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Revista de Enfermagem Referência

Print version ISSN 0874-0283On-line version ISSN 2182-2883

Rev. Enf. Ref. vol.serV no.1 Coimbra Jan. 2020

https://doi.org/10.12707/RIV19099 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

RESEARCH PAPER (ORIGINAL)

 

Higiene oral: atuação da equipa de enfermagem em ambiente hospitalar

Oral hygiene: performance of the nursing team in a hospital environment

Higiene oral: la actuación del equipo de enfermería en el entorno hospitalario

 

Adilson Carlos da Silva Junior1
https://orcid.org/0000-0003-4631-9386

Itamar Paulo Xavier1
https://orcid.org/0000-0003-2894-6546

Laura Menezes Silveira2
https://orcid.org/0000-0002-2397-2553

Angelita Maria Stabile2
https://orcid.org/0000-0002-3371-7038

Evelin Capellari Cárnio2
https://orcid.org/0000-0002-8735-4252

Josiane Lima de Gusmão1
https://orcid.org/0000-0002-3132-1291

André Luiz Thomaz de Souza*1
https://orcid.org/0000-0001-5158-9247

 

1 Centro Universitário do Vale do Ribeira, São Paulo, Brasil

2 Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, Brasil

 

RESUMO

Enquadramento: A higiene oral é um cuidado essencial na assistência de enfermagem. A sua realização auxilia na prevenção de doenças bucais e sistémicas.

Objetivo: Identificar a atuação da equipa de enfermagem na higiene oral em ambiente hospitalar.

Metodologia: Estudo exploratório, descritivo, transversal, de abordagem quantitativa realizado com profissionais de enfermagem, que atuam na área hospitalar. Foi aplicado um questionário contendo informações sociodemográficas, do trabalho e da atuação dos participantes na higiene oral.

Resultados: Cento e quatorze profissionais de enfermagem participaram do estudo, dentre estes, 75,4% relataram que não realizaram a higiene oral no último turno e 44,7% da equipa sugeriu que o doente o fizesse. A sobrecarga de trabalho e a alta rotatividade de doentes foram citadas como impedimentos para realização deste cuidado.

Conclusão: A equipa de enfermagem percebe a higiene oral como um cuidado essencial ao doente, contudo a atuação na prática da higiene oral tem sido negligenciada. Neste contexto, este estudo aponta para a necessidade de fornecer atividades de educação permanente sobre esse cuidado em ambiente hospitalar.

Palavras-chave: higiene bucal; enfermagem; cuidados de enfermagem; prevenção de doenças

 

ABSTRACT

Background: Oral hygiene is essential in nursing care. It helps in the prevention of oral and systemic diseases.

Objective: To identify the performance of the nursing team in oral hygiene in a hospital environment.

Methodology: Exploratory, descriptive, cross-sectional study with a quantitative approach carried out with nursing professionals who work in the hospital environment. A questionnaire was applied to participants about their sociodemographic and professional characteristics and the performance of oral hygiene.

Results: A total of 114 nursing professionals participated in this study. Of these, 75.4% of participants reported that they had not performed oral hygiene in the last shift, and 44.7% of the team members suggested that the patient should do so. Work overload and high patient turnover were mentioned as constraints to the performance of oral care.

Conclusion: The nursing staff perceives oral hygiene as a part of essential patient care; however, oral hygiene practice has been neglected. This study points to the need to provide continuing education activities on this type of care in the hospital environment.

Keywords: oral hygiene; nursing; nursing care; disease prevention

 

RESUMEN

Marco contextual: La higiene oral es un cuidado esencial en la atención de enfermería. Su realización ayuda a la prevención de enfermedades orales y sistémicas.

Objetivo: Identificar la actuación del equipo de enfermería en la higiene bucal en un ambiente hospitalario.

Metodología: Estudio exploratorio, descriptivo, transversal y de enfoque cuantitativo realizado con profesionales de enfermería que trabajan en el área hospitalaria. Se aplicó un cuestionario que contenía información sociodemográfica sobre el trabajo y la actuación de los participantes en la higiene bucal.

