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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.22 Coimbra set. 2019

https://doi.org/10.12707/RIV19027 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

RESEARCH PAPER (ORIGINAL)

 

A pessoa em situação crítica submetida a ventilação não invasiva num serviço de urgência

The critically ill person submitted to non-invasive ventilation in an emergency department

La persona en estado crítico que se somete a ventilación no invasiva en un servicio de urgencias

 

Silvia Maria Gonçalves Fernandes*
https://orcid.org/0000-0002-6608-0344

Maria Augusta Romão da Veiga Branco**
https://orcid.org/0000-0002-7963-2291

Pedro Alexandre da Rosa Rodrigues***
https://orcid.org/0000-0003-0569-4235

 

* Lic., Enfermeira, Unidade Local de Saúde do Nordeste, 5301-852, Bragança, Portugal [sisse_fernandes86@hotmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica; recolha de dados; tratamento e avaliação estatística; análise e discussão de dados; redação do artigo. Morada para correspondência: Rua Santa Rita de Xisto nº 7 3º DRT, 5300-127, Bragança, Portugal.

** Ph.D., Professora Coordenadora, Escola Superior de Saúde de Bragança, 5300-146, Bragança, Portugal [aubra@ipb.pt]. Contribuição no artigo: análise estatística dos dados, discussão dos resultados, revisão global do artigo.

*** MSc., Enfermeiro Especialista, Unidade Local de Saúde do Nordeste, 5301-852, Bragança, Portugal [pedro_sete@hotmail.com]. Contribuição no artigo: análise estatística dos dados, discussão dos resultados, revisão global do artigo.

 

RESUMO

Enquadramento: A eficácia da ventilação não invasiva (VNI), pode decorrer com possíveis complicações que exigem atenção preventiva por parte da enfermagem.

Objetivo: Identificar as complicações da pessoa em situação crítica, submetida a terapia VNI, internada no serviço de urgência.

Metodologia: Estudo exploratório-descritivo, observacional, de caráter quantitativo, realizado através da aplicação de dois instrumentos de recolha de dados: um questionário e uma grelha de observação, a uma amostra de 35 doentes, na sua maioria do sexo feminino (57,14%) e com idade superior a 85 anos (37,14%).

Resultados: O diagnóstico clínico mais frequente foi a insuficiência respiratória (45,71%). As complicações mais frequentes foram a sensação de claustrofobia, as ulcerações da face, a dor e a acumulação de secreções. As complicações menos frequentes foram a congestão nasal, a conjuntivite, a distensão gástrica, a aerofagia e a sensação de vómitos.

Conclusão: Defende-se a divulgação dos resultados, no sentido de abrir a discussão intra e inter equipas, para reforçar a pertinência da formação de enfermagem relativamente aos cuidados em doentes com VNI.

Palavras-chave: complicações; pessoa em situação crítica; ventilação não invasiva

 

ABSTRACT

Background: The effectiveness of non-invasive ventilation (NIV) may be impacted by potential complications that require preventive nursing attention.

Objective: To identify the complications of critically ill patients undergoing NIV therapy admitted to the Emergency Department of ULS-Bragança.

Methodology: Exploratory-descriptive, observational, quantitative study conducted through the application of two data collection instruments, between November 2017 and March 2018: A Questionnaire and an Observation Grid of a sample of 35 patients, mostly female (57.14%) over the age of 85 (37.14%).

Results: The most frequent clinical diagnosis was respiratory failure (45.71%). The most frequent complications were the sensation of claustrophobia, ulcerations of the face, pain, and accumulation of secretions. Less frequent complications were nasal congestion, conjunctivitis, gastric distension, aerophagia, and vomiting.

Conclusion: The dissemination of the results is advocated, in order to open the discussion within and between teams, to reinforce the relevance of nursing training regarding the care of patients with NIV.

Keywords: complications; person in critical situation; noninvasive ventilation

 

RESUMEN

Marco contextual: La eficacia de la ventilación no invasiva (VNI) puede dar lugar a posibles complicaciones que requieren cuidados preventivos de enfermería.

Objetivo: Identificar las complicaciones de los pacientes en estado crítico sometidos a terapia de VNI ingresados en el servicio de urgencias.

Metodología: Se realizó un estudio exploratorio-descriptivo, observacional, de carácter cuantitativo, mediante la aplicación de dos instrumentos de recogida de datos: un cuestionario y una parrilla de observación a una muestra de 35 pacientes, la mayoría de los cuales eran mujeres (57,14%) y con una edad superior a los 85 años (37,14%).

