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Economia Global e Gestão

versão impressa ISSN 0873-7444

Economia Global e Gestão v.15 n.2 Lisboa set. 2010

 

Conflitos de interesse: reflexões ao regime do pós-emprego público

 

Pedro Nunes

Doutorado em Gestão, ISCTE-IUL. Professor Coordenador na Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave. Investigador do CEPESE (Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade) da Universidade do Porto. Ph.D in Management (ISCTE-IUL). Professor at the School of Management, Polytechnic Institute of Cávado and Ave. Researcher at CEPESE (Center for Population and Economics Society Studies, University of Oporto). pnunes@ipca.pt

 

Resumo

No regime jurídico aplicável às situações de pós-cessação de funções (post-public employment) dos cargos políticos e altos cargos públicos refere-se que os titulares de órgãos de soberania e titulares de cargos políticos não podem exercer, pelo período de três anos, contado da data de cessação das respectivas funções, cargos futuros que possam, eventualmente, colidir com o regime de incompatibilidades e, em particular, que possam provocar um conflito de interesse . O presente artigo pretende fazer um resumo e, além disso, integrar reflexões éticas com o estado da arte dessas mesmas situações.

Palavras-chave: Pós-emprego Público, Conflito de Interesse, Período de Reflexão

 

Conflicts of interest: reflections ON the post-public employment regime

Abstract

The legal regime applicable to the post-public employment situations states that the individuals who have held political positions, elected or appointed, cannot exercise, for a period of three years, from the end of their appointments or election, futures position that could possibly collide with the regime of incompatibilities, in particular, which may cause a conflict of interest . This article intends to make a synopsis and also make some reflections about the state of the art in such systems.

Key words: Post-public Employment, Conflicts of Interest, Cooling-off Period.

 

INTRODUÇÃO

Para efeitos do presente artigo presume-se que o conceito de «conflito de interesse» é o conflito que poderá sobrevir entre o «interesse público» e o «interesse privado» quando estão envolvidos titulares de cargos políticos, nomeados ou eleitos, e os altos cargos públicos de livre designação do poder político onde, um dos denominadores, pode ser potencialmente capaz de exercer influência, individual ou não, directa e indirectamente, e que afecte os seus deveres e responsabilidades. «Conflito de interesse» é um conceito social, político, económico, cultural e jurídico (Demmke et al., 2007), carregado de controvérsia e ambiguidade (OCDE, 2006a, 2006b). A compreensão, pelos menos nas duas últimas décadas, do que poderá abranger aquele conceito está em constante evolução, apesar dos esforços significativos no aperfeiçoamento dos padrões da moralidade pública.

O «conflito de interesse» é, geralmente, descrito como uma situação em que alguém, numa posição de confiança (interesse público), incluindo os políticos, têm outros interesses profissionais ou pessoais que se sobrepõem aos primeiros ( Gençkaya, 2009), sendo que a maioria das ofensas no pós-emprego público (post-public employment) ocorre quando os titulares de cargos públicos, eleitos ou não, usam informações ou contactos adquiridos quando estão no Governo ou serviços dependentes, para se beneficiarem, ou beneficiarem outros, depois de abandonarem esses mesmo cargos (Kernaghan, 2007) ou do sector público em geral (acrescentámos nós).

Existem países, no entanto, com detalhes muito nítidos em matéria de regulamentação legal para disciplinar o «conflito de interesse» mas, na generalidade, é uma substância ainda muito pouco desenvolvida. Na literatura da OCDE (2003, 2006a, 2006b) onde se tem vindo a enfatizar o conceito, descreve-se o fenómeno como o conflito existente entre os deveres públicos (interesse público) e os interesses privados dos agentes públicos e a oportunidade que, aqueles, ex-post, têm de poder influenciar de forma indevida a sua performance e os seus deveres e responsabilidades ou, mais em concreto, obscurecer o dever público em favor de interesses privados, tornando nebulosa a separação entre aqueles interesses. Acrescente-se, ainda, que os textos da OCDE (idem, 2003, 2005) , configuram os «conflitos de interesse» como sendo reais, percebidos e potenciais (Figura 1). Para estas dimensões, embora muito abstractas, há autores que consideram que o «conflito de interesse» assume muitos e variados tipos, como se pode ver na Figura 2, a que Kernaghan (2007) dá o devido destaque.

