SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.serIV número21Construcción y validación psicométrica del Cuestionario de Seguridad del Paciente en el QuirófanoGrupo de gestión autónoma de la medicación en un centro de atención psicosocial: experiencia de los usuarios índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

Links relacionados

  • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Revista de Enfermagem Referência

versión impresa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.21 Coimbra jun. 2019

https://doi.org/10.12707/RIV19020 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

RESEARCH PAPER (ORIGINAL)

 

Educação para a saúde nas escolas portuguesas: diretrizes dos setores da saúde e da educação

Health education in Portuguese schools: guidelines from the health and education sectors

Educación para la salud en las escuelas portuguesas: directrices para los sectores de la salud y la educación

 

Leonel Lusquinhos*
https://orcid.org/0000-0001-9144-2629

Graça S. Carvalho**
https://orcid.org/0000-0002-0034-1329

 

* Lic., Enfermeiro, Universidade do Minho, Instituto de Educação, 4710-057, Braga, Portugal [leoneluskinhos@gmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica; desenho de investigação; recolha, tratamento, análise e discussão dos dados e escrita do artigo. Morada para correspondência: Rua Sagrado Coração de Maria nº 4, 4705-479, Guisande, Braga.

** Agregação, Professora Catedrática, Universidade do Minho, Instituto de Educação, 4710-057, Braga, Portugal [graca@ie.uminho.pt]. Contribuição no artigo: desenho de investigação; análise e discussão dos dados e escrita do artigo.

 

RESUMO

Enquadramento: Em Portugal, todas as escolas do ensino básico e secundário são consideradas Escolas Promotoras de Saúde.

Objetivos: Analisar as linhas orientadoras para a implementação de escolas promotoras de saúde, emanadas pelos setores da saúde e da educação e verificar se se coadunam com as linhas orientadoras internacionais.

Metodologia: Estudo de natureza qualitativa, com recurso a análise de conteúdo dos documentos oficiais utilizando o software NVivo® 11 Pro.

Resultados: Ambos os setores (saúde e educação) preocupam-se com as Medidas a adotar para proporcionar condições de organização e de cooperação; têm os Objetivos claramente delineados e coincidentes; consideram relevante as Metodologias/estratégias ativas, especialmente a metodologia por projeto; apresentam Áreas/temas de intervenção idênticas e consideram a Avaliação essencialmente quantitativa.

Conclusão: Os documentos da saúde e da educação são convergentes e complementares, havendo articulação entre ambos os setores para uma eficiente implementação de escolas promotoras de saúde.

Palavras-chave: promoção da saúde; educação para a saúde; serviços de saúde escolar; serviços de saúde comunitária; educação

 

ABSTRACT

Background: In Portugal, all elementary and secondary schools are considered to be Health Promoting Schools.

Objective: To analyze the guidelines for the implementation of health promoting schools, issued by the health and education sectors, and assess whether they are consistent with international guidelines.

Methodology: Qualitative study, with content analysis of official documents using NVivo®11 Pro software.

Results: Both sectors (health and education) care about the Measures to be taken in order to provide organizational and cooperative conditions; define the Objectives clearly, which are coincident; consider active Methodologies/strategies, particularly project methodologies; present similar Areas/themes of intervention; and consider the Assessment essentially quantitative.

Conclusion: The health and education documents are convergent and complementary, with articulation between both sectors for an efficient implementation of health promoting schools.

Keywords: health promotion; health education; school health services; community health services; education

 

RESUMEN

Marco contextual: En Portugal, todas las escuelas de enseñanza primaria y secundaria se consideran escuelas promotoras de la salud.

Objetivos: Analizar las líneas orientadoras para implementar escuelas promotoras de la salud, emitidas por los sectores de la salud y la educación, y verificar si están acordes con las líneas orientadoras internacionales.

Metodología: Estudio cualitativo, para el cual se utilizó el análisis de contenido de documentos oficiales con el software NVivo® 11 Pro.