Resultados: El diagnóstico clínico más frecuente fue la insuficiencia respiratoria (45,71%). Las complicaciones más frecuentes fueron la sensación de claustrofobia, las ulceraciones faciales, el dolor y la acumulación de secreciones. Las complicaciones menos frecuentes fueron la congestión nasal, la conjuntivitis, la distensión gástrica, la aerofagia y la sensación de vómitos.

Conclusión: Se aboga por la difusión de los resultados, con el fin de abrir el debate dentro de los equipos y entre ellos para reforzar la pertinencia de la formación de enfermería en relación con la atención de los pacientes con VNI.

Palabras clave: complicaciones; persona en situación crítica; ventilación no invasiva

 

Introdução

A formação de profissionais de saúde na área da pessoa em situação crítica, devido à gravidade do seu estado clínico, apresenta necessidades e exige atenção e cuidados específicos (Rodrigues, 2017) e destes, registe-se particularmente, os cuidados na ventilação não invasiva (VNI), como técnica indispensável no tratamento de várias patologias do foro respiratório, e nomeadamente, em situações de emergência. A VNI assume, hoje em dia, um papel relevante na prática clínica, como modalidade de terapia ventilatória e como vantajosa alternativa relativamente à ventilação mecânica invasiva (VMI; Ferreira, Nogueira, Conde, & Taveira, 2009), pelo que esta terapia é utilizada frequentemente neste contexto, e constitui uma prática comum para os profissionais de saúde que cuidam da pessoa em situação crítica. Com base nestes pressupostos, o presente estudo tem como objetivo: identificar as complicações da pessoa em situação crítica, submetida a terapia VNI, internada no serviço de urgência, sejam percecionadas pela pessoa e/ou observadas pelo enfermeiro.

 

Enquadramento

Os autores emergentes nesta matéria (Asseiro & Beirão, 2012; Ferreira et al., 2009; Pinto, 2013; Ruzic, 2019; Simonds & Hare, 2013), defendem que a VNI é uma alternativa no tratamento dos doentes com insuficiência respiratória hipoxémica ou hipercápnica, evitando a entubação orotraqueal (EOT) e as complicações decorrentes deste procedimento. Todavia, neste estudo assume-se a definição de Bezerra et al. (2019, p. 1) que defende que a VNI

consiste na administração de ventilação mecânica aos pulmões sem que haja a necessidade de vias aéreas artificiais, podendo ser oferecida ao paciente por meio de ventiladores mecânicos . . . com objetivo de diminuir o trabalho respiratório, o repouso dos músculos respiratórios e melhoria das trocas gasosas.

Assim, a VNI apresenta-se como uma alternativa no tratamento de doentes que por apresentarem falência de um ou mais níveis de funções vitais, são considerados doentes críticos (Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos, 2008) ou pessoa em situação crítica (Ordem dos Enfermeiros, 2010). A este propósito, e porque é neste estudo a amostra de conveniência, a tipologia de pessoa em situação crítica é caracterizada pela Ordem dos Enfermeiros, no que respeita às competências específicas do enfermeiro especialista, definindo esta condição específica: “A pessoa em situação crítica é aquela cuja vida está ameaçada por falência ou eminência de falência de uma ou mais funções vitais e cuja sobrevivência depende de meios avançados de vigilância, monitorização e terapêutica” (Regulamento nº 124/11 de 18 de Fevereiro, p. 8656, 2011).

De acordo com Cruz e Zamora (2013), e Esquinas (2011), a VNI está indicada na presença de sinais funcionais e clínicos de desconforto respiratório, nomeadamente: deterioração da troca gasosa (PaO2 /FiO2 < 200) ou saturação de oxigénio (SpO2< 92%); falência na bomba ventilatória aguda ou crónica agudizada, com hipercapnia e acidose respiratória (PaCO2> 45 mmHg e pH < 7,35); dispneia com uso da musculatura acessória e/ou respiração paradoxal; taquipneia (frequência respiratória > 24 incursões por minuto); hipoxemia [pressão arterial de O2, (PaO2 < 60 mmHg) com fração de O2 inspirado (FiO2>21% e com PaCO2< 45 mmHg)].

De entre as patologias respiratórias com caráter de urgência, há indicações para VNI (Esquinas, 2011; Ferreira et al., 2009) mais frequentemente em: doença pulmonar obstrutiva crónica reagudizada; asma agudizada; na insuficiência respiratória aguda hipoxémica cardiogénica; na insuficiência respiratória aguda hipoxémica não cardiogénica e, ainda, na pneumonia.

