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Sociologia, Problemas e Práticas

versão impressa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  no.72 Oeiras maio 2013

https://doi.org/10.7458/SPP2012722617 

As novas dinâmicas laborais e os desafios da articulação com a vida familiar

New labour dynamics and the challenge of work-life balance

Les nouvelles dynamiques de travail et les défis de la conciliation avec la vie familiale

Las nuevas dinámicas laborales y los desafíos de la articulación con la vida familiar

 

Sara Falcão Casaca*

* Professora auxiliar do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa (ISEG-UTL) e investigadora do Centro de Investigação em Sociologia Económica e das Organizações (Socius). E-mail: sarafc@doc.iseg.utl.pt

 

Resumo

Tendo como tela de fundo as recentes dinâmicas na esfera laboral, o artigo procura dar conta da expressão do emprego feminino, da precariedade contratual e da flexibilidade de tempo de trabalho em Portugal. Reflete ainda sobre as mudanças ocorridas nas condições de trabalho, nas relações de emprego e na organização da vida familiar das mulheres que prestam atividade em alguns dos “novos” setores dos serviços em Portugal (desde o segmento das novas tecnologias de informação e comunicação, incluindo o ramo dos call centres, até ao “novo” comércio de retalho que integra a grande distribuição). O estudo apresentado permite constatar que as alterações verificadas na relação de emprego e nos tempos de trabalho não produzem apenas efeitos complexos (e até contraditórios) nas relações de género; dificultam também a articulação com a vida familiar e reforçam as desigualdades no seio da força de trabalho feminina.

Palavras-chave emprego feminino, flexibilidade de tempo de trabalho, articulação com a vida familiar, novos setores de atividade.

 

Abstract

Considering the recent labour market dynamics, this article explores the main patterns of women’s employment, including working time flexibility and the high incidence of temporary work in Portugal. It also stresses the main changes in working and employment conditions in the new service sectors (ranging from the high-intensive knowledge ICT to the call centres and the new retail sector), thereby discussing the implications for women in terms of the organisation of their family life. The main argument is that flexible working time schedules not only have ambiguous (and even contradictory) effects on gender relations; they also originate difficulties in work-family life balance and reinforce social inequalities among women.

Keywords women’s employment, working time flexibility, work-family life balance, new sectors of activity.

 

Résumé

En prenant pour toile de fond les dynamiques récentes introduites dans le monde du travail, cet article rend compte de l’expression de l’emploi féminin, de la précarité contractuelle et de la flexibilité du temps de travail au Portugal. Il réfléchit également aux changements survenus dans les conditions de travail, dans les relations de travail et dans l’organisation de la vie familiale des femmes qui travaillent dans certains des nouveaux secteurs des services au Portugal (depuis le segment des nouvelles technologies de l’information et de la communication, comme les centres d’appel, jusqu’au nouveau commerce de la grande distribution). L’étude présentée permet de constater que les changements intervenus dans la relation de travail et dans les temps de travail ne produisent pas seulement des effets complexes (voire contradictoires) sur les relations de genre ; ils rendent aussi plus difficile la conciliation avec la vie familiale et ils creusent les inégalités au sein de la force de travail féminine.

Mots-clés emploi féminin, flexibilité du temps de travail, conciliation avec la vie familiale, nouveaux secteurs d’activité.

 

Resumen

Teniendo como tela de fondo las recientes dinámicas en la esfera laboral, el artículo procura reportar la dimensión del  empleo femenino, de los contratos precarios y de la flexibilidad de tiempo de trabajo en Portugal. Refleja también los cambios ocurridos en las condiciones de trabajo, en las relaciones de empleo y en la organización de la vida familiar de las mujeres que prestan actividad en algunos de los nuevos sectores de los servicios en Portugal (desde el segmento de las nuevas tecnologías de información y comunicación, incluyendo el sector de los call centres, hasta el nuevo comercio de menudeo que integra la gran distribución). El presente estudio permite constatar que las alteraciones verificadas en la relación de empleo y en los tiempos de trabajo  no sólo producen  efectos complejos (y hasta contradictorios) en las relaciones de género; dificultan también la articulación con la vida familiar y refuerzan las desigualdades en el seno de la fuerza de trabajo femenina.

Palabras-clave empleo femenino, flexibilidad en el  tiempo de trabajo, articulación con la vida familiar, nuevos sectores de actividad.

