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Sociologia, Problemas e Práticas

versión impresa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  no.81 Lisboa jun. 2016

https://doi.org/10.7458/SPP2016813893 

ARTIGO ORIGINAL

 

Eleições autárquicas 2.0: análise das estratégias de comunicação online de candidatos, partidos e movimentos independentes

Local authority elections 2.0: analysis of the communication strategies used by candidates, parties, and independent movements

Élections municipales 2.0: analyse des stratégies de communication sur internet des candidats, des partis et des mouvements indépendants

Elecciones municipales 2.0: análisis de las estrategias de comunicación online de candidatos, partidos y movimientos independientes

 

Susana Costa Santos*, Carlota Pina Bicho**

*Bolseira de pós-doutoramento, professora auxiliar convidada. Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), CIES-IUL, Av. das Forças Armadas, 1649-026 Lisboa, Portugal. E-mail: salcs@iscte.pt

** Técnica de comunicação e cultura no Conselho Nacional de Juventude. R. dos Douradores 106-118, 1000-207 Lisboa , Portugal. E-mail: carlota.bicho@gmail.com

 

RESUMO

As redes sociais são uma ferramenta indispensável na comunicação política em período de campanha eleitoral. Este artigo pretende contribuir para o debate teórico sobre se as campanhas online contribuem para uma mudança de paradigma comunicacional entre candidatos e eleitores ou, ao invés, reproduzem os estilos e formatos preconizados pelos mass media. O estudo parte da análise de conteúdo das páginas de Facebook de partidos políticos e movimentos independentes relativas às eleições autárquicas de setembro de 2013. Após a análise descritiva é apresentado um modelo explicativo exploratório sobre as variações na interatividade entre páginas.

Palavras-chave redes sociais, eleições, comunicação política, campanha eleitoral.

 

ABSTRACT

The social networks are an indispensable tool for political communication during election campaigns. This article seeks to contribute to the theoretical on whether online campaigns are helping change the paradigm for communication between candidates and voters, or whether on the contrary they are reproducing the styles and formats put forward by the mass media. The study begins by analysing the content of the Facebook pages of political parties and independent movements regarding the September 2013 local elections. The authors then present an exploratory model that seeks to explain the variations in interactivity from one page to another.

Keywords social networks, elections, political communication, election campaign.

 

RÉSUMÉ

Les réseaux sociaux sont un outil de communication politique indispensable en période de campagne électorale. Cet article vise à contribuer au débat théorique sur la question de savoir si les campagnes sur internet contribuent à un changement de paradigme communicationnel entre candidats et électeurs ou si, au contraire, elles reproduisent les styles et les formats préconisés par les médias. L’étude part de l’analyse de contenu des pages Facebook de partis politiques et de mouvements indépendants à l’occasion des élections locales de septembre 2013. Après une analyse descriptive, l’article présente un modèle explicatif exploratoire sur les variations dans l’interactivité entre pages.

Mots-clés réseaux sociaux, élections, communication politique, campagne électorale.

 

RESUMEN

Las redes sociales son una herramienta indispensable en la comunicación política en periodo de campaña electoral. Este articulo pretende contribuir para el debate teórico sobre si las campañas online contribuyen para un cambio de paradigma comunicacional entre candidatos y electores, o, al contrario, reproducen los estilos y formatos preconizados por los medios de comunicación. El estudio parte del análisis de contenido de las páginas de Facebook de partidos políticos y movimientos independientes relativos a las elecciones locales de septiembre 2013. Tras el análisis descriptivo es presentado un modelo explicativo exploratorio sobre las variaciones en la interactividad entre páginas.

Palabras-clave redes sociales, elecciones, comunicación política, campaña electoral.

 

Introdução

Em democracia, regime em que o acesso ao poder está dependente do voto dos cidadãos, a comunicação política, especialmente em momento de sufrágio, torna-se um instrumento de extrema importância.

As formas e conteúdos do discurso político foram mudando ao longo dos tempos, adaptando-se aos regimes, aos valores e contextos culturais, mas também às plataformas através das quais se distribui a informação. Assim sendo, não se poderá pensar na comunicação política de hoje sem passar pela Internet, maior plataforma de distribuição de informação e conhecimento à escala mundial.

A Internet não facilita apenas o acesso à informação sobre os assuntos públicos, como também torna o contacto entre os indivíduos mais fácil e mais imediato. Uma das mudanças mais importantes que a Internet trouxe foi a possibilidade de encontro e partilha entre os indivíduos, com a comunicação horizontal a assumir um papel crescentemente central. Gustavo Cardoso e Vera Araújo examinaram um conjunto de palavras escritas, em 1997 e em 2007, e concluíram que a principal transformação na Internet, ao longo da década, foi a passagem de um espaço dedicado ao conhecimento para um espaço de comunicação (Cardoso, 2013: 169).

Já muito se debateu sobre as possibilidades que as novas tecnologias de comunicação oferecem para uma renovação da democracia. Para os mais otimistas, com a Internet seria possível democratizar os partidos, reformar as instituições políticas, abrir espaço público para debate e contrariar o afastamento dos cidadãos do campo político (Colombo, Galais e Gallego, 2012). Apesar de todas as novas possibilidades, a adaptação dos partidos, instituições tradicionais fortemente hierarquizadas (Lisi, 2011), a um contexto de rede não se espera imediata, e o processo de modernização das campanhas online não tem sido igual em todas as democracias (Gibson, Margolis e Resnick, 2003; Jensen e Anduiza, 2012; Lisi e Santana-Pereira, 2014).

