomia, três caminhos se abrem: fazer a reconstrução da mama, usar uma prótese ou, ainda, não fazer nada. Qualquer uma das opções tem vantagens e desvantagens e só a mulher pode decidir.

Se for sentida a necessidade de manter o aspecto exterior habitual, o uso de prótese pode revelar-se uma boa opção. Mais tarde, logo que a sutura esteja cicatrizada, deve ser usada uma prótese de silicone, idêntica, na forma e no peso, à outra mama para evitar posturas incorrectas. A opção pode, no entanto, recair sobre a reconstrução mamária, durante ou após a mastectomia. Existem vários procedimentos, adequados a cada mulher e em função da idade, do tipo de corpo e da cirurgia efectuada: dos implantes, salinos ou de silicone, ao uso de tecido retirado de outra parte do corpo (barriga, costas, nádegas, por exemplo).

O que é importante é que a mulher se sinta bem consigo mesma. É certo que o diagnóstico de cancro da mama cai como uma bomba, mas o desfecho não é necessariamente uma vida estilhaçada: entre a detecção precoce e a vigilância posterior, o final feliz está ao alcance das mulheres. De cada vez mais mulheres.

O reconhecimento do valor do apoio psicológico é necessário e deve ser plenamente comunicado, para que todos os pacientes oncológicos, assim que possível, sejam acompanhados por um método e uma prática clínicos, que serão ajustados a necessidades particulares e contribuirão para o melhoramento do estado emocional e psíquico. A definição e a preparação estratégica da intervenção psicológica devem ser pensadas o mais cedo possível, para que o impacto da doença seja diminuído. Assim, poder-se-ão considerar, desde o início, a reorganização de expectativas e o reconhecimento dos limites da doença. Com o início do apoio psicológico, a adaptação às (in) capacidades e o planeamento do tratamento serão fundamentados nas reais necessidades do paciente, promovendo a aceitação, a auto-estima, a confiança e novos significados para a vivência patológica.

Intervenções no estilo de vida, incluindo a dieta e a actividade física, têm mostrado resultados muito positivos nos sobreviventes de cancro com melhoria da qualidade de vida, menos fadiga, melhor imagem corporal, menos complicações e maior sobrevivência.

Em suma, ressalva-se a importância da promoção da saúde e prevenção da doença que caracteriza o objectivo estatutário desta instituição. A vigilância e o rastreio são o ponto-chave para o diagnóstico precoce e cura eficaz. Decorrentes dos tratamentos ao cancro da mama, cirurgia e terapias adjuvantes, podem aparecer limitações como dor, diminuição da amplitude do movimento, alterações posturais, diminuição da força e resistência,

alterações da sensibilidade, alterações emocionais, linfedema, trombose linfática, aderências e retracções cicatriciais, situações passíveis de serem tratadas através de fisioterapia e de técnicas dominadas por fisioterapeutas, a avaliar em cada situação específica.

A fisioterapia no CEFO pretende restaurar a capacidade funcional do doente, de acordo com a sua aptidão. São igualmente objectivos do CEFO: diminuir a lista de espera pública de doentes em reabilitação pós-cirúrgica ao cancro da mama; oferecer um tratamento especializado e prestado com qualidade e tempo; criar qualidade de vida; realizar a prevenção do linfedema e outras complicações pós-cirúrgicas; viabilizar de forma célere a reintegração social e profissional do utente na Comunidade.

No contexto do cancro da mama, esta especialidade é de extrema importância, uma vez que abrange a reabilitação no pós-operatório da cirurgia da mama e reconstrução mamária, a reabilitação no contexto de complicações dos tratamentos para este tipo de cancro (por exemplo, radioterapia) e a prevenção e tratamento do linfedema.

Cuidamos de si e dos que ama!

Agende o seu tratamento gratuito de fisioterapia através do número 217 585 648. Traga consigo a prescrição médica (cirurgião, fisiatra, ortopedista e/ou clínico geral).

A sede situa-se na Avenida Almirante Reis, 75-2.º Dto., Lisboa (Metro: Anjos).