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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.20 Coimbra mar. 2019

https://doi.org/10.12707/RIV18078 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

RESEARCH PAPER (ORIGINAL)

 

O ruído em neonatologia: perceção dos profissionais de saúde

Noise in neonatology: perception of health professionals

El ruido en neonatología: percepción de los profesionales de la salud

 

Ernestina Maria Batoca Silva*
https://orcid.org/0000-0002-4401-6296

Ana Cristina Faria Silva Ramos**
https://orcid.org/0000-0002-7179-0439

João Carvalho Duarte***
https://orcid.org/0000-0001-7082-8012

Daniel Marques Silva****
https://orcid.org/0000-0003-4311-6014

 

* Ph.D., Professora Coordenadora, Instituto Politécnico de Viseu, 3504-510, Viseu, Portugal [ernestinabatoca@sapo.pt]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica; recolha de dados; tratamento e avaliação estatística; análise de dados e discussão; escrita do artigo e aprovação final da versão a ser publicada. Morada para correspondência: Rua da Peça, nº 64, Esculca, 3500-843, Viseu, Portugal.

** MSc., Enfermeira, Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho, 4434-502, Vila Nova de Gaia, Espinho, Portugal [ana.acfs@gmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica; recolha de dados; tratamento e avaliação estatística; análise de dados e discussão e escrita do artigo.

*** Ph.D., Professor Coordenador, Escola Superior de Saúde de Viseu, Instituto Politécnico de Viseu, Portugal, membro do Centro de Estudos em Educação, Tecnologias e Saúde (CI&DETS) e da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA:E), 3046-851, Coimbra, Portugal [duarte.johnny@gmail.com]. Contribuição no artigo: tratamento e avaliação estatística.

**** Ph.D., Professor Coordenador, Escola Superior de Saúde de Viseu, Instituto Politécnico de Viseu, Portugal, membro do Centro de Estudos em Educação, Tecnologias e Saúde (CI&DETS) e da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA:E), 3046-851, Coimbra, Portugal [dsilva.essv@gmail.com]. Contribuição no artigo: análise e discussão de dados; escrita do artigo e aprovação final da versão a ser publicada.

 

RESUMO

Enquadramento: É reconhecido o impacto negativo do ruído no recém-nascido em unidades de neonatologia, bem como nos pais e profissionais de saúde, sendo importante a sensibilização para a redução e controlo deste agente stressor.

Objetivos: Identificar a perceção dos profissionais de saúde sobre o ruído em neonatologia.

Metodologia: Estudo quali-quantitativo e descritivo. Amostra não probabilística com 52 profissionais de saúde. Utilizou-se um questionário ad-hoc construído para o efeito.

Resultados: Os profissionais, na sua maioria, consideram a unidade de neonatologia ruidosa, incómoda no desempenho de funções e consideram existir efeitos adversos do ruído, apesar de apresentarem poucos conhecimentos sobre os valores de decibéis recomendados para uma unidade neonatal.

Conclusão: A perceção dos profissionais de saúde sobre o ruído indica a necessidade de implementação de um programa de redução de ruído. Considerou-se pertinente a formação e envolvimento da equipa, de forma a serem elementos ativos e mobilizadores na adoção de medidas que promovam um ambiente acusticamente mais saudável para o recém-nascido e bem-estar dos pais e dos profissionais de saúde.

Palavras-chave: ruído; unidades de terapia intensiva neonatal; pessoal de saúde; recém-nascido

 

ABSTRACT

Background: The negative impact of noise in the newborn in neonatology units, as well as in the parents and health professionals, is known, so it is essential to raise awareness of the reduction and control of this stressor agent.

Objectives: To identify the perception of health professionals about noise in neonatology.

Methodology: Qualitative-quantitative and descriptive study. A non-probabilistic sample of 52 health professionals. An ad-hoc questionnaire designed for this purpose was used.

Results: The majority of professionals considers neonatology units noisy and uncomfortable in performing functions and believes that noise has adverse effects, although there is little knowledge about the decibel values recommended for the neonatal unit.