 

O crescente envolvimento das mulheres no mercado de trabalho tem coexistido com profundas transformações económicas, tecnológicas, organizacionais e laborais. Tendo como tela de fundo este contexto, é nosso objetivo dar conta da expressão e dos contornos do emprego feminino, da precariedade contratual e da flexibilidade de tempo de trabalho, considerando, numa primeira parte, dados provenientes de fontes estatísticas nacionais e europeias. Num segundo momento, procuraremos refletir sobre os efeitos gerados por estas novas dinâmicas nas condições de trabalho e na organização da vida familiar das mulheres que prestam atividade em alguns dos “novos” setores dos serviços1 (segmento das novas tecnologias de informação e comunicação, incluindo o ramo dos call centres, e “novo comércio” de retalho, integrando a grande distribuição).

O estudo apresentado permite constatar que as alterações na relação de emprego e nos tempos de trabalho não geram apenas efeitos complexos (e até contraditórios) nas relações de género; dificultam também a articulação com a vida familiar e reforçam as desigualdades no seio da força de trabalho feminina. Temos sublinhado que as transformações do trabalho e do emprego estão associadas a uma reconfiguração dos vetores de segregação sexual nos “novos serviços” (Casaca, 2005; 2006); neste artigo, procuramos perspetivar as dinâmicas atuais à luz da heterogeneidade feminina, refletindo sobre as desiguais condições de emprego e de vida entre as mulheres. Concluímos que as trabalhadoras dos “novos setores dos serviços” podem ser agrupadas em duas categorias: aquelas que pertencem ao segmento “luminoso” da nova economia (uma minoria mulheres que integra as áreas intensivas em tecnologia e conhecimento) e as que trabalham no setor da distribuição/comércio retalhista e em call centres (grupo que pertence ao segmento “sombrio”, ainda que nenhuma das categorias seja homogénea no seu interior). Enquanto as primeiras beneficiam de uma relação contratual segura, de um emprego bem remunerado e qualificado, as segundas deparam-se com condições de trabalho degradadas e muitas transitam (sucessivamente) entre empregos precários. A flexibilidade temporal é vivenciada em registos distintos (horários distendidos e prolongados, no primeiro caso, e horários mais reduzidos, mas diversificados e imprevisíveis, na segunda situação); para ambos os grupos, porém, quase nunca estas novas temporalidades se traduzem em maleabilidade e num melhor equilíbrio entre a esfera profissional e a familiar.

 

Emprego feminino, flexibilidade temporal e contratual em Portugal e na União Europeia: breve enquadramento

Portugal apresenta uma das mais elevadas taxas de emprego feminino (61,1%) no contexto da União Europeia (UE27), cuja média é de 58,2% (UE27) ou de 59,5% (UE15) (dados referentes ao ano de 2010).2 Em 2011, o valor tinha descido ligeiramente, para 60,4%, mantendo-se igualmente acima das médias da UE15 (59,8%) e da UE27 (58,5%).3 O valor distingue-se, assim, daquele exibido pelo grupo da Europa do Sul (Itália, Grécia e Espanha), com o qual, por força de algumas semelhanças socioeconómicas, o nosso país é frequentemente comparado (veja-se Casaca e Damião, 2011).

Constata-se ainda que, no quadro dos estados-membros abaixo elencados (quadro 1), a taxa de emprego tende a diminuir no caso das mulheres que são mães (à exceção da Dinamarca), ao passo que o inverso sucede com a taxa de emprego masculino. A Alemanha e o Reino Unido destacam-se por apresentarem a maior diferença entre as taxas de emprego das mulheres sem e com filhos/as, enquanto Portugal exibe apenas uma quebra de 2,3 pontos percentuais. Aqui, a taxa de emprego de mulheres mães é relativamente elevada (74,2%), apenas superada pelos valores da Dinamarca, da Suécia e dos Países-Baixos. Importa também notar que esta realidade contrasta fortemente com a de outras sociedades da Europa do Sul.

 

 

Deduz-se, assim, que o nascimento dos/as filhos/as pouco influencia a participação laboral das mulheres portuguesas (veja-se p. ex. Perista, Chagas Lopes e outros/as, 1999; Torres e outros/as, 2004; Casaca, 2005; 2010; 2012a; Wall, 2007). Ainda, segundo a mesma fonte estatística, verifica-se que Portugal evidencia a quinta taxa de emprego mais elevada (63,8%) da UE15, depois da Suécia (82,9%), da Dinamarca (82%), dos Países-Baixos (69,4%) e da Finlândia (66,6%), no que toca às mulheres que são mães de três (ou mais) crianças (dados referentes a 2011).