O caso português apresenta algumas particularidades reveladas em estudos anteriores: (i) baixos níveis de profissionalização das campanhas eleitorais (Lisi, 2013); (ii) estruturas partidárias centralizadas com modelos comunicacionais verticais (Seiceira, 2011); (iii) adesão dos cidadãos aos ideais da democracia deliberativa, mas uma cultura incipiente de debate e de discussão política (Viegas e Santos, 2012); (iv) formas de associativismo mais fortes nas áreas de integração social e com pouca relevância em matéria de novos movimentos sociais (Viegas, Faria e Santos, 2010); e (v) fraca mobilização política dos cidadãos, em especial nas modalidades de protesto e nas novas formas de participação (Viegas, Belchior e Seiceira, 2010).

Este estudo pretende acrescentar conhecimento sobre a campanha online em Portugal e as suas modalidades através da análise das páginas de Facebook das candidaturas às eleições autárquicas de 2013.

As autárquicas de 2013 foram as primeiras eleições realizadas durante o programa de ajuda a que o país tem estado sujeito desde 2011 (Fernandes, 2011; Magalhães, 2014), e por isso foram encaradas pela opinião pública como a primeira grande oportunidade para os portugueses expressarem o seu descontentamento com as políticas em curso e penalizarem a coligação governamental PSD/CDS (Freire, Tsatsanis e Lima, 2015).1 As eleições foram por isso excecionalmente competitivas e os resultados foram extensamente debatidos do ponto de vista do seu significado político.

No que respeita à sua cobertura mediática, estas eleições foram também alvo de muita controvérsia devido aos termos exigidos pela Comissão Nacional de Eleições,2 que ordenavam que todas as candidaturas, independentemente da sua influência e do seu posicionamento no espaço social, tivessem igual cobertura por parte dos órgãos de comunicação social. Assim, as três televisões acabaram por optar por uma cobertura limitada a alguns concelhos e à presença dos líderes nacionais, deixando de fora entrevistas a um só candidato ou as tradicionais reportagens sobre as arruadas e outras ações de campanha.

Neste contexto de limitada cobertura mediática, a dimensão online da campanha tornou-se mais relevante.

 

Comunicação política e campanha eleitoral

Nos regimes democráticos, a comunicação política desempenha um papel essencial: a função da informação sobre os assuntos públicos (Gurevitch, Coleman e Blumler, 2009). Mas é de notar que nas democracias liberais, em que a coerção como forma de dominação perdeu terreno para a persuasão e em que a própria constituição do governo depende diretamente do voto dos cidadãos, a comunicação política assume-se também enquanto um instrumento crucial de legitimação e de acesso ao poder (Bennet e Entman, 2001). Antes de mais, torna-se essencial que os candidatos se esforcem por convencer o eleitor de que são os indicados para o cargo. Neste sentido, as épocas de campanha que precedem uma eleição exigem um grande investimento de recursos por parte dos candidatos.

Ao longo da história da democracia, estes períodos de campanha foram adquirindo contornos diferentes. Pippa Norris divide a evolução da campanha eleitoral em três estágios: campanha pré-moderna, moderna e pós-moderna (Norris, 1997: 5). Maurice Vergeer acrescenta um quarto tipo, a campanha pessoal, que corresponde a uma mudança de paradigma na utilização da Internet como ferramenta de campanha, a Web 2.0. (Vergeer, Hermans e Sams, 2011)

No quadro 1 encontramos uma síntese com as principais características de cada tipo de campanha, o meio de comunicação preferencial e o seu período de predomínio.

 

 

Verifica-se assim que em termos de meios de comunicação a grande transformação ocorre com o surgimento da televisão (Blumler e Kavanagh, 1999; Norris, 1997).

Com a passagem da campanha para o espaço mediático as formas diretas de comunicação interpessoal perdem relevância na estratégia comunicacional dos partidos políticos. E a imprensa do partido, ou subsidiada pelo partido, passa a assumir um papel residual como fonte de informação aos eleitores, passando a ocupar o espaço da militância.

Devido à “erosão das tradicionais clivagens socias e lealdades partidárias” (Norris, 2004: 6), os eleitores passam a apoiar os partidos numa base mais contingente, dependente das suas “performances”, e desenvolvem-se assim os catch-all parties (Kirchheimer, 1990). Geralmente colocados no centro do espetro ideológico, estes partidos investem em estratégias comunicacionais que consigam atrair o maior número possível de eleitores, acabando por conseguir um apoio abrangente mas mais volátil (Belchior e Freire, 2013) do que os partidos na era das campanhas pré-modernas.

A campanha moderna caracteriza-se pela lógica de competição pelo espaço mediático, potenciando a exploração do lado mais “espetacular” da política (Bennet, 2001). O espetáculo enquanto paradigma da comunicação política constrói-se com base na personalização (que centra a atenção na imagem do político e no seu lado mais “humano” e pessoal, relegando para segundo plano as suas ideias), fazendo uso extensivo de imagens e emoções, almejando assim apresentar-se enquanto conteúdo mediático a ser consumido de forma imediata e fácil (Thompson, 2000). Esta lógica aproxima a política do entretenimento, esvaziando-a de conteúdo, e afasta os eleitores, que passam a experienciá-la de forma mais passiva (Gurevitch, Coleman e Blumler, 2009; Jebril, Albaek e Vreese, 2013; Brants, 1998).