Resultados: Ciento catorce profesionales de enfermería participaron en el estudio, de ellos el 75,4% informó de que no realizaron la higiene bucal en el último turno y el 44,7% del equipo sugirió que el paciente lo hiciera. La sobrecarga de trabajo y la alta rotación de pacientes se citaron como impedimentos para realizar esta atención.

Conclusión: El equipo de enfermería considera la higiene bucal como un cuidado esencial para el paciente, sin embargo, esta práctica de la higiene bucal se ha descuidado. En este contexto, el presente estudio señala la necesidad de realizar actividades de educación permanente en torno a este tipo de cuidado en un entorno hospitalario.

Palabras clave: higiene bucal; enfermería; atención de enfermería; prevención de enfermedades

 

Introdução

A higiene oral é um cuidado necessário para a manutenção da saúde bucal. A sua realização de modo insatisfatório pode facilitar a acumulação de placas e a formação de biofilme com microrganismos patogénicos, o que por sua vez, aumentam a probabilidade de desenvolver halitose e infeções respiratórias como a pneumonia hospitalar, gengivite e periodontite. Além disso, pode estar associada a doenças sistémicas como o acidente vascular encefálico isquémico, a endocardite, a aterosclerose carotídea e as alterações glicémicas (Scannapieco & Shay, 2014).

Os cuidados com a boca contribuem não apenas para a saúde bucal como também para a manutenção da saúde geral do doente. Em ambientes hospitalares, este cuidado pode ser realizado pelo próprio indivíduo, por um cuidador, no caso de incapacidade, ou pela equipa que o assiste. Entre os profissionais que assistem o doente hospitalizado, a equipa de enfermagem exerce um importante papel no cuidado bucal, quer seja no incentivo ao autocuidado, nas orientações de como realizá-lo (Assis, Sousa, Turrini, Poveda, & Silva, 2018), ou na execução deste cuidado por métodos químicos e mecânicos para propiciar conforto ao doente e evitar complicações (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2017).

Dada a importância da saúde bucal, é fundamental que este cuidado seja reconhecido pela equipa de enfermagem como parte do processo de cuidar e como prática preventiva que minimiza agravamento da saúde do doente hospitalizado (Buley, 2018). Para tanto, além das habilidades técnicas para realizar a higiene oral, é necessário que a equipa de enfermagem conheça a fisiologia e a anatomia bucal, a fim de reconhecer anormalidades e estabelecer medidas seguras e eficazes.

Estudos sobre o cuidado oral e a enfermagem têm sido realizados com maior ênfase em unidades de terapia intensiva (UTI), principalmente com foco na prevenção da pneumonia associada à ventilação mecânica (PAVM; Rumagihwa & Bhengu, 2019). Todavia, considera-se essencial conhecer como tem sido a atuação da equipa de enfermagem e as perceções destes profissionais sobre esta prática em diferentes cenários assistenciais. Assim, o objetivo deste estudo foi identificar a atuação da equipa de enfermagem na higiene oral em ambiente hospitalar.

 

Enquadramento

Os doentes hospitalizados requerem assistência de enfermagem conforme as necessidades básicas identificadas e o grau de déficit no autocuidado. Aqueles que se encontram em quadro crítico necessitam de cuidado especializado e contínuo, o que os tornam dependentes de uma equipa multidisciplinar no processo de reabilitação. Em alguns casos, os doentes podem necessitar até mesmo de auxílio na realização de tarefas simples do quotidiano, como por exemplo, a higiene oral (Miranda, Paula, Castro Piau, Costa, & Bezerra, 2016).

Embora seja um cuidado que faz parte da rotina de enfermagem, as publicações sobre o tema com autoria de enfermeiros investigadores brasileiros são incipientes, sendo as evidências na sua maioria produzidas por investigadores internacionais (Nogueira & Jesus, 2017). Somado a isso, não existe até ao momento, nenhum levantamento nacional sobre os cuidados e as condições de saúde da cavidade bucal nos hospitais brasileiros, o que reforça a necessidade em conhecer as diferentes realidades do país.

