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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.1 Coimbra mar. 2014

https://doi.org/10.12707/RIII1311 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO

 

Tradução, adaptação cultural e validação para português da Control Attitudes Scale-Revised(CAS-R) em pessoas com doença cardíaca

Portuguese translation, adaptation and validation of Control Attitudes Scale Revised (CAS-R) in people with heart disease

Traducción al portugués, adaptación y validación de la Control Attitudes Scale Revised (CAS-R) en Enfermos Cardíacos

 

Artur Jorge Câmara Pacheco*; Célia Samarina Vilaça de Brito Santos**

*Licenciatura em Enfermagem. Curso Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem de Reabilitação. Mestre em Ciências de Enfermagem – ICBAS- UP. Enfermeiro no Centro Hospitalar Alto Ave, EPE: UCI Cardiologia, 4430-702 Vila Nova de Gaia, Portugal [rutpacheco@gmail.com]. Morada: Rua Manuel da Cunha Moreira, 151, 5º frente - Oliveira do Douro 4430-702 Vila Nova de Gaia

**Licenciatura em Enfermagem. Curso Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem Médico-Cirúrgica. Mestre e Doutora em Psicologia – FPCE-UP. Professora Coordenadora da Escola Superior Enfermagem do Porto, 4200-072, Porto, Portugal [celiasantos@esenf.pt].

 

Resumo

O controlo percebido é um construto que se inscreve nas características psicossociais individuais. O seu estudo tem-se reportado essencialmente a indivíduos que passam por situações de saúde/doença, como as doenças do foro cardiovascular, potencialmente geradoras de resultados nefastos no seu bem-estar físico e psicológico.

Este estudo teve como objetivo traduzir, adaptar linguística e culturalmente e validar para português a Control Attitudes Scale Revised (CAS-R). A amostra foi constituída por 160 doentes cardíacos, internados em serviços de cardiologia/UCIC de três hospitais do Norte de Portugal. A análise de componentes principais indiciou uma estrutura unidimensional da escala, tal como a proposta pelas autoras. Obtivemos um Alpha de Cronbach aceitável (α = 0.65). A validade discriminante revelou uma relação negativa entre o controlo percebido e a ansiedade e depressão. A versão portuguesa da CAS-R mostrou ser um instrumento adaptado para avaliar a perceção de controlo em pessoas com doença cardíaca, importante para ajudar a sinalizar os doentes cardíacos com maiores dificuldades de autogestão da sua doença e tratamento. Apesar de apresentar uma aceitável fidelidade e validade, necessita que sejam realizados novos estudos psicométricos que assegurem o rigor na sua mensuração.

Palavras-chave: controlo percebido; doenças cardiovasculares; estudos de validação.

 

Abstract

Perceived control is a construct which focuses on individual psychosocial characteristics, and its study has been primarily focused on individuals who go through situations of health/disease, such as cardiovascular diseases, with possible adverse effects on their physical and psychological well-being. The aim of this study was to translate, linguistically and culturally adapt, and validate the portuguese version of the Control Attitudes Scale – Revised (CAS-R).

The sample consisted of 160 cardiac patients admitted to the cardiology services/ICCU of three hospitals in the north of Portugal. The principal component analysis revealed the one-dimensional structure of the scale, as had been proposed by the authors, and an acceptable Cronbach’s alpha (α = 0.65) was obtained.

Discriminant validity testing showed a negative relation between perceived control and anxiety and depression. The portuguese version of the CAS-R proved to be a suitable instrument to assess perceived control in cardiac patients and help identify the patients who present greater difficulties in the self-management of the disease and treatment. Even though this instrument shows acceptable validity and reliability, further psychometric studies are needed to ensure measurement accuracy.

Keywords: perceived control; cardiovascular diseases; validation studies.

 

Resumen

La percepción del control es un concepto que se adapta a las características psicosociales individuales y cuyo estudio ha incidido principalmente en personas que pasan por situaciones de salud/enfermedad, como es el caso de las enfermedades del sistema cardiovascular, que potencialmente pueden generar resultados nefastos para el bienestar físico y psicológico.