No entanto, alguns autores afirmam que esta espetacularização da política é essencial para contrariar o crescente decréscimo de interesse por parte dos cidadãos (Zoonen 2005: 23), mas a grande problemática do distanciamento do cidadão tem no seu cerne o lugar de recetor puramente passivo que lhe é atribuído perante uma comunicação feita de espetáculo (Debord, 2012 (1967)).

A campanha pós-moderna está diretamente relacionada com o desenvolvimento do panorama mediático: a multiplicação de canais de televisão, o surgimento de canais de notícias 24 h por dia e o advento da Internet. Neste contexto, com ajuda dos frequentes feedbacks das sondagens, a campanha torna-se contínua. (Norris, 2004: 7). Espera-se acima de tudo que a comunicação entre partido e eleitores seja facilitada e se torne mais próxima e interativa devido às potencialidades do meio.

O impacto das tecnologias da informação ao nível das campanhas eleitorais está ainda longe de se apresentar como uma linha definida. O debate teórico sobre se as campanhas online como as conhecemos contribuem para uma mudança no paradigma da comunicação política ou se reproduzem os mesmos padrões que as campanhas off-line tem sido alimentado por estudos empíricos com resultados contraditórios.

Um estudo experimental conduzido por uma equipa na Holanda concluiu que a combinação entre personalização e interatividade online tem um efeito positivo sobre os cidadãos, sobretudo em relação ao sentimento de terem maior oportunidade de participação (Kruikemeier et al., 2013). O estudo revela ainda que a comunicação online personalizada tem potencial na promoção do interesse pela política, visto que os cidadãos que consultaram os sites experimentais responderam que voltariam a consultá-los.

No entanto, os autores não respondem à questão da diversidade de comportamentos dos cidadãos e, de igual modo, não se debruçam sobre a importância dos conteúdos.

Outro estudo realizado na Holanda, desta vez sobre as estratégias de comunicação dos partidos políticos para as eleições europeias de 2009 concluiu que a campanha online não sofreu grandes alterações, podendo ser caracterizada como “Web 1.0” (Vergeer, Hermans e Sams, 2011: 478). Assim, parece existir um desencontro entre a oferta dos partidos políticos, ainda muito centrada em lógicas de comunicação vertical e unidirecional e a procura por parte dos cidadãos de uma comunicação política mais horizontal e partilhada.

O conceito de campanhas da Web 1.0 refere-se a campanhas online cuja comunicação é predominantemente hierárquica e unilateral, com lógicas e conteúdos que pouco diferem daqueles produzidos pelos meios de comunicação de massa. Nas campanhas Web 1.0, a plataforma muda, mas o modo de comunicação mantém-se sem alterações relevantes, pois o cidadão continua num lugar de recetor passivo tal como acontecia no modelo da comunicação de tendência espetacular dos meios de comunicação de massas. Em oposição, as campanhas “Web 2.0” são as que fazem uso das potencialidades mais recentes do online, baseando-se numa comunicação mais horizontal onde todos podem produzir novos conteúdos, na partilha e na interatividade (Vergeer, Hermans e Sams, 2011: 479).

A lógica da Web 1.0 assemelha-se por isso à lógica off-line dos mass media, enquanto a comunicação Web 2.0 apresenta-se sob a forma de um potencial novo modelo comunicacional (Lilleker e Jackson, 2010).

Ulrike Klinger nota inclusivamente que na lógica das redes sociais os conteúdos mais valorizados são os mais partilhados — sendo a viralidade na rede uma das suas potencialidades mais relevantes, porque permite uma grande exposição de um determinado conteúdo, através da sua partilha em cadeia. E os conteúdos mais partilhados são os que contêm uma mensagem mais positiva, ao contrário do que acontece nos mass media, em que o conteúdo negativo tem maior probabilidade de se tornar notícia (Klinger, 2013: 722) — a própria lógica de circulação das mensagens é diferente.

A comunicação das campanhas 2.0 pode também ser mais individualizada, no sentido em que, devido às potencialidades da rede, o candidato tem a possibilidade de conhecer melhor o(s) seu(s) público(s)-alvo, adaptando a sua mensagem e tornando-a mais eficaz, numa técnica conhecida pelos especialistas como microtargeting (Harfoush, 2009). O microtargeting envolve a recolha e posterior utilização de dados recolhidos sobre os eleitores em grandes bases de dados que segmentam os potenciais eleitores por características sociodemográficas, envolvimento e posicionamento político, questões sociais e económicas, etc., permitindo a elaboração de mensagens específicas e de cariz personalizado (Murray e Scime, 2010).

 

Hipóteses e metodologia

Interessa-nos saber se as campanhas online em Portugal se encontram no caminho de uma mudança de paradigma para uma campanha Web 2.0 ou se, pelo contrário, continuam a desenvolver campanhas de tipo 1.0. Analisaremos por isso as publicações no Facebook das páginas de campanha relativamente à interatividade (gostos, partilhas e comentários), formatos e conteúdos.