Resultados: Ambos sectores (salud y educación) se ocupan de las Medidas por adoptar para proporcionar condiciones organizativas y de cooperación; tienen los Objetivos claramente delineados y coincidentes; consideran relevantes las Metodologías/estrategias activas, especialmente la metodología por proyecto; presentan Áreas/temas de intervención idénticos y consideran la Evaluación esencialmente cuantitativa.

Conclusión: Los documentos de salud y educación son convergentes y complementarios, con articulación entre ambos sectores para una implementación eficiente de las escuelas promotoras de la salud.

Palabras clave: promoción de la salud; educación en salud; servicios de salud escolar; servicios de salud comunitaria; educación

 

Introdução

Em 1991, surge na World Health Organization (WHO) o conceito de Escola Promotora de Saúde (EPS), em que as escolas aderentes a este projeto implementam um plano estruturado e sistematizado para a melhoria da saúde de todos os alunos e do pessoal docente e não docente (WHO, 1998). A EPS tem como finalidade melhorar os resultados escolares e facilitar ações em favor da saúde, gerando conhecimentos e habilidades nos domínios cognitivo, social e comportamental (International Union for Health Promotion and Education [IUHPE], 2009). Para que tal ocorra, é necessário o envolvimento dos setores da saúde e da educação, por forma a melhorar

as competências dos cidadãos para lidarem com a sua saúde e com o sistema de saúde, melhorando as condições para um bom desempenho escolar e profissional, melhorando a qualidade de vida e contribuindo para a transformação da sociedade, nomeadamente eliminando as iniquidades. (Loureiro, 2015, p. 1)

Este estudo pretende analisar as linhas orientadoras para a implementação de EPS emanadas pelos setores da saúde e da educação, e verificar se se coadunam com as linhas orientadoras internacionais, de forma a permitir aos profissionais de saúde e educação uma prática efetiva da promoção e educação para a saúde em meio escolar (PEpS-ME), tendo por base as orientações ministeriais.

 

Enquadramento

A estratégia europeia Saúde 2020 (WHO, 2013), definida no âmbito do programa Quadro das Políticas da União Europeia, reforça a importância dada aos governos e à sociedade para o desenvolvimento de ações transversais para a saúde e o bem-estar das comunidades, apelando à necessidade do reforço das capacidades de intervenção no domínio da saúde pública (Loureiro, Miranda, & Pereira Miguel, 2013), o que é também enfatizado pelo Comité Regional Europeu da WHO (WHO, 2012).

Mas, já em 1986, aquando da Primeira Conferência Mundial da WHO sobre promoção da saúde, em Otava, no Canadá, foram estabelecidas cinco estratégias fundamentais de intervenção na saúde pública, expressas na famosa Carta de Otava (WHO, 1986): criação de políticas públicas saudáveis; criação de ambientes sustentáveis; fortalecimento das ações comunitárias; desenvolvimento de competências pessoais; e reorientação dos serviços de saúde.

Desde esta histórica conferência, a qual efetivou o lançamento da Carta de Otava, já foram realizadas outras oito, onde se foram sucessivamente estabelecendo com maior especificidade os vários conceitos, princípios e áreas de ação da promoção da saúde. Na última, a qual se realizou em Xangai (China) em 2016, a promoção da saúde foi enquadrada no âmbito dos objetivos do desenvolvimento sustentável (WHO, 2016a), de onde resultaram dois documentos: Promovendo a Saúde na Agenda do Desenvolvimento Sustentável (WHO, 2017) e Consenso de Xangai sobre Cidades saudáveis (WHO, 2016b), os quais abordam os determinantes da saúde.

Em Portugal, muitas autarquias têm vindo a desenvolver atividades com vista à melhoria da educação, ao reforço das redes sociais para uma mais eficiente articulação entre instituições, de forma a contribuir para uma maior coesão social e para a promoção da saúde dos seus munícipes (Loureiro, 2013).

De acordo com a IUHPE (2010), o conceito de EPS é alicerçado em seis pilares: i) políticas de escola saudável; ii) o ambiente físico da escola; iii) o ambiente social da escola; iv) habilidades de saúde individual e competências para a ação; v) ligação à comunidade local; e vi) serviços de saúde em parceria com a escola.