Conclusion: The perception of health professionals about noise indicates the need to implement a noise reduction program. We consider the training and involvement of the team relevant, so professionals can be active and inciting in the adoption of measures that promote an acoustically healthy environment for the newborn and the well-being of parents and health professionals.

Keywords: noise; intensive care units, neonatal; health personnel; infant, newborn

 

RESUMEN

Marco contextual: Se reconoce el impacto negativo del ruido en el recién nacido en unidades de neonatología, así como en los padres y en los profesionales de la salud, por lo que es importante la sensibilización para reducir y controlar este factor de estrés.

Objetivos: Identificar la percepción de los profesionales de la salud sobre el ruido en neonatología.

Metodología: Estudio cuali-cuantitativo y descriptivo. La muestra fue no probabilística con 52 profesionales de la salud. Se utilizó un cuestionario ad-hoc construido para tal efecto.

Resultados: La mayoría de los profesionales consideran la unidad de neonatología ruidosa, incómoda en el desempeño de funciones y consideran que existen efectos adversos del ruido, a pesar de que presentan pocos conocimientos sobre los valores de decibelios recomendados para una unidad neonatal.

Conclusión: La percepción de los profesionales de la salud sobre el ruido indica la necesidad de implementar un programa de reducción del ruido. Se consideró pertinente formar e implicar al equipo, de forma que sean elementos activos y movilizadores en la adopción de medidas que promuevan un ambiente acústicamente más sano para el recién nacido y para el bienestar de los padres y de los profesionales de la salud.

Palabras clave: ruido; unidades de cuidado intensivo neonatal; personal de salud; recién nacido

 

Introdução

O internamento do recém-nascido (RN) numa unidade de cuidados intensivos neonatal (UCIN), a forma como a informação do ambiente é recebida e o tipo de resposta individual ao stress, condicionam as alterações a nível do neurodesenvolvimento (Coughlin, 2017). São reconhecidos os efeitos adversos da contínua exposição do RN ao ruído (Caple & Hurst, 2016), bem como nos seus pais e nos profissionais que trabalham em neonatologia (Pineda et al., 2017).

Numa UCIN coexistem diversas fontes de ruído, sendo que o fator humano e os equipamentos são considerados como as principais fontes de ruído, o que torna o ambiente stressante, sendo reconhecido que muito desse ruído pode ser evitado ou minimizado, com recurso a medidas simples e de baixo custo (Marques, 2014). A consciencialização dos profissionais de saúde e a sua formação nesta matéria são importantes, no sentido da implementação de medidas preventivas e/ou corretivas para o controlo acústico ambiental (Carvalhais, Santos, Coelho, Xavier, & Silva, 2016). Como referem Santana et al. (2015), apenas com uma política de educação continuada e com o envolvimento de todos os profissionais se poderão repercutir os efeitos no ambiente da UCIN.

Degorre et al. (2017) referem que a inexistência de monitorizações sistemáticas do nível de ruído não permite o seu controlo e é um fator não favorecedor da implementação e manutenção de medidas para a redução dos níveis de ruído.

O interesse deste estudo relaciona-se com a importância de promover um ambiente que potencie a estabilidade fisiológica do RN e diminua o impacto negativo do ambiente, otimizando o seu crescimento e desenvolvimento e que simultaneamente proporcione o bem-estar da família e dos profissionais de saúde. Tem como finalidade a sensibilização para a promoção da redução do ruído e sustentação de um programa de redução do ruído numa UCIN.

O objetivo deste estudo consiste em identificar a perceção dos profissionais de saúde sobre o ruído em neonatologia.

 

Enquadramento

A preocupação pela manutenção dos níveis de ruído adequados não é uma questão atual. De facto, a exigência do silêncio nos ambientes hospitalares é uma das tradições mais antigas no cuidado à pessoa doente (Agência Nacional de Vigilância Sanitária [ANVISA], 2015) e a questão do controlo do ruído hospitalar encontra-se, atualmente, englobada no manual de standards dos hospitais (Direção-Geral da Saúde. Departamento da Qualidade na Saúde, 2016). Existem recomendações de distintas entidades para valores aceitáveis ou ideais de níveis de pressão sonora para ambientes hospitalares e também para serviços de neonatologia. White, Smith, e Shepley (2013) e Reeves-Messner e Spilker (2017) recomendam que valores de ruído entre 46-50 decibéis (dB) não devem ocorrer em mais de 10% do tempo em cada hora e que o nível de pressão sonora máximo (Lmáx) não deve exceder os 65 dB, podendo apenas verificar-se estes valores em picos de ruído instantâneos.

