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Etnográfica

Print version ISSN 0873-6561

Etnográfica vol.21 no.3 Lisboa Oct. 2017

 

ARTIGOS

 

“Under my skin”: apontamentos biográficos de uma antropóloga em processo

 

“Under my skin”: biographical notes of an anthropologist in progress

 

 

Sónia FerreiraI

ICentro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA / NOVA FCSH), Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, Portugal; URMIS-Paris VII, França. E-mail: sonia.ferreira@fcsh.unl.pt

 

 


RESUMO

A autora partilha reflexões sobre as próprias experiências de investigação, considerando que o antropólogo é os terrenos que faz e o que estes fazem dele e com ele.

Palavras-chave: cultura, ação, comunidade, terreno, investigação, antropologia


ABSTRACT

The paper presents the author’s reflections about her own research experiences, considering that an anthropologist is defined by the fields she / he constructs and is constructed by.

Keywords: culture, action, community, fieldwork, research, anthropology


 

 

Decidi intitular o presente texto a partir do título do primeiro volume da autobiografia de Doris Lessing (1994) porque, ao preparar um relato de incidência biográfica, não pude deixar de sorrir ao lembrar-me das suas provocadoras palavras: “you cannot sit down to write about yourself without rhetorical questions of the most tedious kind demanding attention” (1994: 11).[1] E, assim, voltarei a algumas das questões, por vezes retóricas, e espero que não muito entediantes, que partilhei anteriormente com colegas a partir do conceito de cultura – mostrando como este tinha surgido nas minhas investigações de doutoramento e pós-doutoramento e afetado não só o meu posicionamento no terreno, como a minha própria legitimidade e autenticidade enquanto detentora ou não de uma “cultura profissional” e de uma “cultura nacional” específica; evocando assim o papel do antropólogo no terreno e o modo como este, o terreno, integra o antropólogo, lhe atribui uma identidade e um papel, sendo por isso uma etapa da investigação em que o sujeito está em processo de se tornar qualquer coisa que por vezes pode ser gerida e previamente acautelada, outras nem por isso. Os terrenos são, nesse sentido, momentos únicos de encontro e criação, envolvidos pelo tempo e o espaço que os circunda, dos quais, retomando as palavras certeiras de Lessing (1994: 16), retirar os factos é fácil, sendo as atmosferas que os tornam possíveis o que é verdadeiramente difícil aprisionar.

Neste texto retomo algumas dessas considerações, alargando-as ao meu atual terreno de investigação e ampliando nesse sentido as minhas reflexões do conceito de “cultura” para o de “comunidade”, por este último ter adquirido grande centralidade na minha atual pesquisa.

 

No doutoramento: cultura e ação

Na minha tese de doutoramento, o conceito de cultura surge a partir de uma perspetiva puramente teórica, em que eu, a investigadora, o introduzo para o relacionar criticamente com o material empírico recolhido no terreno, concedendo-lhe destaque heurístico enquanto um dos conceitos que ofereciam uma explicação analítica para a realidade que analisava.[2]

Assim, na minha investigação sobre resistência operária em Almada, durante o período da Segunda Guerra Mundial (Ferreira 2010), nenhum dos meus entrevistados utilizou alguma vez a palavra “cultura” nos seus depoimentos. Mas eu fui buscá-la enquanto conceito antropológico para falar de “cultura de resistência”, de “cultura operária” e, acima de tudo, para relacionar “cultura” com “ação coletiva”.

Esta questão apresentava-se como pertinente porque eu defendia a relevância da análise dos fatores microestruturais que antecedem a mobilização coletiva, conferindo destaque às fases de pré-mobilização como fator parcial de explicação para a forma e o desenvolvimento de um movimento social (­Johnston, Laraña e Gusfield 1994). Isto permitia ter em atenção o papel da cultura neste processo, já que a continuidade não nasce apenas da persistência da organização, mas igualmente de sentidos e sentimentos partilhados pelos membros de um movimento.