Um aspeto fundamental para o sucesso da implementação do conceito de EPS, refere-se ao diálogo e trabalho conjunto dos ministérios da saúde e da educação, sendo necessário:

Garantir a existência de um compromisso contínuo, ativo e manifesto por parte dos governos e das autoridades competentes na implementação, na atualização, na monitorização e na avaliação da estratégia de promoção da saúde (uma forma eficaz de formalizar este compromisso é a assinatura de um acordo de colaboração entre os ministérios da saúde e da educação do governo nacional). (IUHPE, 2009, p. 3)

Neste sentido, em Portugal, o setor da saúde (através da Direcção-Geral da Saúde) e o setor da educação (através da Direção-Geral da Educação) acordaram os objetivos e estratégias para a implementação de EPS no país, tendo desta forma Portugal aderido em 1994 à rede europeia European Network of Health Promoting Schools (ENHPS), com apenas dez escolas piloto e quatro centros de saúde (Faria & Carvalho, 2004). A partir de 1997 procedeu-se ao alargamento (Faria & Carvalho, 2004) e, atualmente, segundo a sucessora organização europeia Schools for Health in Europe (SHE), todas as escolas portuguesas do ensino básico e secundário são consideradas EPS (SHE, 2013).

Assim, torna-se necessário conhecer o que os ministérios da saúde e educação preconizam ao nível das orientações, recomendações e legislação, relativas à PEpS-ME.

 

Questões de investigação

Será que as diretrizes ministeriais da saúde e da educação, vão ao encontro do que é preconizado internacionalmente para as EPS?

Será que existe adequada articulação entre tais diretrizes ministeriais?

 

Metodologia

Neste estudo, de natureza qualitativa, foi realizada a análise de conteúdo dos documentos oficiais e em vigor dos ministérios da saúde e da educação, relativos à PEpS-ME, utilizando o software NVivo® 11 Pro. Os critérios de inclusão dos documentos a serem analisados neste estudo foram: (i) serem emanados pelos setores da saúde e da educação, incluindo legislação, linhas orientadoras, recomendações e pareceres; e (ii) estarem relacionados com a PEpS-ME.

Assim, para a recolha de documentos, foi realizada uma pesquisa online em diversos portais oficiais dos dois setores (saúde e educação): setor da saúde (https://www.dgs.pt/paginas-de-sistema/saude-de-a-a-z/saude-escolar/programa-nacional-de-saude-escolar.aspx; https://www.sns.gov.pt/sns/reforma-do-sns/cuidados-de-saude-primarios-2/publicacoes-e-documentacao-de-suporte/#; http://www.ordemenfermeiros.pt/documentos/Paginas/Colegios.aspx); e setor da educação (http://www.dge.mec.pt/educacao-para-saude; https://www.dgeste.mec.pt/; http://www.sec-geral.mec.pt/).

Obteve-se um total de 29 documentos, sendo sete emanados do Ministério da Saúde, quinze do Ministério da Educação, seis de ambos conjuntamente e um emitido pela Ordem dos Enfermeiros:

- Ministério da Saúde (S1 - Decreto-Lei n.º 239/2015 de 14 de outubro; S2 - Decreto-Lei n.º 28/2008 de 22 de fevereiro; S3 - Despacho n.º 10143/2009 de 16 de abril; S4 - Despacho nº 8815/2015 de 10 de agosto; S5 - Lei nº 47/90 de 24 de agosto; S6 - Plano nacional de saúde revisão e extensão a 2020; S7 - Programa Nacional de Saúde Escolar Avaliação do Ano Letivo 2014/2015);