 

FIGURA 1

Tipos de «conflito de interesses»

 

FIGURA 2

Exemplos de tipologias de «conflito de interesse»

 

Em última instância, o « conflito de interesse» no serviço público é tão antigo como a própria Administração Pública, sendo que o problema, e os estudos assim o indicam, se trata de um fenómeno político e jurídico (Gençkaya, 2009), argumentando-se, com certeza, que se poderá tratar de uma situação, não uma acção, uma vez que o servidor ou agente público poderá ver-se numa situação de « conflito de interesse» sem que para isso actue corruptamente (idem, 2009).

É ainda possível, segundo alguns autores (Demmke et al., 2007) caracterizar o «conflito de interesse», basicamente em três categorias, ou regimes, extensiva à grande maioria dos países (destacando-se, neste caso, apenas as situações de pós-emprego público, uma vez que o autor apresenta outras situações): (i) « Abordagem restritiva » (proibição de exercer uma determinada profissão depois de sair do cargo em que havia « conflito de interesse »; impondo-se o designado período de reflexão ou, na terminologia anglo-saxónica, o cooling-off period ); (ii) « Abordagem moderada » (onde não existem regras ou deveres de informação ou notificação quando se assume uma nova posição ou cargo; no cooling-off period); e, (iii) « Abordagem suave » (sem regulamentação). Gençkaya (2009) argumenta que os «conflitos de interesse» se dividem do ponto de vista do «interesse», em duas categorias [1] : « interesses pecuniários» e « interesses não pecuniários» .

Assim, o « conflito de interesse» no sector público é particularmente importante porque se não é reconhecido e identificado claramente e de forma apropriada, pode comprometer a integridade das decisões dos principais agentes e funcionários do Estado (OCDE, 2005), agências governamentais, parcerias público-privadas, o Governo em particular, porque o fenómeno é uma questão complexa que reflecte questões de natureza estrutural de toda e qualquer sociedade civilizada, ou não.

 

O DILEMA

Claramente, e para além dos cargos de eleição, todos os sistemas de funcionalismo público contemplam a existência de cargos ou postos de livre designação política ou de confiança pessoal dos membros do governo, na mais alta hierarquia da Administração Pública, em particular nos departamentos ministeriais. Trata-se de pessoal que não adquire estabilidade e que deveria renunciar ao cargo quando se produz a desvinculação do ministro ou superior hierárquico imediato.

Assim, não existe, com substância, nos países analisados, legislação que limite ou enumere a proporção que pode ou deve representar o pessoal de livre designação política, excepto nos cargos de eleição. No entanto, é possível encontrar um itinerário lógico, legislativo, no caso de Portugal, assim como noutros. Existindo, deste modo, alguns requisitos, que podem limitar aquele perímetro, tais como:

  • Organização ministerial (leis orgânicas dos vários governos constitucionais);
  • Estrutura organizativa de cada instituição ou serviço (leis orgânicas das direcções-gerais, inspecções-gerais e secretarias-gerais, por exemplo);
  • Massa salarial disponível para efectuar escolhas ou designações políticas;
  • Limitação dos cargos de confiança a determinados níveis; e,
  • Indicação normativa (jurídica) de quais os postos que podem ser cobertos com tal procedimento (caso português).

O sistema de governação da Administração Pública requer novas formas do exercício do poder político em democracia, afigurando-se desde logo uma série de relações entre política e Administração, envolvendo os seguintes actores:

  • Por um lado aqueles dirigentes que desempenham apenas funções políticas ou, pelo menos, comprometidos com a agenda política; e, por outro,
  • Aqueles que, sem estarem comprometidos por esta agenda política seguem, em parte, objectivos e estratégias traçadas por aqueles; e, por último,
  • Aqueles que desempenham a função estritamente ausente do factor político.