Além deste padrão de emprego assente na continuidade, a participação das mulheres portuguesas na atividade laboral coexiste com regimes de tempo particularmente intensivos (cf. p. ex. Casaca, 2005; 2010; 2012a; Torres e outros/as, 2004; Wall, 2007; Guerreiro e outros/as, 2008); com efeito, aproximadamente 82,7% encontram-se a trabalhar a tempo inteiro (INE, 2012; dados referentes ao ano de 2011). Seguindo um prisma complementar, uma vez apurado o modo como os casais com filhos/as se organizam quanto à participação na atividade económica (figura 1), constata-se que é no nosso país que se encontra a percentagem mais elevada de parceiros empregados a tempo inteiro (68% do total de casais), seguindo-se a Finlândia (61%). Por outro lado, nos Países-Baixos em 67% dos casos um elemento está empregado a tempo inteiro (por norma, o homem) e o outro (quase sempre a mulher) mantém um vínculo a tempo parcial (situação que assume também ampla expressão na Alemanha, na Áustria e no Reino Unido, designadamente).

 

 

Relativamente a outras modalidades flexíveis de tempo de trabalho (não incluindo portanto o regime a tempo parcial), Portugal apresenta uma das mais baixas percentagens de mulheres e homens empregados com horários flexíveis: 24,6% e 31,6%, respetivamente (Casaca, 2011: 4).4 Os dados disponibilizados pelo INE (Inquérito ao Emprego, ano 2010)5 indicam que, no caso dos horários antissociais, o trabalho prestado ao fim de semana (sobretudo no primeiro dia) tem um peso considerável no nosso país. Assim, para metade dos homens (51,3%) e 43,4% das mulheres empregadas o horário de trabalho inclui o dia de sábado. Uma em cada quatro pessoas empregadas (homens e mulheres) trabalha também ao domingo (Casaca, 2012a: 27). É de notar que, segundo o último inquérito às condições de trabalho, a cargo da Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound),6 três quartos dos trabalhadores e das trabalhadoras portuguesas (74,5%) referem que a fixação dos horários é determinada pela entidade empregadora. Já no que diz respeito à UE15 em geral, a mesma situação é reportada por 57,9% das pessoas respondentes. Por outro lado, num dos países com maior tradição de diálogo social em torno da organização do trabalho, a Suécia, essa unilateralidade na posição patronal é claramente inferior, sendo referida por 37,9% dos trabalhadores e 35,8% das trabalhadoras (cf. Casaca, 2012a: 27).

O aumento das taxas de emprego feminino relaciona-se com a expansão do emprego a tempo parcial e com a crescente precarização laboral. Ambas as modalidades (regime a tempo parcial e contratos não permanentes) são preponderantemente preenchidas por mulheres, correspondendo quase sempre a uma degradação das condições de emprego: baixos salários, escassas oportunidades de desenvolvimento profissional e de acesso a benefícios sociais, fraca ou nula proteção social e inerente risco de exclusão económica e social (cf. p. ex. Meulders, 1998; Ruivo, González e Varejão, 1998; Maruani, 2003; Casaca, 2005; 2010; 2012a; Kovács e Casaca, 2007).

A figura 2 indica que a percentagem de trabalhadores/as abrangidos/as por contratos de duração limitada em Portugal é uma das mais expressivas do contexto europeu, sobretudo da UE15 (neste elenco, só a Espanha exibe um valor superior). Em praticamente todos os países, a precariedade incide fundamentalmente sobre a população feminina: no país vizinho, cerca de 26,4% trabalhadoras estavam, em 2011, numa situação laboral precária, seguidas das portuguesas (22,4%).7

 

 

Também o desemprego tem vindo a agravar-se no nosso país. No que diz respeito à UE15, os valores da taxa de desemprego total são praticamente semelhantes em 1999 e 2011 — 9,5% e 9,7%, respetivamente, tendo diminuído no caso das mulheres (de 11,1% para 9,8%) e aumentado ligeiramente no que diz respeito aos homens (de 8,3% para 9,7%). Outra tendência é diagnosticada na realidade portuguesa: aqui, a taxa de desemprego aumentou significativamente no caso dos homens (de 4,4% para 13,2%) e no das mulheres — de 5,3% para 13,5%. O país apresenta, assim, o terceiro valor mais elevado da UE15, tanto no caso da força de trabalho feminina como masculina.8

 

