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Revista de Enfermagem Referência

versión impresa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.17 Coimbra jun. 2018

https://doi.org/10.12707/RIV17068 

ARTIGO DE REVISÃO

REVIEW PAPER

 

A caminhada como intervenção durante a quimioterapia: revisão integrativa

Walking as an intervention during chemotherapy: integrative review

La caminata como intervención durante la quimioterapia: revisión integradora

 

Carla Sílvia Fernandes*; Bruno Miguel Borges de Sousa Magalhães**; Célia de Brito Santos***; Juan Miguel Martínez Galiano****

* Ph.D., Professora Auxiliar, Universidade Fernando Pessoa, Escola Superior de Saúde, 4200-150, Porto, Portugal [carlasilviaf@gmail.com]. Contribuição no artigo: análise da pesquisa bibliográfica e redação do artigo. Morada de correspondência: Rua do Cidral nº 28, 4490-562, Póvoa do Varzim, Portugal.

** MSc., Professor Adjunto, Escola Superior de Saúde de Santa Maria, 4049-024, Porto, Portugal [bruno.magalhaes@santamariasaude.pt]. Contribuição no artigo: análise da pesquisa bibliográfica e revisão do artigo.

*** Ph.D., Professora Coordenadora, Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072, Porto, Portugal [celiasantos@esenf.pt]. Contribuição no artigo: análise da pesquisa bibliográfica e revisão do artigo.

**** Ph.D., Professor, Universidade de Jaén, 23071, Jaén, Espanha [jgaliano@ujaen.es] Contribuição no artigo: revisão do artigo.

 

RESUMO

Enquadramento: A caminhada tem vindo a ser utilizada como intervenção promotora da saúde e para alívio dos sintomas em utentes com cancro durante a quimioterapia.

Objetivo: Delineou-se este percurso com o objetivo de mapear a produção científica sobre a utilização da caminhada enquanto intervenção nos utentes sujeitos a quimioterapia.

Metodologia: Procedeu-se a uma revisão integrativa da literatura de artigos das bases de dados MEDLINE® e CINAHL®. O protocolo de revisão foi elaborado e a categorização temática foi realizada.

Resultados: Com base nos critérios de inclusão e exclusão, foram considerados 12 estudos primários para análise, publicados entre 2010 e 2017. Foram identificadas 5 áreas temáticas relevantes: duração, frequência e acompanhamento da caminhada durante a quimioterapia, adesão à intervenção da caminhada, efeitos nos sintomas psicológicos e físicos, população-alvo e instrumentos de avaliação utilizados.

Conclusão: Apesar das vantagens da utilização da caminhada durante a quimioterapia, é ainda incipiente a sua utilização como intervenção de enfermagem, sendo fundamental mais investigação a este nível.

Palavras-chave: caminhada; quimioterapia; neoplasias; exercício

 

ABSTRACT

Background: Walking has been used as a health promotion and symptom relief intervention in patients with cancer during chemotherapy.

Objective: To map the existing literature on the use of walking as an intervention in patients undergoing chemotherapy.

Methodology: Integrative review of articles found in MEDLINE® and CINAHL® databases. The review protocol was designed and the thematic categorization was performed.

Results: Based on inclusion and exclusion criteria, 12 primary studies published between 2010 and 2017 were considered for analysis. Five relevant thematic areas were identified: duration, frequency, and monitoring of walking during chemotherapy; adherence to the walking intervention; effects on psychological and physical symptoms; target population; and assessment tools.

Conclusion: Despite the advantages of the walking intervention during chemotherapy, evidence on its use as a nursing intervention is still scarce, with further research being required in this area.

Keywords: walking; chemotherapy; neoplasms; exercise

 

RESUMEN

Marco contextual: La caminata se ha utilizado como intervención para promover la salud y aliviar los síntomas durante la quimioterapia en los pacientes con cáncer.

Objetivo: Se desarrolló este itinerario con el objetivo de mapear la producción científica sobre la utilización de la caminata como intervención en los usuarios sometidos a quimioterapia.

Metodología: Se realizó una revisión integradora de la literatura de artículos de las bases de datos MEDLINE® y CINAHL®. El protocolo de revisión se diseñó y se realizó la categorización temática.