As complicações por uso da VNI agrupam-se em três áreas (Gay, 2009): as relacionadas com o tipo de máscara; as causadas pelo fluxo de ar; e as mais graves, com consequências hemodinâmicas e potencialmente fatais. As primeiras, relacionadas com a máscara, são as erupções cutâneas, as ulcerações da ponte nasal, a obstrução nasal, a aspiração de vómito, a hipersalivação ou boca seca, e a aerofagia e lesões nas mucosas. As causadas por pressão ou fluxo de ar são, segundo o mesmo autor, dor de ouvidos, sinusite, insuflação gástrica, pneumotórax e irritação dos olhos. Por fim, Gay (2009) apresenta a agitação ou intolerância à ventilação (desconforto), o acúmulo de secreções, a hipoxemia severa, a hipotensão e o compromisso hemodinâmico. Outras, relacionadas com a dor ou desconforto da face, lesões na pele, e sensação de claustrofobia (promotora de agitação e intolerância à VNI), a congestão nasal, a secura da mucosa nasal e oral, a dor ao nível das orelhas, irritação dos olhos e distensão gástrica (Pinto, 2013; Ximendes & Silva, 2015), e ainda: o eritema facial, alterações a nível das mucosas, agitação e intolerância à ventilação; claustrofobia, distensão abdominal; aerofagia, vómitos, pneumonia aspirativa, broncoaspiração, lesões de pele no ponto de contacto da máscara (face e nariz), dor, acumulação de secreções na via aérea.

 

Questão de investigação

Quais as complicações apresentadas pelos doentes submetidos a VNI, num serviço de urgência?

 

Metodologia

Partindo do objetivo e da questão de investigação formulados, foi desenvolvido um estudo exploratório-descritivo e observacional do tipo quantitativo, entre novembro de 2017 e março de 2018, em período de internamento no serviço de urgência da Unidade Local de Saúde do Nordeste (ULSNE). A amostra respondente é do tipo intencional, constituída por 35 doentes que cumpriram os seguintes critérios de inclusão: apresentarem consciência tempo-espacial, e critérios clínicos para iniciar terapia com VNI. Todos os doentes incluídos no estudo usaram o mesmo tipo de máscara (facial).

A recolha de dados, foi efetuada através de dois instrumentos de recolha de dados (IRD): (i) Questionário relativo à caracterização amostral: variáveis sociodemográficas e caracterização clínica do doente (estado de consciência, comorbilidades, oxigénioterapia e ou suporte ventilatório no domicílio, motivos de admissão no SU e diagnóstico clínico); (ii) Grelha relativa à observação das complicações (variável dependente em estudo) que insere: 1) Complicações percecionadas pelo doente (congestão nasal, conjuntivite, sensação de claustrofobia, distensão gástrica, aerofagia, vómitos, ulcerações da face, dor, acumulação de secreções na via aérea); 2) Complicações observadas pelo enfermeiro (alteração ao nível das mucosas, conjuntivite, agitação e intolerância à ventilação, distensão gástrica, vómitos, ulcerações da face, acumulação de secreções na via aérea).

A recolha dos dados respeitou um mapeamento cronológico de três observações separadas por 8 e 24 horas entre si e respetivamente, formando três momentos distintos, sendo eles: 1ª observação (ocorrências de complicações durante e até às primeiras 8 horas de internamento); 2ª observação (ocorrências durante e até às 24 horas seguintes desde o início do tratamento); 3ª observação (ocorrências durante e até às 48 horas seguintes desde o início do tratamento). Estes três momentos cronológicos foram assim assumidos, para ir ao encontro do que autores como Gay (2009), Pinto (2013) e Ximendes e Silva (2015), de alguma forma evidenciam, defendendo que as complicações aparecem progressiva e exponencialmente, com o número de horas de manutenção da VNI.

Neste estudo, verificou-se um número decrescente de doentes, ao longo destas observações, facto explicado por: transferência de doentes para outra unidade, ou suspensão de terapêutica por VNI.

Os dados recolhidos foram inseridos e analisados no programa informático IBM SPSS Statistics, versão 21.0, pelo número de codificação, respeitando o anonimato e sigilo da informação. A análise de dados, usou a estatística descritiva para descrever e caracterizar a amostra em estudo, com cálculo de frequências absolutas (n), relativas (%), medidas de tendência central (média, X) e de dispersão (DP), bem como, para identificar e comparar as complicações observadas vs percecionadas.

