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Ex aequo

versão impressa ISSN 0874-5560

Ex aequo  no.28 Vila Franca de Xira  2013

 

Neves, Sofia (coordenadora) (2011) Género e Ciências Sociais, Maia, Edições ISMAI, 234 páginas.

 

Lígia Amâncio

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa, Portugal

 

Este livro é mais um importante contributo para a história da difícil relação das ciências sociais com o conceito de género, reflexo da relação ainda mais difícil das ciências sociais com o pensamento crítico feminista e a subversão da ordem de género dominante e heterossexual. Resultado do Seminário Interdisciplinar Género e Ciências Sociais, organizado no ISMAI, pela coordenadora, em 2009, esta publicação inscreve-se no lento progresso do debate em torno de uma área de reflexão e estudo que tem permanecido nas margens das ciências sociais, mas não tem parado de crescer e se afirmar, nos últimos anos. Merece destaque a importância da colaboração entre Portugal e o Brasil, neste domínio, também presente nesta publicação através da participação de investigadoras brasileiras.

Organizado em duas partes, a I Parte, intitulada Aproximações teóricas e epistemológicas ao Género, reúne contributos para a compreensão das resistências ao género e ao feminismo (Capítulos 1 e 2) e para os desenvolvimentos que o género, enquanto projeto político, proporcionou e permitiu reconhecer (Capítulos 3, 4, e 5), no plano epistemológico, mas também no plano metodológico e político. Intimamente associado a uma rutura epistemológica nas ciências sociais não deixa de surpreender a força com que as diversas disciplinas têm resistido a este seu novo habitante e às novas dinâmicas reflexivas que ele traz.

Na II Parte, intitulada Entre o fazer e o ser feito/a pelo Género, apresentam-se vários estudos, bem ilustrativos, na sua diversidade e envolvimento social e político, do potencial analítico e crítico, aberto pelo conceito de género, quando se abandona o sentido neutro e binário com que o conceito se vulgarizou mesmo nas ciências sociais, como se diz na I Parte: a reprodução do duplo-padrão nos modelos de relacionamento de adolescentes (Capítulo 6), a relação do direito com o universo LGBT (Capítulo 7), homens e masculinidades (Capítulo 8), condições de vulnerabilidade ao HIV/SIDA (Capítulo 9), preconceitos em relação à homossexualidade (Capítulo 10), a presença feminina na delinquência juvenil (Capítulo 11) e o lugar das mulheres na migração (Capítulo 12).

Pondo em perspetiva o contexto português, este livro mostra que esta área de estudos evoluiu, como nos outros países, começando por contaminar o conceito de género com a visão binária do sexos, e confundir o seu projeto político com as mulheres, para depois se alargar à contestação de uma ordem social baseada na norma da heterossexualidade, ao mesmo tempo que se desenvolvia a reflexão crítica sobre as potencialidades do conceito no seu cruzamento com outras pertenças sociais que contribuem para a diversidade e a complexidade dos contextos sociais onde a ordem dominante se constrói e reproduz. As especificidades do contexto português prendem-se sem dúvida com o início tardio deste caminho e com uma notável recuperação do atraso inicial. Do ponto de vista das ciências sociais, por outro lado, encontramos os efeitos da chegada de um novo conceito para um velho problema, durante tanto tempo excluído das interrogações da ciência dominante, ou colocado numa posição subalterna dentro da hierarquia das desigualdades sociais quando já não era possível excluí-lo. Daí a permanente exigência de definição, explicação, reflexão a que os estudos desta área estão sujeitos, apesar dos modos de ser mulher (ou homem) já serem definidos como um processo de construção, há 50 anos atrás, por Simone de Beauvoir. E, no entanto, ainda é preciso lembrá-lo.

Ainda bem que este livro nos lembra, mais uma vez, este esforço permanente de reflexão que só é possível numa perspetiva crítica e politicamente envolvida e nos traz os contributos de muitos/as investigadores/as cujo trabalho tem marcado esse caminho na sociedade portuguesa.

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