Resultados: Con base en los criterios de inclusión y exclusión, se consideraron para su análisis 12 estudios primarios publicados entre 2010 y 2017. Se identificaron 5 áreas temáticas relevantes: duración, frecuencia y seguimiento de la caminata durante la quimioterapia, adhesión a la intervención de la caminata, efectos en los síntomas psicológicos y físicos, población objetivo e instrumentos de evaluación utilizados.

Conclusión: A pesar de las ventajas de la utilización de la caminata durante la quimioterapia, su utilización como intervención de enfermería es aún incipiente, por lo que es fundamental realizar más investigaciones a este nivel.

Palabras clave: caminata; quimioterapia; neoplasias; ejercicio

 

Introdução

Embora tenha havido um progresso considerável na tentativa de redução da incidência de cancro (Siegel et al., 2012), este é ainda responsável por uma em cada três mortes prematuras em todo o mundo (Bray, 2016). O aumento do número de indivíduos com diagnóstico de cancro a cada ano, associado ao envelhecimento e ao crescimento da população, bem como a melhores taxas de sobrevivência, levarão a um número cada vez maior de sobreviventes de cancro (Siegel et al., 2012). Porém, o percurso da doença oncológica modificou-se, deixando de estar ligada ao diagnóstico de morte anunciada, transitando para um conceito de doença crónica (Peixoto, Peixoto, Santos, & Pinto, 2016), ao qual surge associado uma sequência de tratamentos agressivos com efeitos colaterais significativos e impactantes na vida da pessoa. A pessoa com cancro poderá experienciar uma grande quantidade de sintomas devido ao tratamento e à progressão da doença, nomeadamente a fadiga, a falta de energia, a dificuldade respiratória, a dor, ansiedade, a depressão e os problemas de sono (Bennion & Molassiotis, 2013). Muitos destes sintomas surgem associados aos tratamentos de quimioterapia, nomeadamente os mais frequentemente reportados, como é o caso das náuseas, dos vómitos, da alopecia e da fadiga (Wagland et al., 2015), assim como consequências emocionais de ansiedade e sobrecarga da família (Sasaki et al., 2017). Como resultado, é cada vez mais importante integrar os recursos que podem ajudar os utentes, cuidadores e prestadores de cuidados de saúde a navegar nas várias fases da sobrevivência do cancro (Siegel et al., 2012). A multiplicidade e a complexidade dos sintomas em utentes tratados com quimioterapia requerem intervenções multifacetadas para controlo de sintomas (Coolbrandt et al., 2014). São diversas as intervenções que podem ser usadas para ajudar a pessoa a lidar com os sintomas, nomeadamente as sessões de ensino, psicoterapia, terapia comportamental, assim como o exercício físico (Coolbrandt et al., 2014). As intervenções de exercício e o aumento da atividade física representam uma opção promissora para contrariar a multiplicidade dos sintomas (Zimmer et al., 2016). Meneses-Echávez, González-Jiménez, Correa-Bautista, Río, e Ramírez-Vélez (2015) salientam o exercício como intervenção segura e eficaz para gestão da fadiga em utentes com cancro submetidos a tratamento ativo. No entanto, Zimmer et al. (2016) destaca alguns constrangimentos metodológicos, particularmente no que se refere à heterogeneidade de avaliações e intervenções, assim como a falta de grupos de controlo adequados. Os estudos que recorrem a intervenções de atividade física durante a quimioterapia utilizam uma variabilidade de estratégias, nomeadamente no tipo de exercícios, duração, implementação, autogerenciadas ou supervisionadas (Meneses-Echávez et al., 2015). Por outro lado, algumas destas intervenções não são provavelmente atingíveis para a maioria dos utentes com cancro, porque são caras, exigem conhecimentos e equipamentos substanciais, e geralmente estão disponíveis apenas em grandes áreas metropolitanas (Vallance et al., 2016). Segundo Sung e Bae (2012), a caminhada é o exercício mais descrito na literatura, evidenciando vantagens na sua aplicação. A caminhada é uma intervenção simples e menos onerosa para utentes com cancro, passível de ser autogerenciada, podendo ser introduzida em grande escala (Gokal et al., 2016). Os enfermeiros que trabalham em oncologia devem promover o exercício como uma intervenção de incentivo para o bem-estar durante o tratamento de quimioterapia (Husebø, Allan, Karlsen, Søreide, & Bru, 2015). Cientes dos potenciais benefícios que poderão advir de uma intervenção simples como é o caso da caminhada, delineou-se uma revisão integrativa da literatura com o objetivo de mapear a produção científica sobre a utilização da caminhada enquanto intervenção nos utentes sujeitos a quimioterapia. Os resultados desta revisão podem fornecer aos profissionais um conhecimento mais aprofundado para o desenvolvimento de intervenções com exercícios simples, como é o caso da caminhada. Pretende-se dar resposta à seguinte questão de revisão: Qual a utilização da caminhada como intervenção em utentes adultos em tratamento com quimioterapia?