O Facebook é um meio gratuito e de acesso generalizado entre os utilizadores da Internet, que permite uma comunicação direta não manipulada por terceiros. Interessa percecionar qual foi o seu impacto em termos de democratização da competição. Tradicionalmente as campanhas eleitorais dos grandes partidos são mais intensas e modernizadas. Vários autores defendem que a Internet é inerentemente democratizante — a hipótese equalizadora. Pode-se esperar que os pequenos partidos beneficiem deste possível efeito, tal como foi descrito em eleições em outros países (Gibson, Margolis e Resnick, 2003).

Neste sentido avançamos com a primeira hipótese:

H1a. Espera-se que a plataforma online tenha tido um efeito equalizador na competição eleitoral esbatendo as desigualdades de recursos entre grandes partidos, pequenos partidos e movimentos independentes.

E com uma sub-hipótese, específica para os pequenos partidos sem assento parlamentar.

H1b. Espera-se que os partidos sem assento parlamentar tenham sido aqueles que mais utilizaram as ligações entre a sua página de Facebook e os outros locais na rede para se promoverem.

Por outro lado, os mais céticos contrapõem esta hipótese, defendendo que a comunicação online continua a fazer parte do “mundo real” (Margolis e Resnick, 2000) e o potencial democratizante do meio acaba por ser vencido perante as estruturas de poder desiguais, não sendo possível romper completamente com as dificuldades que os pequenos partidos enfrentam no mundo off-line, impondo-se um efeito normalizador (Margolis e Resnick, 2000; Lilleker e Jackson, 2010).

No caso português os partidos políticos têm uma coordenação forte a nível nacional, com uma tendência para uma comunicação mais “estruturada e vertical” (Seiceira, 2011: 133) e com baixos níveis de profissionalização (Lisi, 2011; 2013), bastante diferente da lógica de comunicação horizontal da Internet. Assim, as próprias estruturas partidárias acabam por constituir um entrave à adaptação dos partidos à rede. Neste sentido formulamos a segunda hipótese:

H2. Espera-se que os grandes partidos (PS, PSD) tenham sentido mais dificuldades em adaptar-se à lógica das campanhas 2.0 devido à sua estrutura de coordenação centralizada.

No caso dos movimentos independentes de base local este tipo de dificuldade não existe. Além disso, também é sabido que a Internet permite associações de curta duração (Castells, 2009), pelo que a comunicação via online pode beneficiar em muito os movimentos independentes, que não têm um eleitorado fixo e precisam de mobilizar apoios num tempo relativamente curto. Assim:

H3. Espera-se que os movimentos independentes organizados localmente tenham tido mais facilidade em utilizar as potencialidades da rede na sua estratégia de comunicação eleitoral.

É de frisar que nem todas as candidaturas de movimentos independentes partem do mesmo patamar de recursos e de competências políticas. No caso das eleições autárquicas de 2013 várias foram as candidaturas de movimentos encabeçados por ex-detentores de cargos autárquicos. Espera-se que estas candidaturas tenham realizado uma campanha mais próxima das campanhas dos grandes partidos. Assim:

H4. Os movimentos independentes encabeçados por candidatos com anteriores cargos autárquicos tenderão a reproduzir o tipo de campanha dos grandes partidos, beneficiando do conhecimento, da experiência e da rede de contactos dos partidos pelos quais antes tinham concorrido.

Finalmente, e tendo em consideração o contexto de crise económica,

H5. Espera-se que os partidos na oposição tenham feito maior uso da campanha negativa como estratégia de demarcação dos efeitos da crise económica associados aos partidos do governo.

Metodologicamente optou-se pela recolha de todo o tipo de publicações relativas à atividade das páginas de campanha das eleições autárquicas de 2013 no Facebook, durante o período oficial de campanha compreendido entre 17 e 27 de setembro e a posterior construção de uma base de dados em SPSS.

Escolheu-se analisar a totalidade de candidaturas partidárias e de movimentos independentes dos concelhos de Lisboa, Porto, Vila Nova de Gaia, Sintra, Oeiras e Loures, por estes serem os concelhos tradicionalmente mais disputados em termos eleitorais, sendo também cinco destes concelhos os mais populosos.3

Optou-se pela análise da rede social Facebook por esta ser a mais popular e aquela que regista o maior número de utilizadores em Portugal (Cardoso et al., 2014).4

Contaram-se ao todo 49 candidaturas; no entanto não se registou qualquer página de campanha de Facebook em três das candidaturas (PTP de Sintra, PTP de Loures e PCTP/MRPP de Gaia). Das 47 páginas de campanha existentes, oito foram encerradas imediatamente após as eleições, pelo que não foi possível o acesso direto a estas páginas durante o período em que procedemos à análise. A recolha de dados relativos a seis destas páginas foi por isso feita através de capturas prévias realizadas uma vez por dia ao longo de todo o período oficial de campanha. No entanto, devido a uma limitação técnica, falharam as capturas das páginas da coligação PSD/CDS de Gaia e do PTP de Gaia, pelo que não pudemos proceder à análise destas duas páginas.

Analisaram-se as 45 páginas de Facebook recolhendo dados referentes às suas publicações (no total 1272) através de um sistema de codificação em SPSS, cujo codebook se encontra em anexo.