Transformações setoriais e profissionais: refletindo sobre alguns paradoxos

O setor dos serviços é atualmente aquele que mais força de trabalho reúne no nosso país (62,5% em 2011), sendo nele que 52% dos homens e 74,5% das mulheres empregadas desenvolvem a sua atividade profissional (INE, 2012). No caso das mulheres, é de assinalar a sua sobrerrepresentação nos serviços sociais (educação, saúde e ação social) e pessoais. Esta feminização explica-se, em parte, pelo facto de serem segmentos socialmente associados às tarefas desenvolvidas pelas mulheres no interior do espaço doméstico/familiar, tipificados como próximos dos atributos “naturais” da feminilidade (Casaca, 2005). É de notar que o crescimento do emprego feminino se tem registado fundamentalmente em setores onde predominam os baixos salários e em profissões que requerem poucas qualificações ou que são mesmo tidas como indiferenciadas (veja-se p. ex. Ferreira, 1999; 2003; Perista, Chagas Lopes e outros/as, 1999; Casaca, 2005).9

Nota-se uma concentração acentuada de mulheres nas profissões menos valorizadas socialmente, apesar das mudanças em curso e do acesso de um grupo (restrito) a profissões mais qualificadas e até de enquadramento. O facto, porém, de homens e mulheres exercerem as mesmas profissões não exibe, linearmente, uma situação de igualdade; com efeito, as funções que exercem, as especializações e os níveis hierárquicos remetem frequentemente para estatutos diferenciados, salários e condições de emprego desiguais (Casaca, 2005). Convirá a este propósito salientar que, segundo informação disponibilizada pela Comissão Europeia, a probabilidade de as mulheres ocuparem cargos de direção é menor nos setores identificados como “novos”, designadamente nos ramos intensivos em tecnologias, do que nos ramos tradicionais da economia (cf. Eurostat, 2002: 81).

Este facto, porém, não deixa de ser paradoxal à luz de um dos argumentos mais proeminentes da sociologia contemporânea; são vários/as os/as autores/as que vêm defendendo que as novas tecnologias encerram o potencial de agirem como catalisadoras da modernização das relações de género, estimulando o desmantelamento das estruturas patriarcais e da tradicional divisão sexual do trabalho (p. ex. Castells, 2000 1996&#93). Foi a partir da identificação de um intenso debate em torno desta problemática que nos propusemos estudar os “novos” setores dos serviços em Portugal (cf. Casaca, 2005; 2006; 2012b), abordando de seguida os desencontros ali vividos entre a atividade profissional e o domínio familiar.

 

Atividade profissional e vida familiar em alguns dos novos setores dos serviços: um balanço das (in)compatibilidades

 

Nota metodológica e caracterização das inquiridas

O estudo centrou-se em dois subsetores dos serviços, ainda que muito heterogéneos entre si: por um lado, o segmento da informação e comunicação (call centres e áreas de atividade intensivas em conhecimento: telecomunicações, conteúdos informáticos, software, multimédia e audiovisuais);10 e, por outro, o “novo” comércio de retalho (grande distribuição e novos formatos comerciais). A designação de “novos” não decorre de qualquer orientação determinista relativamente às transformações socioeconómicas (cf. Kovács, 2002); procura-se, antes, fazer referência a setores de atividade cujo desenvolvimento se enquadra no processo de reconfiguração da estrutura económica e socioprofissional, associado à expansão do segmento das tecnologias de informação e comunicação (frequentemente conotado com os “novos” setores da economia) e do “novo comércio”. Neste caso, estão incluídos os formatos comerciais que se afastam do comércio tradicional, desde as grandes superfícies alimentares e especializadas (ramos de eletrodomésticos, desporto, vestuário, livros e discos, bricolage) até aos centros, galerias e condomínios comerciais. Estes estão associados a novas estratégias empresariais e de gestão da mão de obra, que em muito se distanciam do comércio tradicional (para um maior desenvolvimento veja-se p. ex. Salgueiro e outros/as, 2000; Marques e outros/as, 2001; Casaca, 2005).

Ora, tratando-se de “novos” segmentos de atividade, importaria questionar até que ponto se verificam “novidades” no plano das relações de emprego e das relações de género, designadamente no sentido da dessegregação sexual. Se são setores que recorrem, num registo intensivo e sistemático, a modalidades flexíveis de contratação e de tempos de trabalho (cf. Casaca, 2005), caberia também ponderar em que medida estas se anunciam benéficas ou lesivas da igualdade de oportunidades.

A investigação empírica incidiu sobre as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, abrangendo também Aveiro (zonas geográficas onde os novos formatos comerciais e as empresas que operam no domínio dos serviços de informação e comunicação têm maior presença).11 Para esta análise em particular, foram inquiridos 187 indivíduos (82 homens e 105 mulheres, 44% e 56% do total da amostra, respetivamente) e realizadas entrevistas em profundidade a trabalhadoras de empresas diferentes dos setores selecionados (cerca de 20), bem como a gestores/as de empresas e outros/as informantes privilegiados/as (p. ex. dirigentes sindicais e representantes de organismos públicos).12

Em estudos anteriores, a nossa análise refletiu sobre as implicações da flexibilidade de emprego e de tempo de trabalho nas relações de género, destacando as condições laborais e de vida tanto de homens como de mulheres; neste artigo, porém, centramo-nos nos desafios, oportunidades e obstáculos com que os diferentes grupos de mulheres se confrontam, tendo presente uma subamostra distribuída pelos grupos profissionais que constam do quadro 2.