A clássica dicotomia Wilsoniana e, em particular, a relação entre ministros e funcionários públicos (burocracia) não é um assunto novo na área da Administração Pública (Brans et al., 2002) ou como refere Jacobsen (2001) a relação entre políticos e burocratas e, em particular, a distribuição do poder entre as esferas é um clássico na ciência política desde Max Weber e Woodrow Wilson. A dicotomia entre políticos e burocratas é, em todo o caso, mais uma expressão do que uma realidade (...) (Popik, 1998), embora se paute, nas relações do sector público com o privado, pela não existência de estratégias e atitudes bem definidas sobre o « conflito de interesse » e de incompatibilidades, em particular no regime de pós-emprego público.

Se, por um lado, são os políticos que tomam decisões, por outro, também são os burocratas quem as executa e que, muitas vezes, são quem influenciam, fortemente, as decisões dos próprios políticos. É, de resto, a posição de Shergold (1997) acrescentando que os burocratas são uma simples parte da máquina do Estado, acrescentando que a transformação do serviço público transcende as barreiras ou limites da política.

A teoria que viria a desencadear a problemática sobre a relação entre políticos e burocratas foi a teoria clássica da separação de poderes (Machado, 1999). Conforme argumenta o autor, «a evolução das funções dos políticos e dos burocratas são produto da progressiva expansão do poder dos burocratas em desempenhar funções que antes residiam apenas na esfera de actuação dos políticos». É, pois, uma evidência que a formulação e a implementação das políticas públicas dependem, em grande medida, do equilíbrio no relacionamento entre políticos e burocratas (Pollitt, 1990). Parece, pois, inquestionável que os agentes em confronto terão obviamente que conviver em um ou outro cenário, numa ou noutra imagem, com menor ou maior grau de participação e/ou subordinação mas, com um enorme equilíbrio de relacionamento.

A reafirmação de uma dimensão política sobre a dimensão burocrática exige amplos esforços para levar a reforma administrativa à Administração Pública (Machado, 1999), esforços esses que, se acredita, derivam implicitamente do « paradigma da Escolha Pública» , que defende que o poder dos políticos, em especial dos que compõem os órgãos executivos públicos, deve ser aumentado à custa da diminuição do poder da burocracia, referindo-se a este propósito (Peters et al., 1999) que, para controlar o poder da burocracia, ou burocracias, se sugere um conjunto de actuações, a saber:

· Manipulação das estruturas, criando gabinetes que complementem as estruturas existentes e tradicionalmente dominadas pelos funcionários;

· Controlo do recrutamento nos postos mais elevados;

· Tentar mudar as atitudes e a cultura das pessoas que ocupam os postos mais elevados e de maior responsabilidade, independentemente do recrutamento se fazer por critérios políticos ou não; e

· Alterar o nível em que se tomam as decisões.

O estudo da relação entre política e burocracia ganha maior relevância no âmbito dos níveis mais elevados da Administração Pública, em particular os dirigentes, na medida em que as mudanças propostas mundialmente para alterar o aparelho estatal requerem a construção de «coligações» entre as lideranças políticas partidárias e/ou vinculadas ao Governo e os ocupantes de cargos de alta direcção/dirigentes. Há poucas indicações de como ocorre o equilíbrio dos ditames da burocracia com os da política. Ao contrário, procura-se geralmente estabelecer uma resposta tecnocrática como solução, tentando separar radicalmente a actuação técnica dos funcionários de carreira, considerada meritocrática, do padrão imposto pelos políticos, classificado quase sempre como clientelista (Loureiro et al., 1998).

Apesar do que se alega, é hoje consensual que a simples e única divisão do trabalho dos burocratas e dos políticos devam coexistir em duas esferas de actuação distintas, posição que vem sendo, aliás, diluída ao longo dos tempos, até por comprovação de estudos empíricos. Constata-se, assim, que se trata de uma relação mais complexa em termos de interacção.