Apesar destas recomendações, constata-se a existência de níveis de ruído excessivos nas unidades de neonatologia, com valores superiores aos recomendados. Em média, estudos realizados em neonatologia apresentam valores de ruído entre 10 a 40 dB acima dos valores recomendados (Reeves-Messner & Spilker, 2017). Para além de níveis de pressão sonora elevados, o período temporal em que estes decorrem e as fontes de ruído, merecem especial atenção e constituem grande preocupação.

O choro do RN no interior da incubadora pode ocasionar ruído entre 81 a 87 dB e daí a importância de promover o seu conforto, de modo a diminuir ao máximo os episódios de choro e de atender logo que possível ao choro do mesmo, bem como aos alarmes de monitores e equipamentos (Reeves-Messner & Spilker, 2017).

As atitudes humanas são igualmente identificadas como uma das principais fontes de ruído, sendo reconhecido que constituem 50% das fontes que produzem ruído (Daniele, Pinheiro, Kakehashi, & Balieiro, 2012). A elevada quantidade de pessoas que permanecem na UCIN, tais como profissionais de saúde e pais, está também associada a alterações significativas no nível de ruído, sendo apontadas ainda as conversas das visitas, a utilização dos telefones e a passagem de turno das equipas de enfermagem e médica, podendo estas ocasionar sons em torno dos 55,2 a 75,7 dB (Correia, Mendonça, & Souza, 2014).

Outras fontes de ruído que concorrem para o aumento do ruído ambiental estão relacionadas com as fontes de oxigénio e ar comprimido, humidificadores de oxigénio em funcionamento, aspirador por vácuo (Correia et al., 2014) e a utilização de fornecimento de oxigénio ao RN por cânula nasal (Pineda et al., 2017).

Apesar de ter sido considerada um microambiente ideal para o RN durante muito tempo, atualmente a incubadora levanta questões relacionadas com a sua capacidade de proteção, nomeadamente no que respeita ao ruído. De facto, a incubadora funciona parcialmente como barreira acústica dos sons ambientais exteriores, mas os sons produzidos pelo seu próprio funcionamento e pelas atividades realizadas ao RN no seu interior, bem como a manipulação das mesmas e a colocação de objetos na sua cúpula, a abertura e fecho das suas portas ao aceder ao RN, os eventuais alarmes da incubadora e a conversação perto da mesma, provocam ruído e ampliam-no (Correia et al., 2014). A este propósito, os mesmos autores acrescentam que o funcionamento do próprio motor da incubadora pode gerar sons de cerca de 50 dB. Ainda o tipo de materiais utilizados nos pavimentos é responsável pelo ruído se não possuírem uma adequada qualidade de absorção sonora (Agência Nacional de Vigilância Sanitária [ANVISA], 2015).

 

Questões de investigação

Qual a perceção dos profissionais de saúde sobre o ruído em unidades de neonatologia?

 

Metodologia

Estudo quali-quantitativo e descritivo, com uma amostra não probabilística, constituída por 52 profissionais de saúde, sendo 55,8% enfermeiros, 26,9% médicos, 13,5% assistentes operacionais e 3,8% outros profissionais a exercerem funções no serviço de neonatologia (estes incluem um fisioterapeuta e um assistente técnico). Consideraram-se como critérios de inclusão: desempenharem funções regulares no serviço de neonatologia, e estarem presentes na unidade durante o período de realização do estudo. O estudo obteve o parecer favorável da Comissão de Ética do Hospital da área do grande Porto da região Norte de Portugal (Parecer nº. 41/2017). Para a recolha de dados, a investigadora deslocou-se à unidade e entregou um envelope a cada um dos participantes contendo o questionário e o consentimento informado. Após o preenchimento, foi devolvido ao enfermeiro-chefe e médico responsável da unidade, que o entregou à investigadora, num envelope fechado e sem identificação, para assegurar a anonimização dos participantes. O estudo decorreu entre junho e agosto de 2017.