El objetivo de este estudio fue traducir, adaptar lingüística y culturalmente, y validar la Control Attitudes Scale Revised(CAS-R) para el portugués. La muestra estuvo constituida por 160 pacientes cardíacos ingresados en cardiología / UCIC de tres hospitales en el norte del país. El análisis de los componentes principales atribuyó una estructura unidimensional a la escala, tal como fue propuesto por las autoras.Así, obtuvimos un Alpha de Cronbach aceptable (α = 0.65). La validez discriminante mostró una relación negativa entre el control percibido, la ansiedad y la depresión. La versión en portugués del CAS-R demostró ser uninstrumento adecuado para la evaluación de la percepción de control en personas con enfermedad cardíaca y un elemento importante para ayudar a identificar a los pacientes cardíacos con mayores dificultades para la autogestión de su enfermedad y tratamiento. A pesar de presentar una fiabilidad y validez aceptable, es necesario que se realicen nuevos estudios psicométricos para asegurar la precisión en su medición.

Palabras clave:control percibido; enfermedades cardiovasculares; estudios de validación.

 

Introdução

A influência do Controlo Percebido (CP) na saúde tem por base o controlo e as capacidades de cada indivíduo para controlar eventos potencialmente negativos. Mardiyono, Songwathana, e Petpichetchian (2011, p. 236) definem-no como “(…)a crença pessoal de que o indivíduo tem controlo sobre si e capacidade para controlar eventos que constituem uma ameaça”. As perceções de controlo têm demonstrado ser importantes preditores do comportamento e funcionamento social, sendo construções centrais em destaque nas teorias motivacionais, como a teoria do comportamento planeado de Ajzen e a teoria social cognitiva de Bandura. A definição deste construto tem ainda pouco consenso por ser definido por diferentes teorias, sendo ainda o seu significado ambíguo. No entanto, este tem vindo a ser entendido como uma característica da personalidade capaz de contribuir para o ajustamento psicossocial dos indivíduos quando expostos a eventos ameaçadores (Jacelon, 2007; Mardiyono et al., 2011) e, capaz de minimizar as reações negativas aos acontecimentos adversos da vida (Beckjord, Glinder, Langrock, & Compas, 2009). Importa referir que apesar de ser uma característica da personalidade esta não é imutável, mas antes é capaz de ser aumentada, nomeadamente com intervenções do foro educativo (Moser & Dracup, 2000; Moser & Watkins, 2008; Moser et al., 2012).

Existe evidência de que elevados níveis de CP se associam a níveis baixos de sofrimento psíquico (Moser & Watkins, 2008). A investigação acerca deste conceito tem demonstrado, que altos níveis de CP estão fortemente associados e, em alguns casos, são preditivos de uma melhor saúde mental e física (Beckjord et al., 2009). Sendo a ansiedade e a depressão fatores com influência negativa na qualidade de vida dos indivíduos e relacionando-se de forma indireta com o CP, quanto maiores forem os níveis de controlo percebido, melhor será a qualidade de vida dos indivíduos (Moser & Watkins, 2008). Vários investigadores se têm vindo a debruçar acerca da importância deste conceito na área específica da doença cardiovascular (DCV). Moser e Watkins (2008), e Moser et al. (2009) revelam que a qualidade de vida e a adaptação psicossocial à cronicidade da doença, bem como o sucesso da recuperação psicossocial de eventos cardíacos agudos, dependem mais de fatores psicológicos do que físicos, sendo o maior objetivo preparar, com sucesso, a adaptação dos indivíduos às suas condições cardiovasculares. O CP modera o impacto negativo da ansiedade sobre as complicações intra-hospitalares, tais como as complicações pós-enfarte agudo do miocárdio, incluindo isquemia recorrente, re-enfarte e arritmias malignas (Moser et al., 2009). Um estudo de McKinley et al. (2012) vem reforçar esta conclusão referindo-se à relação entre baixos níveis de controlo percebido com um aumento de complicações pós-síndrome coronário agudo (SCA). Para além de existir evidência científica do papel positivo do CP em indivíduos com doenças cardiovasculares como o enfarte agudo do miocárdio (EAM) e a insuficiência cardíaca (ICC), Vollman, Lamontagne, e Wallston (2009) referem-se também ao papel deste constructo em indivíduos com outras doenças crónicas como a diabetes, o cancro, a doença mental e a artrite reumatóide. Moser e Watkins (2008) mencionam também o papel positivo das perceções de controlo no aumento da adesão ao regime terapêutico em indivíduos com diabetes, submetidos a reabilitação cardíaca, hipertensos, alcoólicos e idosos. É atualmente inegável a associação entre o CP e o melhor ajustamento psicossocial, a menor ansiedade, depressão, stress emocional e a melhoria da autoestima tanto na doença aguda como na crónica (Vollman et al., 2009).