 

Procedimentos metodológicos de revisão integrativa

Considerando a questão de investigação e os objetivos formulados, realizou-se uma revisão integrativa seguindo as etapas previstas pelo Joanna Briggs Institute (JBI, 2014). Iniciou-se o percurso através da questão baseada nos elementos população, conceito e contexto (JBI, 2014). O processo de pesquisa decorreu no mês de agosto de 2017. Nesta revisão, conforme a Tabela 1, foram incluídos estudos realizados com indivíduos com idade superior ou igual a 18 anos, portadores de doença oncológica, independentemente da localização anatómica, em tratamento ativo de quimioterapia, integrando uma intervenção com caminhada durante o tratamento de quimioterapia, com avaliação dos resultados nos sintomas ou comportamento de saúde, que sejam estudos primários, e que tenham sido publicados em inglês.

A pesquisa foi conduzida de forma independente por dois investigadores, procurando identificar todos os estudos publicados até junho de 2017 nas bases de dados eletrónicas MEDLINE® e CINAHL®. Os descritores utilizados na pesquisa efetuada foram: cancer patient, chemotherapy, adjuvant e walking. O processo de seleção dos estudos envolveu diferentes etapas. A primeira etapa consistiu na leitura dos títulos dos artigos identificados na pesquisa, com o objetivo de rejeitar aqueles que não respondiam aos critérios de inclusão. Seguidamente, com base na leitura do resumo, foram selecionados os estudos que obedeciam aos critérios de inclusão, sendo excluídos aqueles cujos resumos estavam incompletos ou que suscitavam dúvidas. Por último, o processo de seleção dos documentos incluiu a leitura integral dos mesmos. Foram incluídos para análise um total de 12 estudos. Este processo foi realizado pelos investigadores, de forma independente, e o resultado final foi obtido após reunião de consenso. Com vista a sistematizar os dados extraídos dos estudos, estes foram compilados de forma descritiva em tabelas.

 

Resultados e interpretação

Foi inicialmente identificado um total de 651 artigos, dos quais 110 se encontravam duplicados. A amostra foi, então, composta por 541 estudos, dos quais 181 foram incluídos pela leitura do título. Destes, 130 estudos foram excluídos, e 51 propostos para leitura integral, dos quais 39 foram excluídos. Foram incluídos 12 artigos para análise final (Figura 1).

Na Tabela 2 é realizada uma sumarização dos estudos que compuseram esta revisão, incluindo informação relativa aos autores, ano de publicação, local de realização do estudo, principais objetivos, desenho do estudo e participantes. Salienta-se que, apesar de na pesquisa não terem sido estabelecidos limites temporais de publicação, a amplitude dos resultados iniciais foi de 40 anos (1977-2017). Porém, os artigos que integraram esta revisão são referentes aos últimos anos. Observamos uma maior incidência no ano de 2015, com quatro artigos, seguido de 2016 e 2011, com dois artigos e 2014, 2013 e 2010 com um artigo em cada ano. No que se refere ao local de realização dos estudos, foi encontrada uma grande dispersão geográfica - dois foram publicados nos Estados Unidos da América e em Taiwan, e um em cada um dos seguintes locais: Canadá, Austrália, Coreia do Sul, Tailândia, Inglaterra, Noruega, França e Suécia.

Os artigos incluídos na revisão integrativa são na sua maioria estudos quantitativos (n = 11), sendo que a maior parte são ensaios clínicos. De realçar que 10 dos estudos têm como participantes utentes com cancro da mama, apenas num estudo são integrados utentes com cancro da mama e coloretal (Backman et al., 2014) e um outro com utentes com cancro do ovário (Newton et al., 2011). Resultados semelhantes foram encontrados em estudos de revisão sobre a atividade física em utentes com cancro (Zimmer et al., 2016; Meneses-Echávez et al., 2015; Jacobsen, Donovan, Vadaparampil, & Small, 2007). No que se refere aos objetivos dos estudos, estes apresentam pretensões distintas, sendo o mais frequente a avaliação da adesão à intervenção física (E1, E5, E8, E12), assim como a avaliação do impacto físico (E3, E4, E6, E11) e psicológico (E2, E3, E4, E10, E11) da intervenção ou em aspetos mais específicos, como é o caso do consumo máximo de oxigénio (E6, E9), hemoglobina (E6), marcadores inflamatórios (E6) e sistema imunológico (E7).