Dentre as barreiras para a insuficiência deste cuidado descritas na literatura destacam-se a ausência de educação, de capacitação da equipa, de protocolos de cuidados, de materiais, carência de tempo e funcionários, incapacidade física do doente (Gibney, Wright, Sharma, & Naganathan, 2015) e baixa prioridade em relação a outros cuidados de enfermagem (Nogueira & Jesus, 2017). Além disso, muitos profissionais de enfermagem consideram a higiene oral apenas como medida de higiene e conforto e desconhecem o seu efeito na prevenção da pneumonia e/ou outras doenças sistémicas (Rumagihwa & Bhengu, 2019).

A cultura do cuidado com a saúde bucal nos hospitais brasileiros ainda é reduzida e pouca credibilidade é dada a higiene oral no planeamento assistencial. Geralmente os profissionais inseridos na assistência ignoram a relação existente entre a higiene oral e a prevenção de doenças (Miranda et al., 2016). Neste contexto, o enfermeiro possui um papel decisivo na anamnese e no exame físico, pois é neste momento que são identificadas as necessidades básicas do doente. É importante destacar que na saúde bucal a discussão clínica com o cirurgião dentista pode permitir ao enfermeiro uma tomada de decisão mais eficiente, o que por sua vez favorece a padronização dos cuidados de enfermagem, principalmente nas situações que envolvem riscos de complicações, como por exemplo, risco de hemorragia nos doentes com trombocitopenia (Buley, 2018).

 

Questão de Investigação

Qual a atuação da equipa de enfermagem na higiene oral em ambiente hospitalar?

 

Metodologia

Estudo exploratório, descritivo, transversal, de abordagem quantitativa, realizado entre os meses de maio e agosto de 2018, num hospital público de médio porte localizado no Estado de São Paulo, Brasil. O estudo foi aprovado por uma Comissão de Ética em Pesquisa com Seres Humanos sob o parecer n° 2.950.933.

A amostra deste estudo foi intencional e não probabilística, composta por profissionais da equipa de enfermagem (enfermeiro, técnico e auxiliar de enfermagem). Como critérios de inclusão ficaram estabelecidos: ser da equipa de enfermagem, de ambos os sexos, estar envolvido na assistência ou gerência dos serviços de enfermagem. Foram excluídos os participantes que durante a colheita de dados não preencheram e/ou não devolveram o questionário de pesquisa aos investigadores. Não foram incluídos no estudo os profissionais que estavam de férias, licença médica ou licença de maternidade, assim como aqueles, que não foram encontrados após duas tentativas para colheita de dados.

Para a recolha dos dados foi elaborado um questionário a partir de fundamentações teóricas disponíveis na literatura (Associação de Medicina Intensiva Brasileira, 2014; Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2017). O questionário continha 32 questões objetivas relacionadas com as informações sociodemográficas (sexo, estado civil, idade); do trabalho (setor e turno em que atua, tempo de formação, tempo de experiência profissional, se possuía outro vínculo de trabalho) e sobre a atuação da equipa de enfermagem na higiene oral.

Os formulários de pesquisa foram submetidos ao processo de refinamento com o objetivo de verificar se os seus itens representavam o universo do conteúdo, se permitiam alcançar os objetivos propostos e se apresentavam clareza e objetividade. Este refinamento foi realizado por três enfermeiros especialistas na temática. Na sequência foi realizado um teste piloto com profissionais que não fizeram parte da amostra final do estudo.

O tempo estimado para preenchimento do questionário foi de aproximadamente 10 minutos para cada participante e a sua aplicação ocorreu conforme os turnos de trabalho da equipa de enfermagem, assim como a disponibilidade de cada participante. Após o preenchimento, os questionários foram recolhidos, sendo preservado o anonimato dos participantes.

Os dados foram analisados de forma descritiva com auxílio do software IBM SPSS Statistics, versão 20.0. Os resultados são apresentados através de frequência absoluta e relativa, média e desvio padrão (DP).

 

Resultados

A amostra final deste estudo envolveu 114 participantes distribuídos em – enfermeiros (21,0%), técnicos de enfermagem (24,6%) e auxiliares de enfermagem (54,4%). Dentre os profissionais não incluídos (n = 55), 3,63% recusaram-se a participar e 96,37% não atenderam aos critérios de inclusão.

