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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.18 Coimbra set. 2018

https://doi.org/10.12707/RIV18008 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO

RESEARCH PAPER

 

Literacia em saúde de utentes com hipertensão e diabetes de uma região do norte de Portugal

          

Health literacy of patients with hypertension and diabetes in a northern region of Portugal

Alfabetización en salud de usuarios con hipertensión y diabetes en una región del norte de Portugal

 

Isabel Maria Batista de Araújo*
https://orcid.org/0000-0001-5143-4237

Rui Alberto Ferreira Jesus**
https://orcid.org/0000-0003-4224-1526

Maria de Lurdes Teixeira***
https://orcid.org/0000-0003-4008-6315

Ana Rita Santos Cunha****
https://orcid.org/0000-0002-2173-7197

Fernando Miguel da Silva Santos*****
https://orcid.org/0000-0001-8556-5550

Sílvia Raquel Fernandes Miranda******
https://orcid.org/0000-0003-0935-8917

 

* Ph.D., Professora Adjunta Principal, Escola Superior de Saúde do Vale do Ave - CESPU, 4760-409, Vila Nova de Famalicão, Portugal [isabel.araujo@ipsn.cespu.pt]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, metodologia e redação do artigo. Morada para correspondência: Rua José António Vidal, 81, 4760-409, Vila Nova de Famalicão, Portugal.

** Ph.D., Professor Adjunto Principal, Instituto Politécnico de Saúde do Norte - CESPU, 4585-116, Gandra, Portugal [rui.jesus@ipsn.cespu.pt]. Contribuição no artigo: tratamento e avaliação estatística.

*** Ph.D., Professora Adjunta Principal, Instituto Politécnico de Saúde do Norte - CESPU, 4585-116, Gandra, Portugal [mlurdes.teixeira@ipsn.cespu.pt]. Contribuição no artigo: redação do artigo.

**** Lic., Enfermeira, Unidade de Saúde Familiar Dallem D’Ave, 4765-628, Delães, Portugal [rita.c95@hotmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica e recolha de dados.

***** Lic., Enfermeiro, Polienf Porto, 4050-047, Porto, Portugal [fernando.santos95@hotmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica e recolha de dados.

****** Lic., Enfermeira, Unidade de Saúde Familiar Dallem D’Ave, 4765-628, Delães, Portugal [silvia_811_@hotmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica e recolha de dados.

 

RESUMO

Enquadramento: A literacia em saúde (LS) é um conceito que pode ser analisado em 3 domínios: promoção da saúde, prevenção da doença e cuidados de saúde.

Objetivo: Descrever o nível de LS de um grupo de utentes com hipertensão arterial e diabetes de uma região do norte de Portugal.

Metodologia: Estudo descritivo-exploratório transversal. Amostra de conveniência com 401 utentes de um agrupamento de centros de saúde da região norte de Portugal. Recolheram-se dados após consentimento informado dos utentes, através de um inquérito com a escala de avaliação de LS, European Health Literacy Survey (HLS-EU-PT), traduzida e validada para Portugal. Utilizaram-se técnicas da estatística descritiva e inferencial, com recurso ao software IBM SPSS Statistics, versão 24.

Resultados: Os utentes apresentavam um nível inadequado ou problemático de LS e consideraram o médico e o enfermeiro como os profissionais que podem melhorar o seu nível de LS.

Conclusão: Níveis baixos de LS são um problema para a gestão em saúde, pelo que urge apostar numa estratégia para aumentar a LS nos utentes com doenças crónicas.

Palavras-chave: alfabetização em saúde; diabetes mellitus; hipertensão; doença crónica

 

ABSTRACT

Background: Health Literacy (HL) is a concept that can be analyzed in 3 domains: health promotion, disease prevention and health care.

Objective: Describe HL level of a group of patients with hypertension and diabetes in a northern region of Portugal.

Methodology: Cross-sectional descriptive-exploratory study. Sample of convenience, with 401 users of a cluster of health centers in the northern region of Portugal. Data were collected after informed consent of the users, through a survey with the LS assessment scale European Health Literacy Survey (HLS-EU-PT), translated and validated into Portuguese. Descriptive and inferential statistics techniques were used, using SPSS, version 24.