A partir destes pressupostos emergem importantes implicações teóricas e clínicas para os profissionais de saúde. Algumas dessas implicações na área da enfermagem reportam-se ao desenvolvimento de intervenções capazes de aumentar os níveis de CP em indivíduos com doença cardíaca contribuindo para uma redução das complicações pós-SCA (McKinley et al., 2012). Desse modo, torna-se premente a sinalização dos indivíduos com maior suscetibilidade para sofrerem de stress psicossocial após um evento cardíaco. Tal irá permitir aos profissionais de saúde desenvolverem intervenções com o objetivo de minimizar ao máximo os efeitos negativos dos seus processos de saúde/doença e melhorarem a sua adaptação às condições de saúde. Em grupos de indivíduos com doença crónica, esta intervenção por parte dos enfermeiros é de extrema importância devido ao elevado grau de exigência na autogestão da doença e do seu regime terapêutico, permitindo uma melhor gestão da doença e dos sintomas a ela associada (Moser et al., 2009).

A importância que o CP pode ter nos resultados em saúde, nomeadamente na área cardiovascular, e a ausência de um instrumento específico capaz de avaliar a perceção de controlo em doentes cardíacos em Portugal, levou-nos à pretensão de traduzir, adaptar e validar para a realidade portuguesa, um instrumento capaz de medir este constructo, tendo por base, um já existente nos Estados Unidos.

O presente artigo resulta de uma dissertação de mestrado realizada no âmbito das Ciências de Enfermagem no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto.

Foi nosso objetivo com este estudo, traduzir, adaptar linguística e culturalmente e validar para português a Control Attitudes Scale Revised (CAS-R) desenvolvida por Moser et al.(2009).

 

Metodologia

O processo de tradução, adaptação cultural e validação da CAS-R foi desenvolvido através de um conjunto de procedimentos de modo a garantir a equivalência linguística, cultural e métrica dos conceitos em estudo. Como forma de dar corpo ao processo de tradução e adaptação cultural da escala, optou-se por um estudo de cariz quantitativo e metodológico, tendo em consideração o que Polit, Beck, e Hungler (2004) e Ribeiro (1999) referem acerca das características dos mesmos.

A recolha de dados foi efetuada através de um formulário, aplicado pelo investigador. Foi usada a técnica de entrevista, utilizando os seguintes instrumentos: questionário de caracterização sociodemográfica e clínica, construído pelo investigador; a versão portuguesa da escala de ansiedade e depressão hospitalar (HADS) de Pais-Ribeiro et al. (2007); e, a versão por nós traduzida e adaptada para o contexto português no presente estudo da Control Attitudes Scale Revised (CAS-R) de Moser et al. (2009).

Os dados foram tratados com suporte do programa informático Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 19, onde foram avaliadas as suas propriedades psicométricas tendo em conta os critérios descritos por Ribeiro (1999) e com recurso à estatística paramétrica.