O instrumento de recolha de dados utilizado foi um questionário ad-hoc com questões de caracterização sociodemográfica e escala de Likert com cinco níveis, sendo 1 o menor valor e 5 o maior valor, para identificar a perceção dos profissionais de saúde sobre o ruído em neonatologia, incluindo: o ruído global e conforto acústico na unidade; influência do ruído no estado atual do RN; implicações no seu desenvolvimento; efeitos na saúde dos pais/familiares e nos profissionais; o incómodo do ruído no desempenho profissional; conhecimentos sobre a temática do ruído e dos decibéis recomendados; preocupação com o ruído; contribuição do comportamento e possibilidade de redução do ruído. Estabeleceu-se uma codificação destas questões e definiram-se dois grupos de coorte, tornando as variáveis dicotómicas, de modo a proporcionar uma leitura e análise global das respostas através do teste binomial. Foi realizado um pré-teste a seis profissionais de saúde da unidade de neonatologia, o qual refletia a diversidade da amostra: um médico, quatro enfermeiros e um assistente operacional. No final do pré-teste foi efetuada uma entrevista que permitiu clarificar alguns conceitos nas questões.

O instrumento continha também questões abertas, tendo sido efetuada a análise de conteúdo das respostas de acordo com Bardin (2016).

Para a análise dos dados recorremos ao programa IBM SPSS Statistics, versão 24.0 de 2016 para Windows. O nível de significância estabelecido foi de 5% (p = 0,05).

 

Resultados

Caracterização sociodemográfica

Os profissionais de saúde são na sua maioria do sexo feminino (90,4%), com idades compreendidas entre os 25 e os 60 anos (M = 40,94 ± 10,32 anos). Verificou-se que metade possuía até 38 anos de idade (Md = 38). Verificou-se que a maior parte são enfermeiros (55,8%), 26,9% são médicos, 13,5% são assistentes operacionais e 3,8% são outros profissionais/técnicos, sendo que destes um é fisioterapeuta e um é assistente técnico. O tempo de experiência profissional varia entre 2 e 39 anos (M = 17,06 ± 9,75 anos) e 40,4% possuem experiência = 21 anos. A experiência em neonatologia varia entre 6 meses e 30 anos (M = 12,42 anos ± 9,17).

Perceção sobre o ruído em neonatalogia

Para apurar a perceção dos profissionais sobre o ruído em neonatologia foram estudadas as variáveis conforme a Tabela 1 e verificou-se que os valores mínimos oscilam entre 1 e 3, com valores médios superiores nos “efeitos na saúde dos profissionais” (M = 4,42 ± 0,54), na “influência no estado clínico atual do RN” e “implicações no desenvolvimento do RN” (M = 4,12 ± 0,68) e menores nos “conhecimentos relativos aos dB recomendados” (M = 2,29 ± 0,75) e “conhecimentos relativos à temática do ruído” (M = 2,77 ± 0,51).

Ruído global e conforto do ambiente acústico da unidade

Constatou-se que a maior parte da amostra (77%) considera a unidade de neonatologia ruidosa, com diferenças estatisticamente significativas (Binomial p = 0,000). São os enfermeiros que apresentam maior perceção de ruído na unidade (OM = 30,17) e os assistentes operacionais são o grupo profissional com menor perceção do nível de ruído (OM = 16,71). Existem diferenças estatisticamente significativas entre a perceção do nível de ruído na unidade e o grupo profissional (X2 = 7,717; p = 0,021). São os que possuem experiência profissional = 21 anos que apresentam maior perceção de ruído na unidade (OM = 27,76), não se verificando diferenças estatisticamente significativas (X2 = 0,365; p = 0,833).