Discuti teoricamente o assunto a partir de duas abordagens distintas. Uma primeira acentuava a relação entre valores e ação e permitia pensar esta como conduzida através de princípios fundamentais com os quais os atores se identificam e, simultaneamente, perceber a forma como os valores influenciam a definição de objetivos específicos e a identificação de estratégias eficientes, providenciando as motivações necessárias para suster os custos da ação (della Porta e Diani 1999: 61-62).

Esta perspetiva não permitia, contudo, descrever os valores como variável explicativa central no caso de ações que, por definição, põem em causa alguns dos culturalmente legitimados objetos de poder de uma dada sociedade. Nesse sentido, Swidler (1986) contrapõe criticamente, ao defender que a cultura influencia a ação não ao providenciar os valores que a orientarão, mas ao moldar um repertório de hábitos, aptidões, etc., a partir dos quais as pessoas construirão estratégias de ação e formas de a organizar. Ou seja, a cultura contribui para a ação moldando a sua formação e desenvolvimento e não determinando os objetivos a atingir, já que esta não constitui um sistema unificado mas antes um repertório a partir do qual os atores selecionam componentes para construir linhas de ação.

Uma segunda abordagem discutia a possibilidade de interpretar a experiência dos movimentos sociais ou coletivos como praxis cognitiva, o que implicaria a permanente circulação de produção e reprodução de códigos culturais. Reconhecia-se que uma componente chave dos movimentos se encontra de certa forma relacionada com a produção simbólica, sendo esta entendida não como pré-condição para o conflito, mas sim como uma das suas partes constituintes (della Porta e Diani 1999: 69).

Assim, e de forma resumida, estas eram mais ou menos as questões que eu ia colocando, discutindo-as a partir de um regime ideológico particular, o do Estado Novo, e articulando-as com questões associadas ao género e à classe, pois estudei essencialmente os discursos e as memórias de um grupo de mulheres operárias.

 

No pós-doutoramento: “cultura” e “comunidade” em contexto migrante

Quando cheguei ao Canadá, em 2009, mais especificamente a Toronto, para a realização de uma pesquisa de pós-doutoramento, deparei-me com uma situação totalmente diferente, pois todas as pessoas com quem falava utilizavam nos seus discursos a palavra “cultura”.[3] Não contei a sua incidência na transcrição das 47 entrevistas realizadas durante a estadia de terreno, mas este era sem sombra de dúvida o termo mais vezes utilizado nos discursos pelos meus entrevistados e outros interlocutores no terreno, a par, talvez, com o de “comunidade”. Aliás, os termos justapunham-se com frequência em expressões como a “cultura da nossa comunidade” ou “a nossa cultura”, ou expressões adjacentes como “a nossa tradição” ou “a tradição da nossa comunidade”, “os nossos costumes”, etc.

Neste contexto, o termo aparecia-me claramente de forma emic, emanava do terreno, a partir de discursos, tanto individuais como coletivos. Havia assim uma ideia, aparentemente estabelecida, sobre cultura – cultura em geral, cultura portuguesa – que permeava os discursos do grupo, apesar das inerentes tensões internas, clivagens de classe, de idade ou de região de origem, como acontecia, por exemplo, com a proclamada “subcultura” dos açorianos (­Oliveira 2009; Leal 2016).[4]

A ideia de cultura apresentava uma grande centralidade neste domínio, tornando-se fundamento de muitas reivindicações, que tanto assumiam discursos mais marcadamente identitários como outros de caráter político, exemplo dos discursos de campanha dos políticos luso-canadianos ou dos que pretendem ganhar o voto “étnico” dos portugueses, e também discursos com objetivos económicos ancorados no designado “comércio étnico” e na promoção, por exemplo através de anúncios publicitários, de práticas de “comercialização da nostalgia” (Leal 2000).

As produções mediáticas da designada “comunidade” portuguesa constituíam o objeto de análise do projeto de investigação em que me encontrava inserida no Canadá, e muitos dos seus produtores assumiam mesmo frequentemente o papel de ativistas culturais, esgrimindo argumentos e acionando estratégias de legitimidade em torno da sua proximidade e conhecimento sobre a cultura portuguesa (Ferreira e Rosales 2010; Silvano, Rosales e Ferreira 2013). E os conteúdos que produziam eram apresentados como conteúdos sobre a “nossa cultura”.