- Ministério da Educação (E1 - Decreto-Lei nº 139/2012 de 5 de julho; E2 - Decreto-Lei nº 6/2001 de 18 de janeiro; E3 - Decreto-Lei nº 74/2004 de 26 de março; E4 - Despacho n.º 19308/2008 de 21 de julho; E5 - Despacho nº 15987/2006 de 26 de setembro; E6 - Despacho nº 19 737/2005 de 13 de setembro; E7 - Despacho nº 25 995/2005 de 16 de dezembro; E8 - Despacho nº 2506/2007 de 20 de fevereiro; E9 - Educação para a Cidadania – linhas orientadoras; E10 - Lei nº 115/97 de 19 de setembro; E11 - Lei nº 46/86 de 14 de outubro (atualizada); E12 - Lei nº 49/2005 de 30 de agosto; E13 - Programa de apoio à promoção e educação para a saúde; E14 - Promoção e educação para a saúde relatório 2012/2013; E15 - Referencial de Educação para a Saúde);

- Ministério da Saúde e Ministério da Educação (SE1 - Despacho conjunto nº 734/2000 de 18 julho; SE2 - Lei n.º 120/99, de 11 de agosto; SE3 - Lei n.º 3/84, de 24 de março; SE4 - Lei n.º 60/2009 de 6 de agosto; SE5 - Portaria n.º 196-A/2010 de 9 de abril; SE6 - Protocolo de colaboração entre a Direção Geral de Educação e a Direção Geral da Saúde);

- Ordem dos Enfermeiros (OE1 - Parecer nº 14 / 2013, Programa Nacional de Saúde Escolar - Mesa do colégio de especialidade de enfermagem de saúde infantil e pediátrica).

Os documentos foram sujeitos a análise de conteúdo, utilizando-se para o efeito o software NVivo® 11 Pro. Aplicou-se inicialmente a técnica do wordstorm, para identificação das palavras mais frequentes nos documentos, e procedeu-se à categorização pré-definida através de uma leitura flutuante, deixando sempre em aberto a possibilidade de, durante a análise, surgirem novas categorias relevantes para o estudo (Bardin, 2009; Moraes & Galiazzi, 2011). Por fim, as unidades de análise dos 29 documentos foram sujeitas a codificação em função das seguintes cinco categorias: Medidas adotadas; Objetivos; Metodologias/estratégias; Áreas/temas de intervenção; Avaliação.

 

Resultados

Documentos analisados

Os 29 documentos obtidos foram categorizados em função da sua origem (setor da saúde e setor da educação) e da tipologia (Diário da República - DR, Documento de trabalho - DT, Relatório - RT e Outros documentos - OD), conforme a Tabela 1.

O tipo DR, que incluía Decretos-lei e Despachos, foram os mais frequentes, com 21 documentos. Estes eram sobretudo da educação (11) e apenas cinco da saúde, para além de outros cinco publicados por ambos os setores. Encontrou-se ainda um DT emanado por ambos os setores, três pelo setor da educação e outro pela saúde. Foram obtidos dois RT, um da saúde e outro da educação. A categoria de OD apenas incluiu um documento que se refere a um parecer emitido pela Ordem dos Enfermeiros.

Numa primeira fase do estudo, foi realizada a pesquisa no software NVivo®11 Pro das 30 palavras mais frequentes no conjunto dos 29 documentos analisados, tendo sido obtidas as seguintes cinco palavras principais, por ordem de grandeza: saúde; educação; ensino; escolar; e formação (Figura 1). Na Figura 1, a dimensão da letra é proporcional à frequência do termo.

Foi também realizada uma pesquisa idêntica de 30 palavras mais frequentes, mas a partir: dos seis documentos emanados pelos dois setores (Figura 1B); dos documentos originários só do setor da saúde (Figura 1C); e a partir dos 16 documentos do setor da educação (Figura 1D).

As cinco palavras mais frequentes encontradas nos documentos de ambos os setores foram: educação; saúde; sexual; planeamento; e familiar (Figura 1B). Nos documentos só do setor da saúde, as cinco principais palavras foram: saúde; escolar; educação; escola; e programa (Figura 1C). Nos documentos só da educação foram: educação; ensino; saúde; formação; e escolar (Figura 1D).