Os burocratas vêm gradualmente ganhando espaço aos políticos na definição da missão e dos objectivos e orientação política e, por sua vez, os políticos têm cada vez mais necessidade de se imiscuírem ou envolver nos problemas da Administração e da gestão. Deste modo, o burocrata como executante neutro na óptica do desenho de Weber e de Wilson, em que não participa na elaboração das políticas públicas tem, assim, cada vez menos consistência. Os estudos empíricos de Aberbach, Putnam e Rockman (1981) introduziram um conjunto de imagens que reflectem uma interacção bem mais consistente do que a adentrada por Weber e Wilson. Um pouco mais longe vai o modelo de James Svara (1999) em que o autor constrói um modelo (1985) a que chama de Dichotomy-Duality-Model. Trata-se de um arquétipo inspirado no clássico modelo de decisão e no clássico modelo de Weber (Hansen et al., 2002).

Apesar do que se expõe, hoje parece abandonada a ideia de separação radical entre política e Administração (burocratas) (Jacosen, 2001). Políticos e burocratas são vistos como duas esferas que se encaixam. Freitas do Amaral (2002) salienta que a política e a Administração Pública não são actividades insensíveis uma à outra, já que a Administração Pública sofre de influência directa da política. Em regra, toda a Administração Pública, além de actividades administrativas, é também execução ou desenvolvimento de uma política. Mas, por vezes, é a própria Administração que se sobrepõe à autoridade política, por qualquer razão enfraquecida ou incapaz, caindo-se, então, no exercício do poder pelos funcionários (situação a que Max Weber chamou de burocracia e Galbraith tecnocracia (idem, 2002). Permanecem, apesar disso, algumas dúvidas, já que a distinção entre política e Administração no plano das ideias é mais ou menos consensual, sendo que no plano prático e do quotidiano nem sempre é tarefa exequível ao nível do seu entendimento.

Na literatura (ver por exemplo Bouckaert et al., 2000) podem encontrar-se vários estudos empíricos que pretendem dar resposta à complexidade das « relações entre os políticos e burocratas». Apesar daquela complexidade é possível categorizar, de modo geral, os seguintes tipos ou modelos para aquela relação:

i. Separados, razoavelmente politizados (Finlândia, Alemanha e Holanda);

ii. Fortemente politizados (Bélgica e Itália);

iii. Separados (Canadá e Irlanda);

iv. Separados, alguns politizados (Dinamarca);

v. Integrados, fortemente politizados (França);

vi. Separados, ligeiramente politizados (Japão, Noruega a Austrália);

vii. Separados, não politizados (Nova Zelândia e Reino Unido); e

viii. Separados, progressivamente politizados (Suécia).

Muitos países, na sua generalidade, e com uma rigidez variável, detêm um sistema legal de regulação mais rigorosa para o pessoal que ocupa cargos políticos do que para os restantes funcionários ou agentes, não implicando, por si só, que estes últimos também não se encontrem obrigados a alguns condicionamentos, nomeadamente o regime de incompatibilidade ou, eventualmente, a qualquer tipo de restrição.

De resto e ao nível das restrições em actividades políticas, da parte dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos pode dizer-se que (OCDE, 1998): (i) Podem participar em debates públicos e políticos. Situação comum ao México, Holanda, Nova Zelândia (com ressalva ao conflito com o interesse público e o código de conduta), Suécia, Suíça, EUA e Austrália (aqui com algumas recomendações a propósito do código de conduta), Áustria, Bélgica, Finlândia. Sendo expressamente proibido na Turquia e na Irlanda. Com algumas restrições, nomeadamente para os códigos de conduta e regras profissionais, estão o Reino Unido, Canadá, Dinamarca, França, Alemanha e Japão; (ii) Serem membros de partido político. Não há restrições em nenhum dos países assinalados, com excepção da Irlanda, Turquia e do Japão onde é proibido. Existem, contudo, algumas restrições no Reino Unido; e, (iii) Serem cidadãos elegíveis em actos eleitorais ou disputarem eleições nacionais (Governo) mantendo a qualidade de dirigentes (ressalvando-se a sua suspensão para o caso de Portugal). A situação é proibida no México, Turquia, Reino Unido, EUA, Austrália, Irlanda e Japão. Sem restrição para a Holanda, Suécia, Suíça, Áustria, Bélgica, Finlândia, França e Islândia. Com algumas restrições para Nova Zelândia, Noruega, Canadá, Dinamarca e Alemanha. De destacar que se presta especial atenção ao nível político, incluindo o parlamento (Itália, Japão, Nova Zelândia e Portugal), (OCDE, 2000), membros de gabinetes (Itália, Japão, Nova Zelândia, Portugal e Espanha).

