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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.20 Coimbra mar. 2019

https://doi.org/10.12707/RIV18073 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

RESEARCH PAPER (ORIGINAL)

 

Construir a confiança para o parto: avaliação de um programa de intervenção em enfermagem

Building trust to childbirth: assessment of a nursing intervention programme

Construir la confianza para el parto: evaluación de un programa de intervención en enfermería

 

Ana Paula Prata Amaro de Sousa*
https://orcid.org/0000-0001-7552-9716

Célia Samarina Vilaça de Brito Santos**
https://orcid.org/0000-0001-9198-2668

Maria Margarida Reis Santos Ferreira***
https://orcid.org/0000-0002-7948-9317

 

* Ph.D., Professora Adjunta, Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072, Porto, Portugal [prata@esenf.pt]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica; recolha de dados; tratamento e avaliação estatística; análise de dados e discussão, escrita do artigo. Morada para correspondência: Rua Dr. António Bernardino de Almeida, 4200-072, Porto, Portugal.

** Ph.D., Professora Coordenadora, Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072, Porto, Portugal [celiasantos@esenf.pt]. Contribuição no artigo: análise de dados e discussão, escrita do artigo.

*** Ph.D., Professora Coordenadora, Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072, Porto, Portugal [mrs@esenf.pt]. Contribuição no artigo: análise de dados e discussão, escrita do artigo.

 

RESUMO

Enquadramento: A autoeficácia da mulher durante o trabalho de parto influencia a forma como este é percebido e afeta a sua satisfação com a experiência de parto. Vários estudos demonstraram ser necessário que a preparação para o parto incorpore e reforce este conceito.

Objetivo: Avaliar a eficácia do programa Construir a Confiança para o Parto na perceção de autoeficácia das grávidas para lidarem com o trabalho de parto.

Metodologia: Estudo longitudinal, quasi-experimental, pré e pós-teste, com medidas repetidas. Realizado numa instituição do Norte de Portugal. Amostra de 66 grávidas no grupo experimental e 55 no grupo controlo. Utilizado o Questionário de Autoeficácia no Trabalho de Parto.

Resultados: As expetativas de autoeficácia aumentaram de forma extremamente significativa ao longo do tempo no grupo experimental (F(1,81; 118) = 37,26; p = 0,000). Não se encontraram diferenças com significado estatístico entre os grupos (F(1; 119) = 3,39; p = 0,068).

Conclusão: O programa promoveu um aumento significativo da autoeficácia da grávida para lidar com o trabalho de parto, embora sem diferenças significativas com o grupo controlo.

Palavras-chave: educação pré-natal; trabalho de parto; autoeficácia; enfermeiras obstétricas

 

ABSTRACT

Background: The self-efficacy of the woman during labor influences its perception and affects her satisfaction with the childbirth experience. Several studies have shown that childbirth preparation classes need to integrate and reinforce this concept.

Objective: To assess the effectiveness of the Build Trust to Childbirth programme in the perception of labor self-efficacy of pregnant women.

Methodology: Longitudinal, quasi-experimental study, with pre- and post-test with repeated measures. Conducted in an institution of northern Portugal. Sample of 66 pregnant women in the experimental group and 55 in the control group. The Childbirth Self-Efficacy Inventory was used.

Results: The self-efficacy expectations increased very significantly over time in the experimental group (F(1.81; 118) = 37.26; p = 0.000). There were no statistically significant differences between the groups (F(1; 119) = 3.39; p = 0.068).

Conclusion: The programme promoted a significant increase in labor self-efficacy of the pregnant woman, with no significant differences with the control group.

Keywords: prenatal education; labor, obstetric; self efficacy; nurse midwives

 

RESUMEN

Marco contextual: La autoeficacia de la mujer durante el parto influye en la forma como este se percibe y afecta a su satisfacción con la experiencia del parto. Varios estudios demostraron que es necesario que la preparación para el parto incorpore el refuerzo de este concepto.

Objetivo: Evaluar la eficacia del programa Construir la Confianza para el Parto en la percepción de la autoeficacia de las embarazadas para lidiar con el trabajo del parto.

Metodología: Estudio longitudinal, cuasiexperimental, pre y postest, con medidas repetidas. Se realizó en una institución del norte de Portugal. La muestra estuvo formada por 66 embarazadas en el grupo experimental y 55 en el grupo de control. Se utilizó el Cuestionario de Autoeficacia en el Trabajo del Parto.