Estes dados indicam que os documentos selecionados incidem, de facto, em aspetos relacionados com saúde e educação em meio escolar, o que demonstra serem relevantes para o objetivo deste estudo, que é conhecer as diretrizes ministeriais e verificar se vão ao encontro do que é preconizado internacionalmente para as escolas promotoras de saúde.

Atendendo a que promoção da saúde (PS) e educação para a saúde (ES) são dois conceitos-chave das EPS, procedeu-se também à consulta do número de ocorrências destes termos nos documentos em análise. Como esperado, nos documentos do setor da saúde o conceito de PS surge em maior número (71) do que o de ES (57), enquanto, pelo contrário, no setor da educação o conceito de ES é amplamente mais utilizado (211) que o de PS (24). Nos documentos produzidos em conjunto por ambos os setores, o conceito de ES (43) é mais referenciado que o de PS (11). No seu todo, o conceito mais utilizado é de ES (311) comparativamente a PS (106).

Análise dos documentos por categoria

As cinco categorias de análise (Medidas adotadas, Objetivos, Metodologias/estratégias; Áreas/temas de intervenção; e Avaliação) foram aplicadas aos 29 documentos do setor da saúde e da educação, em que os seis documentos produzidos pelos dois setores foram considerados para ambos. Da análise realizada através do software NVivo® 11 Pro obteve-se a Figura 2, em que a dimensão da área é proporcional ao número de ocorrências na respetiva categoria. Do total de 346 ocorrências, verificou-se que a categoria Medidas adotadas é a mais frequente, com 105 ocorrências (66 da educação e 39 da saúde) enquanto a das Áreas/temas de intervenção é a de menor frequência, com apenas 25 ocorrências (17 da saúde e oito da educação). Apenas a primeira categoria apresenta maior número de ocorrências no setor da educação, todas as outras categorias são mais preponderantes no setor da saúde. De facto, as 346 ocorrências corresponderam a 208 (39+45+47+60+17) do setor da saúde e a 138 (66+30+24+10+8) no setor da educação (a href ="/img/revistas/ref/vserIVn21/IVn21a08f2.jpg">Figura 2). A maior discrepância entre a frequência de ocorrências encontrou-se nos documentos sobre Metodologias/estratégias (60 na saúde versus 10 na educação) e sobre Áreas/temas de intervenção (17 na saúde versus oito na educação).

Estes dados mostram que o setor da saúde se preocupa bastante mais do que o da educação no que diz respeito à definição de Metodologias/estratégias e de Áreas/temas de intervenção. Pelo contrário, o setor da educação parece preocupar-se bastante mais do que o da saúde sobre as Medidas a adotar.

Análise por categoria e por tipologia de documentos

Utilizando a categorização acima descrita (Medidas adotadas; Objetivos; Metodologias/estratégias; Áreas/temas de intervenção; e Avaliação), determinou-se o número de ocorrências em função da tipologia dos documentos analisados: DR; DT; RT; e OD. DR é a tipologia com mais documentos (21), sendo seguido por DT, RT e OD, com cinco, dois e um documento, respetivamente (Tabela 2).

Das 346 ocorrências totais, a grande maioria (268) foi encontrada em DR (com 196 no setor da saúde e 72 no da educação), o que era expectável na medida em que esta tipologia era a que continha mais documentos. A categoria Metodologias/estratégias (58) foi a que mais contribuiu no setor da saúde, enquanto no setor da educação foram as Medidas adotadas (57).

Contrariamente ao setor da saúde, que só apresentou 9 ocorrências em DT, o setor da educação apresenta um elevado número de ocorrências (57) nesta tipologia, a maioria das quais (21) na categoria de Avaliação. Isto, apesar de terem sido só cinco documentos em análise (Tabela 2).

As outras duas tipologias com poucos documentos, RT (2) e OD (1), apresentam poucas ocorrências no setor da saúde (1 e 2 respetivamente), mas no setor da educação encontraram-se nove ocorrências em RT.

Estes resultados mostram que os DR foram a fonte principal de ocorrências de categorias de análise, especialmente no que se refere às Metodologias/estratégias no setor da saúde e às Medidas adotadas no setor da educação. Segue-se a tipologia DT, em que o setor da educação foi mais presente, especialmente na categoria de Avaliação.