 

PERÍMETRO DO «CONFLITO DE INTERESSE»: O CASO PORTUGUÊS

As disposições relativas a inexistência de « conflito de interesse » ou regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos de titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos aparece referenciado, disperso por vários diplomas legais, dos quais se destacam as mais importantes e actualizadas referências, a saber: Lei n.º 9/90, de 1 de Março, Lei n.º 56/90, de 5 de Setembro, Lei n.º 28/95, de 18 de Agosto, Lei n.º 42/96, de 31 de Agosto, Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto, Lei n.º 39-B/94, de 27 de Fevereiro, Lei n.º12/98, de 24 de Fevereiro, DL n.º 196/93, de 27 de Maio e DL n.º 71/2007, de 27 de Março.

Neste contexto, e para o caso português, constata-se que em toda a legislação se faz, sempre, referência aos seguintes cargos:

· «Cargos políticos de eleição» [2] ;

· «Cargos políticos de livre designação» [3] ; e,

· «Altos cargos públicos de livre designação política» [4] .

De tudo o que fica exposto, conclui-se que dos grupos e cargos em referência (cargos políticos e altos cargos públicos), se faz alguma confusão conceptual com outras especificidades. Dito de outro modo, os diplomas legais não são claros na separação de: «Cargos políticos de eleição» (embora aqui seja fácil encontrar o itinerário e/ou significado); «Cargos políticos de livre designação, de confiança política»; e, «Altos cargos públicos de livre designação, de confiança política». A pouca clareza persiste nos dois últimos grupos.

De todo o modo, e para efeitos do presente artigo, os cargos que estarão envolvidos serão os três grupos assinalados na Figura 3 e que prestam serviço, a qualquer título, no sector privado e que foram detentores de um dos cargos assinalados na Figura [5] seguinte.

 

FIGURA 3

Perímetro do conflito de interesse

 

TIPOS DE OFENSA NO PÓS-EMPREGO PÚBLICO

Para Kernaghan (2007) existem várias situações (que configuram tipologias) de ofensas que poderão ocorrer após a cessação de funções (sendo que poderão surgir quando se deixa o cargo público ou, eventualmente, quando se regressa a um novo cargo público diferente do primeiro), a saber: influência na busca de novo emprego; lobbying pós-emprego; «mudar de lado» (político); uso de informações privilegiadas; e emprego de ex-funcionários ou agentes públicos. Assim, e de acordo com o mesmo autor (idem, 2007) a gestão do «conflito de interesse» no pós-emprego público (ou cessação de funções) decorre (e ocorre) principalmente quando os funcionários e agentes públicos estão a trabalhar no e para Governo, depois de deixarem o Governo, nas relações de actuais funcionários com ex-funcionários e nas organizações privadas que empregam ex-funcionários e agentes públicos.

Regular, e até gerir, as situações de ofensa ao regime pós-cessação de funções tende a ser mais difícil do que nas situações em que o «conflito de interesse» ocorre durante o exercício da função, porque os crimes no regime de pós-emprego público conquanto sejam cometidos por funcionários e agentes públicos que, embora estejam fora da Administração Pública, movem-se em termos de influência muito para além do próprio controlo do Governo. As restrições podem, muito mais facilmente, serem aplicadas a actuais funcionários e agentes e titulares de cargos públicos, do que àqueles que cessaram funções. Em qualquer caso a panóplia de «conflitos de interesse» (Figura 4) é bastante numerosa o que torna o seu controlo ainda mais difícil.

 

FIGURA 4

Potenciais «conflitos de interesse» em potenciais situações

 

No movimento (relação) entre o sector público e o sector privado é bem conhecida a expressão revolving door. É neste movimento de actores (público e privado) que existe tal fenómeno (Figura 5). Grandes executivos de empresas privadas e de grupos de interesse têm até relacionamentos muito próximos (íntimos) com instituições governamentais, em especial os que regulam sectores de actividade que lhes são próximos ou que, potencialmente, lhes aporta interesse.