Resultados: Las expectativas de autoeficacia aumentaron de forma extremadamente significativa a lo largo del tiempo en el grupo experimental (F(1,81; 118) = 37,26; p = 0,000). No se encontraron diferencias con significado estadístico entre los grupos (F(1; 119) = 3,39; p = 0,068).

Conclusión: El programa promovió un aumento significativo de la autoeficacia de la embarazada para lidiar con el trabajo del parto, aunque sin diferencias significativas con el grupo de control.

Palabras clave: educación prenatal; trabajo de parto; autoeficacia; enfermeras obstetrices

 

Introdução

A preparação para o parto, em Portugal, é considerada um direito, explanado na Lei nº 142/99 de 31 de agosto (1999). Configura-se como uma intervenção útil na preparação da mulher/casal, sendo o seu principal objetivo ensinar à grávida/casal técnicas que apoiam a utilização de estratégias de coping adequadas à gestão do trabalho de parto. Apesar de já ser efetuada em várias instituições de saúde do nosso país há vários anos, a sua eficácia não se encontra comprovada na promoção da autoeficácia para lidar com o trabalho de parto.

A teoria cognitivo-comportamental tem enfatizado a importância dos profissionais de saúde conhecerem e atuarem sobre os pensamentos, as emoções, os comportamentos e as atitudes dos utentes, para contribuir para o controlo da dor, do bem-estar e da adaptação dos indivíduos (Prata, 2016; Zinken, Cradock, & Skinner, 2008). Relativamente ao parto, os estudos demonstram que a autoeficácia influencia a forma como este é percebido, recomendando os autores que as sessões de preparação para o parto (PPP) incorporem e reforcem a teoria de autoeficácia no seu curriculum (Ip, Chan, & Chien, 2005; Cunqueiro, Comeche, & Docampo, 2009; Prata, 2016).

Considera-se que as sessões de PPP contribuem para empoderar a mulher/casal, pois contribuem para a aquisição de informação sobre trabalho de parto e parto, delineamento de objetivos realistas, aprendizagem de estratégias de coping para a gestão da dor, e concorrem para a tomada de decisão informada e obtenção de um sistema de apoio adequado de outras pessoas significativas e de profissionais de saúde. Entender a perceção de autoeficácia da mulher no pré-parto pode ajudar os profissionais de saúde a prepararem adequadamente a grávida para o parto e, dessa forma, contribuírem para a promoção de uma experiência de parto mais positiva (Prata, Santos, & Reis Santos, 2009).

A autoeficácia foi aplicada em diversos estudos de investigação sobre confiança materna e resultado do parto (Ip et al., 2005; Cunqueiro et al., 2009), contudo, em Portugal não se encontraram estudos sobre a promoção da autoeficácia na gravidez nem sobre a sua influência na satisfação com o parto.

Neste sentido, e para promover a autoeficácia no trabalho de parto e parto, foi desenvolvido o programa Construir a Confiança para o Parto (CCpP).

O presente estudo teve como objetivo avaliar a eficácia do programa CCpP na perceção de autoeficácia das grávidas para lidar com o trabalho de parto.

 

Enquadramento

O programa de intervenção CCpP foi desenvolvido com base na teoria da autoeficácia de Albert Bandura, na filosofia Lamaze para o século XXI e no modelo de promoção da saúde de Nola Pender, após se ter efetuado uma revisão da literatura e dois estudos: um exploratório, de cariz qualitativo, com o objetivo de identificar um conjunto de intervenções de enfermagem adequadas à promoção da autoeficácia no trabalho de parto e um estudo de consensos, de cariz quantitativo, com o objetivo de validar a relevância e aplicabilidade das intervenções identificadas (Prata, 2016).