Análise interpretativa por categoria e por tipologia de documentos

Com vista à interpretação da contribuição dos setores da saúde e da educação para a implementação e monitorização das EPSs, apresenta-se a análise interpretativa de ocorrências (unidades de análise) codificadas em cada categoria (Medidas adotadas, Objetivos, Metodologias/estratégias; Áreas/temas de intervenção; e Avaliação) e originária dos diversos tipos de documentos (DR; DT; RT; e OD).

Medidas adotadas

Na categoria Medidas adotadas, o setor da saúde demonstra assumir, entre outros, compromissos de parceria efetiva com os agrupamentos escolares, e especifica mesmo que as Unidades de Cuidados na Comunidade têm como prioridade atuar na ES e implementar o Programa Nacional de Saúde Escolar, sendo ainda definidos rácios de profissionais de saúde para crianças no âmbito da saúde escolar (Tabela 3A).

Por sua vez, o setor da educação inclui, entre outras medidas, a ES no projeto educativo da escola, determina a criação de uma equipa dedicada à educação para a saúde em cada agrupamento ou escola não agrupada (Tabela 3A).

Estes extratos de unidades de análise são exemplos de como ambos os setores se preocupam com as condições de organização e de cooperação para assegurarem a promoção e educação para a saúde em meio escolar.

Objetivos

No que se refere aos Objetivos delineados por cada setor para a PEpS-ME, estes parecem ser coincidentes, tendo como foco a melhoria dos conhecimentos e literacia em saúde bem como promover a capacitação das crianças e jovens, bem como de toda a comunidade escolar, para a tomada de decisões adequadas à sua saúde e bem-estar (Tabela 3B).

Metodologias/estratégias

No que diz respeito à categoria das Metodologias/estratégias para a implementação da promoção e educação para a saúde em meio escolar, verifica-se que ambos os setores são adeptos de metodologias ativas (Berbel, 2011; Diesel, Baldez, & Martins, 2017), em particular a metodologia por projeto, em que o setor da saúde salienta mais a abordagem multidisciplinar e holística e o da educação enfatiza o processo de diagnóstico e de avaliação (Tabela 3C).

Áreas/temas de intervenção

Os documentos de ambos os setores definem as Áreas/temas de intervenção de forma idêntica, embora no setor da saúde se tenda a definir um leque mais alargado das temáticas, como se pode observar na Tabela 3D.

Avaliação

No que diz respeito à categoria da Avaliação, o setor da saúde apresenta um conjunto de 43 indicadores para aplicação a nível nacional, sendo uns focados nos processos e outros nos resultados, em que os dados são geralmente requeridos em percentagens (Tabela 3E). Por sua vez, o setor da educação apresenta monitorização e avaliação, com recurso a métodos descritivos e correlativos, muito centradas nas unidades orgânicas (Tabela 3E).

 

Discussão

No presente estudo procedeu-se à análise de conteúdo (utilizando o software NVivo®11 Pro), aplicando cinco categorias de análise (Medidas adotadas, Objetivos, Metodologias/estratégias; Áreas/temas de intervenção; e Avaliação), nos documentos de diversas tipologias (DR; DT; RT; e OD) provenientes dos setores da saúde e da educação. Pretendeu-se, assim, conhecer e comparar as linhas orientadoras emanadas de ambos os setores, com vista a compreender a articulação entre ambos e verificar se se coadunam com as linhas orientadoras internacionais para a promoção e educação para a saúde em meio escolar.