 

FIGURA 5

Fenómeno do Revolving door

 

Nesta decorrência e perante o exposto, o interesse pela ética assume particular importância como parte da solução e, talvez, como possível solução para comportamentos menos adequados e inoportunos no regime de pós-emprego público.

Existem vários métodos que estão disponíveis para controlar, ou pelo menos minimizar, o fenómeno da «porta giratória» (revolving door) e que têm implicações no « conflito de interesse» . Esse controlo pode ser exercido (Young, 2006), de entre outras, por medidas que contemplem uma legislação que obrigue à divulgação de bens e rendimentos, à divulgação e transparência de interesses pessoais e familiares, nomeadamente a situação de possíveis incompatibilidades profissionais e pessoais, etc.

Em muitos países da OCDE existem várias combinações de mecanismos, especialmente aqueles que têm como objectivo sensibilizar para a garantia da transparência, que são implementados com alguma eficácia para evitar o « conflito de interesse» (Demmke et al., 2008, apud Gençkaya, 2009) (Figura 6).

 

FIGURA 6

Normas comuns em matéria de «conflito de interesse»

 

Por exemplo, no conjunto de países da UE assinalados na Figura 7, pode ver-se que apenas um agregado de 11 países possui políticas ou regulamentos que abrangem o regime do pós-emprego público para os que cessam funções no Governo e apenas seis países para os que cessam funções no Parlamento, existindo, mesmo assim, um número significativo de ausência de informação e não regulação da situação, tornando a condição do pós-emprego público, ao nível das políticas, muito fragilizada em países- membros da UE (Figura 7).

 

FIGURA 7

Políticas sobre « conflito de interesse» nos membros do Governo e do Parlamento dos países-membros da EU

 

Como já se referiu, o fenómeno do «conflito de interesse» está relacionado com a ética ou, pelo menos, com a falta dela, o que potencialmente leva a mais e maior corrupção. Tal facto contribui, inequivocamente, para ameaçar e criar barreiras ao desenvolvimento nacional ( Pathranarakul, 2005). Neste entendimento, deverão ser propostas medidas específicas que: encorajem os líderes de todas as organizações a agirem como catalisadores para a mudança e reforço de melhoria dos mecanismos da deontologia profissional, melhorando, ao mesmo tempo, a integridade na gestão das organizações públicas e privadas; e, coloquem o problema do «conflito de interesse» na agenda nacional, de forma a desenvolver sérios esforços na sua implementação, quer ao nível do indivíduo, quer ao nível organizacional, incrementando orientações para a gestão do « conflito de interesse » no serviço público (organizações políticas e governamentais).

 

PERÍODO DE REFLEXÃO (C OOLING-OFF PERIOD) VERSUS REGIME DO PÓS-EMPREGO PÚBLICO (POST-PUBLIC EMPLOYMENT)

Admite-se que o problema do cumprimento, ou não, do período de reflexão (cooling-of period) está para além das regras ou regulamentos legais que se possam estabelecer. Sem se dissentir está, também, o problema da ética (ausência de comportamentos éticos) que, do mesmo modo, não fica resolvido apenas pelos códigos de conduta ou quaisquer outros regulamentos legais, mesmo que em abundância. Assim, e apesar da ocorrência de multiculturalismos presentes nas várias formas de governação, a solução não está por si só, e por mais ou menos rígido que seja o sistema, no estabelecimento de um período temporal de um mês ou, até, num período ilimitado de «reflexão» (Figura 8).

 

FIGURA 8

Período de reflexão (Cooling-off period)

 

O cooling-off period [6]deverá ser proporcional à potencial gravidade e risco do «conflito de interesse» no pós-emprego público. Como se refere em Gely et al. (2001) (…), há uma variação substancial de país para país, e também dentro dos países nos vários níveis de Administração Pública, do cumprimento dos prazos e limites adoptados para evitar crimes no pós-emprego público, embora o seu cumprimento seja mais efectivado para os altos cargos políticos do que os restantes agentes e funcionários.