Entre os participantes do estudo, o sexo feminino foi predominante (68,4%), a média de idade foi de 35,7 (DP = 10,98) anos, sendo a idade mínima de 19 anos e máxima de 70 anos. A maioria era casada (46,5%), trabalhava no período diurno (68,4%), estava formada como profissional de enfermagem há aproximadamente 8,7 (DP = 6,96) anos, e atuava na enfermagem há aproximadamente 7,9 (DP = 7,47) anos.

Ao serem questionados sobre a participação em educação continuada sobre higiene oral, mais da metade responderam que nunca haviam participado (58,8%). O setor de trabalho predominante da equipa de enfermagem foi o centro cirúrgico (15,8%), seguido pelo centro obstétrico (14,9%), conforme dados apresentados na Tabela 1.

Ao indagar os 24 enfermeiros sobre o número de prescrição de higiene oral no último turno, 54,2% relataram que não prescreveram a higiene oral naquele momento, enquanto que 45,8% relataram a prescrição de no mínimo uma higiene durante o turno de trabalho. Quando questionada a equipa de enfermagem sobre o número de vezes que realizaram higiene oral no último turno, 75,4% relataram não ter realizado higiene oral nos doentes hospitalizados. Menos de metade da equipa de enfermagem sugeriu que os doentes realizassem higiene oral no último turno (44,7%). A equipa de enfermagem também foi questionada sobre os impedimentos para que a realização da higiene oral não fosse efetuada, os resultados podem ser visualizados na Tabela 2.

Ao investigar a avaliação da equipa de enfermagem sobre a higiene oral, mais da metade dos participantes responderam nunca ter participado de educação continuada sobre o tema. Um terço afirmou não acreditar / não saber se a higiene oral previne pneumonia. Contudo, 96,5% acreditam que ela possa prevenir infeção na cavidade bucal; 85,1% informaram não acreditar / não saber se o tema higiene oral já havia sido abordado em atividade de educação continuada promovida pela instituição onde trabalha; 45,6% afirmaram que o tema higiene oral não foi abordado de forma eficaz durante a formação profissional. Além disso, mais da metade da equipa de enfermagem relatou não buscar atualização sobre o tema higiene oral. Os resultados sobre a atuação e avaliação da equipa de enfermagem na higiene oral estão apresentados na Tabela 3.

 

Discussão

Este estudo evidencia que a higiene oral é uma prática valorizada pela equipa de enfermagem. A maioria dos profissionais acredita que a higiene oral previne a pneumonia e infeções orais, e reconhece este cuidado como parte do processo de enfermagem. Mais de 90% dos profissionais afirmaram que todos os doentes hospitalizados necessitam de higiene oral e 70% relataram não haver impedimentos para sua realização.

Contudo, observou-se que este cuidado tem sido negligenciado na atuação destes profissionais, pois mais da metade dos enfermeiros relataram não ter prescrito a higiene oral no seu último turno, 75,4% da equipa de enfermagem informou que não realizou o procedimento e, apenas 44,7% sugeriu que o doente o fizesse. Entre as razões para a não realização da higiene oral e/ou dificuldades na sua implementação foram citadas a alta rotatividade e curta permanência do doente em setores como o centro cirúrgico e obstétrico, o número reduzido de funcionários, a sobrecarga de trabalho, a ausência de recursos materiais e a falta de aceitação do doente.

Estes dados revelam a necessidade na implementação de ações que favoreçam a atuação da equipa de enfermagem na realização da higiene oral do doente hospitalizado. Além disso, contribui no conhecimento sobre o cuidado com a saúde oral em hospitais brasileiros. Destaca-se, que outros estudos também apontam dificuldades similares na realização da higiene oral pela equipa de enfermagem (Blum et al., 2017; Gibney et al., 2015; Jordan et al., 2014).