Num dos programas de televisão estudados no âmbito desse projeto, o forte laço com uma identidade cultural portuguesa é enfatizado pela utilização constante de signos culturais, como a bandeira nacional, videoclips musicais e a presença em estúdio de objetos decorativos alusivos a Portugal e ao catolicismo. E no dia 10 de junho, dia oficial de Portugal e das Comunidades Portuguesas, os símbolos nacionais, sempre presentes no cenário, são exibidos de forma particularmente expressiva.[5] A apresentadora enverga uma blusa que tem como padrão a bandeira nacional portuguesa e, posicionando-se em frente a um escudo português que se encontra pendurado na parede do estúdio, deseja “Bom dia da pátria a todos!”, relembrando como este dia é, segundo ela, celebrado com maior emoção pelas “comunidades portuguesas” do que pelos portugueses residentes em Portugal.[6] E a seguir estabelece parâmetros identitários diferenciadores entre o Canadá e Portugal, através da distinção “pátria” e “país”, afirmando: “a pátria é onde nascemos, mas o Canadá é o nosso país”, reiterando que não quereria viver noutro sítio e agradecendo “a esta grande terra que é o Canadᔠpor “nos ter acolhido há tantos, tantos anos” e por ser um país onde os portugueses têm o direito de promover e celebrar “as nossas raízes e a nossa cultura”.

Neste programa, os conteúdos difundidos tendem a reproduzir, respeitar e enaltecer o que é designado como “as nossas tradições” e a “cultura da nossa comunidade”, assumindo a apresentadora um posicionamento estratégico próximo do que defini, a partir de Ginsburg (1997), como o de um “ativista cultural”, facto que não se encontra isolado da sua participação política no ­Partido Democrata, concorrendo a um cargo escolar numa área maioritariamente portuguesa em termos residenciais.[7] Deste seu posicionamento deriva a ­possibilidade de se assumir enquanto “autoridade cultural”, o que é bem visível em alguns dos comentários que tece, por exemplo, às atividades promovidas pelas associações de migrantes portugueses no que concerne à legitimidade e validade dos elementos culturais materiais e expressivos por estas promovidos e que são definidos como pertencentes à “cultura popular portuguesa”, em alguns casos especificamente açoriana.[8]

Esta utilização da cultura como recurso simbólico vai ao encontro do descrito por Bendix (2005: 200), que chama a atenção para os papéis culturais que os sujeitos, que ela define como entrepreneurs, assumem no seio de uma “economics of folk culture” (Bendix 2005: 202). Estes promotores, na literatura sociológica e antropológica designados geralmente mediadores ou cultural brokers, procuram organizar os indivíduos, a sua audiência ou clientela, com base no princípio orientador da etnicidade. Como refere Brettell, “the entrepreneur employs the idiom of ethnicity to maintain a degree of ethnic isolation and to enhance identification with the Portuguese nation” (2003: 130).

A definição dos parâmetros que definem esta “cultura popular” levanta, contudo, questões complexas e frequentemente associadas a discursos sobre poder, autenticidade e legitimação. A construção da “autenticidade cultural”, como sugerem Klimt e Leal (2005), pode assumir várias formas nos diferentes contextos em que decorre no mundo lusófono e, no caso da produção mediática que tenho vindo a referir, a autoridade para decidir o que constitui a “cultura do popular”, tal como os autores referem, ancora-se na ideia de pátria, e a sua validação assenta em demonstrações de relação continuada e de similitude cultural com esse lugar de origem (Klimt e Leal 2005: 11).