A teoria social cognitiva de Albert Bandura expõe que as crenças de autoeficácia, relevantes para a proteção da resposta fisiológica ao stresse (Pereira & Almeida, 2004), são originadas pelos significados que as pessoas atribuem à informação que obtêm através de experiências pessoais de sucesso, observação do desempenho dos outros, persuasão verbal e perceção dos estados somáticos e emocionais (Bandura, 1997; Pajares, 2002; Pereira & Almeida, 2004; Baptista, Santos, & Dias, 2006; Zinken et al., 2008). São crenças pessoais acerca da capacidade para ultrapassar os obstáculos, contudo não basta que as capacidades estejam presentes, a pessoa tem de acreditar que as possui e que, por isso, consegue concretizar determinada linha de ação (Prata et al., 2009). A autoeficácia no trabalho de parto e parto inclui as expetativas de autoeficácia (avaliação da grávida acerca da sua capacidade para realizar um determinado comportamento na fase ativa do trabalho de parto e no período expulsivo), essenciais nos momentos da autorregulação do comportamento relativo à saúde, e às expetativas de resultado (avaliação da grávida de que esse comportamento leva a um determinado resultado nas duas fases de trabalho de parto), importantes para a formação da intenção (Pereira & Almeida, 2004).

A filosofia Lamaze declara a normalidade do nascimento, reconhece a capacidade inerente à mulher de parir e promove as práticas para um nascimento saudável (Lamaze International, 2013). De acordo com esta filosofia, a mulher em trabalho de parto deve estar rodeada de profissionais de saúde e de familiares que acreditem e que a ajudem a confiar na sua capacidade para ter o filho e a mobilizar-se livremente de forma a sentir-se confortável.

Ter o filho em segurança, encontrar conforto durante o trabalho de parto, elaborar um plano de parto, preparar para a tomada de decisão informada e para comunicar com os profissionais de saúde, melhorar o conhecimento sobre parto normal e apresentar a evidência científica, são objetivos dos programas de preparação para o parto baseados nesta filosofia (Romano & Lothian, 2008; Prata, 2016). O modelo de promoção da saúde de Nola Pender surgiu com o propósito de se compreender quais os determinantes do comportamento que deveriam ser a base para o aconselhamento em saúde. Segundo Pender (2011), este modelo está assente no princípio de que o indivíduo, de acordo com a sua natureza multidimensional, deve ser visto de forma holística. Fundamenta-se na teoria da expetativa-valor e na teoria social cognitiva, de Albert Bandura, sendo a autoeficácia uma das crenças pessoais incluídas nesta teoria, conceito central do modelo (Pender, 2011). Desta forma, afigura-se como um recurso útil na preparação da mulher/casal para a tomada de decisão e para a participação ativa no trabalho de parto e parto.

Estes pressupostos teóricos e as intervenções de enfermagem identificadas nos estudos realizados permitiram elaborar o programa CCpP, com o objetivo de promover a autoeficácia no trabalho de parto, e com a finalidade de possibilitar que a mulher obtenha uma maior satisfação com a experiência de parto.

É um programa centrado no cliente, pois reconhece os conhecimentos e capacidades inerentes à mulher para parir e valoriza as suas crenças. Apresenta, no seu desenvolvimento: uma abordagem comportamental, que tem em vista alterar as atitudes e os comportamentos das grávidas relacionados com o parto, de forma a encorajar um envolvimento ativo nesse processo; uma abordagem cognitiva, ajudando a grávida/casal a modificarem a sua forma de pensar, adotando atitudes positivas que visam aumentar a autoconfiança e a autoconsciência; e uma abordagem educacional e de empoderamento, que tem como objetivo informar e ensinar sobre autoeficácia e trabalho de parto, no sentido de facilitar as escolhas e a tomada de decisão informada de forma a promover a autoeficácia.

O programa, dirigido a grávidas/casais com 20 anos ou mais e com 28 ou mais semanas de gestação, desenvolve-se em duas sessões teóricas, quatro teórico-práticas, uma visita ao bloco de partos e um contacto individual. Cada sessão tem duração de 90 minutos e é de frequência semanal. As sessões integram até 12 participantes.

 

Questão de investigação

O programa CCpP é eficaz na promoção da autoeficácia das mulheres, para lidarem com o trabalho de parto?

 

Hipóteses

H1: A autoeficácia para lidar com o trabalho de parto aumenta significativamente nas grávidas que completaram o programa CCpP.

H2: As grávidas que completaram o programa CCpP reportam uma autoeficácia para lidar com o trabalho de parto significativamente maior que as grávidas que frequentaram as sessões standard.

 

Metodologia

Estudo de cariz quantitativo, longitudinal, quasi-experimental, pré e pós-teste, com medidas repetidas. Amostra não probabilística, de conveniência. Critérios de inclusão: estar grávida; ter 20 ou mais anos de idade; ter 28 ou mais semanas de gestação e querer participar na preparação para o parto, na instituição. Critérios de exclusão: ter programado cesariana eletiva; já ter efetuado preparação para o parto e não aceitar participar em todas as fases do estudo.