Na sequência da análise crítica dos estudos incluídos nesta revisão e à luz do conhecimento teórico existente, consideramos relevante a apresentação de cinco áreas temáticas: duração, frequência e acompanhamento da caminhada durante a quimioterapia; adesão à intervenção da caminhada; efeitos nos sintomas psicológicos e físicos; população-alvo; e instrumentos de avaliação utilizados.

Duração, frequência e acompanhamento da caminhada durante a quimioterapia

A caminhada é a intervenção de atividade física mais frequentemente utilizada (Husebø et al., 2015; Naraphong, Lane, Schafer, Whitmer, & Wilson, 2015; Sung & Bae, 2012), sendo fácil a sua implementação, e considerado o exercício preferido em numerosos estudos (Sung & Bae, 2012; Szymlek-Gay, Richards, & Egan, 2011). Os estudos em análise revelam uma heterogeneidade na aplicação da caminhada, nomeadamente no que se refere à duração, intensidade, frequência, supervisão, assim como as ferramentas para a sua avaliação, o que dificulta a sua comparação. Lewis, Lyons, Jarvis, e Baillargeon (2015) referiu a mesma dificuldade numa revisão sobre a monitorização da atividade física. A duração da intervenção de caminhada sobrepôs-se, na maioria das vezes, ao tempo destinado aos ciclos de quimioterapia. A duração mais frequente foi de 12 semanas (E2, E3, E5, E7, E9, E10) ou intervenções mais curtas entre as 9 e 12 semanas (E6, E8) ou intervenções com acompanhamento para além dos ciclos de quimioterapia, até aos 6 meses (E1, E4, E12).

As intervenções foram na sua maioria de intensidade moderada, e em alguns estudos de caráter progressivo (E2, E3, E5). Gokal et al. (2016) propunham que os participantes começassem a completar 10 minutos de caminhada e, em seguida, aumentassem a duração da caminhada até 30 minutos, cinco vezes por semana. Naraphong et al. (2015) recomendavam 20 minutos de caminhada por sessão ou, pelo menos, duas sessões de 10 minutos até atingir um máximo de 20-30 minutos, 3 a 5 vezes por semana. Por outro lado, Huang et al. (2015) descrevem um programa de aumento progressivo da prescrição de exercícios através de três fases: inicial, melhoria e manutenção. A frequência de exercício sugerido foi de três vezes por semana durante as primeiras 6 semanas, e cinco vezes por semana durante as segundas 6 semanas. A duração do exercício também foi aumentada gradualmente, de 15 para 25 minutos por sessão para as semanas de 1 a 4, para 25-35 minutos por sessão para as semanas de 5 a 8 e 35-40 minutos por sessão para as semanas de 9 a 12. Em outros estudos, a intervenção foi progressiva de acordo com a capacidade cardiorrespiratória dos participantes (E6, E7), ou com prescrições individualizadas (E11).

Uma das estratégias utilizadas em dois estudos foi os 10.000 passos (E8, E12). As pessoas têm vindo a ser aconselhadas a andar mais de 10.000 passos por dia com a finalidade de promover a saúde (Castres, Tourny, Lemaitre, & Coquart, 2017). Esta intervenção é considerada uma atividade física moderada, que decorre em média ao longo de 30 minutos (Backman et al., 2014). As origens da recomendação de 10.000 passos não são propriamente científicas, isto porque os pedómetros vendidos no Japão na década de 1960 foram comercializados sob o nome manpo-kei, o que se traduziu em 10.000 passos de medida, vindo ao longo dos últimos anos a ser utilizado em diversos estudos associados à promoção da saúde (Castres et al., 2017; Backman et al., 2014; Swenson, Nissen, & Henly, 2010; Bravata et al., 2007).