Results: Users presented an inadequate or problematic level of HL. These considered the doctor and the nurse as the professionals who can improve their HL level.

Conclusion: Low HL level is a problem for health management, it is important to focus on a strategy to increase HL in chronic disease patients.

Keywords: health literacy; diabetes mellitus; hypertension; chronic disease

 

RESUMEN

Marco contextual: La alfabetización en salud (AS) es un concepto que se puede analizar en tres ámbitos: promoción de la salud, prevención de la enfermedad y asistencia sanitaria.

Objetivo: Describir el nivel de AS de un grupo de usuarios con hipertensión y diabetes en una región del norte de Portugal.

Metodología: Estudio descriptivo-exploratorio transversal. Muestra de conveniencia de 401 usuarios de un agrupamiento de centros de salud en la región norte de Portugal. Los datos se recogieron, después de obtener el consentimiento informado de los usuarios, a través de una encuesta con la escala de evaluación de AS, la European Health Literacy Survey (HLS-EU-PT), traducida y validada para Portugal. Se utilizaron técnicas de estadística descriptiva e inferencial, para lo cual se recurrió al software IBM SPSS Statistics, versión 24.

Resultados: Los usuarios presentaron un nivel inadecuado o problemático de AS y consideraron al médico y al enfermero como los profesionales que pueden mejorar su nivel de AS.

Conclusión: Los niveles bajos de AS son un problema para la gestión de la salud, por lo que es necesario apostar por una estrategia para aumentar la AS en los pacientes con enfermedades crónicas.

Palabras clave: alfabetización en salud; diabetes mellitus; hipertensión; enfermedad crónica

 

Introdução

A promoção da saúde (PS) contribui para a redução das doenças, principalmente na promoção de estilos de vida saudáveis. Uma das estratégias de PS é a educação para a saúde. Esta visa a melhoria da saúde, a prevenção de doenças e a reabilitação ou adaptação a uma nova condição de vida. A educação para a saúde capacita as pessoas para zelarem pelo seu projeto de saúde, isto é, faz com que elas adquiram conhecimentos, aptidões e competências para melhorarem a sua qualidade de vida e, deste modo, serem responsáveis pela sua saúde e pela saúde dos que as rodeiam (Salazar, Crosby, & DiClemente, 2015). Um bom nível de literacia em saúde (LS) é necessário para monitorar o estado de saúde de uma pessoa e tomar decisões relacionadas com a prevenção. De facto, a investigação tem mostrado que a LS representa uma variável central na vigilância, atenção e controlo das doenças em geral e, em particular, das doenças crónicas, como utentes com hipertensão arterial (HTA) e diabetes mellitus (DM). Este estudo foi realizado com o intuito de ir ao encontro do Programa Nacional de Educação para a Saúde, Literacia e Autocuidados, criado pelo XXI Governo Constitucional (Despacho nº 3618-A/2016 de 10 de março). O objetivo do estudo foi avaliar o nível de LS em utentes com HTA ou DM de uma região do norte de Portugal.

 

Enquadramento

A LS é um conceito multidimensional, cujos domínios nucleares integram: (i) os cuidados de saúde; (ii) a prevenção da doença e (iii) a promoção da saúde. O primeiro domínio - cuidados de saúde - define-se como a capacidade de processar a informação acerca de problemas de saúde, para a compreensão, interpretação e avaliação de informações médicas na tomada de decisão acerca das mesmas. O domínio da prevenção de doenças é definido como a capacidade de processar informações sobre fatores de risco para a saúde na compreensão, interpretação e avaliação na tomada de decisões que protejam a própria saúde. Por fim, a PS é definida como a capacidade de identificar determinantes de saúde no ambiente social e físico, compreender a influência de variáveis contextuais na saúde individual ou familiar, bem como atuar sobre elas por forma a reduzir os seus efeitos nocivos. A LS integra ainda quatro níveis de processamento de informações para o processo de tomada de decisão: acesso, compreensão, avaliação, e utilização (Soares et al., 2013; Sørensen et al., 2012).