Das 246 grávidas que aceitaram participar no estudo, entre o 1º e o 2º momento de avaliação perderam-se 89 (36%), 36 do grupo experimental, e no 3º momento 36 (23%), 18 do grupo experimental. Os principais motivos de perda foram causas clínicas e não preenchimento do questionário no 3º momento de avaliação.

As participantes eram inscritas nas sessões de PPP de acordo com as suas disponibilidades. As que pretendiam realizar as sessões às terças e quintas-feiras integravam o grupo experimental, as outras eram alocadas ao grupo controlo.

A colheita de dados foi efetuada numa instituição da região Norte de Portugal, entre janeiro de 2011 e setembro de 2012, em três momentos: Pré-teste (M1) - recolha de dados realizada na consulta pré-natal, entre as 28 e 32 semanas de gestação, às participantes dos dois grupos, no momento da aceitação de participação na PPP; Pós-teste (M2) - entre as 37 e as 39 semanas de gestação, após participar na PPP (programa CCpP e curso de PPP, segundo o método psicoprofilático); Follow-up (M3) - 48 a 72 horas após o parto.

A implementação do programa CCpP foi realizada pela investigadora e por duas enfermeiras especialistas em saúde materna e obstetrícia da instituição, com experiência em preparação para o parto. No sentido de minimizar as diferenças de procedimento entre os vários elementos da equipa de investigação, realizou-se uma fase preparatória que teve como objetivos dar a conhecer o programa, o instrumento de recolha de dados e uniformizar conceitos. A avaliação foi efetuada por questionário, previamente entregue às participantes em envelope fechado e posteriormente devolvido no serviço.

Como instrumento de colheita de dados foi utilizado o Questionário de Autoeficácia no Trabalho de Parto (QAETP) de Nancy Lowe (1993), traduzido e adaptado para a população portuguesa por Neves (2010), tendo sido concedida autorização pelas duas autoras. Este instrumento consiste num questionário de autorrelato, com duas subescalas de 15 e 16 itens e uma grelha de resposta tipo Likert de 10 pontos. O score final resulta do somatório da pontuação das subescalas. Uma maior pontuação corresponde a uma maior perceção de autoeficácia. O estudo da consistência interna do QAETP revelou um valor do coeficiente alpha de Cronbach (baseado nos itens estandardizados) para a escala total de 0,96, e para cada subescala, valores que variavam entre 0,87 e 0,95. Estes resultados estão em sintonia com os valores encontrados por outros autores (Lowe, 1993; Howharn, 2008; Neves, 2010) e permitem afirmar que o QAETP concede confiança nos resultados, pois apresenta valores de consistência interna com fiabilidade elevada.

Com recurso a medidas de tendência central, de dispersão e aos testes paramétricos (t-Student para amostras independentes e emparelhadas e análise de variância e F- ANOVA, para medidas repetidas) foi efetuado o tratamento estatístico dos dados no programa IBM SPSS Statistics, versão 21.0, para Windows.

Todos as participantes assinaram o termo de consentimento informado e o estudo foi autorizado pelo Conselho de Administração após parecer positivo da Comissão de Ética da Instituição.

 

Resultados

A amostra constituiu-se por 121 grávidas, 66 no grupo experimental e 55 no grupo controlo. Eram maioritariamente casadas, tinham o ensino superior e uma idade que variou entre os 20 e os 41 anos no grupo experimental e controlo, sendo a média de 31,17 (DP = 4,28) e de 32,9 (DP = 4,14) anos, respetivamente. Quanto à equivalência dos grupos, verificou-se não haver diferença estatisticamente significativa.

No primeiro momento de avaliação (M1), pré-intervenção (Tabela 1), no que respeita às expetativas de resultado para a fase ativa do trabalho de parto (FATP), após aplicação do teste t de Student para amostras independentes, verificou-se não existirem diferenças estatisticamente significativas entre grupos (t (117,9) = -0,971; p = 0,334). Apurou-se, no entanto, que as grávidas do grupo controlo tinham em média expetativas de resultado para a FATP mais altas (M = 8,41; DP = 0,61) do que as participantes do grupo experimental (M = 8,29; DP = 0,81). No período expulsivo (PE; Tabela 1) foram, também, as grávidas do grupo controlo que apresentaram uma mais elevada expetativa de resultado (M = 8,58; DP = 1,08), não se observando, no entanto, diferenças estatisticamente significativas entre os grupos (t (119) = -1,23; p = 0,221).