Assim, no contexto onde decorreu a minha primeira investigação de pós-doutoramento as discussões em torno do vocábulo cultura e da sua semantização foram-me impostas pelos meus informantes, sendo eu própria frequentemente descrita e apresentada como parte integrante e, neste caso, verdadeiramente legítima desta cultura a que se referiam. Mostravam-me frequentemente elementos da mesma que eu desconhecia ou que não integro habitualmente nas minhas práticas quotidianas mas que ali havia necessidade de reafirmar e legitimar. Desta vez não era questionada sobre a repressão no período do Estado Novo, sobre termos técnicos da indústria da cortiça ou “daqueles tempos difíceis que se viveram”, num claro afastamento geracional. Ali, no Canadá, eu era o exemplo vivo daquela cultura que os meus informantes referiam, falava um português considerado excecional e frequentemente invejado, comia pastéis de nata e bebia bicas nos cafés da “comunidade” e estava a par das notícias sobre a política nacional. Por outro lado, não reconhecia a visão mitificada de um Portugal rural e bucólico, nunca tinha cantado tantas vezes o hino nacional, nem dominava as canções dos ranchos folclóricos ou de alguns cantores populares, e assim também lá fui eu tentando cumprir, por vezes com dificuldade, o meu lugar enquanto membro da “nossa cultura” e membro honorário “da nossa / sua comunidade”.[9]

Em França, onde desenvolvi ulteriores pesquisas de pós-doutoramento, estas questões colocaram-se de forma bastante diferente.[10] Mais do que a ideia de cultura partilhada, transmitida, é em grande medida o termo “comunidade”, também ele tão caro à discussão antropológica, o que levanta as questões mais interessantes. As políticas francesas no que diz respeito à imigração partem do modelo laico e republicano que concebe a integração como um processo individual, o do universalismo republicano, e que conduz ao não reconhecimento institucional das especificidades dos grupos. A França enquanto “nação” ignora, até aos anos 80, o facto de ser um país de imigração (Schnapper 1989), acentuando a persistência do mito da unidade nacional pós-Revolução Francesa (Noiriel 1988). Nancy Green (1991) considera, por exemplo, que uma das grandes diferenças entre a França e os EUA é precisamente a da conceptualização da sua identidade nacional em função daquilo que a imigração traria para esta. Reproduz-se a ideia da França como país de asilo, mas não recetor de imigração maciça, a França como país da homogeneidade cultural, ideia promovida, a partir do final do século XIX, pelas próprias ciências sociais. Estas, aquando do seu nascimento, numa Europa industrializada e em formação de Estados-nação, continuam no hexágono a reproduzir a ideia, pós-Revolução, da nação enquanto relação contratual com o Estado e não ancorada em relações étnicas ou culturais. Só a partir dos anos 70 podemos encontrar um olhar para as identidades particulares e uma análise e descrição das características etnológicas do “povo francês”. O universo migrante continua, no entanto, a ficar invisível (Noiriel 1992) e existem de facto diferenças substanciais entre o creuset (fusão) francês e o melting pot americano, onde se desenha uma oposição relevante entre um “dever de história” e um “dever de memória”. No primeiro é a questão da esfera pública que se impõe, remetendo para a construção da cidadania e tendo a nação como quadro de referência, ou seja, o todo e não grupos particulares. Alguns movimentos em França têm vindo a contrariar isso, mas a criação, em 2004, do projeto da Cité Nationale de l’Histoire de l’Immigration não apaziguou os ânimos, antes continuou a alimentar a polémica por esta privilegiar na sua exposição permanente a perspetiva temática, não dando assim visibilidade aos diferentes grupos ou “comunidades” supostamente representados.[11]

Ora, o termo “comunidade” remete para a ideia de grupo, de pertença, logo de diferença e oposição a outros grupos. E se, no discurso oficial português, o termo “comunidade” ou “comunidades” é entendido como território simbólico de uma nação portuguesa desterritorializada, em França a reprodução desse discurso é, ainda hoje, fortemente criticada.[12] Os discursos políticos reprovam abertamente aquilo a que chamam comunitarismo ou práticas comunitárias; exógena e endogenamente, não há “comunidades de franceses” a viver no estrangeiro, aliás os franceses emigrados são designados como expatriados, o que de si oferece uma reflexão interessante sobre o conceito de emigração e a sua óbvia atribuição a uma migração essencialmente económica oriunda de países entendidos como periféricos. Mesmo os grupos de portugueses residentes em França que chegam entre finais dos anos 60 e abril de 1974 se distinguem entre os que assumem frontalmente o projeto migratório como económico e os que destacam antes a sua componente política, pelo repúdio da ditadura, da guerra colonial ou da subserviência ideológica. Sendo estas questões mais porosas do que estanques (Clímaco 1992; Pereira 2000, 2012), não deixam de criar discursos e representações que circulam em torno das definições e caracterizações da primeira vaga maciça de emigrantes portugueses chegados a território francês, entrecruzando as questões de classe, de género ou de proveniência regional.[13]