Ao longo do processo de investigação foram respeitados todos os princípios éticos, que devem orientar qualquer investigação (Fortin, 2009). Destacam-se a obtenção das autorizações dos autores das escalas utilizadas, e das comissões de ética dos hospitais onde decorreu a colheita de dados, bem como a obtenção do consentimento informado de cada um dos participantes no estudo.

 

Instrumento

A CAS-R foi originalmente desenvolvida por Moser et al. (2009). Tal como na versão original, a versão traduzida e adaptada para a cultura portuguesa da CAS-R é constituída por oito afirmações. Pretende-se, por meio destas afirmações, averiguar o grau de controlo percebido de pessoas com doença cardíaca, a partir do seu grau de concordância com cada uma delas, obtido através de uma escala de likert de cinco pontos. O score global deste instrumento varia entre 8 a 40, sendo que, quanto mais alto ele for, maior é o grau de controlo percebido. O score é obtido a partir da soma dos oito itens sendo que nas afirmações 5 e 8, a sua pontuação é invertida. A sua aplicação pode ser sob a forma de autopreenchimento ou através de entrevista.

 

Processo de tradução e adaptação cultural

Depois de concedida a autorização pelos autores da CAS-R, procedemos à sua tradução e adaptação, utilizando a metodologia descrita por Ribeiro (1999), nomeadamente: a tradução da escala para o idioma falado e escrito em português, sendo mantida a estrutura e as características da escala de origem. A tradução foi efetuada pelo investigador, pela orientadora deste estudo e por uma investigadora da área da saúde com formação base em Psicologia e Doutoramento em Saúde Pública. A retroversão para a língua original foi realizada por um tradutor independente (professor/perito de língua inglesa), o qual não tinha conhecimento da escala original. No sentido da sua adequação linguística, foi realizada a comparação entre as duas versões da escala (original e retroversão), não existindo discrepâncias significativas entre as mesmas. Foi ainda realizada uma análise e discussão de todos os itens da escala com especialistas (professor de língua inglesa, psicóloga, investigador e orientadora), no sentido de analisarmos a conotação cultural de cada um deles e se o seu significado era sobreponível ao da cultura original. A versão final de consenso foi ainda aplicada a dez participantes, com a finalidade de efetuar a reflexão falada sobre os questionários (estudo piloto). Após o preenchimento do instrumento, estes participantes (não incluídos no estudo principal) foram questionados acerca da compreensão e pertinência das questões e facilidade de preenchimento, permitindo aferir se os termos utilizados eram facilmente compreendidos e aceitáveis pelos respondentes. Todos os inquiridos referiram boa compreensão e aceitação das questões apresentadas. O tempo de resposta à escala variou entre dois e três minutos.

 

Participantes

Como forma de dar continuidade ao processo de validação da versão portuguesa da CAS-R recorremos a uma amostra do tipo intencional (Polit et al., 2004). A amostra foi constituída por 160 pessoas internadas em serviços de cardiologia e Unidades Cuidados Intensivos de Cardiologia (UCIC) de três hospitais da região norte do país. A constituição da amostra obedeceu aos seguintes critérios: ter idade igual ou superior a 18 anos; estar orientado no tempo e no espaço (sem alterações cognitivas); estar estável sob o ponto de vista hemodinâmico; aceitar participar no estudo; e estar internado há pelo menos 24 horas. A recolha de dados decorreu no período entre janeiro e abril de 2011.

O tamanho da amostra é um aspeto fundamental para que os resultados deles obtidos sejam seguros, nomeadamente quando se pretende estudar as características psicométricas de um instrumento. Dado que não existem indicadores perfeitos sobre o tamanho adequado de uma amostra, seguimos a regra de Tinsley e Tinsley (como citado por Ribeiro, 1999) de utilizar, no mínimo, cinco sujeitos por cada variável a medir.