 

 

É nos serviços interpessoais que mais se concentra a força de trabalho feminina incluída na nossa amostra: as mulheres perfazem 63,9% do total de “vendedores/balconistas/assistentes” de loja e “encarregados/supervisores/as do comércio”, 89,5% dos/as “operadores/as de linha de caixa”, e 55,6% da totalidade de “operadores/as de call centre” (Casaca, 2005). Neste último segmento, a feminização faz-se sobretudo sentir em funções de front office (atendimento de primeira linha), onde são fundamentalmente valorizados atributos relacionais e sociais — capacidade de comunicação e de gestão das emoções, paciência para ouvir os/as outros/as, empatia e resistência a tarefas monótonas e repetitivas) (Casaca, 2006; 2012b). No que se refere aos novos formatos comerciais, a presença de mulheres é particularmente expressiva no grupo de operadoras de caixa (grande distribuição) e no de assistentes de loja (retalho especializado — vestuário feminino, infantil e juvenil; cosmética, lingerie…). Quanto ao setor mais intensivo em conhecimento, constata-se que as telecomunicações são relativamente permeáveis ao recrutamento de mulheres, enquanto os subsetores ligados à informática (novas tecnologias de informação e software) prevalecem domínios claramente masculinos (idem).

Pormenorizando o perfil das inquiridas, importará referir que aproximadamente 71% têm até 30 anos de idade; cerca de um quinto situam-se entre os 31 e os 35, e apenas 9% contam mais de 41 anos. Trata-se portanto de um grupo relativamente jovem, refletindo a própria composição etária que caracteriza os setores selecionados (cf. Casaca, 2005). Entre as mulheres com menos de 25 anos estão maioritariamente aquelas que são operadoras de linha de caixa (grande distribuição) e de call centres; nos escalões mais avançados situam-se sobretudo as empregadas de balcão (assistentes de loja). O nível de escolaridade é relativamente elevado: metade possuem um diploma referente a um curso médio ou superior, praticamente um quinto completaram o 12.º ano, 26% detêm entre o 9.º e o 11.º anos, e apenas um número residual apresenta habilitações inferiores. Quanto à situação familiar, a maioria coabita ainda com os pais/mães (43%), 15% vivem sós, 6% vivem com os/as filhos/as (famílias monoparentais), e aproximadamente 37% são casadas ou vivem em união de facto. Do total de respondentes, cerca de 40% são mães, essencialmente de crianças com menos de seis anos de idade (65% dos casos); entre aquelas, a maioria têm uma criança (68%), cerca de um quarto têm duas, e 11% têm entre três e quatro filhos/as.

 

Condições de trabalho e de emprego nos novos setores dos serviços

A situação contratual ressalta como um vetor de diferenciação em matéria de condições de emprego, de trabalho e de oportunidades de vida. Considerando a amostra feminina no seu todo — e uma vez efetuado o teste estatístico para verificar se havia associação entre a situação contratual e o grupo profissional —, foi apurado um resultado estatisticamente significativo.13 É assim possível inferir que as contratações permanentes se associam às categorias profissionais “dirigentes e quadros superiores”, “especialistas das profissões intelectuais e científicas” e “técnicas e profissionais de nível intermédio” (setor TIC — tecnologias de informação e comunicação), enquanto as contratações precárias estão associadas às profissões “operadoras de call centres” e “operadoras de linha de caixa” (Casaca, 2005).

O setor da informação e comunicação não é uniforme em matéria de condições de emprego: a esmagadora maioria das trabalhadoras (86%) do setor intensivo em conhecimento beneficia de um contrato por tempo indeterminado (vulgo permanente), ao passo que aquelas que prestam atividade em call centres estão maioritariamente abrangidas por uma relação contratual precária (87%), sobretudo por um contrato a termo (de notar que, ao abrigo de uma relação frequente de subcontratação, o contrato de trabalho é celebrado com uma empresa de trabalho temporário, e não com a empresa onde prestam efetivamente atividade) (veja-se também Santos e Marques, 2006). No setor do “novo” comércio há uma maior homogeneidade entre a situação contratual das mulheres que integram o setor da distribuição e aquelas que trabalham no comércio a retalho especializado: em ambos os casos, 52% das inquiridas estão com contratos precários, na sua maioria a termo (modalidade preponderante na grande distribuição), mas também ao abrigo de falso “trabalho independente” (recibos verdes) e de trabalho não formalizado (ausência de contrato) — situações encontradas no comércio retalhista especializado.