Não existe assim oficialmente uma “comunidade portuguesa” para o Estado francês, mas existe o disfarçado apelo ao voto étnico, com as reuniões dos candidatos às eleições autárquicas com porteiras portuguesas, os cafés bebidos por Marine Le Pen num “café português”, o apoio dado a comemorações específicas como as do 10 de Junho ou ao filme La Cage Dorée (A Gaiola Dourada, 2012) promovido pelo único eleito português da Câmara Municipal de Paris no ano anterior ao plebiscito, enquanto comanda uma campanha ­explicitamente direcionada para os portugueses intitulada “Quem vota, conta”. Para o Estado português, esta “comunidade” existe de forma aberta, fixada essencialmente no Conselho das Comunidades Portuguesas e organizações similares e num conjunto de notáveis selecionados através das estruturas diplomáticas e das parcerias económico-políticas que se instituem enquanto porta-vozes e dinamizadores desta “comunidade imaginada” (Anderson 1983), que é assim instrumentalizada quando necessário na criação de um “nacionalismo à distância” (Anderson 1992; Glick-Schiller e Fouron 2001). E por tudo isso não deixamos de encontrar em França discursos sobre pertença, adesão ou integração num modelo, o do “ser português”, que se procura validar entre “compatriotas” e se descreve aos recém-chegados.

Já no Canadá estas questões – de pertença ou não à “comunidade”, de caracterização e circunscrição dessa mesma “comunidade”, as representações e subsequentes estereótipos a esta associados – não estavam ausentes dos discursos que se estabeleceram no terreno. Mas em França, a instrumentalização política dos migrantes portugueses, a frequente associação dos portugueses aos bons migrantes, aos bem “integrados”, entendendo-se integrados no sentido da integração no mercado de trabalho, com pouca participação cívica e inerente fraca participação em movimentos sociais, mas uma imagem positiva e exemplar (Cordeiro 1985), coloca o discurso sobre a “comunidade” num plano mais sensível. Num colóquio sobre cinema e revolução pude assistir a mais uma contenda onde se digladiavam argumentos contra e a favor o filme La Cage Dorée (2012) de Ruben Alves, versus o Ganhar a Vida (2001) de João Canijo, partindo precisamente a discussão de quem pode legitimamente caracterizar e de quem contribui para estereotipar.[14] No caso de La Cage Dorée, discutia-se o conferir eventualmente má visibilidade em frases como “faz mais mal do que bem”, por amplificar uma imagem que se considera essencialista e redutora.

Existiram alguns movimentos que poderíamos classificar de contracorrente representacional, como a Associação Lusogay, que em 2003 desfilou na Gaypride de Paris em traje folclórico, ou a campanha da Associação de Jovens Cap Magellan, de 2001, intitulada “Portugal is chic” (“Portugal é chique”), demonstrando que esta negociação conflitual não é nova (Dos Santos 2010).

No Facebook, e faço referência às redes sociais pela atualidade que têm enquanto terreno etnográfico, assisto com bastante frequência a discussões deste género que incidem, e vou dar apenas dois exemplos dos inúmeros possíveis, nos comportamentos da dita “comunidade portuguesa”, como a lista de portugueses candidatos às eleições autárquicas a concorrer pelo Front ­Nacional,[15] ou a emissão na televisão francesa de um programa bastante popular e com muita audiência, sobre Portugal, com imagens de La Cage Dorée e testemunhos de Tony Carreira, Linda de Suza[16] e Cristiano Ronaldo. As redes sociais tornam-se assim também locais de contenda identitária, onde as discussões vão do questionar da própria ideia de “comunidade” às corretas características a imputar a esta. E, assim, a “comunidade portuguesa imaginada” veste-se e despe-se de atributos ao sabor dos argumentos dos seus partidários ou detratores.