As características dos participantes no estudo, obtidas através da estatística descritiva, revelaram uma amostra constituída maioritariamente por homens (65%), com uma média de idades de 62.17 anos (DP= 11.79), católicos (92,5%) e residentes no distrito do Porto (62,5%) e de Braga (36,3%). Tendo em consideração o estado civil, os intervenientes eram maioritariamente casados ou viviam em união de facto (79,4%); residiam na sua maioria com o cônjuge, cônjuge e filhos ou com um dos pais (74,4%), sendo o número de pessoas com quem coabitavam, em média 1.89 (DP= 1.38). Quanto à escolaridade, verificou-se que esta era muito baixa, possuindo a maioria dos participantes uma escolaridade média de 5.54 anos (DP= 3.73), com uma moda igual a 4 e uma mediana com o mesmo valor numérico. Relativamente à atividade profissional, o grupo representado pelos reformados destacava-se de todos os outros (60%), seguido pelos que trabalhavam por conta de outrem (26,3%). Os principais diagnósticos de internamento foram o EAM (58,8%), seguido da ICC (16,9%) e da angina instável (AI) (13,8%). Quanto ao tratamento, a maioria dos indivíduos tinha sido submetido a angioplastia (41,6%), seguido de tratamento médico (40,6%) e com um valor percentual mais baixo (18,1%), a cirurgia cardíaca.

 

Resultados

Com o objetivo de avaliar as principais características psicométricas da versão portuguesa da CAS-R na amostra em estudo, foi analisada a validade de constructo e a fidelidade do instrumento.

 

Validade de constructo

No sentido de analisarmos a validade de constructo da CAS-R e adequarmos a sua estrutura às características linguísticas e culturais portuguesas, procedeu-se à análise de componentes principais, à análise da validade convergente-discriminante dos itens com as subescalas encontradas e à análise discriminante com a versão portuguesa da HADS. Nas análises realizadas, tentámos reproduzir os procedimentos seguidos pelos autores do instrumento.

Foram definidos como critérios para a eliminação de itens, os seguintes: itens com carga fatorial inferior a 0.40, e itens que diminuíssem a consistência interna (Alpha de Cronbach) da subescala a que pertenciam (Polit et al., 2004).

De modo a percebermos se o constructo a medir (controlo percebido) se apresentava, no contexto português, como um constructo uno, ou pelo contrário, se apresentava com dimensões, foi realizada uma análise de componentes principais (ACP), exploratória pelo método varimax, do tipo ortogonal com normalização de Kaiser. Para tal, definiu-se como critério que os eighenvalues deveriam ser superiores a 1. A partir desta análise, obtiveram-se três fatores com uma variância explicada de 58,13 % (26,06% para o primeiro fator, 16,11% para o segundo fator e 15,95% para o terceiro fator), com um Alfa de Cronbach total de 0,65 (0,70 para o primeiro fator, 0.31 para o segundo fator e 0.39 para o terceiro fator) (Tabela 1).

A análise da estrutura fatorial encontrada, não nos pareceu explicativa do constructo a medir, mesmo tomando por base os referenciais teóricos atuais que definem o conceito de controlo percebido (Jacelon, 2007; Moser et al., 2009; Mardiyono et al., 2011).

Nesse sentido, tentámos a realização de uma nova ACP, forçada a dois fatores, seguindo o procedimento dos autores da escala (Moser et al., 2009). Pela análise com rotação, forçada a dois fatores (Tabela 2), obteve-se uma variância explicada de 44. 93% (26,41% para o primeiro fator e 18,51% para o segundo fator), com um Alpha de Cronbach total de 0.65 (0.70 para o primeiro fator e 0.36 para o segundo fator). No entanto, também esta estrutura em duas dimensões, não nos pareceu muito consistente, tendo por base o constructo teórico a medir (Moser & Dracup, 2000; Moser et al., 2009; Mardiyono et al., 2011).