Esta intervenção surge normalmente associada à utilização do pedómetro, ou a um diário de etapas. Bravata et al. (2007) referem que o uso de um sistema de monitorização pode ser um fator motivacional essencial para o aumento da atividade física. Os pedómetros foram utilizados em cinco dos estudos (E1, E2, E3, E8, E12), associados ao diário (E1, E2, E8) ou apenas o diário (E4, E9, E11). As intervenções que usam diários de internet, pedómetros e assistentes digitais pessoais portáteis encontraram maior adesão em comparação com os diários de papel tradicionais (Lewis et al., 2015). Os pedómetros podem ser usados nesses estudos, tanto como uma intervenção para motivar a atividade física, assim como uma ferramenta para medir os passos por dia. Os participantes podem ter aumentado a sua atividade física, apenas por saber que estão a ser monitorizados (Bravata et al., 2007). A utilização dos pedómetros durante a caminhada permite uma autogestão da atividade física podendo ser obtido um maior custo-benefício comparativamente com outras estratégias de intervenção (Johnson, Lier, Soprovich, Mundt, & Johnson, 2015). As intervenções autogerenciadas, sem necessidade de sessões supervisionadas e individualizadas, que requerem contribuições de especialista ou suporte adicional de profissionais de saúde, com elevados custos associados, têm obtido resultados positivos evidenciando a sua eficácia (Gokal et al., 2016). A maior parte dos programas em análise foram autogerenciados no domicílio (E1, E2, E3, E4, E9, E10, E12). Backman et al. (2014) incluiu no seu estudo uma caminhada em grupo por semana. Por outro lado, no estudo realizado por Naraphong et al. (2015), um membro da família era convidado como treinador para ajudar o participante a identificar atividades adequadas e seguras, o que poderia constituir uma fonte de motivação. Conforme nos salientam Yang, Tsai, Huang, e Lin (2011), a eficácia de uma intervenção de exercício no domicílio durante o tratamento do cancro pode depender muito da motivação dos participantes para aderir a esse programa.

Adesão à intervenção da caminhada

Como já mencionado anteriormente, nos estudos em análise existe uma multiplicidade de objetivos que se repercutem nos instrumentos de medida e, consequentemente, na avaliação de resultados. Além disso, existe uma heterogeneidade metodológica nos estudos que leva a variações nas estimativas de efeito. Alguns estudos pretenderam avaliar a adesão à intervenção (E1, E5, E8, E11). No estudo realizado por Vallance et al. (2016), ao contrário da hipótese formulada, o kit de recursos estruturado de atividade física não facilitou o comportamento de adesão à atividade física em comparação com materiais de impressão de saúde padrão em mulheres com cancro da mama. Segundo Huang et al. (2015), o tempo e a intensidade do exercício influenciam a adesão ao programa de exercícios de caminhada. Os preditores da adesão relativamente ao tempo foram a fadiga e o interesse no exercício, e os preditores de adesão à intensidade foram a fadiga e a perceção da importância do exercício. Backman et al. (2014) descrevem que a maioria dos participantes alcançou uma média de 83% do alvo de 10.000 passos por dia, conseguindo um aumento significativo na atividade física diária (p = 0,016) no grupo de intervenção. Swenson et al. (2010) concluiu que a adesão a um programa regular de atividade física foi difícil de manter durante o tratamento agudo de quimioterapia, mas melhorou com cada ciclo de quimioterapia e após esta estar concluída. A adesão é um fenómeno complexo que engloba fatores relacionados com a condição de saúde, o tratamento e o meio ambiente de cada paciente, bem como fatores psicológicos, que influenciam a adesão do paciente ao programa prescrito (Husebø, Dyrstad, Søreide, & Bru, 2013). Analisando a adesão às intervenções de todos os estudos em análise, esta variou entre os 74 e 95%. Os estudos anteriores de exercícios realizados no domicílio com utentes com cancro referem uma grande variação de adesão (Husebø et al., 2013; Newton et al., 2011). Swenson et al. (2010) mencionam que entre os utentes que completaram o estudo, a adesão foi inferior ao ideal, com uma média de menos de 75% das etapas prescritas durante as primeiras 6 semanas. No entanto, após a conclusão do tratamento, a adesão aumentou para 87%-98% aos 3, 6, 9 e 12 meses. Segundo Newton et al. (2011), as taxas de adesão podem estar relacionadas com a monitorização de proximidade, feedback personalizado ou suporte contínuo, e a natureza das intervenções, permitindo que os participantes realizem as sessões nos momentos mais convenientes para eles. Além disso, e em comparação com outro tipo de intervenções, a caminhada é relatada como o tipo preferido de exercício.