O estudo obteve parecer favorável da Comissão de Ética, conforme referência nº 006540 e a autorização do Diretor do Departamento de Urgência, Emergência e Cuidados Intensivos da ULSNE. A utilização dos dados confidenciais do processo individual do doente teve em conta os seguintes pressupostos: acordo ético relativo à consulta do processo e obtenção de dados; acordo relativo à absoluta preservação do anonimato; todos os momentos de colheita ocorreram no local dos limites físicos deste serviço. O consentimento informado, incluído no início do IRD, foi obtido de duas formas: em doentes alfabetizados, através de assinatura, em doentes não alfabetizados, através de colheita de dígito.

 

Resultados

A amostra, tal como se observa na Tabela 1, apresenta 20 sujeitos do sexo feminino (57,14%) e 15 do sexo masculino (42,86%). Todos os elementos têm mais do que 75 anos de idade, tendo 13 mais de 85 anos (37,14%).

No sentido de compreender o contexto patogénico em que emergem as complicações em estudo, foram identificados os diagnósticos clínicos da amostra. Verificou-se (Tabela 2) que a maioria da amostra (n = 16; 45,71%) apresentava o diagnóstico de insuficiência respiratória e 13 doentes apresentavam pneumonia (37,14%), seguidos de 12 doentes com insuficiência cardíaca (34,29%). A doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) agudizada, a acidose respiratória e a sepsis tiveram o mesmo número de registos (14,29%; n = 5), respetivamente.

Os resultados das complicações percecionadas pela amostra nos três momentos de avaliação, após iniciar VNI, apresentam-se na Tabela 3.

É importante salientar que, no 1º Momento de avaliação foram observados os 35 doentes; no 2º Momento, 24 doentes e no 3º momento, 14 doentes.

A apresentação da frequência revelará as complicações percecionadas mais relevantes. Relativamente à sensação de claustrofobia, observa-se que 68,57% dos doentes afirmou senti-la na 1ª avaliação; assim como 58,33% a sentiram na 2ª avaliação e 50% na 3ª avaliação. Quanto às ulcerações da face, verificou-se que nos diferentes momentos de avaliação, a maioria dos doentes, 51,43%; 62,50% e 57,14%, respetivamente a cada momento, sentia que a máscara os estava a magoar. Em todos os momentos de avaliação, 45,71%, 58,33% e 50% dos doentes percecionaram dor, respetivamente, e evidenciaram que o local mais doloroso era na ponte nasal. Quanto à acumulação de secreções, percecionada pelos doentes, foi referida por 31,34% da amostra na 1ª avaliação, por 41,67% dos doentes na 2ª avaliação, e ainda na 3ª avaliação por 42,86% da amostra.

As restantes complicações analisadas - a congestão nasal, a conjuntivite, a distensão gástrica, a aerofagia e a sensação de vómito - apresentaram-se menos relevantes, por serem infrequentes, tendo sido apenas registadas no 2º e 3º momentos de avaliação.

As complicações observadas pelo enfermeiro nos três momentos de avaliação são apresentadas na Tabela 4. Em termos de maior relevância, considera-se o conjunto de dados que a seguir se apresenta. A alteração ao nível das mucosas, mais propriamente a presença de secura da boca, é referida por 80% dos doentes na 1ª observação; 91,67% da amostra refere-a na 2ª observação e 78,57% na 3ª observação. Quanto à agitação e intolerância à ventilação, observou-se que na 1ª avaliação era mais frequente os doentes quererem tirar a máscara (28,57%), bem como 25,71% apresentavam agitação psicomotora; e 25,71% dos doentes não suportava bem a máscara. Verificou-se que de forma global, os doentes em estudo apresentavam sinais adaptativos ao tratamento e com evidência de diminuição progressiva das complicações. Constatou-se que maioritariamente - 62,86% dos doentes, 87,50% e 78, 57%, respetivamente - apresentavam marcas da máscara; e além disto, foi verificado que em 31,43% da amostra, 58,33%, e 71,43%, respetivamente, havia ulcerações da face nos diferentes momentos de observação e rubor no local de contacto. Quanto à acumulação de secreções - verificada através de observação da presença de tosse produtiva - constatou-se que 28,57% dos doentes tinham acumulação de secreções na 1ª avaliação, 29,17%, na 2ª avaliação e 35,71% dos doentes apresentou esta complicação na 3ª avaliação. As complicações menos evidentes foram a conjuntivite, a distensão abdominal e os vómitos.