Validade convergente-discriminante dos itens

No sentido de decidirmos quanto à manutenção (ou não) de dimensões na escala em estudo, bem como do seu número, realizámos o estudo de validade convergente-discriminante dos itens. Ribeiro (1999) menciona que esta validade é um bom indicador de que o item mede o mesmo constructo da subescala a que pertence e não outro, ou seja uma boa validade deste tipo mostra que a correlação do item com a subescala a que pertence é substancialmente mais elevada do que a correlação do item com as subescalas ou fatores a que não pertence (item discriminativo), formando-se estruturas conceptuais distintas.

Dado que não existem valores padronizados para que um item seja considerado discriminativo, utilizámos o seguinte critério: a correlação do item com fator a que pertencia (com base na ACP) deveria, no mínimo, ser superior a 0.10 da correlação com os outros fatores considerados na ACP. Verificámos que só podiam ser considerados discriminativos (na solução a três e a dois fatores) os itens, 2, 4, 6 e 7. Tendo em conta que os restantes não o são, concluímos que as diferentes estruturas fatoriais não eram explicativas do construto em análise, pois os resultados estatísticos não sugerem que o controlo percebido (CP) seja constituído por estruturas conceptuais claramente distintas.

Tendo por base que nenhuma das estruturas fatoriais anteriormente realizadas, respondia, de forma adequada, ao conceito a medir, quando analisado, quer em termos estatísticos, quer relativamente ao seu confronto com a sua explicação teórica (Moser et al., 2009), decidimos tentar ainda a ACP forçada apenas a um fator, tal como a opção dos autores da escala original. Consideramos esta estrutura conceptual mais congruente com o conceito em análise.

Assim, com base na última estrutura fatorial encontrada, e até que novos estudos sejam realizados no sentido de validar os resultados aqui apresentados, decidimos optar pela solução de uma escala unidimensional, tal como a proposta pelos autores da escala original (CAS-R) Moser et al. (2009). No presente estudo, esse fator único explica 30,27% da variância total, obtendo-se um Alpha de Cronbach total de 0.65. Nesta estrutura fatorial, todos os itens apresentaram cargas fatoriais superiores a 0.40, à exceção do item 3 (Tabela 3). No entanto, optámos pela sua não-eliminação nesta fase, uma vez que esta não contribuía para uma alteração significativa do Alpha de Cronbach da escala (Tabela 5).

 

Tabela 4

 

 

Validade discriminante

Um dos métodos para avaliarmos a validade de constructo, referidos por Ribeiro (1999, p.115), é a validade discriminante, sendo que esta “ (…) refere-se à extensão em que a correlação do instrumento com instrumentos que medem diferentes constructos é menor, do que a correlação com os que medem o mesmo constructo”.

Como forma de a mensurar, foi seguido o critério dos autores, tendo-se usado outro instrumento que mede dois construtos opostos ao controlo percebido, nomeadamente a ansiedade e a depressão. Assim, utilizamos a versão portuguesa da HADS, validada por Pais-Ribeiro et al. (2007) para a população portuguesa, composta por duas subescalas com sete itens cada, sendo que uma delas mede a ansiedade (HADS-A) e outra a depressão (HADS-D).

Ao realizar-se a correlação de Pearson entre versão portuguesa da CAS-R e a versão portuguesa da HADS, e tendo em consideração Pestana e Gajeiro (2008), obteve-se uma correlação negativa fraca (r=-0.20; p &0,05) para a HADS-A, e uma correlação negativa moderada (r=-0.46; p &0.01) para a HADS-D. Assim, quanto maior o controlo percebido, menor será a ansiedade e a depressão, com uma diminuição mais significativa para esta última.

Podemos assim concluir que os dois instrumentos medem conceitos diferentes e opostos, o que está de acordo com a evidência teórica existente na área em estudo que indica que o controlo percebido é favorecedor da adaptação dos indivíduos à doença, enquanto a ansiedade e depressão são fatores que interferem negativamente na vivência com a doença (Moser et al., 2009; McKinley et al., 2012; Moser et al., 2012).