 

Resultados

Resultados gerais

Do ponto de vista da interatividade podemos perceber no imediato que o nível de participação dos eleitores nas páginas de campanha é bastante baixo. A média dos “gostos” (likes) ficou em 49,74. No entanto, a moda ficou bastante abaixo: dois foi o número de “gostos” mais frequente. Esta diferença deve-se ao grande intervalo entre mínimo (0) e máximo (5720) de número de “gostos” registado. Verifica-se que os intervalos para o número de partilhas e de comentários foram também extensos, mas as médias (8,62 e 2,63 respetivamente) foram baixas novamente. Categorizámos a contabilização dos “gostos”, partilhas e comentários segundo a sua percentagem acumulada. Verificámos que cerca de 50% de todas as publicações tiveram zero comentários, menos de 21 “gostos” e menos de duas partilhas, e cerca de 75% tiveram menos de três comentários, menos de 48 “gostos” e menos de seis partilhas.

Estes dados contrariam a expectativa de um nível elevado de interatividade, esperada devido às características do meio, especialmente no que diz respeito aos comentários, funcionalidade que permitiria a geração de debate e de aferição de feedback por parte dos eleitores. Mais de metade das publicações não chegaram sequer a ter qualquer comentário e 75% não tiveram mais que três. Este é um dado que causa surpresa, especialmente, se se tiver em consideração que as caixas de comentários do Facebook são várias vezes utilizadas enquanto autênticos fóruns de debate em muitas outras circunstâncias (Castells, 2009). As partilhas registam também um nível bastante baixo de ocorrência, com 50% de publicações que tiveram apenas duas partilhas ou menos.

Assim, verificamos um subaproveitamento desta funcionalidade, cuja potencialidade ao nível da propagação da mensagem por vários utilizadores seria também uma das mais relevantes em termos de interatividade na rede. Podemos por isso dizer que os partidos não conseguiram produzir conteúdos que se adaptassem com sucesso à lógica de viralidade do Facebook (Klinger, 2013). Os “gostos” registam apesar de tudo um nível mais elevado de ocorrências, mas há também que ter em conta que esta funcionalidade permite apenas a expressão de apoio ou aprovação a uma determinada mensagem por parte dos utilizadores mas não representa em si uma mais-valia para difusão da mesma na rede ou para a geração de debate.

Relativamente aos formatos verificámos que a maioria dos conteúdos (78,5%) não foram apresentados exclusivamente sob a forma de texto, fazendo-se acompanhar de imagens ou vídeos. O recurso à imagem estática ou dinâmica apresenta-se como essencial a fim de tornar a comunicação mais fácil, imediata e agradável para o recetor. Assim, podemos dizer que regra geral os candidatos aproveitaram esta possibilidade. Verifica-se no entanto também que a grande maioria das publicações foram acompanhas de imagem: 64,7% do total de publicações tinham imagens, enquanto apenas 13,8% foram acompanhadas sob a forma de vídeo.

Do ponto de vista da segmentação de públicos, verifica-se um fraco direcionamento das mensagens para alvos específicos, registando-se 96,1% de publicações que não tinham como alvo nenhum tipo de segmento populacional. Ainda assim, podemos acrescentar que as raras publicações segmentadas em termos de público tiveram como públicos-alvo mais frequentes as classes profissionais e as faixas etárias. O microtargetting não foi, no entanto, uma estratégia à qual os candidatos recorreram.

Recolhemos ainda dados relativos ao conteúdo das publicações. Optámos por dividir o conteúdo em: (i) informação sobre propostas, ideias e programa eleitoral; (ii) informações sobre a campanha; (iii) informações sobre o(s) candidato(s); e (iv) campanha negativa.

Na primeira categoria incluímos as publicações que divulgavam o programa eleitoral ou propostas específicas e manifestos de cariz ideológico. A segunda compreende as publicações que não continham qualquer tipo de ideia ou proposta propriamente dita e se limitavam a divulgar aparições públicas do candidato, tais como arruadas, comícios, festas e outros eventos, ou as publicações que se resumiam a frases curtas de apelo ao voto conhecidas como soundbites. A terceira diz respeito às publicações que se centravam no candidato, fornecendo esclarecimentos sobre o seu percurso profissional ou informações de cariz mais pessoal. As publicações assinaladas como campanha negativa foram aquelas cujo conteúdo se centrava na crítica aos candidatos ou partidos opositores.

A primeira distinção entre publicações em que o conteúdo se focava em propostas e ideias e publicações de conteúdo mais “leve”, de promoção da campanha em si, teve como propósito averiguar a quebra ou continuidade com um modelo de comunicação política espetacular (Gurevitch, Coleman e Blumler, 2009; Jebril, Albaek e Vreese, 2013). Como já foi referido no enquadramento teórico, este paradigma de comunicação, típico dos mass media, baseia-se num enaltecimento da forma em detrimento do conteúdo e num discurso cada vez menos assumido do ponto de vista ideológico.

A categoria dedicada às informações sobre os candidatos pretendia avaliar a centralidade dos mesmos na campanha e o nível de personalização. Achou-se pertinente incluir a categoria de campanha negativa porque perante o contexto de crise económica e das medidas impopulares impostas pela coligação governamental PSD/CDS, havia uma forte possibilidade de a campanha de partidos não pertencentes ao governo apelar ao voto de protesto e à penalização dos partidos no poder, e entendemos que esse seria um dado também interessante de analisar.