Estas questões não podem obviamente ser dissociadas do contexto atual, e um tema que marcou indelevelmente o meu terreno, associado à realidade económica e política portuguesa com a entrada da Troika[17] e das medidas de austeridade que todos conhecemos, é o da denominada “nova emigração”, emigração esta que apresenta como traço peculiar o integrar supostamente um conjunto significativo de jovens qualificados. Não apresentarei neste texto uma discussão detalhada sobre a quantificação ou qualificação dessa emigração, mas esta questão tem assumido fortes repercussões na minha estadia de terreno já que me foi imputado várias vezes o papel de representante dessa geração qualificada que “opta” por viver no estrangeiro.[18] As perguntas sobre a minha situação efetiva – uma investigadora apenas de passagem?, alguém em processo migratório?, qual a relação com Portugal?, quais as expectativas em França e em Portugal?, como compará-las? –, aliadas ao facto de a minha estadia ser feita em família (com um marido e uma criança que quando chegou tinha cinco meses), criam uma relação com o terreno bastante ambígua, pois a minha posição profissional (e com isto quero dizer situação na profissão) torna-me um exemplo vivo das questões mais discutidas sobre Portugal e os portugueses. Se posso ser, pela faixa etária e as habilitações académicas, comparada aos jovens que aparecem no artigo da revista francesa Les Inrockuptibles, de 4 novembro de 2012, intitulado “Portugal, la valise ou la misère”, é com estranheza para muitos que rejeito para música de fundo da minha existência o regresso “Para os braços da minha mãe”, espécie de hino da nova emigração cantado por Pedro Abrunhosa e Camané, afastando-me de uma categorização que parece assentar-me tão bem e que a realidade em França acentua vertiginosamente.[19] Os despedimentos na Embaixada, o afastamento do delegado da agência noticiosa Lusa, a sua substituição por uma jornalista mais nova e mais mal paga, a substituição desta por outra jornalista ainda pior remunerada, o despedimento de inúmeros professores de português, ou seja, o visível desmoronar de relações laborais, económicas, culturais e mesmo de direitos civis (com o encerramento de consulados) estabelecidas na emigração com o Estado português assumem centralidade. E o antropólogo, com a sua chegada a França, torna-se exemplo desse estado que se esboroa, assumindo-se desde logo que a sua presença representa uma opção pela emigração. Esta representação, este impulso para que me torne também porta-voz de uma geração esmagada pelo peso da austeridade, em confronto aberto com o Estado e o regime que abertamente deixou de a representar – o convite do primeiro-ministro à emigração dos mais novos ecoa, sendo-me frequentemente pedido com estupefação que confirme a veracidade da afirmação – provoca uma necessidade constante de me posicionar sobre a temática. Ou seja: o que acho da situação do país?, quero voltar?, vou voltar?, o que pretendo fazer da minha vida? E simultaneamente confere-me o papel de autoridade, por ter vivido lá, por ainda estar mais lá simbolicamente e por isso poder atestar a veracidade de muitas informações que chegam via meios de comunicação social, redes sociais ou histórias familiares. E, assim, fui mesmo convidada a relatar a minha experiência de vida numa reportagem para um canal televisivo português sobre os novos emigrantes. Declinei o convite, mas, para quem estuda os média, claro, várias reflexões a acrescentar ao caderno de campo.

Em França, tal como no Canadá, é-me assim frequentemente atribuída uma identidade fortemente associada à minha relação com Portugal, à minha identidade nacional. Agora menos pelos atributos que poderíamos denominar como mais clássicos (o domínio da língua, das referências culturais, dos acontecimentos históricos), mas sim como representante do Portugal da crise, da austeridade, da emigração, da miséria e do desespero que ressuscita fantasmas, revalida memórias de resistência e luta e coloca o antropólogo, enquanto “tipo-ideal”, no centro dos acontecimentos.