 

Estudo de fidelidade da versão portuguesa da CAS-R

Para o estudo de fidelidade da versão portuguesa da CAS-R foi utilizado o coeficiente Alpha de Cronbach, que fornece uma medida da consistência interna. De acordo com Ribeiro (1999), as medidas de fidelidade indicam de que forma as diferenças individuais obtidas numa prova são atribuíveis a reais diferenças nas características medidas.

O Alpha de Cronbach encontrado aproximou-se dos obtidos pelos autores do instrumento original (Moser et al., 2009) que realizaram o seu estudo em três grupos de doentes cardíacos (Enfarte Agudo do miocárdio - EAM, Doença Arterial Coronária - DAC, Insuficiência Cardíaca Congestiva – ICC) de modo a comprovarem a sua aplicação válida e fidedigna em todos os doentes com patologia cardíaca (Tabela 4).

No que se refere à homogeneidade, como se pode observar na Tabela 5, os itens da escala apresentam correlações com a escala total, que variam entre r= 0.132 (no item 3) e r= 0.522 (no item 4). Por outro lado, apenas o item 3, tal como anteriormente já referido, aumentava o valor de Alpha de Cronbach da escala total, se eliminado (de 0,65 para 0,67).

Como forma de complementar o trabalho desenvolvido, foi realizada a análise descritiva dos resultados da aplicação da versão portuguesa da CAS-Rà amostra global. Assim, os resultados indiciam que o grau de controlo percebido dos doentes cardíacos que participaram na amostra (N=160) foi de 27.66 (DP=3.96), com um mínimo de 19 e um máximo de 39, no somatório dos oito itens da escala, representando um controlo percebido razoável.

 

Discussão

Propusemo-nos traduzir, adaptar e validar a CAS-R para a realidade portuguesa. Para tal, tentámos reproduzir os procedimentos estatísticos dos autores e as orientações de outros autores de referência, no sentido da validação da mesma.

A versão portuguesa da CAS-R mostrou-se de aplicação rápida, através de auto preenchimento ou entrevista (2 a 3 minutos), de fácil compreensão para os participantes.

A análise da estrutura conceptual da escala permitiu-nos concluir que os construtos teóricos se encontravam organizados da mesma forma que a escala desenvolvida pelos autores para doentes cardíacos. Em primeiro lugar, obteve-se uma estrutura fatorial de três fatores, e mesmo depois de forçada a dois fatores, aquando da avaliação da validade convergente-discriminante dos itens, em ambas as soluções fatoriais, só foram considerados discriminativos quatro dos oito itens.

Os resultados estatísticos sugeriram que o controlo percebido não era composto, pelo menos de forma clara, por mais do que uma “entidade conceptual”. Face a estes resultados, optámos pela solução proposta pelos autores da mesma, Moser et al. (2009), constituída por apenas um fator, o que nos indica que o construto em análise é uno e não divisível. Também decidimos pela não-eliminação de itens nesta fase, uma vez que não iríamos beneficiar significativamente o Alpha de Cronbach da escala em análise.

Quanto à confiabilidade da escala, os resultados do nosso estudo, embora um pouco inferiores à versão original de Moser et al. (2009), traduzem uma aceitável consistência interna (α = 0.65) tendo em conta o número reduzido de itens do instrumento (Ribeiro, 1999).

A partir do estudo de validade discriminante, verificou-se uma relação negativa entre o constructo em análise e os construtos ansiedade e depressão (r=-0.20; p &0.05 e r=-0.46; p &0.01, respetivamente). Estas relações são corroboradas pelos resultados obtidos no estudo original, desenvolvido por Moser et al. (2009), o qual relacionou também a CAS-R com outros instrumentos que avaliavam a ansiedade e depressão, tendo confirmado a hipótese de que o controlo percebido se relacionava negativamente com esses constructos. Desse modo, o nosso estudo suporta as conclusões dos autores acima referidos ao demonstrar que as pessoas com níveis de controlo percebido elevados apresentam baixos níveis de ansiedade e de depressão.