Os cuidados oferecidos pela equipa de enfermagem, em especial, o cuidado com a cavidade bucal, requerem a superação de barreiras do sistema, do doente e do conhecimento (Booker, Murff, Kitko, & Jablonski, 2013). As barreiras do sistema estão relacionadas com a cultura tradicionalista do cuidado centrado no médico. A integração da assistência deste profissional, a do profissional dentista e da equipa de enfermagem pode ser positiva para a saúde bucal e geral do doente hospitalizado (Booker et al., 2013).

Dentre as barreiras relativas ao doente que podem dificultar a higiene da cavidade bucal, destaca-se principalmente o relato do uso de ventilação mecânica invasiva. Nesta situação a equipa de enfermagem deve ter maior atenção na realização da higiene oral devido à presença do tubo orotraqueal. Embora o tubo orotraqueal seja essencial para a manutenção da ventilação adequada em doentes críticos, ele pode restringir o acesso à cavidade bucal, causando insegurança no profissional quanto ao risco de deslocamento do tubo, desconforto e ferimentos ao doente, dificultando a higiene adequada (Booker et al., 2013).

Neste contexto, é fundamental orientar e treinar a equipa para a prática adequada da higiene oral no doente em uso de ventilação mecânica invasiva, sobretudo para aqueles com intubação orotraqueal. Nestes doentes, a limpeza natural da boca através da mastigação está reduzida, assim como a movimentação da língua e bochechas durante a fala. Ainda, a redução no fluxo salivar e o uso de antibióticos ou corticoides facilitam o desequilíbrio da homeostase bucal e propiciam a formação do biofilme (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2017).

Nestas condições, os diversos patógenos que colonizam a cavidade bucal podem ser transportados para o trato respiratório pela orofaringe através da aspiração do conteúdo da cavidade bucal, culminando com o desenvolvimento da PAVM e agravando o estado de saúde do doente, o que por sua vez, contribui para o aumento dos índices de mortalidade (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2017). É recomendado que todos os que integram a equipa de saúde que assiste o doente hospitalizado sejam estimulados e treinados para realização diária da higiene oral (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2017). Ressalta-se que os doentes capazes de realizar a higiene oral devem ser supervisionados e orientados pela equipa de enfermagem para a prática correta de escovar as gengivas, dentes, língua, bochecha, palato e assoalho da boca, podendo ser utilizado escova macia, creme dental, enxaguatório bucal e fio dental (Stina, Zamarioli, & Carvalho, 2015).

A barreira do conhecimento requer a educação permanente e continuada como elementos centrais na formação de profissionais qualificados para o exercício da enfermagem. Dentre os participantes deste estudo, apenas 35,1% procuram atualização sobre as condutas para realização da higiene oral e somente 18,4% disseram ter lido o POP institucional sobre a higiene oral. O enfermeiro enquanto líder deve assumir a responsabilidade em procurar formas de capacitar sua equipa continuamente nas instituições de saúde (Orlandini & Lazzari, 2012). Além disso, é importante a valorização dos registos deste cuidado no prontuário, pois respalda a equipa de que o cuidado foi realizado e evidencia a evolução de possíveis anormalidades encontradas durante o procedimento que podem direcionar quanto ao melhor plano terapêutico para o doente.

Em relação aos impedimentos para realização da higiene oral apontados no presente estudo, a alta rotatividade e curta permanência do doente em setores como o centro cirúrgico e obstétrico foram razões citadas. De facto, a dinâmica de trabalho da equipa de enfermagem que atua no centro cirúrgico pode ter maior enfoque nos protocolos cirúrgicos do perioperatório atendendo a necessidades básicas, psíquicas e físicas manifestadas durante este período.

Contudo, a equipa de enfermagem pode orientar o doente no período pré-operatório quanto ao cuidado com a saúde bucal após a cirurgia, levando em consideração que algumas cirurgias podem limitar temporariamente a prática do autocuidado (Assis et al., 2018). Ainda, a equipa de enfermagem pode certificar com o doente se a higiene oral foi realizada, visto que estudos têm mostrado que a higiene oral quando realizada no período pré-operatório pode minimizar o risco de inflamações e complicações no pós-operatório, principalmente para os doentes que serão submetidos à intubação orotraqueal, aqueles com patologia oral prévia (Shigeishi et al., 2016) e aqueles que serão submetidos a cirurgias cardíacas (Amaral et al., 2016).