Relativamente ao “conforto do ambiente acústico da unidade”, a maior parte dos profissionais (54%) consideram-no desconfortável, não se verificando diferença estatisticamente significativa pelo teste binomial (p = 0,678).

A sala da unidade de neonatologia considerada como mais ruidosa foi a sala A (51,9%), seguida da opção todas igualmente ruidosas com 36,5%. Quanto ao turno em que existe maior nível de ruído, a maior parte da amostra (96,2%) reconheceu o turno da manhã como o mais ruidoso. Nenhum profissional referiu o turno da noite como sendo o mais ruidoso.

Quanto às fontes que provocam maior ruído na unidade de neonatologia (sendo 1 para a menor fonte de ruído e 5 para a maior fonte de ruído), constatou-se que 42,3% dos profissionais consideraram os equipamentos (M = 3,63 ± 1,509). Por ordem decrescente aparecem as conversas entre os elementos da equipa (M = 3,48 ± 1,20), a prestação de cuidados/procedimentos (M = 2,73 ± 1,27), seguido das visitas de familiares (M = 2,60 ± 1,332) e finalmente o telefone/telemóveis (M = 2,56 ± 1,420).

Foi questionado aos participantes se consideravam existir outras fontes de ruído para além das enunciadas na questão fechada. Das respostas destacam-se as seguintes: campainha da unidade, rádios existentes na unidade, telefone do serviço, cestos do lixo e cestos da roupa, choro do RN, abrir e fechar portas, abrir e fechar gavetas e armários e a manipulação de materiais.

Influência do ruído no estado atual do RN e implicações no seu desenvolvimento

Verificou-se que a maior parte dos respondentes (87%) tem perceção da “influência do ruído no estado clínico atual do RN” (M = 4,12 ± 0,68; Mo = 4) e 90% perceção das “implicações no desenvolvimento do RN” (M = 4,12 ± 0,68), verificando-se pelo teste binomial diferenças estatisticamente significativas entre grupos em ambas as variáveis (p = 0,000).

Efeitos na saúde dos pais/familiares e nos profissionais de saúde

Constatou-se que a maior parte dos profissionais de saúde (77%) possui perceção dos “efeitos do ruído na saúde e bem-estar dos pais/familiares” (M = 3,81 ± 0,79) e 100% acreditam que existem “efeitos na saúde dos profissionais” (M = 4,42 ± 0,54) com diferenças estatisticamente significativas pelo teste binomial (p = 0,000).

Incómodo do ruído no desempenho profissional

Para a totalidade da amostra, o ruído incomoda no desempenho das suas funções (M = 3,71 ± 0,61).

Conhecimentos relativos à temática do ruído em Neonatologia e dB recomendados

Relativamente à autoavaliação dos “conhecimentos sobre a temática do ruído”, constatou-se que 73% referem possuir um nível adequado de conhecimentos (M = 2,77 ± 0,51), verificando-se pelo teste binomial diferenças estatisticamente significativas entre os que referem possuir um nível adequado de conhecimentos e os que referem não possuir (p = 0,001).

No que concerne aos “conhecimentos relativos aos valores de dB recomendados” para uma UCIN, verificou-se que a maior parte da amostra (58%) apresenta poucos conhecimentos sobre os valores de dB recomendados (M = 2,29 ± 0,75) e pelo teste binomial não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre os profissionais de saúde que reconhecem um adequado nível de conhecimentos sobre os valores de dB recomendados em oposição ao grupo que não reconhece (adequado nível de conhecimentos; p = 0,332).

Perceção se o ruído é superior ao recomendado

Verificou-se que a maioria (98%) considera que o nível de ruído existente na unidade ultrapassa os valores recomendados para uma unidade com estas características (M = 3,63 ± 0,56), com diferenças estatisticamente significativas entre o grupo de profissionais que consideraram que o ruído é superior aos valores recomendados e os que não consideraram (binomial p = 0,000).

Preocupação com o ruído

Relativamente à perceção dos profissionais sobre a “preocupação com o ruído” na unidade, verificou-se que a maior parte dos inquiridos (90%) referiram que se preocupam em algum momento com o ruído existente na unidade (M = 3,17 ± 0,62), verificando-se pelo teste binomial diferenças estatisticamente significativas com o grupo que não se preocupa com o ruído (p = 0,000).