Será assim o antropólogo simultaneamente representante e agente de um processo histórico específico? Ou encontra-se em processo de se tornar exemplo do seu próprio objeto de estudo, ao aceitar uma etiqueta identitária que, mais do que um lugar a ocupar, lhe atribui funções a desenvolver na teia semiótica do ser ou estar “emigrado”?

De alguma forma, é como se, em vez de ir fora estudar o que lá está, numa situação clássica de procura do nativo encarcerado (Appadurai 1988a, 1988b), se vai para fora para ver, evocar e ver evocado o local de onde se partiu; para ver como este é visto e como é visto o antropólogo através dele, sentindo-se este último frequentemente como o “antropólogo encarcerado” que não consegue fugir, não ao objeto, mas a um locus identitário imposto por este, que o remete irremediavelmente para um lugar de pertença e para uma relação com esse lugar que é difícil clarificar no decorrer do encontro etnográfico.

É como se o antropólogo não conseguisse sair do lugar de onde veio e a corresidência evocada por Clifford (1997) se desse antes pelo lado do nativo, pois este pela origem, pela viagem e pelas redes familiares também coabita o lugar de origem do antropólogo. É um processo constante de desterritorialização e reterritorialização, entre cá e lá, vendo Portugal a partir de França mas também a França quando se está em Portugal. Fala-se, na pós-modernidade, sobretudo em viagem, em deslocação espacial, mas é importante não desmerecer a permanente viagem mental e representacional que se opera no encontro entre informante e etnógrafo quando se supõe a partilha de um universo cultural de origem.

Retomando uma admirável frase de Alexandre O’Neill, diria que o trabalho de campo no seio da emigração se poderia resumir, para ambos os lados da equação, ou seja, tanto para o informante como para o antropólogo, nas sábias palavras do poeta: “Portugal, questão que eu tenho comigo mesmo” (1965: 211).

 

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NOTAS

[1]             Este texto resulta de duas apresentações orais que realizei em 2011 (no encontro “Cultura? Que cultura? Encontros Quase de Verão”, org. CRIA – linha “Práticas e Políticas da Cultura”, com o título “Será a cultura ‘resistente’? Opções, estratégias e instrumentalizações entre a fábrica e a diáspora”) e em 2014 (no colóquio “40 anos do 25 de Abril na Antropologia”, org. Departamento de Antropologia, FCSH-UNL), ambas em Lisboa. Em termos de linguagem e forma, optei por manter a informalidade das apresentações orais, tendo procedido para a presente publicação apenas a ligeiras reformulações e atualizações bibliográficas. Agradeço aos leitores anónimos os pertinentes comentários e críticas construtivas.

[2]             Refiro-me ao projeto “Mulheres e ‘fabricantas’: resistência operária em Almada”, investigação de doutoramento em Antropologia (FCSH, Universidade Nova de Lisboa) concluída em 2009, com orientação científica de Paula Godinho e bolsa da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (SFRH / BD / 30070 / 2006).

[3]             Entre abril de 2009 e abril de 2011 fui bolseira de pós-doutoramento do projeto “Sentir o pulso da comunidade: políticas e narrativas identitárias de uma comunidade migrante portuguesa no Canadá”, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (PTDC / HAH / 71260 / 2006) e coordenado por Filomena Silvano (FCSH, Universidade Nova de Lisboa).

[4]             Para uma discussão sobre a mesma questão, centrando-se no caso da British Columbia, ver Mapril (2017).

[5]             Para uma leitura detalhada das comemorações do 10 de Junho em Toronto, ver Leal (2014).

[6]             Melo e Silva referem: “A referência à população emigrada faz-se por intermédio de categorias tais como emigração, diáspora e comunidades, muitas vezes concebidas como intercambiáveis. No entanto, embora todas façam alusão ao conjunto dos portugueses residentes fora de Portugal, a primeira categoria tende a expressar somente o aspeto demográfico ou a condição legal das populações que se deslocam entre fronteiras nacionais, enquanto as outras duas se revelam categorias eminentemente identitárias, isto é, representações sobre a situação da emigração. […] Se essas categorias são motivo de disputa e de reflexão entre parcelas dos próprios migrantes e, também, entre a classe política, elas próprias constituem dados de investigação e objeto de análise, em conexão com aquilo que representam conceptualmente nas ciências sociais” (2009: 36).