Quanto às expetativas de autoeficácia na FATP (Tabela 2), as mulheres do grupo controlo apresentaram uma média mais alta (M = 7,60; DP = 1,40) do que as que integraram o grupo experimental, verificando-se haver diferença estatisticamente significativa entre os grupos (t (119) = -2,53; p= 0,013). As grávidas que pertenciam ao grupo controlo tinham uma expetativa de autoeficácia na FATP mais alta que as do grupo experimental. Relativamente às expetativas de autoeficácia no PE, a média foi de 6,63 (DP = 1,83) no grupo experimental e de 7,38 (DP = 1,03) no grupo controlo, tendo as participantes do grupo controlo uma expetativa de autoeficácia no PE significativamente mais alta do que as do grupo experimental.

Estes resultados levaram a inferir que as duas amostras em estudo eram equivalentes para todas as variáveis, com exceção das relativas às expectativas de autoeficácia.

No pós-teste (M2), a média relativamente às expetativas de resultado foi igual nos dois grupos (Tabela 3). Em contraste, apurou-se que a média das expetativas de autoeficácia no grupo controlo (M = 16,4; DP = 2,1) foi ligeiramente superior à do grupo experimental (M = 16,3; DP = 2,4). Observou-se, no entanto, que houve um maior aumento do valor da média das expetativas de autoeficácia no grupo experimental entre os dois momentos.

Relativamente à medição efetuada no follow-up (M3), a média das expetativas de resultado aumentou no grupo controlo (M = 17,6; DP = 1,7), tornando-se, tenuemente, superior à média do grupo experimental (M = 17,4; DP = 1,7). Da mesma forma, observou-se que a média das expetativas de autoeficácia no grupo controlo (M = 17,0; DP = 1,9) era superior à do grupo experimental (M = 16,4; DP = 2,7).

Para dar resposta à hipótese “A autoeficácia para lidar com o trabalho de parto aumenta significativamente nas mulheres que completaram o programa CCpP” efetuou-se o teste ANOVA para medidas repetidas, numa amostra de 66 participantes.

Os resultados evidenciaram que houve um aumento das expetativas de resultado ao longo do tempo, F(2; 130) = 6,01; p = 0,003. O teste post hoc Bonferroni revelou uma diferença estatisticamente significativa entre o pré-teste e o pós-teste (p = 0,008) e entre o pré-teste e o follow-up (p = 0,004), não se verificando diferenças significativas entre o pós-teste e o follow-up (p = 0,590).

No que diz respeito às expetativas de autoeficácia, não se verificou existir esfericidade, pelo que foi necessário corrigir o teste F de ANOVA, de acordo com o fator de correção de Greenhouse-Geisser. Os resultados comprovaram que houve um aumento extremamente significativo das expetativas de autoeficácia ao longo do tempo (F(1,81; 117,94) = 37,26; p = 0,000). De acordo com o teste post hoc Bonferroni as diferenças mais significativas ocorreram entre o pré-teste e o pós-teste (p = 0,000) e entre o pré-teste e o follow-up (p = 0,000), não se verificando diferenças significativas entre o pós-teste e o follow-up (p = 0,899).

Relativamente à hipótese “As grávidas que completaram o programa CCpP reportam uma autoeficácia para lidar com o trabalho de parto significativamente maior do das grávidas que assistiram às sessões standard”, efetuou-se o teste ANOVA para medidas repetidas, numa amostra de 121 participantes, 66 no grupo experimental e 55 no grupo controlo.

No que concerne às expetativas de resultado, apurou-se que houve um aumento das expetativas de resultado ao longo do tempo (F(2; 240) = 9,88; p = 0,000). As maiores diferenças observaram-se entre o pré-teste e o pós-teste (p = 0,003) e entre o pré-teste e o follow-up (p = 0,000). Não se verificaram diferenças significativas entre o pós-teste e o follow-up (p = 0,180).