Nos últimos anos, a importância da LS tem sido amplamente reconhecida, tanto nos meios académicos, quanto nos centros de decisão e planeamento das políticas de saúde, tendo-se tornado um constructo teórico em permanente revisão e reconfiguração. Atualmente, a LS é perspetivada como um conjunto complexo de habilidades, tais como ler e agir sobre informações de saúde escritas, comunicar as necessidades aos profissionais de saúde e entender as instruções dos profissionais. O nível de LS não é uma característica, mas sim um estado que, em parte, reflete a vivência de cada pessoa no seu processo saúde/doença, o seu estilo de comunicação predominantemente com a comunidade clínica, no sistema de cuidados de saúde (Peterson et al., 2011). Os estudos apontam que uma pessoa com um nível de LS suficiente/excelente tem maior probabilidade de tomada de decisão clínica, na saúde da sua família e da comunidade onde está inserida (Sørensen et al., 2012). Estudos recentes constatam que pessoas com níveis mais altos de LS reduzem os custos em saúde, têm mais conhecimento sobre saúde, recorrem com menos frequência aos serviços de saúde e, quando ocorrem hospitalizações, estas são de duração mais curta (Sørensen et al., 2012).

Os níveis baixos de LS estão associados a uma maior dificuldade em gerir o projeto de saúde, em compreender e seguir instruções dos profissionais de saúde e em perceber folhetos informativos. Enquanto utilizadores dos serviços, as pessoas com baixos níveis de LS, tendem a procurar menos vezes os cuidados de saúde para fins de promoção da saúde e prevenção da doença, e, quando ocorrem hospitalizações, estas são mais longas e geralmente apresentam complicações resultantes de patologias crónicas mal controladas (Direção-Geral da Saúde [DGS], 2016). Outros estudos salientam que as pessoas portadoras de doenças crónicas devem ser alvo de intervenção específica, já que é esperado que estas atinjam o controlo adequado da doença e consigam prevenir complicações (Pereira, Costa, Sousa, Jardim, & Zanini, 2012). Além disso, a evidência científica mostra que níveis baixos de LS são um fator de risco para várias patologias, nomeadamente endócrinas e cardiovasculares (Santos, 2010). De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE, 2011), em Portugal, estimava-se que 40,5% da população residente (cerca de 2875 mil pessoas), com idades entre os 15 e os 64 anos eram portadoras de problemas de saúde ou doenças crónicas.

Como já evidenciámos, a LS assume um papel determinante na gestão, controlo e prevenção da doença em geral. No entanto, é ainda mais importante em algumas patologias, quer pelo nível de cronicidade das mesmas, quer pelo amplo espectro de efeitos que podem produzir no quotidiano dos utentes. As patologias que suscitam mais preocupação são a DM e a HTA (DGS, 2016).

Atualmente, existem 382 milhões de pessoas portadoras de DM, sendo que se estima que chegue a 592 milhões em 2035 (International Diabetes Federation, 2013). Em Portugal, existem 3 milhões de pessoas portadoras de HTA, ou seja, uma em cada três (Serra, 2016). A evidência disponível mostra que o nível de LS é inadequado ou problemático em diferentes contextos e/ou com diferentes perfis de participantes (Kale et al., 2015; Edwards, Wood, Davies, & Edwards, 2015).

 

Questão de investigação

Qual o nível da LS em pessoas portadoras de DM ou HTA, de um Agrupamento de Centros de Saúde (ACeS), de uma região do norte de Portugal?

 

Metodologia

Ao abrigo do paradigma quantitativo, foi realizado um estudo descritivo exploratório transversal. A colheita de dados ocorreu de dezembro de 2016 a fevereiro de 2017, tendo sido efetuada num ACeS da região norte de Portugal. Neste estudo, participaram 401 utentes, num total de 13842 inscritos no referido ACeS. Optou-se por uma amostra de conveniência. Foram definidos como critérios de inclusão: ser portador de DM ou HTA; ter idade igual ou superior a 18 anos; e encontrar-se a frequentar as consultas de enfermagem para pessoas com DM ou HTA.