Cerca de 84% das mulheres que beneficiam de segurança contratual estão a trabalhar a tempo inteiro (veja-se quadro 3). É portanto nos segmentos “novo comércio” e call centres que se verifica um maior peso das contratações precárias, sendo também a rotação manifestamente elevada: 86% das trabalhadoras com contratos a termo, apesar da sua juventude, já mudaram de emprego, refletindo — como nos confirmaram os seus depoimentos — trajetórias pouco lineares, tipo “yô-yô”, frequentemente labirínticas (Pais, 2001).14 De registar ainda que mais de um terço (36%) das trabalhadoras abrangidas por uma relação contratual a termo já passaram, nos últimos cinco anos, pela condição de desempregadas. O quadro 3 demonstra também que as oportunidades de formação e promoção escasseiam entre as trabalhadoras a tempo parcial, entre aquelas que se encontram abrangidas por contratos a termo e as que têm uma relação contratual com uma empresa de trabalho temporário (ETT).

 

 

No que se refere ao setor da grande distribuição, Margaret Maruani (1991) afirma que este pode mesmo ser considerado um laboratório ou um terreno de ensaio das novas formas de emprego. Com efeito, estas grandes unidades comerciais, dados os prolongados períodos de funcionamento, têm jogado com dois tipos de flexibilidade: a temporal e a contratual (Scott, 1994). Registámos, a este respeito, uma semelhança entre as condições de trabalho deste segmento e as dos call centres: um elevado grau de precariedade, através do qual as empresas procuram reduzir custos laborais e flexibilizar o número de trabalhadores/as em função das oscilações da procura, e o recurso a horários flexíveis.

Trata-se, pois, de afinidades que se afiguram consistentes com o argumento segundo o qual as operadoras de call centres, as operadoras de caixa e, em algumas situações, as assistentes de loja (vendedoras) se aproximam da descrição de “novos proletários dos tempos modernos” (cf. Scott, 1994: 236); ou — como explicitámos noutro lugar (Casaca, 2005; 2012b) — do segmento “sombrio” dos “novos setores dos serviços”, caracterizado pelas escassas oportunidades de formação e de desenvolvimento profissional, pelos baixos salários e pela vulnerabilidade à precariedade de emprego.

 

As novas temporalidades de trabalho nos novos setores dos serviços: resultados de um estudo

Verifica-se uma justaposição de contrariedades: as mulheres que se encontram em empregos contratualmente precários são também aquelas mais sujeitas a horários impostos, que na prática pouco ou nada têm de flexíveis. No caso dos call centres, o recrutamento de jovens, muitos/as deles/as estudantes universitários/as e ainda sem família própria constituída, atenua de algum modo o conflito entre os tempos de trabalho remunerado e as exigências do contexto familiar. A difícil gestão das temporalidades, como se desenvolve no ponto seguinte, agrava-se particularmente entre as trabalhadoras do setor da grande distribuição, pois, em virtude dos baixos salários, dificilmente conseguem custear as estruturas de suporte — dificuldades que se acentuam devido à escassez de serviços e equipamentos públicos de apoio às famílias.

 

A (in)flexibilidade de tempo de trabalho: o caso da grande distribuição

Não existem diretivas europeias sobre os horários de funcionamento das unidades comerciais, pelo que a regulamentação dos mesmos é da responsabilidade de cada estado-membro. Por conseguinte, em Portugal, não obstante o facto de a regulamentação geral caber ao poder central, é possível proceder a ajustamentos de âmbito regional e local (cf. Marques e outros/as, 2001: 307). À data do estudo, os estabelecimentos de venda ao público podiam estar abertos das 6 às 24 horas, durante todos os dias da semana, desde que as áreas de venda fossem inferiores à grandeza de uma unidade comercial de dimensão relevante (UCDR). No caso das áreas incluídas neste conceito, estava limitado o trabalho aos domingos e feriados de janeiro a outubro — dias em que o horário não podia exceder o período das 8 às 13 horas (cf. Salgueiro e outros/as, 2000; Marques e outros/as, 2001).15