Como podemos verificar através dos dados do quadro 2, as publicações desprovidas de conteúdo sobre propostas e ideias foram muito mais frequentes.

 

 

Apesar de as publicações focadas em propostas e ideias ocuparem o segundo lugar, o facto é que mais de metade dos conteúdos partilhados não forneciam qualquer tipo de informação ou esclarecimento sobre os projetos do partido ou movimento para a autarquia em causa. Este dado permite-nos concluir que o paradigma comunicacional espetacular característico dos mass media, baseado em conteúdos leves e desprovidos de propostas propriamente ditas, não foi contrariado nas campanhas online. Cerca de 10% das publicações foram assinaladas enquanto informação sobre o(s) candidato(s), o que revela algum nível de personalização, sem no entanto deixar concluir que essa tenha sido uma estratégia extensamente utilizada nas campanhas analisadas.

A campanha negativa revelou-se residual, com uma percentagem de publicações de 3,1%. Podemos concluir que o contexto em que as eleições foram realizadas não tornou as campanhas especialmente agressivas do ponto de vista do ataque aos opositores.

Resultados por tipos de candidatura

A fim de aferir as disparidades e semelhanças entre os diferentes tipos de candidaturas, procedemos a um cruzamento dos dados anteriores com as cinco categorias de candidatura: grandes partidos (PS e PSD), pequenos partidos com assento parlamentar (CDU, BE e CDS), pequenos partidos sem assento parlamentar (PCPT/MRPP, PAN, PND, PNR, PTP, PPM e PPV) e movimentos independentes com anteriores cargos partidários e movimentos independentes sem esses cargos.

De realçar que seis das candidaturas analisadas eram coligações entre partidos. Cinco das ditas coligações eram constituídas por pequenos partidos com o PSD. Considerámos estas candidaturas na categoria de grande partido, pois a máquina de campanha partidária do PSD sobrepôs-se aos outros pequenos partidos, que quase passaram despercebidos durante a campanha. A sexta coligação foi entre o PPM o PND e o PPV, pelo que foi incluída na categoria de pequenos partidos sem assento parlamentar. A figura 1 resume a distribuição em valores médios de “gostos”, partilhas e comentários por tipo de candidatura.

 

 

Percebemos imediatamente que, apesar de os números de “gostos”, partilhas e comentários nas publicações serem geralmente baixos, houve diferenças consoante o tipo de candidatura. As medidas de associação revelam relações de média intensidade entre as variáveis.5

A grande exceção à regra verifica-se nas páginas dos movimentos independentes, em que o valor médio de “gostos” foi de 355, 37 partilhas e 19 comentários. Estes números contrastam fortemente com a situação dos pequenos partidos, especialmente os pequenos partidos sem assento parlamentar, com uma média de 9 “gostos”, 3 partilhas e 1 comentário. Os pequenos partidos com assento parlamentar apresentam valores na mesma ordem de grandeza ao nível dos comentários, enquanto os valores médios de “gostos” e partilhas duplicam face aos partidos sem assento parlamentar. Os grandes partidos alcançam uma posição intermédia, posicionando-se sempre abaixo dos movimentos independentes e dos independentes com anteriores cargos autárquicos.

Podemos desde já afirmar que, do ponto de vista das potencialidades interativas do meio, os movimentos independentes foram os mais bem-sucedidos, o que vai ao encontro da nossa hipótese 3. E que grandes partidos e movimentos independentes liderados por anteriores autarcas conseguiram atrair uma atenção semelhante em termos de interatividade, o que comprova a nossa hipótese 4.

A segmentação das mensagens de acordo com um público-alvo específico (microtargetting) revelou-se residual. Entre os movimentos independentes e os pequenos partidos com assento parlamentar encontram-se os valores mais elevados de segmentação, embora a medida de associação entre variáveis (V de Cramer) não apresente valores estatisticamente significativos.

 

 

Esta ligeiramente superior percentagem de mensagens direcionadas para um público específico por parte dos pequenos partidos com assento parlamentar deve-se sobretudo às publicações da CDU (7,4%) e da candidatura independente de Rui Moreira à Câmara Municipal do Porto (6,7%).

A CDU apresenta a percentagem mais alta de publicações dirigidas a um determinado segmento. Após uma análise mais pormenorizada, verificamos que cinco das nove publicações com público segmentado se dirigem a trabalhadores de empresas/instituições do concelho em causa. Assim, este dado não nos surpreende, tendo em conta que o discurso da CDU tem frequentemente como ponto central os trabalhadores e os seus direitos. As mensagens da CDU não são portanto segmentadas de acordo com faixas etárias ou outro tipo de divisões, mas sim de acordo com uma única determinada categoria (trabalhadores assalariados), e por isso este dado não reflete uma modernização da sua campanha, antes sim uma continuidade no seu tipo de discurso com uma forte componente ideológica.

No caso particular da candidatura de Rui Moreira, verifica-se uma maior modernização da estratégia de comunicação, no sentido em que várias publicações se dirigem a públicos diferenciados, nomeadamente a jovens, a idosos, a professores e a pessoas desfavorecidas.