Utilizou-se um questionário que se encontrava dividido em três grupos, sendo que o grupo I foi constituído por questões de cariz sociodemográfico (sexo, idade, habilitações literárias, estado civil e atividade profissional). O grupo II apresentava questões para determinar o nível de LS, recorrendo à escala European Health Literacy Survey (HLS-EU-PT; Sørensen et al., 2012), traduzida e validada em Portugal por Pedro, Amaral, e Escoval (2016). As respostas aos itens variaram entre 1 e 5, sendo que de 1 a 4, os valores significam, respetivamente, muito difícil e muito fácil, e o 5 referia-se a não sabe/não responde. A principal variável sobre a qual recaiu o estudo, a LS, integra três dimensões da saúde passíveis de avaliação: os Cuidados de saúde (16 itens); a Promoção da saúde (15 itens) e a Prevenção da doença (16 itens). Os valores padronizados para a escala assumem um valor mínimo de zero e um máximo de 50, onde o zero representa o pior nível de literacia possível, e o 50 o melhor. A escala permite ainda dividir os níveis de LS por categorias, sendo elas classificadas como inadequado, problemático, suficiente e excelente (Think Tank Capacitação do Cidadão em Saúde, 2015). O grupo III remeteu para as variáveis clínicas (patologia e qual o profissional de saúde que mais contribui para aumentar a LS). Este instrumento foi aplicado sob a forma de inquérito.

Foi solicitada autorização à comissão de ética da Administração Regional de Saúde do Norte (Parecer nº 101/2016). Após autorização, realizou-se uma reunião com os coordenadores de três unidades de saúde familiares (USF). Foi apresentado o projeto e solicitada colaboração para identificar possíveis participantes. Em cada USF foi disponibilizado espaço com privacidade para a recolha de dados. Aquando das consultas, os utentes foram convidados a participar no estudo. Foi aplicado o termo de consentimento informado e foi garantido o anonimato e a confidencialidade dos dados recolhidos. Após a recolha de informação, cada questionário foi codificado com um número e com uma letra. A análise dos dados efetuou-se com técnicas de estatística descritiva e inferencial, recorrendo ao programa IBM SPSS Statistics, versão 24. Os testes estatísticos (qui-quadrado e teste t) foram efetuados com um nível de significância de 5%.

 

Resultados

Tendo em conta o objetivo do estudo, num primeiro ponto apresentam-se os resultados descritivos e, posteriormente, os resultados da análise bivariada.

Caracterização da amostra

Este estudo contou com a participação de 401 utentes de um ACeS, sendo 192 (47,88%) do sexo masculino e 209 (52,12%) do sexo feminino. As idades dos utentes variaram entre 22 e 92 anos, com uma média de 62,3 anos. Relativamente ao estado civil e atividade profissional, como mostra a n = 65; 86,7%) e estado civil união de facto (n = 42; 56%), no entanto não se encontrou diferença estatística entre os turnos de trabalho com o sexo e o estado civil (Tabela 1, predominaram os casados (308; 76,81%) e reformados (230; 57,36%). Os participantes, na sua maioria (329; 82,05%), apenas possuíam o ensino básico.

Literacia em Saúde

Relativamente à LS, no geral, 172 (42,9%) dos utentes encontravam-se num nível problemático, enquanto, que 162 (40,4%) apresentavam um nível inadequado de LS.

Nas Figuras 1, 2 e 3 resumem-se os 47 itens da escala HLS-EU-PT, divididos nas suas três dimensões: Cuidados de saúde, Prevenção da doença, e Promoção da saúde, respetivamente. A cor clara são apresentados os itens em que os utentes afirmaram ter maior facilidade, como por exemplo, seguir as instruções do médico ou farmacêutico. A cor escura são apresentados os itens que, de acordo com os utentes, são mais difíceis de realizar.

Particularizando as diferentes dimensões da escala (Cuidados de saúde, Prevenção da doença e Promoção da saúde), como é possível observar na Figura 4, todos os inquiridos se posicionaram num nível inadequado de LS, à exceção da dimensão Cuidados de Saúde, onde a maioria dos utentes se posicionou no nível problemático.

Todas as dimensões são diretamente proporcionais ao nível de LS geral, o que quer dizer que, sempre que o nível de uma dimensão aumenta, o nível geral de LS da pessoa irá aumentar também, e vice-versa. Existe uma ligação de interdependência entre as diferentes dimensões.