Contribuição do comportamento dos profissionais

Quando questionados sobre a contribuição do seu comportamento para o ruído na unidade de neonatologia a maior parte dos profissionais refere que o seu comportamento contribui para o ruído na unidade (M = 2,88 ± 0,51). Pelo teste binomial verificaram-se diferenças estatisticamente significativas entre o grupo de profissionais que considera que o seu comportamento não influencia o ruído na unidade (19%) e os que consideram que em algum momento o seu comportamento condiciona o ruído (81%; p = 0,000).

Possibilidade de redução do ruído

Quando inquiridos sobre a “possibilidade de redução do ruído na unidade” de neonatologia (M = 3,94 ± 0,54), a totalidade da amostra refere ser possível reduzir (100%).

Sugestões para melhorar os níveis de ruído na unidade de neonatologia

Da análise de conteúdo efetuada à questão aberta sobre as sugestões para a redução do ruído na unidade de neonatologia emergiram três categorias: Recursos humanos, Recursos materiais e Estrutura física (Tabela 2). As expressões dos respondentes são na sua maioria referentes à categoria dos Recursos humanos e às subcategorias de Sensibilização e formação sobre o tema, Alteração de procedimentos, Alteração de comportamentos e Liderança. Podem constatar-se alguns excertos das respostas: “Formação dos profissionais de saúde e sensibilização para o silêncio” (Q12); “Formação na área” (Q42); “Sensibilização dos pais e familiares do RN no sentido de falarem mais baixo” (Q32); “Colocação de sinal luminoso que acende sempre que o limite do ruído seja ultrapassado” (Q1); “Silenciar os alarmes rapidamente” (Q11); “Não colocar objetos em cima das incubadoras” (Q11, Q40); “nada se consegue sem boas lideranças com encorajamento dos que pretendem mudar para melhor” (Q40).

Na categoria referente aos Recursos materiais emergiram as subcategorias de Otimização dos alarmes e Melhoria de outros materiais de apoio. Foram apontadas sugestões que passam por “Retificar com maior frequência volume de alarmes do equipamento” (Q4; Q36); “Trocar alguns equipamentos que por si só provocam barulho como abrir e fechar o contentor de lixo” (Q30); “Na campainha da porta de acesso à unidade pôr sinal luminoso ou menos intenso” (Q26). A Estrutura física foi ainda outra categoria que emergiu, sendo que os inquiridos referiram estratégias relacionadas com a melhoria da gestão e sonoridade dos espaços: “A sala de pausa de refeições dos profissionais deveria ser noutro sítio” (Q14); “Melhorar o isolamento sonoro das salas” (Q3; Q14).

 

Discussão

O objetivo do estudo consistiu em identificar a perceção dos profissionais de saúde sobre o ruído em neonatologia, através de um questionário ad-hoc.

Na análise da perceção sobre o ruído global verificou-se que 77% consideram a unidade de neonatologia ruidosa, com algum grau de incómodo no desempenho das suas funções (100%) e noção de desconforto relativo ao conforto acústico da unidade (54%). Tais resultados indicam, à semelhança do estudo de Carvalhais et al. (2016), que há um desconforto no ambiente da unidade, identificando o ruído como um agente perturbador e com impacto negativo durante e após o trabalho.

Relativamente aos efeitos do ruído, tal como Daniele et al. (2012), constatatou-se que a maioria dos inquiridos considera existir influência no estado atual do RN, no seu desenvolvimento e também nos pais e nos profissionais de saúde. De facto, a exposição do RN a níveis de ruído elevados pode ocasionar efeitos adversos na estabilidade fisiológica e neurodesenvolvimento. Pode contribuir para alterações auditivas e comportamentais, influenciando negativamente a recuperação, com consequente aumento do tempo de internamento (Correia et al., 2014).