Na tentativa de combater irregularidades em áreas funcionais da gestão pública, vários países da OCDE promoverem a implementação de programas de ética, em particular de mecanismos de transparência e de responsabilização, que pretendem apoiar o comportamento ético dos funcionários através de uma mistura de regras e incentivos gerenciais (UNPAN, 2004). Vários instrumentos se têm desenvolvido para prevenir o «conflito de interesse», embora as proibições e restrições devam ser encaradas como soluções temporárias (OCDE, 2006a), exigindo-se sempre atenção ao fenómeno. Reconhecem-se, para alguns países, alguns desses exemplos de prevenção e forma de evitar o «conflito de interesse» (Figura 9).

 

FIGURA 9

Instrumentos que previnem o «conflito de interesse»

 

Como se conhece, a maioria (85% sim, 14% não) dos países da OCDE adoptou um conjunto de procedimentos ao nível das proibições e restrições no regime de pós-emprego público. Apesar disso, aquele aumento formal de mecanismos (códigos de legislação primária e secundária, de conduta, e outros documentos jurídicos ou documentos não legais) não tem traduzido, na prática, uma eficaz prevenção do «conflito de interesse». Contudo, a legislação primária tem sido a mais abundante forma de mecanismos de prevenção do fenómeno na generalidade dos países.

Mas, como argumenta Bell (2007), nenhum dos relatórios nacionais sugere que a corrupção é endémica e que se trata de um problema generalizado a todo o sistema, facto que não é abonatório para as boas práticas de combate ao fenómeno, uma vez que é do senso comum que o período de pós-emprego público é, e foi identificado, como uma área de risco emergente nas relações público-privadas (OCDE, 2006a), sendo necessário, por isso, garantir a aplicação efectiva das regras e políticas que evitem e previnam o «conflito de interesse» no período pós-cessação de funções do emprego ou cargo público. Neste sentido, parece clara a ideia da necessidade do desenvolvimento de princípios éticos que promovam a diminuição gradual e a ausência do conflito, estabelecendo-se um conjunto de princípios ou pilares que funcionem num quadro de boas práticas (Figura 10).

 

FIGURA 10

Factores-chave para o regime de pós emprego público

 

(IN) CONCLUSÃO REFLEXIVA

As causas do aumento da preocupação pública e governamental sobre o «conflito de interesse» no pós-emprego público inclui o facto do sector público ter vindo a desenvolver estreitas interacções com outros sectores, o que pode resultar num aumento dos riscos para a manutenção da sua integridade (OCDE, 2009).

Determinar a extensão do fenómeno do revolving door e o seu efeito real sobre eventuais distorções na política pública é uma tarefa árdua. Como referem vários estudos, é difícil provar ou determinar que uma ocasionada decisão que tenha sido tomada, beneficiando ou não, tenha sido feita por uma questão de lealdade para com o empregador anterior, para agradar a si mesmo ou, até, para agradar a um potencial empregador futuro. Pode simplesmente ter sido tomada apenas a coberto da elementar visão que o funcionário ou agente tem sobre a realidade… Se assim for, é uma questão de ética ou simplesmente ideológica? Parece ser do conhecimento de todos que o fenómeno do revolving door é um problema de ligação de interesses privados e de interesses públicos e, em última instância, dos interesses privados e das decisões do Governo que poderão consubstanciar-se num importante instrumento de influência ou tráfico de influência. Sabe-se, assim, que a solução não passa, apenas, pela proibição ou imposição de um período temporal (período de reflexão no pós-emprego público) aos ocupantes de cargos políticos e de altos caros públicos na Administração Pública, de livre designação do poder político. A possibilidade de poderem beneficiar, ou beneficiarem-se, das políticas que ex ante formularam, pode conservar-se em qualquer dos casos. Todos experienciam, assim, que a solução não passa só pelo melhoramento das leis ou regulamentos.