Variáveis clínicas

No que respeita às variáveis clínicas, tal como se pode observar na Tabela 2, os utentes com acompanhamento, ou seguidos em alguma consulta apresentavam um maior nível geral de LS comparativamente com os que não eram acompanhados em unidades de saúde.

O nível de LS geral foi ligeiramente superior nos inquiridos que referiam não ter nenhuma patologia (para além da DM e da HTA).

 

Discussão

Os resultados evidenciam uma amostra constituída maioritariamente por mulheres, casadas, com média de idade de 62 anos, com ensino básico, reformadas e portadoras de HTA ou DM, e que manifestaram níveis problemáticos ou inadequados de LS. Este estudo corrobora o perfil de resultados dos estudos nacionais, que tiveram como objeto de estudo a LS (Costa, Saboga-Nunes, & Costa, 2016; Espanha, Ávila, & Mendes, 2016; Pedro et al., 2016).

Quando se analisa a LS pelas suas diferentes dimensões, apura-se um nível inadequado para as dimensões Prevenção da doença e Promoção da saúde e um nível problemático para a dimensão Cuidados de saúde. Estes resultados permitem afirmar que os utentes possuem alguma capacidade para processar a informação fornecida pelos profissionais de saúde, e que a mesma serve para as suas tomadas de decisões terapêuticas. No entanto, estão menos capazes de compreender a informação para lidar com os fatores de risco e os determinantes de saúde de forma a promover a sua saúde e a saúde dos que os rodeiam, assim como de utilizar corretamente os diferentes serviços de saúde em função das suas necessidades. Importa sublinhar que o presente estudo, embora tendo um carácter geográfico definido (a área de abrangência de um ACeS) e uma amostra com especificidades decorrentes da zona de residência onde se inserem os inquiridos, apresenta importantes semelhanças com os resultados de outros estudos (Davey, Holden, & Smith, 2015; Espanha et al., 2016; Omachi, Sarkar, Yelin, Blanc, & Katz, 2013). Esta consonância de resultados reveste-se de particular importância, uma vez que permite perceber a existência de um perfil de LS dos portugueses, o que reclama uma efetiva estratégia de promoção da capacitação dos utentes para gerirem eficazmente as suas necessidades de cuidados e informação em saúde. Salienta-se que, como todos os estudos, a presente investigação também comporta as suas limitações, apresentando-se desde logo como limitação o carácter localizado da recolha de informação e da amostra que a sustentou, já que foi realizada apenas numa região específica e com pequena representação da população. No entanto, importa igualmente salientar que os dados obtidos podem representar um importante contributo para a (re)definição das estratégias de promoção da LS da instituição de saúde onde se realizou o estudo.

De acordo com a Estratégia de Saúde da União Europeia a LS é o princípio fundamental no empowerment dos cidadãos, afirmando que os cuidados de saúde devem ser mais individualizados e centrados no utente, que este se deve tornar um sujeito ativo, ao invés de um mero objeto dos cuidados de saúde. Promover a LS e aumentá-la é a chave para a visão da Europa 2020: um desenvolvimento inteligente, inclusivo e sustentável, contribuindo desta forma para um alívio social e económico dos países da União Europeia (European Commission, 2007).

Nesta investigação, ao compararmos as pessoas portadoras de HTA com as que são portadoras de DM, verificou-se que quem possui mais LS são os que possuem DM. Esta diferença poderá estar relacionada com o facto de a HTA ser uma patologia provocada por comportamentos de risco, ao contrário de quem é portador de DM porque, apesar de também poder estar associada aos comportamentos de risco, pode ser de causa natural, derivado de um problema endócrino. Sendo a DM uma patologia de difícil controlo, é esperado que as pessoas possuam um pouco mais de LS.

Comparando o nível de LS com o facto de ter outra patologia para além das estudadas, era esperado que as pessoas com mais patologias apresentassem mais LS, já que contactam mais vezes com o sistema de saúde (Davey et al., 2015), no entanto, tal não se verificou. Nesta investigação, são as pessoas portadoras só de DM ou de HTA que apresentam um maior nível de LS, apesar de essa diferença não se mostrar estatisticamente significativa.