Efeitos nos sintomas psicológicos e físicos

Outros estudos avaliaram os sintomas físicos (E2, E3, E4, E6, E7, E9, E11) e os psicológicos (E2, E3, E4, E10, E11) da intervenção. Os estudos E6 e E9 referem efeitos da intervenção na melhoria da capacidade cardiorrespiratória, mas não obtiveram relação com a fadiga. Kim, Shin, e Suk (2015) referem reduções significativas no peso, índice de massa corporal, e percentagem de gordura corporal. No entanto, a contagem de células imunes não mudou significativamente. Yang et al. (2011) e Newton et al. (2011) relataram resultados significativamente mais baixos na gravidade dos sintomas físicos. Gokal et al. (2016) demonstraram efeitos positivos significativos na fadiga, autoestima e humor geral. No entanto, não existiram efeitos de intervenção para a ansiedade e a depressão. Naraphong et al. (2015) referem que o grupo de intervenção apresentou melhoria significativa na aptidão física, menos fadiga (embora com baixa evidência estatística) e uma redução significativa no distúrbio do humor, embora não suficientemente forte para diminuir o distúrbio do sono. O impacto nos distúrbios de humor é referido nos estudos E2, E3 e E10. Por último, Husebø et al. (2015) salientam sentimentos de bem-estar psicológico, físico e social associado à caminhada, assim como o facto de os participantes relatarem sentir-se mais fortes do ponto de vista psicológico após o exercício.

Os efeitos da utilização da caminhada sobre as medidas de resultado aqui apresentados são muito heterogéneos. No entanto, a evidência científica fundamenta o impacto da atividade física em utentes com cancro, destacando a importância de os encorajar a adotarem estilos de vida ativos durante o tratamento e em todo o período de sobrevivência (Zhang, Xiao, & Chen, 2017; Gokal et al., 2016; Zimmer et al., 2016; Husebø et al., 2015; Jacobsen et al., 2007), nomeadamente através da caminhada (Lewis et al., 2015). De facto, uma intervenção de atividade física de baixa intensidade na forma de caminhada é viável durante o tratamento de quimioterapia. Dentro das atividades físicas existentes, a caminhada é uma alternativa exequível, apesar dos sintomas crescentes associados à quimioterapia (Backman et al., 2014).

População-alvo

Algumas recomendações sobressaem da revisão em análise, tanto para investigações futuras, como para a implementação destas estratégias nos cuidados de saúde. No que se refere à investigação, mais especificamente, às opções metodológicas dos estudos, podemos concluir que existe uma variabilidade na aplicação da intervenção de caminhada, nomeadamente no que se refere à duração, intensidade, frequência e supervisão. Por outro lado, recorde-se que a maioria dos estudos em análise foi realizada com utentes com cancro da mama, impedindo a generalização para outras populações. Vallance et al. (2016) salienta que a trajetória da pessoa com cancro da mama apresenta um conjunto único de desafios que afetam significativamente a capacidade e a vontade de adotar um programa de atividade física.

Por outro lado, a população em estudo foi essencialmente feminina, apenas são referidos oito elementos do género masculino (um participante no estudo E9 e sete participantes no estudo E8) na totalidade dos participantes. Alguns dos ensaios clínicos utilizaram amostras muito pequenas, referidas como limitação pelos próprios autores (E1, E3, E6, E8, E10).

Instrumentos de avaliação utilizados

Os instrumentos de avaliação dos resultados foram muito diversos, incluindo a utilização de autorrelatos da atividade física (E4, E5, E9, E10). De acordo com Backman et al. (2014), a dependência dos dados autorrelatados não nos permite ter a certeza de que os dados são precisos pela falta de controlo das etapas relatadas. Lewis et al. (2015) salientam que as intervenções de atividade física comportamental evoluíram de intervenções com diários de papel para novas tecnologias, facilitando a monitorização. A tecnologia indicia a promessa de uma nova modalidade de intervenção. A monitorização através de um pedómetro pode, por si só, constituir uma intervenção. Com efeito, o uso desses dispositivos pequenos e relativamente baratos está associado a aumentos significativos na atividade física e às melhorias do estado de saúde (Bravata et al., 2007). Goode, Lawler, Brakenridge, Reeves, e Eakin (2015), num estudo de revisão sobre intervenções telefónicas, impressas e baseadas na web para atividade física, dieta e controlo de peso entre sobreviventes de cancro, sugere a integração de outras tecnologias, tais como SMS, aplicações móveis/smartphones/apps. Isto inclui a exploração do potencial dessas tecnologias para oferecer suporte a longo prazo e de forma mais económica. Lewis et al. (2015) referem que muitos desses sistemas permitiriam que os pesquisadores e participantes realizassem uma vigilância diária sobre o uso da aplicação (quantidade de atividade diária) e o envolvimento com outros (chat de participantes). Permitiriam a integração de funções adicionais (monitorizando outros indicadores de saúde, criando alarmes inteligentes, ativando notificações), podendo fornecer informações mais detalhadas e recomendações individualizadas por parte dos profissionais de saúde. Esta constitui uma área de pesquisa necessária e a desenvolver.