Cabe à entidade empregadora organizar os tempos de trabalho de molde a operar no âmbito do regime de abertura adotado na sua área de venda, sendo frequentemente o mesmo posto de trabalho ocupado por mais que uma pessoa. Está contratualmente estipulado que o horário máximo é de 40 horas semanais; cada trabalhador/a pode, porém, estar ao serviço mais duas horas por dia, desde que — e tal como está consagrado no contrato coletivo de trabalho (CCT) — o ajustamento seja efetuado dentro de um período máximo de oito semanas e prevaleçam doze horas mínimas de intervalo entre duas jornadas consecutivas. De acordo com as fontes de informação contactadas, estão patentes quatro tipos de horários de trabalho: a tempo inteiro (40 horas), a tempo parcial (TP) de 30 horas, a tempo parcial de 25 horas e a tempo parcial de 12 horas semanais (no último caso, trata-se de trabalho a TP essencialmente prestado ao fim de semana). É ainda comum, como se referiu, a sobreposição de outras duas modalidades de trabalho flexíveis: o horário por turnos fixos e por turnos rotativos (veja-se também Cruz, 2003).

As alterações horárias não significativas têm de ser comunicadas aos/às trabalhadores/as com oito dias de antecedência — prazo que é ampliado até um mês caso estejam em causa mudanças de fundo.16 A partir dos depoimentos prestados pelas trabalhadoras a tempo parcial, é possível constatar que, apesar deste regime, os contratos tendem a estipular uma disponibilidade para a empresa até às doze horas diárias. Este facto, associado a horários que se prolongam pelo fim de tarde e noite, é tido frequentemente como impeditivo da convivência familiar; os reescalonamentos constantes e a convocação não atempada para realizar horas “suplementares” constituem constrangimentos importantes à articulação entre os diferentes domínios da vida destas trabalhadoras. Uma das entrevistadas (Madalena) relata assim a sua experiência numa superfície comercial:

O meu horário era esquisitíssimo. Às segundas e terças, entrava às 3, saía às 8, às 20h; quarta e quinta tinha folga, à sexta, entrava às 15h e saía às 22h, ao sábado, também entrava às 15h e saía às 23h e ao domingo entrava às 17h30 e saía à meia-noite e meia. Esse tempo &#91…&#93 tive de vir morar com a minha sogra. Era a minha cunhada que ficava com o bebé, que o ia buscar ao infantário, porque eu era impossível. &#91…&#93. Era impossível porque o meu marido também tem uns horários descontrolados. Tanto trabalha noites inteiras como dias inteiros. &#91Madalena, ex-empregada de comércio, nascida em 1978, sete anos de escolaridade, casada, mãe de duas crianças com menos de cinco anos de idade e à espera da terceira&#93

Menciona ainda que, quando descobriu que estava grávida, se sentiu “apavorada”: o reverso da gravidez foi a não renovação do contrato de trabalho. É ainda de reter a referência a “horários descontrolados”. Efetivamente, para estas trabalhadoras, mesmo sabendo que os horários têm de ser afixados ou comunicados com trinta dias de antecedência (caso os direitos consagrados no CCT sejam cumpridos…), prevalece a incerteza quanto ao modo como articular o novo horário com as exigências da vida familiar e pessoal, incluindo as soluções a equacionar relativamente à guarda das crianças no período de prestação de trabalho à noite, em feriados ou fins de semana.

Uma outra entrevistada, Graça, trabalha como operadora de caixa, aufere 500 euros mensais e passa 10 horas diárias no respetivo espaço comercial; o horário tanto pode ter lugar entre as 9,00 e as 19,00 horas, com duas horas para refeição, como entre as 11,00 e as 21,00 horas, ou estender-se entre as 13,00 e as 23,00 horas. Trabalha por turnos rotativos, os quais são reelaborados semanalmente, com direito a dois dias de descanso semanais, igualmente rotativos. Estes horários obrigam a despesas acrescidas, dado o prolongamento do tempo de permanência da filha no infantário. Nos dias em que termina o expediente às 23 horas, pede à mãe que vá buscar a criança e, uma vez findo o turno, passa ainda por casa dos pais… Só depois regressa à sua própria casa, com a filha, nunca antes da meia-noite e meia. O contrato de trabalho foi sujeito a renovação por duas vezes, aguardando ansiosamente pela próxima decisão da entidade empregadora. Receia, porém, que o mesmo não seja renovado — prática que, aliás, vem sendo recorrente na empresa.