Verificou-se que a maioria dos profissionais de saúde (73%) reconhece possuir conhecimentos adequados sobre a temática do ruído, contudo, tal como no estudo de Daniele et al. (2012), a maioria (58%) apresenta poucos conhecimentos sobre os valores de dB recomendados para a UCIN. Não obstante, a maior parte dos profissionais (98%) considera que a unidade ultrapassa os níveis de ruído recomendados, parecendo estar consciente da necessidade de intervenção de controle/redução do ruído na unidade (Degorre et al., 2017; Santana et al., 2015).

Constatou-se que 23,1% dos profissionais indicam que a maioria das vezes existe preocupação com o ruído e 65,4% referem que por vezes se preocupam. Apesar do ruído causar preocupação em algum momento, maioritariamente (81%) referem que o seu comportamento contribui de alguma forma para o ruído na unidade. Daniele et al. (2012) concluíram que os profissionais de saúde tentavam não provocar ruído, mas que a falta de conhecimento sobre os níveis recomendados e a ausência de monitorizações de ruído regulares na unidade, não contribuíam para a manutenção de atitudes pró-ativas e duradouras.

São os enfermeiros que possuem maior perceção do ruído e os que apresentam menor perceção são os assistentes operacionais. Sabe-se que a formação dos enfermeiros exige a aquisição de competências e responsabilidades que lhes permitam proporcionar cuidados centrados no desenvolvimento, com medidas para controlar o ruído (Ferraz, 2017).

Apurou-se também que os elementos com = 21 anos de experiência profissional apresentam maior perceção do ruído, não obstante, não terem sido verificadas diferenças estatisticamente significativas. Daniele et al. (2012) também verificaram que os que possuem maior experiência apresentam maior noção de ruído, mas com diferenças estatisticamente significativas.

Sobre as fontes de ruído, os profissionais referiram maioritariamente o ambiente da unidade e nomearam os equipamentos e o choro do RN, resultados também encontrados no estudo de Daniele et al. (2012). Indicaram ainda a prestação de cuidados/procedimentos, o telefone/telemóveis e os rádios da unidade, dados que confirmam o estudo de Correia et al. (2014) e de Carvalhais et al. (2016) que constataram que 55,8% dos profissionais reportaram os equipamentos como principal fonte de ruído, seguido da conversa entre os elementos da equipa. Os profissionais terem reconhecido a influência do seu comportamento e atividades relacionadas com os cuidados, no ruído da unidade, constitui-se como um importante aspeto de reflexão.

Relativamente às sugestões para melhorar o ruído, emergiram três grandes categorias que compreendem um conjunto de ações interdependentes dirigidas aos Recursos humanos, Recursos materiais e Estrutura física. As intervenções no âmbito dos Recursos humanos são as mais apontadas, nomeadamente a sensibilização e formação dos profissionais e dos pais sobre o tema do ruído no sentido de serem elementos pró-ativos no processo de mudança dos níveis de ruído na unidade. Carvalhais et al. (2016) referem que a formação da equipa no sentido da adoção de comportamentos favorecedores do controlo de ruído na unidade é essencial e deve ser encarado como o primeiro passo para a implementação de um programa de redução de ruído na UCIN. É reconhecido que as mudanças estruturais e comportamentais podem alterar de forma significativa o nível de ruído da UCIN, sendo nestas últimas que podemos atuar de forma imediata (Correia et al., 2014; Marques, 2014). Nas mudanças comportamentais foram apontadas medidas simples e tão importantes para o ambiente na UCIN, tais como falar mais baixo, remoção ou cuidados na utilização dos rádios da unidade, diminuição da conversa nas salas de cuidados, não utilização de telemóveis dentro da unidade, resposta mais rápida aos alarmes dos equipamentos e cuidados na manipulação de materiais e equipamentos. Estas sugestões são idênticas às encontradas por Carvalhais et al. (2016), acrescidas da limitação do número de visitas e de mais silêncio nas passagens de turno. Dinis e Rabiais (2017) concluem que o excesso de alarmes e falsos alarmes poluem o ambiente sonoro e reduzem a taxa de resposta aos alarmes, aumentando o ruído.

Relativamente à alteração de procedimentos, foram referidos cuidados na recolha de lixo, gestão do número de pessoas na unidade e diminuição da iluminação das salas.