Numa primeira fase, pela análise de frequência de palavras (wordstorm), verificou-se que os 29 documentos selecionados para análise de conteúdo incidiam, de facto, em aspetos relacionados com saúde e educação em meio escolar, indicando serem fontes adequadas para o presente estudo. Os resultados da análise de conteúdo mostraram que o setor da saúde utiliza com maior frequência do que o da educação o conceito de PS, o qual é definido como:

qualquer atividade que se leva a cabo para melhorar e/ou proteger a saúde de todos os utentes da escola, … que inclui a disponibilização e o desenvolvimento de atividades relacionadas com políticas escolares saudáveis, o ambiente físico e social da escola, o currículo, a interligação com a comunidade e com os serviços de saúde. (IUHPE, 2010, p. 2)

Por sua vez, o setor da educação utiliza como conceito-chave a ES, definida como “uma atividade de comunicação que implica um ensino-aprendizagem respeitante a uma série de conhecimentos, crenças, atitudes, valores, habilidades e competências” (IUHPE, 2010, p. 3), o que está relacionado com o desenvolvimento da própria pessoa, onde o alvo são, especialmente, os alunos.

A partir ainda da análise de frequência de palavras nas cinco categorias de análise verificou-se que o setor da saúde se preocupa mais com as Metodologias/estratégias e as Áreas/temas de intervenção, enquanto o setor da educação se preocupa principalmente com as Medidas a adotar na PEpS-ME.

Os extratos de unidades de análise nas cinco categorias mostraram bem que ambos os setores da saúde e da educação: (i) se preocupam com as Medidas a adotar para proporcionar condições de organização e de cooperação com vista a assegurar a promoção e educação para a saúde em meio escolar; (ii) têm os Objetivos claramente delineados e coincidentes com vista ao aumento da literacia em saúde e à capacitação para tomadas de decisão favoráveis à saúde e bem-estar; (iii) consideram relevante Metodologias/estratégias ativas, em particular a metodologia por projeto, atuando de forma complementar, em que o setor da saúde salienta mais a abordagem multidisciplinar e holística e o da educação enfatiza o processo de diagnóstico e de avaliação; (iv) apresentam Áreas/temas de intervenção idênticas; e (v) a Avaliação é essencialmente de cariz quantitativo, sendo o setor da saúde focado nos processos e nos resultados e o da educação no diagnóstico, monitorização e avaliação.

Este estudo, no seu todo, demonstra que existe articulação entre os dois setores, verificando-se que ambos os setores da saúde e da educação têm elaborado documentos de referência convergentes e complementares para a promoção e educação para saúde em meio escolar, de forma a dar cumprimento ao preconizado internacionalmente, tal como, por exemplo, pela IUHPE (2009) e a SHE (2013).

Os documentos analisados são na sua maioria (22 em 29) Decretos-Lei e Despachos publicados em DR, o que faz com que a sua abrangência seja ao nível nacional e, por isso, a sua implementação potencialmente mais efetiva. De facto, a legislação analisada neste estudo demonstra haver forte compromisso interministerial visando a participação ativa e em equipas multidisciplinares dos profissionais da saúde e da educação no desiderato comum da construção de um projeto estruturado em torno duma efetiva EPS a nível nacional. Na verdade, a implementação do modelo de EPS originou-se há mais de duas décadas com a adesão de Portugal à rede europeia ENHPS em 1994 (Faria & Carvalho, 2004; SHE, 2013), e a legislação atualmente em vigor permite inferir da continuação do interesse interministerial em caminhar em conjunto para que crianças e jovens possam desenvolver as suas competências em saúde.

 

Conclusão

Neste estudo analisaram-se os documentos oficiais dos setores da saúde e da educação que estabelecem as condições para a implementação da promoção e educação para saúde em meio escolar, que se mostraram adequados quer em perspetivas coincidentes e complementares dos dois setores, quer na eficaz articulação entre eles, tal como preconizado internacionalmente. O que se torna agora importante conhecer é como, na prática, as escolas desenvolvem as atividades de promoção e educação para a saúde. Este estudo permite os profissionais de saúde e educação, que desenvolvem a sua atividade na PEpS-ME, a possibilidade de uma prática efetiva alicerçada em orientações, recomendações e pareceres ministeriais de ambos os setores.

Este é um estudo em fase de desenvolvimento em que se pretende comparar o ideário teórico, oficial, das diretrizes ministeriais com a realidade da escola e encontrar sintonias e disfunções relativamente à articulação entre os setores de saúde e educação no terreno. A finalidade é encontrar as melhores condições de articulação entre os dois setores, na prática, para que as crianças e jovens possam desenvolver da forma mais efetiva possível as suas competências em saúde.