Estudos recentes apontam para o facto de que quem tem baixos níveis de LS está mais propenso a recorrer aos cuidados de saúde, uma vez que não tem confiança em si nem consegue gerir a sua condição de saúde sem aconselhamento do profissional de saúde. Relacionado, ainda, com o uso dos cuidados de saúde, quem tem acompanhamento em alguma unidade de saúde, tem um maior nível de LS, ainda que este dado não seja estatisticamente significativo.

Estudos apontam o médico como sendo a fonte principal de informação, ou seja, a primeira escolha das pessoas sempre que necessitam de esclarecer dúvidas ou obter algum tipo de informação relativa a saúde, tornando-o o profissional que mais contribui para o aumento da LS das pessoas (Espanha et al., 2016). Na presente amostra, os resultados vão ao encontro do panorama geral, já que estes inquiridos também indicam os médicos como o profissional que mais contribui para o aumento da LS, seguindo-se os enfermeiros.

 

Conclusão

As pessoas com baixa LS têm tendência a ter mais complicações resultantes da HTA e da DM isto porque, por um lado, o controlo da doença é mais exigente, e por outro, estas pessoas apresentam uma clara insuficiência das competências necessárias para lidar com a doença. Devem, por isso, ser objeto de particular atenção dos profissionais de saúde (em particular dos enfermeiros e médicos) para as dotar de competências de gestão e resposta às exigências das suas enfermidades.

Sem níveis de LS mais elevados, em Portugal não será possível atingir os objetivos de uma cidadania europeia saudável. Para que isso seja possível, é importante perceber que baixos níveis de LS podem ter consequências, não só para as pessoas, mas também para os sistemas de saúde e para a sociedade em geral.

Considerando as limitações da amostra e as particulares características deste estudo, os resultados obtidos permitiram responder à questão de investigação, identificando uma predominância de um nível inadequado ou problemático de LS, associado às variáveis de género (uma amostra maioritariamente constituída por mulheres), com baixa escolaridade e portadoras das patologias HTA e DM. Estes resultados, consonantes com a literatura disponível sobre o tema, evidenciam a associação entre nível de escolaridade e nível de LS - uma correlação positiva que deve merecer a atenção dos profissionais de saúde, já que as pessoas com menor capital escolar serão igualmente aquelas que possuem menos recursos de informação e reduzidas competências de ação nas dimensões da Prevenção da doença e da Promoção da saúde.

Estes dados permitem afirmar a clara necessidade de mais programas de educação para a saúde, desenhados de acordo com as especificidades de cada grupo populacional e de cada tipologia de doença. As dimensões Promoção da saúde e Prevenção da doença encontram-se num nível inadequado, o que se traduz numa insuficiência de capacidades e conhecimentos para prevenir possíveis estados de doença, circunstância que deverá integrar, igualmente, o foco de ação prioritária por parte dos profissionais de saúde.

Considera-se que os dados resultantes desta investigação representam um importante contributo para o conhecimento sobre a LS, mas, considera-se igualmente que o tema deve continuar no centro das agendas de investigação, da atenção da academia e dos decisores políticos, para que se prossiga na identificação dos perfis regionais e nacionais da LS dos portugueses. Se se proceder a este levantamento, obter-se-á um razoável domínio de conhecimento sobre as reais necessidades dos utentes em termos de informação e educação para a saúde nos vários domínios do tratamento e da relação com os profissionais de saúde, possibilitando uma adequação das estratégias de intervenção terapêutica, ajustadas a cada utente. Este, poderá de igual forma ser o contributo desta investigação: ao identificar níveis problemáticos de LS dos utentes crónicos neste ACeS permite que os responsáveis criem planos de intervenção adequados para dar resposta a esta lacuna.

Importa, ainda, a realização de estudos com metodologias plurais, que combinem estratégias metodológicas diversas, para que se analise a multidimensionalidade inerente à problemática da LS.

 

Referências bibliográficas

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Recebido para publicação em: 05.03.18

Aceite para publicação em: 22.06.18

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