Um estudo que verificou os efeitos de escovar os dentes e de usar gluconato de clorexidina 0,12% em doentes submetidos à cirurgia cardíaca, mostrou que os doentes que realizaram a higiene oral sob supervisão de um profissional apresentaram menor incidência de PAVM no pós-operatório e menor tempo de permanência hospitalar (Nicolosi, Del Carmen, Martinez, Gonzalez, & Cruz, 2014). Desta maneira, fica evidente que o planeamento da assistência a doentes cirúrgicos deve incluir a avaliação das condições de saúde bucal antes da cirurgia a fim de garantir uma boa manutenção da saúde geral no pós-operatório.

A higiene deficitária e a presença de inflamações como a periodontite (inflamação das gengivas, tecido ósseo e ligamentos periodontais) permite que os microrganismos presentes na cavidade bucal causem bacteremia, facilitando a adesão dos agentes infecciosos em superfícies cardíacas previamente comprometidas que podem ser fatais ao doente submetido à cirurgia cardíaca (Amaral et al., 2016). Ademais, independentemente do tipo de tratamento instituído ao doente hospitalizado, a periodontite tem sido fortemente associada ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares (Kholy, Genco, & Van Dyke, 2015), o que vai ao encontro da necessidade de salientar a importância da higiene oral na prevenção de outras consequências para a saúde, principalmente no doente hospitalizado.

Outras razões citadas neste estudo, para não realizar a higiene da bucal foram o número reduzido de funcionários, a sobrecarga de trabalho e a ausência de suprimentos materiais, sendo estes achados similares aos de um estudo realizado na Croácia (Jordan et al., 2014). Por outro lado, um estudo multicêntrico realizado no Brasil, mostrou que 19% dos enfermeiros consideram o tempo insuficiente para realização do procedimento (Blum et al., 2017). O mesmo estudo indica que a equipa de saúde tem dificuldades para prestar cuidados de higiene oral devido à ausência de capacitação e de protocolos adequados, sugerindo que tais problemas poderiam ser minimizados com a introdução do odontólogo nos hospitais (Blum et al., 2017).

Portanto, a presença de um cirurgião dentista nos hospitais poderia permitir a assistência deste profissional de forma integrada a equipa multidisciplinar, melhorando o cuidado oferecido ao doente hospitalizado tanto na promoção da saúde bucal quanto no tratamento de doenças bucais que podem não ter sido identificadas ou tratadas antes do internamento. Ainda, possibilitaria a capacitação de recursos humanos para a prática da higiene oral segura e eficaz, levando em consideração a condição clínica do doente e das suas necessidades (Marin, Lanau, & Bottan, 2016).

Entre os participantes deste estudo, somente metade considera que durante a formação profissional a abordagem do tema saúde bucal foi eficaz. Desta maneira, a atuação do cirurgião dentista na equipa multidisciplinar, poderia ajudar a suprir o déficit de informações sobre saúde bucal que parece haver na formação da equipa de enfermagem, superando a barreira do conhecimento na realização do cuidado oral (Booker et al., 2013). Além disso, o trabalho em conjunto com estes profissionais pode fomentar protocolos nas instituições e capacitar recursos humanos, especialmente a equipa de enfermagem que fornece cuidados diretos ao doente. Este trabalho pode resultar em melhorias nas condutas para a realização da higiene oral como a técnica de escovar os dentes, o uso de elixir bucal e de fio dental, a identificação de placas dentárias, o uso de vernizes fluoretados e indicadores de doença dentária como a gengiva hemorrágica (Booker et al., 2013).

A maioria dos participantes deste estudo considerou que a higiene oral é uma atribuição da equipa de enfermagem e acredita que todos os doentes hospitalizados necessitam deste cuidado. Neste sentido, a higiene oral não é apenas um procedimento, ela faz parte do processo de enfermagem no qual o enfermeiro ao realizar a prescrição de enfermagem deve incluir detalhadamente as práticas a serem realizadas, considerando o estado clínico do doente e as características como o risco de hemorragia, a presença de lesões na cavidade bucal, capacidade de abertura da boca, nível de sedação/consciência, presença ou não de dentes, próteses dentárias, de cânulas e sondas. Destaca-se que a higiene oral tem baixo custo e configura-se como um indicador da qualidade assistencial no ambiente hospitalar (Saldanha, Costa, Pinto, & Gaetti Jardim, 2015).