A pressão entre a noção tradicional de Administração Pública e da nova forma de gestão pública está a surgir, não surpreendentemente, mais nos países que não têm uma atenção especial ao problema de «conflito de interesse» porque, cada vez mais, o Estado tem mais relações com o sector privado. É, possivelmente, na área da ética e deontologia que o problema é claramente mais identificável. Não parece existir incerteza de que a cultura da ética é um factor importante para garantir que a Administração Pública mantenha o grau de confiança pública necessária numa democracia moderna. Assim, não detemos interrogações, absolutamente, de que a solução para garantir um pós-emprego público mais íntegro e transparente passa não só, obviamente, pelo aumento e qualidade de mais regras ou legislação primária mas, também, por uma cultura de civilidade desde a idade precoce, pela formação e aprendizagem, como cultura de valores que promovam o interesse público num quadro ético e de moralidade, transparência e controlo, de responsabilidade individual e do exemplo pessoal. Em conclusão: uma cultura organizacional que seja intolerante ao «conflito de interesse».

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Notas

[1] Interesses pecuniários: envolvem potenciais ganhos financeiros. Interesses não pecuniários: envolvem a componente não financeira.

[2] Por exemplo: Presidente da República, Primeiro-Ministro, etc.

[3] Por exemplo: Membros da Alta Autoridade para a Comunicação Social, Governador e Vice-Governador Civil, etc.

[4] Por exemplo: Director-geral e Subdirector-geral.

[5] O Top Public Service (TPS) não se confunde com Top Management Service (TMS) já que aquele (TPS) se refere a posições políticas ou, pelo menos, de livre escolha e designação política, não se excluindo que para alguns países as duas situações (políticas e não políticas) se encontram por vezes naquele grupo de designações, enquanto o TMS é um reconhecido (normalmente) e estruturado sistema de gestão de pessoal para as posições do alto funcionalismo público, mas que não são políticas, ou pelo menos de escolha ou designação do poder político. Para o caso português, o Top Public Service é o equivalente aos nossos directores-gerais, secretários-gerais, inspectores-gerais e directores municipais, o Top Management Service é o equivalente aos nossos directores de departamento e chefes de divisão e equiparados; Sendo que ambos os subsistemas pertencem ao grupo do Senior Public Service. O termo Political Civil Servants (PCS) dado às posições do TPS não deve ser confundido com as do TPM. Aquelas, ao contrário destas, são posições administrativas (TMS) e não posições políticas (TPs). O mesmo é dizer, socorrendo-nos do caso português, que os directores-gerais e inspectores-gerais (de entre outros) fazem parte do Political Civil Servants e que os Directores de Serviço e Chefes de Divisão assumem-se (pelo menos desde 1997) como posições administrativas, não políticas, embora não incluídas em carreira, fazendo, da mesma forma, parte dos designados «cargos híbridos». A palavra executive, muito usada na América do Norte e Pacífico para designar Top Managers é enganadora: No Reino Unido e na Irlanda é aplicada aos níveis mais baixos do funcionalismo público onde os seus ocupantes são recrutados sem qualquer formação universitária. O adjectivo sénior pode ser confundido com alguma aparência com seniority (antiguidade). A expressão Higher civil service é muito usada para substituir a expressão Cadres Supérieurs e/ou Haut Fonctionnaire (França); e, o Senior Executive Service (SES) tem o mesmo significado que a expressão Senior Civil Service (por exemplo nos EUA e no Reino Unido). Normalmente designa-se para o TPS o spoil system e para o TMS o merit system.

[6] Tempo de reflexão imposto ao agente ou ocupante do cargo após cessação de funções.

[7] Os cinco anos de «período de reflexão», como máximo, podem ser aplicado aos funcionários públicos que deixam o serviço antes de atingirem a idade de reforma (65 anos na Alemanha). Quando os funcionários públicos deixam definitivamente o serviço público (França) não podem exercer actividades privadas, por um período de cinco anos, que são determinadas pela Administração ou, ainda, participar em empresas privadas que tenham relacionamento com o ex-empregador, OCDE (2006a).

[8] Em alguns casos não há prazo fixado aplicado, porque a duração real das limitações depende da matéria específica em que o funcionário tenha participado pessoal e substancialmente (idem, 2006a).