As expetativas de resultado no grupo experimental não diferiram de forma significativa das do grupo controlo, verificando-se que o efeito do grupo não foi estatisticamente significativo (F(1; 119) = 0,96; p = 0,330). Apesar destes resultados, as expetativas de resultado foram afetadas de forma extremamente significativa ao longo do tempo no grupo experimental (F(2; 130) = 6,01; p = 0,003). No grupo controlo, as expetativas de resultado, apesar de também aumentarem de forma significativa (Tabela 4), o aumento só se tornou significante no pós-parto (p = 0,028).

 

 

A ANOVA para medidas repetidas, com a correção de Greenhouse-Geisser determinou que a média das expetativas de autoeficácia, na amostra, difere significativamente entre as três avaliações (F(1,79; 214,62) = 55,44; p = 0,000). O teste post hoc com correção de Bonferroni revelou que as diferenças mais significativas ocorreram entre o pré-teste e o pós-teste (p = 0,000) e entre o pré-teste e o follow-up (p = 0,000). Não se verificando diferenças significativas entre o pós-teste e o follow-up (p = 0,899).

De acordo com os grupos (Tabela 5), as expetativas de autoeficácia aumentaram de forma extremamente significativa ao longo do tempo no grupo experimental (F(1,81; 118) = 37,26; p = 0,000) e no grupo controlo (F(1,76; 95) = 21,23; p = 0,000). No entanto, entre os grupos não se encontraram diferenças com significado estatístico (F(1; 119) = 3,39; p = 0,068).

 

 

Discussão

A implementação do programa CCpP desenrolou-se de acordo com a estrutura e o planeamento previstos e o grupo de controlo efetuou o curso de preparação para o parto, segundo o método psicoprofilático, oferecido pela instituição onde se realizou o estudo.

Concluiu-se que as grávidas, no início do estudo, apresentavam uma elevada expetativa de resultado e de autoeficácia. Este resultado pode ser explicado pelo facto de a maioria das participantes ter expetativas realistas para o trabalho de parto, apresentar-se motivada para a frequência da PPP e procurar conhecimento e aquisição de competências para lidar com o trabalho de parto, o que é compatível com altas expetativas de resultado e de autoeficácia.

Quanto à avaliação do programa CCpP, os resultados demonstraram que promoveu um aumento significativo das expetativas de resultado ao longo do tempo, mantendo-se este efeito mesmo após o parto. Tal como referido por Howharn (2008), no estudo quasi-experimental que realizou com o objetivo de determinar a eficácia da PPP na autoeficácia para lidar com a dor de trabalho de parto, constatou-se que a informação e a prática de técnicas comportamentais e cognitivas para lidar com o trabalho de parto aumentaram as expetativas de resultado.

Nos três momentos de avaliação, apesar das expetativas de resultado terem aumentado de forma significativa, a sua evolução foi menor e sem significado estatístico entre o pós-teste (M2) e o follow-up (M3). No grupo controlo, a média das expetativas de resultado só aumentou significativamente após o parto. Estes resultados são contrários aos de Howharn (2008), que refere que no pós-parto há um decréscimo significativo das expetativas de resultado.

Quanto às expetativas de autoeficácia, comprovou-se que o programa CCpP promoveu um aumento significativo destas expetativas nos três momentos de avaliação, embora, também, menor e sem significado estatístico entre o pós-teste e o follow-up. A informação, a prática de técnicas não farmacológicas de alívio da dor de trabalho de parto, a construção do plano de parto, a partilha de experiências e a visita ao bloco de partos produziram efeitos nas expectativas de autoeficácia da grávida, resultados consistentes com os de outros investigadores (Lowe, 1993; Howharn, 2008).

Pode, assim, concluir-se que o programa promoveu um aumento da autoeficácia da grávida para lidar com o trabalho de parto, comprovando-se a primeira hipótese colocada.

Apesar do incremento na autoeficácia para lidar com o trabalho de parto, tanto no que diz respeito às expetativas de resultado, como às expetativas de autoeficácia, os resultados obtidos não permitiram concluir que as grávidas que completaram o programa CCpP reportavam uma autoeficácia para lidar com o trabalho de parto significativamente superior à das grávidas que assistiram às sessões standard.

O facto de na fase inicial as participantes do grupo controlo terem expetativas de autoeficácia significativamente mais elevadas do que as do grupo experimental, não permitiu afirmar que os resultados estatísticos se deviam aos efeitos do programa CCpP ou às características dos grupos, pelo que não se pôde confirmar a hipótese apresentada.