Apesar do presente estudo evidenciar dados sobre a atuação da equipa de enfermagem na higiene oral, algumas limitações devem ser consideradas na interpretação dos dados. Os resultados envolvem a atuação e avaliação da equipa de enfermagem de apenas uma instituição de saúde, localizada numa região específica, o que pode não refletir a realidade brasileira. Além disso, não foram realizadas análises estatísticas inferenciais, o que impede a associação de causalidade entre as variáveis investigadas.

Como pontos fortes do estudo destaca-se a identificação de fatores que podem afetar a assistência de enfermagem direcionada a saúde bucal do doente hospitalizado, principalmente fatores relacionados com o número reduzido de funcionários, sobrecarga de trabalho e escassez de recursos materiais. Uma implicação deste estudo é, também, a necessidade de ampliar discussões sobre o tema por meio de pesquisas em diferentes localidades do país e fortalecer o processo de formação e atuação dos profissionais nos cuidados com a saúde bucal.

Cabe destacar, que diante dos problemas identificados, até ao término da pesquisa foi oferecido à equipa de enfermagem do local do estudo uma capacitação sobre higiene oral, o que contou com a participação de todos os enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem nos diferentes turnos de trabalho.

 

Conclusão

Este estudo mostrou que a equipa de enfermagem percebe a higiene oral como um cuidado essencial aos doentes hospitalizados e identifica-a como uma atribuição da enfermagem. Contudo, a não realização e/ou prescrição deste procedimento foi comum na população investigada, sendo apontado como impedimentos para a realização da higiene oral a sobrecarga de trabalho e a alta rotatividade dos doentes. Adicionalmente, os resultados também apontam para a necessidade de fornecer atividades de educação permanente sobre o tema cuidados com a saúde bucal.

Sabendo dos fatores que impedem a realização da higiene oral no doente hospitalizado, sugerimos que estudos clínicos sejam realizados a fim de testar o efeito de intervenções educativas no conhecimento e atuação da equipa de enfermagem na higiene oral, especificamente com foco na prevenção de doenças locais e sistémicas, como por exemplo, a PAVM.

 

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Contribuição de autores

Conceptualização: Junior, A. C .S., Xavier, I. P., Silveira, M. L., Stabile, A. M., Cárnio, E. C., Gusmão, J. L., & Souza, A. L. T.

Tratamento de dados: Silveira, M. L., Stabile, A. M., Gusmão, J. L., & Souza, A. L. T.

Análise formal: Silveira, M. L., Stabile, A. M., Gusmão, J. L., & Souza, A. L. T.

Investigação: Junior, A. C .S., Xavier, I. P., Silveira, M. L., & Souza, A. L. T.

Metodologia: Junior, A. C .S., Xavier, I. P., Silveira, M. L., & Souza, A. L. T.

Administração do projeto: Souza, A. L. T.

Supervisão: Souza, A. L. T.

Escrita - rascunho original: Silveira, M. L., Stabile, A. M., Cárnio, E. C., Gusmão, J. L., & Souza, A. L. T.

Escrita - análise e edição: Silveira, M. L., Stabile, A. M., Gusmão, J. L., & Souza, A. L. T.

 

* Autor de correspondência:

André Luiz Thomaz de Souza

Email: alfenas2@hotmail.com

 

Como citar este artigo: Junior, A. C. S., Xavier, I. P., Silveira, L. M., Stabile, A. M., Cárnio, E. C., Gusmão, J. L., & Souza, A. L. T. (2020). Higiene oral: atuação da equipa de enfermagem em ambiente hospitalar. Revista de Enfermagem Referência, 5(1), e19099. doi: 10.12707/RIV19099

 

Recebido: 13.12.19

Aceite: 09.03.20

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