Em jeito de síntese, os resultados sugerem que os enfermeiros devem introduzir nas suas práticas e encorajar as pessoas com cancro a participar em intervenções como a caminhada (Naraphong et al., 2015). No que se refere à intervenção da caminhada, propriamente dita, nos estudos em análise, esta assume características distintas, nomeadamente no que se refere à duração, à frequência, à intensidade e à supervisão. Gokal et al. (2016) referem que as intervenções autogerenciadas apresentam vantagens, designadamente serem passíveis de serem realizadas em casa em qualquer horário, o seu design de baixo custo, que não requer contacto direto, orientação durante a intervenção ou qualquer equipamento de exercícios.

Sobre as implicações para a enfermagem, é necessário a continuidade de pesquisas focadas na avaliação do tipo, tempo e intensidade da caminhada, emparelhados com as trajetórias de sintomas vivenciados pelo doente durante a quimioterapia, o que ajudará a desenvolver intervenções de enfermagem personalizadas (Naraphong et al., 2015; Swenson et al., 2010). Os enfermeiros devem integrar estas intervenções na sua prática clínica, motivando os utentes para participar em programas de atividade física, devendo ser dada mais atenção ao significado dos fatores motivacionais externos e como estes podem ser aplicados clinicamente em programas de mudança de comportamentos de saúde (Husebø et al., 2015). As intervenções de atividade física devem ser adaptadas ao ciclo de tratamento de quimioterapia, devendo os utentes ser informados de que a sua capacidade de participar na atividade física irá melhorar ao longo do tempo e que não devem desanimar se tiverem dificuldade em manter a sua atividade física normal durante vários dias após os tratamentos de quimioterapia (Swenson et al., 2010).

 

Conclusão

Analisando o percurso de acordo com os objetivos propostos foi possível descrever a produção científica publicada sobre a utilização da caminhada como intervenção em utentes em tratamento com quimioterapia. A evidência científica encontrada é ainda muito restrita a uma população muito específica, na maioria mulheres com cancro da mama. Devem ser realizados mais estudos para compreender como se correlacionam algumas variáveis, nomeadamente a influência da caminhada nos sintomas, integrando ensaios clínicos com amostras mais representativas e o uso de instrumentos de medidas padronizados, que permitam melhorar as abordagens analíticas que são úteis para identificar intervenções baseadas em evidências. Os programas de caminhada precisam de ter em consideração as necessidades da população-alvo, a fim de otimizar a adesão, os resultados, e as mudanças de comportamento. A intervenção de atividade física de baixa intensidade na forma de caminhada é viável durante o tratamento com quimioterapia. Apesar dos sintomas crescentes, a caminhada, no que se refere ao grau de dificuldade, parece ser uma alternativa viável. Fornecer aos utentes a capacidade de autogerir os seus próprios horários de exercícios é menos dispendioso, podendo ser introduzido em grande escala. A este nível, seria relevante o desenvolvimento de ferramentas de monitorização da caminhada com recurso a pedómetro em aplicações móveis/smartphones/apps, e a avaliação da sua aplicação em estudos futuros. Sobre as implicações deste estudo para a prática dos enfermeiros, podemos concluir que estes devem incluir estratégias para melhorar os comportamentos de atividade física e reduzir o tempo sedentário durante a quimioterapia adjuvante. É importante comunicar os benefícios da caminhada para inspirar e motivar os utentes ao longo da sua trajetória de doença. No que se refere à investigação, este estudo alerta para a necessidade do desenvolvimento de mais pesquisas, mais orientadas para exercícios específicos, tais como a caminhada, utilizando instrumentos fidedignos e procurando resultados comuns.

 

Referências bibliográficas

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Recebido para publicação em: 30.08.17

Aceite para publicação em: 05.12.17

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