O facto de diminuir a iluminação na sala tem sido associado a mais baixos níveis de ruído, observando-se que, com esta estratégia, tendencialmente as pessoas falam mais suavemente (Daniele et al., 2012).

Apenas com uma política de educação continuada e com o envolvimento de todos os profissionais na busca de soluções para o problema se poderão repercutir efeitos no ambiente da UCIN, transformando a realidade existente (Santana et al., 2015; Marques, 2014). Neste sentido, a referência pelos profissionais da necessidade de uma boa liderança, da necessidade e vigilância dos comportamentos e alertas ou incentivos dos mesmos significa que seriam importantes no âmbito de uma cultura de silêncio que se pretende que seja assumida por todos.

À semelhança do estudo de Carvalhais et al. (2016), foi reconhecido que a substituição de materiais metálicos por outros de plástico, pode auxiliar na redução do ruído.

Na estrutura física, as sugestões evocam alterações no isolamento sonoro das salas e organização do espaço. Apesar da estrutura física ser muito importante no controlo e redução do ruído da UCIN, por si só não é suficiente, sendo necessário uma cultura vocacionada para a redução do ruído (Santana et al., 2015).

Como limitações, considerou-se que o tamanho da amostra é reduzido, no entanto estudar uma unidade específica e envolver todos os profissionais da equipa foi uma excelente oportunidade não só para sensibilizar para as questões do ruído na UCIN, mas também uma forma dos profissionais reportarem a sua perceção e refletirem sobre as práticas e o seu contexto, fundamental para as mudanças estruturais, comportamentais e organizacionais necessárias.

 

Conclusão

Constata-se que os profissionais de saúde consideram a UCIN maioritariamente ruidosa, pouco confortável e revelaram algum grau de incómodo relativamente ao conforto acústico do ambiente. A maior parte dos inquiridos reconhece os efeitos nefastos do ruído no RN, mas também nos pais, apesar de reconhecerem como mais evidentes as implicações nos profissionais de saúde. Os profissionais inquiridos referem que o seu comportamento contribui de alguma forma para o ruído global da unidade, evidenciando algumas lacunas a nível de conhecimentos dos valores recomendados para uma UCIN. Apesar de considerarem que possam existir na sua unidade níveis de ruído superiores aos recomendados, referem que é possível reduzir o ruído.

Os profissionais identificaram os equipamentos como a principal fonte de ruído, seguido da conversa entre os elementos da equipa. Na resposta aberta sobre esta questão enunciaram os dispositivos e materiais onde destacam os cestos do lixo, a campainha e o telefone da unidade.

O grupo profissional influencia a perceção de ruído na unidade, sendo os enfermeiros os que apresentam maior perceção. A experiência profissional influencia a perceção, sendo os que apresentam mais anos de serviço os que possuem maior perceção sobre o ruído na unidade.

Este estudo revela-se importante pela sensibilização dos profissionais de saúde que trabalham em unidades de neonatologia. Considerou-se imperativo a implementação de medidas que promovam um ambiente acusticamente mais confortável, contribuindo para o bem-estar do RN, pais e profissionais de saúde. A implementação de estratégias de diminuição/controlo do ruído deverá incidir em diferentes âmbitos, tais como os Recursos humanos, Recursos materiais e Estrutura física. Sabe-se que intervir no ambiente acústico da UCIN envolve custos, tempo, paciência e trabalho em equipa pelo que se sugere iniciar por uma análise SWOT (Strenghts, Weaknesses, Opportunities, Threats) elaborada pelos profissionais do serviço. Importa também investir na formação da equipa multidisciplinar de forma a delinear e consciencializar para a adoção de intervenções eficazes de controlo do ruído. Este estudo foi acompanhado por uma monitorização dos valores do ruído na unidade cujos dados serão tidos em conta na abordagem destas sugestões.

Sugere-se ainda a exploração desta temática sobre o ruído em neonatologia em futuras investigações, com monitorização no interior das incubadoras.

 

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Recebido para publicação em: 27.11.18

Aceite para publicação em: 11.02.19

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