 

Referências bibliográficas

Bardin, L. (2009). Análise de conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70.         [ Links ]

Berbel, A. N. (2011). As metodologias ativas e a promoção da autonomia de estudantes. Semina: Ciências Sociais e Humanas, 32(1), 25–40. doi: https://doi.org/10.5433/1679-0359.2011v32n1p25        [ Links ]

Diesel, A., Baldez, A., & Martins, S. (2017). Os princípios das metodologias ativas de ensino: Uma abordagem teórica. Revista Thema, 14(1), 268–288. doi: https://doi.org/10.15536/thema.14.2017.268-288.404        [ Links ]

Faria, H. A., & Carvalho, G. S. (2004). Escolas promotoras de saúde: Factores críticos para o sucesso da parceria escola-centro de saúde. Revista Portuguesa de Saúde Pública, 22(2), 79–90.         [ Links ]

International Union for Health Promotion and Education. (2009). Construindo escolas promotoras de saúde : Diretrizes para promover a saúde em meio escolar. Saint-Denis, França: Autor.         [ Links ]

International Union for Health Promotion and Education. (2010). Promover a saúde na escola: Da evidência à acção. Saint-Denis, França: Autor. Recuperado de http://www.iuhpe.org/images/PUBLICATIONS/THEMATIC/HPS/Evidence-Action_ENG.pdf        [ Links ]

Loureiro, I. (2013). Da utilização da investigação em saúde à criação de políticas e práticas de empowerment dos cidadãos. Revista Portuguesa de Saude Publica, 31(1), 1–2. doi: 10.1016/j.rpsp.2013.06.002        [ Links ]

Loureiro, I. (2015). A literacia em saúde, as políticas e a participação do cidadão. Revista Portuguesa de Saude Publica, 33(1), 1. doi: 10.1016/j.rpsp.2015.05.001        [ Links ]

Loureiro, I., Miranda, N., & Pereira Miguel, J. M. (2013). Promoção da saúde e desenvolvimento local em Portugal: Refletir para agir. Revista Portuguesa de Saúde Pública, 31(1), 23–31. doi: 10.1016/j.rpsp.2013.03.001        [ Links ]

Moraes, R., & Galiazzi, M. C. (2011). Análise textual discursiva. Coleção Educação em Ciências (2a ed.). Ijuí, Brasil: Editora Unijuí         [ Links ].

Schools for Health in Europe. (2013). State of the art : Health promoting schools in Europe acting for better schools , leading to better lives. Utrecht, Netherlands. Recuperado de http://www.schools-for-health.eu/uploads/files/SHE-Factsheet_1_State_of_art_Health Promoting Schools.pdf        [ Links ]

World Health Organization. (2013). Health 2020: A European policy framework supporting action across government and society for health and well-being. Copenhagen, Denmark: Author.         [ Links ]

World Health Organization. (2016a). Shanghai Declaration on health promotion in the 2030 Agenda for Sustainable Development. Shangai, China: Author.         [ Links ]

World Health Organization. (1986). Carta de Ottawa para a promoção da saúde. 1a Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde. Ottawa, Canada: Autor.         [ Links ]

World Health Organization. (1998). Health-Promoting Schools: A healthy setting for living, learning aond working. Geneva, Switzerland: Author.         [ Links ]

World Health Organization. (2012). European Action Plan for Strengthening Public Health Capacities and Services. Copenhagen, Denmark: Author.         [ Links ]

World Health Organization. (2016b). Shanghai Consensus on Healthy Cities 2016. Shangai, China: Author.         [ Links ]

World Health Organization. (2017). Promoting health in the SDGs. Geneva, Switzerland: Author.         [ Links ]

 

Recebido para publicação em: 15.04.19

Aceite para publicação em: 05.06.19

Creative Commons License Todo el contenido de esta revista, excepto dónde está identificado, está bajo una Licencia Creative Commons