[7]             Sobre a atividade política dos migrantes portugueses no Canadá, numa análise comparativa com os EUA, ver Bloemraad (2009). Sobre os média, a autora destaca: “[…] the Toronto ethnic media has been a particularly fertile ground for community advocates and politicians. One former member of municipal government had a regular radio show before being elected, a former school trustee worked as a newspaper journalist, and at least two elected school board members have regular programmes on Portuguese-language television” (Bloemraad 2009: 175). Sobre os média étnicos portugueses no Canadá e em França, ver Ferreira (2014, 2016).

[8]             Para uma análise comparativa no que diz respeito à “cultura açoriana”, nomeadamente as Festas do Espírito Santo e as relações intergeracionais, ver Mapril (2017).

[9]             Para uma reflexão mais aprofundada sobre estas questões e que entra em diálogo com alguns dos enunciados que apresento neste texto, ver Dos Santos (2017).

[10]           Refiro-me aos projetos de investigação de pós-doutoramento “ ‘Magazine Contacto’: uma produção televisiva multissituada e a construção da identidade nacional portuguesa na diáspora” (maio de 2012 a abril de 2016) e “Construções mediáticas da nação: ser português no mundo” (maio de 2016 a abril de 2018), financiados por uma bolsa da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (SFRH / BPD / 78828 / 2011) e com acolhimento do Centro em Rede de Investigação em Antropologia (CRIA / ISCTE-IUL; CRIA / NOVA FCSH) e da URMIS – Paris VII.

[11]           Sobre esta questão, ver Noiriel (2004) e Dos Santos (2017).

[12]           Como referem Silva e Dos Santos: “O problema relaciona-se com a dificuldade em definir, de forma empírica, o que constitui uma ‘comunidade portuguesa’. Seja localmente ou numa escala global, uma comunidade portuguesa ou um conjunto delas não corresponde a uma realidade unívoca” (2009: 131). Ou, como sintetiza Brettell para uma análise em contexto urbano: “this concept of the urban ethnic community – in both the geographical and the network senses – needs careful scrutiny, especially since community, in one or both senses, is not necessarily inevitable and cannot simply be assumed” (2003: 109).

[13]           “A partir du début des années 60, l’émigration politique et l’émigration économique se confondent dans le cas des jeunes portugais. La complexité des raisons du départ entraîne une situation ambigue. La grande émigration portugaise des années 60-70 est marquée par des motivations politiques qui ne s’avouent pas toujours et qui se mêlent de façon inextricable aux causes économiques dominantes” (Clímaco 1992: 44).

[14]           O referido colóquio foi organizado por INHA / Gulbenkian / Sorbonne-Paris III, e decorreu nos dias 10-12 de março de 2014.

[15]           Questões que adquiriram ainda maior amplitude no decorrer das eleições presidenciais e legislativas de 2017 – ver, por exemplo, as edições n.º 284 (9 de novembro de 2016) e n.º 303 (29 de março de 2017) do periódico franco-português Lusojornal (disponível em https://lusojornal.com/, última consulta em outubro de 2017).

[16]           Sobre a relação entre música e imigração portuguesa em França, ver Pereira (2015).

[17]           Em maio de 2011, Portugal pediu um resgate financeiro que foi assegurado e fiscalizado pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco Central Europeu e pela Comissão Europeia. Estas três entidades ficaram conhecidas como a Troika.

[18]           Sobre esta questão, consultar Peixoto et al. (2016) e Dos Santos (2013).

[19]           A canção “Para os braços da minha mãe”, de Pedro Abrunhosa (letra e música) e Camané (participação especial), pode ser ouvida em https://www.youtube.com/watch?v=L-3TWoMz6kA (última consulta em outubro de 2017).

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