Podemos assim concluir que o controlo percebido pode ser identificado como uma influência positiva capaz de resolver problemas e de ter um papel ativo na diminuição dos níveis de ansiedade, face a uma situação de maior dificuldade como a doença cardíaca (Moser, 2007; Moser & Watkins, 2008; Moser et al., 2009; Girard & Murray, 2010; Mardiyono et al., 2011). Os resultados obtidos pela aplicação da versão portuguesa da CAS-R, observados a partir da média, amplitude e desvio-padrão, evidenciam níveis de controlo percebido indicativos de que os participantes neste estudo apresentam alguma capacidade de resolução dos problemas que os vão acometendo. Esta interpretação dos resultados obtidos tem em conta o que os seus autores, Moser et al. (2012) definiram nos seus estudos: scores = 16 sugerem um baixo nível de controlo percebido e scores = 32 indicam um grau de controlo percebido moderadamente elevado. Vários estudos corroboram os nossos resultados, referindo-se a graus de controlo percebido positivos mas não moderadamente elevados. Isto indica capacidade por parte dos indivíduos com doença cardíaca para lidar com situações potencialmente ameaçadoras ao seu estado de saúde (Moser et al., 2009; McKinley et al., 2009; Riegel et al., 2011). Parece-nos que quanto maior é o grau de controlo percebido dos indivíduos, mais positivas serão as suas atitudes no que se relaciona à sua doença, promovendo a adoção de disposições mais favoráveis para com a sua patologia e sintomatologia associada. Tal vai ao encontro do estudo de McKinley et al. (2009), o qual se refere a atitudes mais positivas para com a saúde quando existam níveis de controlo percebido mais elevados. Este dado torna premente que os enfermeiros estejam atentos aos diversos fatores psicológicos capazes de promover um desequilíbrio na perceção do indivíduo sobre a sua doença e sendo útil ao desenvolvimento de um maior controlo sobre os processos de saúde do indivíduo.

Os resultados obtidos no presente estudo, apesar de demonstrarem a fiabilidade e validade da escala em análise no contexto português, indicam a necessidade da realização de novos estudos, em diferentes contextos de doença e em populações mais alargadas, no sentido de validarmos os resultados aqui obtidos. A aplicação da versão portuguesa da CAS-R permite ao enfermeiro o diagnóstico dos processos de autogestão da doença e dos regimes terapêuticos a ela associados, no sentido de ajudarem o indivíduo a aumentar o seu senso de controlo em relação à sua saúde. Contribui-se, assim, para que aquele participe ativamente no seu processo de saúde/ doença, de forma a tomar decisões mais conscientes e seguras para si. A partir destes pressupostos emerge como implicação para a prática, a diminuição dos efeitos adversos da doença e, consequentemente, das suas agudizações.

 

Conclusão

A versão portuguesa da CAS-R mostrou ser um instrumento adaptado para avaliar a perceção de controlo sobre a doença, em pessoas com doença cardíaca. Este instrumento foi bem aceite pelos participantes, constituindo-se como um instrumento independente e específico. No entanto, os resultados aqui apresentados, sugerem a necessidade de serem realizados novos estudos que permitam assegurar a sua fidelidade e validade na sua aplicação ao contexto português.

Importa ainda referir algumas limitações do presente estudo. A primeira deve-se ao facto de os nossos participantes serem, na sua maioria, idosos e com baixa escolaridade. Também os participantes foram selecionados de instituições hospitalares exclusivamente da região norte do país, o que impede a generalização dos resultados aqui obtidos, nomeadamente a outros grupos populacionais.

Em suma, a versão portuguesa da CAS-R, por ser um instrumento pequeno e de fácil aplicação, torna-se útil para ser aplicado pelos enfermeiros na sua prática clínica. Esta, pode ser uma ferramenta de apoio na identificação de fatores psicossociais, que podem predispor a um mais precário processo de transição saúde/ doença.

 

Referências bibliográficas

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Recebido para publicação em: 25.01.13

Aceite para publicação em: 04.05.13

 

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