 

Discussão

As complicações foram estudadas sob dois pontos de vista: as percecionadas pelo doente e as observadas pelo enfermeiro. As percecionadas pelo doente, e assumidas com maior evidência, foram: A sensação de claustrofobia na avaliação até 8 horas, sentida por 68,57% de 35 doentes, na avaliação até 48h, sentida por 24 doentes (58,33%) e na avaliação até 48h, sentida por 50% dos doentes. Esta evidência corrobora o resultado de Mehta e Hill (2001) e Freo et al. (2013), que também encontraram a sensação de claustrofobia em 10 a 20% dos doentes, mas não corrobora Gay (2009), cuja principal complicação verificada foi o desconforto do doente em 30 a 50% da sua amostra.

As ulcerações da face, foram referidas em maioria - por 51,43%, 62,50% e 57,14% dos doentes - nos três momentos de avaliação como “a máscara está a magoar”.

A dor, quando questionados se sentiam dor, na avaliação até 8h, a maioria (54,29%), respondeu não sentir dor, mas na avaliação até às 24h, 25,33% da amostra respondeu sim; já na avaliação até 48h, 50% da amostra respondeu afirmativamente e 50% respondeu o inverso, o que não corrobora o estudo de Gay (2009), onde a dor só surge em 10 a 20% dos doentes. Relativamente ao local de dor, a maioria da amostra identificou o nariz, em todos os momentos de avaliação.

Relativamente à acumulação de secreções, a maioria dos doentes, ao serem questionados, respondeu não, nos três momentos de avaliação; todavia foram encontrados alguns doentes da amostra, 31,43%, 41,67% e 42,86%, respetivamente - com esta queixa, nos sucessivos momentos de observação.

Quanto à segunda forma de abordagem, ou seja, as complicações observadas pelo enfermeiro, verifica-se que a alteração a nível das mucosas, mais concretamente secura da boca, é maioritariamente observada nos três momentos de avaliação, corroborando os resultados de Gay (2009) ao ter verificado alteração das mucosas em 30 a 50% dos doentes estudados.

No que respeita à conjuntivite, complicação também verificada no estudo de Gay (2009) em 33% da sua amostra, e em 10 a 20% no estudo de Mehta e Hill, (2001), e que aqui se verifica pela presença de lacrimejo, olho vermelho ou exsudado, nas três avaliações sucessivas.

A agitação e intolerância à ventilação foi observada, mas concluiu-se que os doentes estavam, em geral, pouco agitados e tolerantes ao tratamento: em todos os momentos de avaliação a maioria dos doentes não demonstrava agitação nem vontade de tirar a máscara, estavam bem posicionados e adaptados e não se verificaram fugas de ar.

As ulcerações da face, tal como as feridas na ponte nasal, já anteriormente encontradas por Gay (2009) em 10 a 20% da sua amostra, também aqui se verificaram, com grande evidência: a maioria dos doentes apresentava marcas da máscara e rubor no local de contacto, em todos os momentos de avaliação. Contrariamente, registou-se pouca evidência no parâmetro feridas abertas no local de contacto.

 

Conclusão

Os enfermeiros que trabalham em contexto cuidativo da pessoa em situação crítica, em terapia com VNI, desenvolvem um conhecimento empírico acerca da incidência e prevalência de complicações por VNI. Todavia, este conhecimento, é uma matéria de opinião, redutora e indutora de erro. Em enfermagem importa desenvolver o conhecimento, a partir da prática baseada na evidência. É essencial, conhecer o tipo de complicações e respetiva evolução, para poder desenvolver de forma consistente, práticas de atuação ao nível preventivo, a partir de dados e resultados confiáveis.

Em termos de resposta ao objetivo formulado, verificou-se que as complicações mais frequentes foram: a sensação de claustrofobia nas três avaliações, as ulcerações da face, a dor provocada pela presença da máscara, a acumulação de secreções. As complicações menos frequentes foram a congestão nasal, a conjuntivite, a distensão gástrica, a aerofagia e a sensação de vómitos.

É essencial reconhecer que estas são complicações consequentes da terapia VNI, e que podem e devem ser precocemente vigiadas, no sentido de poderem ser minimizadas e/ou anuladas, facto relevante para o sucesso desta técnica e para a recuperação do doente, razão pela qual o enfermeiro assume um papel primordial nos cuidados da terapia com VNI. Assim, considera-se pertinente a divulgação destes resultados, no sentido de abrir a discussão intra e inter equipas, e reforçar a pertinência da formação de enfermagem na prática cuidativa em doentes com VNI.

 

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Recebido para publicação em: 22.05.19

Aceite para publicação em: 26.08.19

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