Relativamente às limitações metodológicas do estudo, considera-se que a extrapolação dos resultados deve ser efetuada com cuidado, pois os resultados obtidos podem não ser representativos para populações inseridas noutros contextos, devido ao facto de se ter optado por recolher dados numa única instituição. Sugere-se a replicação do programa CCpP em outros contextos, como por exemplo, nos cuidados de saúde primários, em clínicas privadas e, ainda, em outras regiões do país.

Apesar desta limitação, considera-se que a investigação permitiu obter resultados que são significativos para a população estudada e que têm implicações para a prática de enfermagem. Os resultados obtidos permitem ao enfermeiro de saúde materna e obstetrícia perceber a importância da autoeficácia para lidar com o trabalho de parto e as intervenções adequadas à sua promoção.

 

Conclusão

Vários autores demonstraram que a autoeficácia para lidar com o trabalho de parto influencia a forma como este é percebido, recomendando, por isso, que nas sessões de PPP ela seja incorporada e trabalhada com as grávidas. Não se tendo encontrado estudos, em Portugal, sobre esta temática, entendeu-se pertinente e útil realizar esta investigação, considerando que as mulheres/casais/famílias e os enfermeiros de saúde materna e obstétrica poderiam beneficiar dos seus resultados. Este estudo poder-se-á constituir uma mais-valia para as instituições de saúde, pois fruto de intervenções de enfermagem na maternidade centradas na mulher, pode conduzir a ganhos em saúde.

Com o programa CCpP foi possível aumentar, de forma significativa, as expetativas de resultado e de autoeficácia ao longo do tempo, mantendo-se este efeito mesmo após o parto. Concluiu-se que a informação veiculada e a prática de técnicas comportamentais e cognitivas para lidar com o trabalho de parto aumentaram as expetativas de resultado da grávida. A prática de técnicas não farmacológicas para alívio da dor de trabalho de parto, a construção do plano de parto, a partilha de experiências e a visita ao bloco de partos aumentaram as expetativas de autoeficácia das mulheres, persuadindo-as sobre a sua capacidade para efetuar tarefas relacionadas com o trabalho de parto.

Apesar do incremento das expetativas de resultado e de autoeficácia, os resultados obtidos não permitiram comprovar que as grávidas que completaram o programa CCpP apresentavam uma autoeficácia para lidar com o trabalho de parto significativamente superior ao das grávidas que assistiram às sessões standard.

Considera-se que este resultado pode ser devido ao facto de as participantes do grupo controlo apresentarem, à partida, expetativas de autoeficácia significativamente mais elevadas do que as do grupo experimental, o que não permite, com base segura, inferir se os resultados se devem às diferenças entre os grupos ou à intervenção propriamente dita. No entanto, apesar de não se poder avaliar o tamanho do efeito do programa CCpP na autoeficácia, considera-se que este produziu resultados na sua promoção para lidar com o trabalho de parto, pois após a intervenção e no follow-up, os grupos tornaram-se homogéneos, no que se refere a esta variável.

O programa CCpP teve como pontos fortes o facto de ter sido elaborado a partir não só de uma base teórica, mas também do conhecimento que resultou de entrevistas efetuadas às mulheres, tornando-as, por isso, participantes ativas no seu desenvolvimento.

O facto de as intervenções de enfermagem terem sido validadas por peritos na área em estudo foi outro ponto forte, pois dessa forma potencializa-se, não só uma prática de cuidados de qualidade e a obtenção de ganhos em saúde, como também a investigação na área científica de enfermagem e a prática baseada na evidência. Para além disso, ter sido implementado e a sua eficácia e impacte avaliados não só no grupo experimental, como também num grupo controlo, permitiu uma melhor discriminação dos resultados.

Em síntese, pode-se concluir que o programa foi eficaz na promoção da autoeficácia para lidar com o parto, e que este é um constructo que vale a pena investigar e aplicar na preparação para o parto, pois traz benefícios para a mulher, já que a ajuda a experienciar mais sentimentos positivos durante o trabalho de parto.

 

Referências bibliográficas

Bandura, A. (1997). Self-efficacy: The exercise of control. New York, NY: Freeman.

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Recebido para publicação em: 08.10.18

Aceite para publicação em: 02.02.19

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