Relativamente à direção da comunicação, a maioria das publicações remete para fora da rede, privilegiando uma lógica de campanha 1.0. A figura 3 apresenta a direção da comunicação em quatro categorias: (i) para fora da rede, (ii) site de candidatura, (iii) Facebook e (iv) outros locais na rede por tipo de candidatura.

 

 

Os partidos sem assento parlamentar são os que mais utilizaram os recursos em rede, promovendo-se através da utilização de links para outros locais na rede e para a sua página de Facebook. Neste sentido comprova-se a hipótese 1b, de que os partidos com menos acesso ao espaço mediático são aqueles que mais contornam esse problema através da divulgação em rede.

Finalmente, a campanha negativa, apesar de residual, como ficou demonstrado na análise global dos dados, foi utilizada de forma diferenciada pelos vários tipos de candidatura.

De acordo com a figura 4 quem mais recorreu a este tipo de campanha nas páginas do Facebook foram os pequenos partidos com e sem assento parlamentar, com 30 e 32,5%, respetivamente.6 Entre os vários tipos de candidatura são os independentes com anteriores cargos autárquicos aqueles que menos utilizam. Uma das razões prende-se com o facto de estes candidatos terem um passado recente ligado aos grandes partidos. Por outro lado, os movimentos independentes parecem ter apostado mais num tipo de campanha que os diferenciasse pela positiva, centrando-se na divulgação de iniciativas próprias.

 

 

A hipótese 5 é comprovada em parte, visto que candidaturas independentes e de pequenos partidos têm uma utilização bastante diferente.

Modelo explicativo

De modo a compreender as variações na interatividade entre as páginas de Facebook dos vários candidatos às eleições autárquicas, foi testado um modelo, através de uma regressão linear exploratória (método forward). Foram criados quatro blocos: (1) comunicação social e em rede, (2) orientação ideológica e tipo de partido, (3) recursos,7 e (4) presidência ou oposição.

O bloco relativo à comunicação social e em rede explica 2,4% do número de “gostos” (p < 0,001). Quando se acrescenta a orientação ideológica e o tipo de partidos o poder explicativo aumenta em 24,8% (p < 0,001). Os recursos de campanha aumentam o poder explicativo em 2,1% (p < 0,001). A presidência de autarquia aumentou o poder explicativo do modelo em 1% (p < 0,001).

 

 

Os conteúdos retirados dos media têm, em média, menos “gostos” do que os outros conteúdos. Um partido de direita tem, em média, mais “gostos” que um partido de esquerda. Comparativamente aos grandes partidos, os partidos pequenos com e sem assento parlamentar apresentam em média menos “gostos”. Quanto maior o orçamento para a campanha digital maior o número de “gostos”. E por último, os candidatos que concorrem na condição de presidente da câmara têm, em média, mais “gostos” que os outros candidatos.

Pode então concluir-se que as variáveis do bloco 2 — variáveis de orientação ideológica e de tipo de partido — são os fatores determinantes para a predição do maior número de “gostos” na página de Facebook de campanha.

Neste sentido rejeitam-se as hipóteses 1a, que apontava para um efeito equalizador das redes sociais, e a hipótese 2, que apontava para uma maior dificuldade das estruturas dos grandes partidos para se adaptarem às lógicas de comunicação em rede.

 

Conclusões

A campanha Web 2.0 pressupõe a adaptação dos partidos ou movimentos à utilização da Web enquanto plataforma de partilha e de proximidade.

Pode dizer-se que no caso das eleições autárquicas de 2013 os partidos e os movimentos independentes perceberam a importância da sua presença nas redes sociais, visto que apenas três das candidaturas não fizeram qualquer tipo de campanha no Facebook.

Em termos de interatividade, avaliada aqui pelo número de “gostos”, partilhas e comentários, os níveis apresentam-se bastante baixos. Como foi já referido, os comentários e as partilhas são funcionalidades de extrema importância na rede social. Enquanto o primeiro tem o potencial de gerar debate, o segundo permite a difusão em cadeia da mensagem. Desta forma, o facto de metade das publicações terem zero comentários e menos de duas partilhas revela de forma inequívoca que os candidatos não conseguiram chegar aos eleitores e criar conteúdos que apelassem à participação destes no contexto da rede.

A técnica conhecida como microtargeting, que consiste em conhecer a população alvo da campanha, segmentando-a e podendo assim criar mensagens mais individualizadas e personalizadas, aproximando o candidato dos eleitores, foi praticamente inexistente. Esta foi a técnica que muitos afirmam ter feito com que Obama ganhasse as eleições presidenciais nos Estados Unidos em 2008 (Murray e Scime, 2010). As redes sociais encerram uma imensa possibilidade ao nível da exploração desta técnica que foi subutilizada na campanha eleitoral em análise. Os candidatos não romperam por isso com a lógica de comunicação centrada no candidato, baseada em mensagens massificadas, que alimenta a distância entre o candidato e os eleitores, atirando estes últimos para “fora” do processo político.

O formato a que mais se recorreu foi a imagem, muitas vezes acompanhada de texto curto ou legenda. Poucas foram as publicações que se resumiam a texto, e o vídeo registou também algum nível de utilização. Estes dados indicam uma preocupação por parte dos candidatos em tornar o conteúdo apelativo e fácil de apreender. Esta é de resto uma lógica já conhecida pelos políticos em campanha. O paradigma da política espetacular requer uma comunicação leve e fácil, desprovida de conteúdos “pesados” e apresentada sob formatos apelativos.

A análise do tipo de conteúdos leva-nos também a concluir que a lógica utilizada na sua produção em pouco se diferenciou das técnicas tradicionais de campanha nos meios de comunicação de massas. As publicações “vazias de conteúdo”, como fotografias de arruadas e festas, pequenos textos ou frases de apelo ao voto, foram as mais frequentes. E podemos incluir nesta categoria as informações sobre os candidatos e a campanha negativa, por serem também manobras de marketing político que não divulgam informações sobre as propostas e as ideias dos candidatos. E assim sendo podemos dizer que cerca de 70% das publicações não contrariavam a lógica da comunicação espetacular de um discurso pouco “politizado”.

O nosso estudo teve também em conta as diferenças de utilização da rede social entre os diferentes tipos de candidatura, a fim de averiguar até que ponto a tradicional desigualdade na modernização da campanha entre grandes e pequenos partidos tinha sido atenuada. Do ponto de vista da interatividade, que reflete em muito se uma campanha online Web 2.0 foi bem conseguida ou não, não podemos afirmar que a plataforma beneficiou os pequenos partidos. Tendo em conta os nossos dados relativos a “gostos”, comentários e partilhas, podemos concluir que as tradicionais diferenças das campanhas entre grandes e pequenos partidos, não foram contrariadas online. Apesar da baixa taxa de sucesso no geral, os pequenos partidos registaram níveis de interatividade mais baixos que os grandes partidos. Os partidos pequenos com e sem assento parlamentar são aqueles que menos interatividade geram nas redes sociais, estando os partidos sem assento em situação de maior desvantagem (menos recursos, menos atenção mediática, maior amadorismo na condução da estratégia de comunicação). Assim, podemos concluir que a plataforma não teve um efeito equalizador (contrariando a hipótese 1a), apesar de os pequenos partidos terem utilizado mais as ligações entre as suas páginas de Facebook e outros locais na rede (hipótese 1b).

Podemos considerar que a situação reveladora foi a dos movimentos independentes. Para além de registarem o maior número de gostos, estas candidaturas foram também as mais bem-sucedidas em termos de partilhas e comentários. Se a hipótese de a Internet equalizar a competição partidária não se comprovou, não podemos dizer o mesmo da hipótese de este meio beneficiar os movimentos independentes. Acima de tudo, do ponto de vista dos indicadores de interatividade, as candidaturas independentes foram as que melhor conseguiram chegar aos eleitores, adaptando-se sem dificuldades a uma comunicação mais horizontal e dinâmica. A candidatura de Rui Moreira diferencia-se de todas as outras em vários aspetos, destacando-se pela positiva no que concerne ao aproveitamento das potencialidades da comunicação em rede, merecendo no futuro ser estudada em maior profundidade.

No que concerne ao formato e conteúdos, chegamos à conclusão que, em termos de modelo comunicacional, tanto as candidaturas independentes como as partidárias, apostaram numa comunicação virada para o espetáculo e pouco direcionada para as propostas e os projetos.

Concluímos assim que a campanha online das eleições autárquicas de 2013 se aproximou muito mais do paradigma das campanhas 1.0, que não contraria as lógicas já solidificadas pelos meios de comunicação de massas, do que das campanhas Web 2.0, e que, apesar de se ter verificado que os movimentos independentes beneficiaram da utilização da Internet, a plataforma não se revelou um equalizador da competição partidária.

 

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Receção: 15 de maio de 2014 Aprovação: 23 de março de 2016

 

NOTES

1 Ver, por exemplo: http://www.publico.pt/portugal/jornal/autarquicas-vao-ser-teste-ao-governo-e-barometro-das-legislativas26302914

2 Comunicado Oficial da CNE de 26 de junho de 2013, “Tratamento jornalístico não discriminatório”:
http://www.cne.pt/sites/default/files/dl/al_2013_apoio_comunicado-tj-pub.pdf

3 Oeiras é o único concelho que não se encontra entre os seis mais populosos. Neste caso o principal motivo da escolha deve-se ao facto de Isaltino Morais, presidente da Câmara entre 1985 e 2013, ano em que foi condenado a uma pena de prisão por corrupção, ser de novo candidato à presidência da Assembleia Municipal pelo movimento independente “Isaltino-Oeiras Mais à Frente”.

4 De acordo com os dados recolhidos no inquérito Sociedade em Rede 2014, 98% dos internautas têm uma conta no Facebook.

5 (1) eta = 0,403, (2) eta = 0,367, (3) eta = 0,363.

6 Os testes de associação entre as variáveis (V de Cramer) revelaram uma associação fraca: 0,204***.

7 Avariável recursos foi construída a partir da recolha de informação sobre gastos de campanha em “comunicação impressa e digital” entregue pelos partidos e movimentos ao Tribunal de Contas. Os orçamentos variaram entre um valor mínimo de 50 euros (PCTP/MRPPem Oeiras) e um valor máximo de 176.051,75 euros (coligação PSD/PPM/MPT no Porto).

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