Eu vivo sozinha com a minha filha. Sou mãe solteira e os encargos são imensos. Tenho renda para pagar, luz, água, essas coisas todas. É muito. O que mais quero é ter um emprego estável e um horário fixo, que termine às 18,00. &#91Graça, operadora de caixa de supermercado, nascida em 1978, nove anos de escolaridade, solteira e mãe de uma filha de quatro anos&#93

Neste segmento de atividade, a articulação com a vida familiar é portanto dificultada pelas alterações recorrentes nos horários de trabalho, que, por sua vez, geram a necessidade de rearranjos constantes na vida familiar e pessoal. Acresce que, como se disse, o CCT deixa em aberto a possibilidade de, no decurso do próprio dia, ser solicitado o prolongamento de mais duas horas de trabalho, sem que o mesmo seja considerado (e remunerado) como trabalho suplementar. Segundo as palavras de um dirigente sindical, as mulheres são as mais penalizadas pela flexibilização dos horários.

Normalmente, as mulheres têm mais pressão sobre si &#91…&#93 e sofrem mais esta liberalização dos horários de trabalho &#91…&#93 Porquê? É mais sobre elas que recaem os cuidados dos filhos, os cuidados da casa, a gestão da casa. A compatibilização da vida profissional com a vida familiar torna-se quase um inferno. Depois, numa sociedade que é machista, ainda há a tentação de pressionar. A família, o marido, em vez de ajudar, pressiona: “Porque é que vais trabalhar ao domingo? &#91…&#93 Porque é que não vens mais cedo.” Portanto, em vez de haver ajuda, há desajuda, quer dizer, há pressão… &#91Dirigente sindical do CESP — Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal&#93

Não obstante o contrato coletivo de trabalho consagrar o direito a um dia de descanso semanal complementar e a um outro obrigatório, as folgas rotativas, muitas delas desfasadas dos tempos de descanso dos restantes membros da família, constituem fonte de ansiedade e de stresse. Também as férias, quando não negociadas, geram situações em que algumas trabalhadoras ficam impedidas de as gozar num período coincidente com o dos/as familiares. Fazendo a ponte com outras narrativas individuais, o nosso estudo evidenciou o quanto a precariedade contratual e a flexibilidade dos horários ensombram os projetos de vida, cerceiam expetativas e colocam frequentemente em suspenso planos de autonomização individual, de formalização de uma relação de casal ou de parentalidade (Casaca, 2005; veja-se também Guerreiro e Abrantes, 2004; Kovács e Chagas Lopes, 2012).

 

A cultura do presentismo no setor das tecnologias de informação e comunicação (TIC)

No setor das TIC, à exceção dos call centres, é particularmente intensivo o tempo consagrado ao trabalho remunerado, o que parece suceder tanto por força de constrangimentos organizacionais — contextos profissionais onde o “presentismo” é interpretado como sinónimo de um elevado compromisso profissional e de lealdade organizacional —, como de fatores subjetivos (motivações individuais). Um estudo promovido pela ANETIE (Associação Nacional das Empresas das Tecnologias de Informação e Eletrónica) (2003) dá conta de cargos e funções onde os indivíduos chegam a trabalhar 70 e 80 horas por semana. Assim sucede com a função de programação de software (alto nível), de análise informática, de arquitetura de redes, de engenharia de sistemas, de arquitetura de sistemas, e de coordenação e engenharia de I&D.

O imperativo de disponibilidade total ou do “casamento com a empresa”, que se expressa em horários prolongados, distendidos, e na secundarização das outras esferas da vida, é pouco compatível com as responsabilidades socialmente atribuídas às mulheres (e por elas interiorizadas…) — facto que, como concluímos noutro lugar, contribui para a sua exclusão dos empregos estratégicos e nucleares nestes novos setores (Casaca, 2006).17 Os gestores contactados são unânimes em afirmar que não existe qualquer barreira formal ou processo discriminatório contra as mulheres no interior das suas empresas, pelo que o seu afastamento se deve sobretudo à falta de organização da sociedade e à escassez de apoios no seio da estrutura familiar. No entanto, transparece frequentemente dos seus discursos a dicotomia estereotipada de “mulher pouco disponível” versus “homem totalmente disponível” para as exigências temporais pouco “amigas” da família.

Neste sentido, e de acordo com um dirigente sindical do SINTTAV (Sindicato Nacional dos Trabalhadores das Telecomunicações e Audiovisuais), as principais questões que levam as mulheres a pedir apoio jurídico prendem-se com as ausências e as faltas motivadas pela assistência na doença aos/às filhos/as. Neste contexto, mesmo entre as mulheres que enquadrámos no “segmento luminoso”, a compatibilização entre o investimento na carreira profissional e a vida privada é um dos objetivos mais difíceis de conseguir.

A entrevistada seguinte é quadro superior numa empresa das tecnologias de informação; reconhece trabalhar mais de 50 horas semanais, a que acresce o trabalho complementar que usualmente a acompanha aos fins de semana. Embora a “flexibilidade” de horário não conste do contrato de trabalho, está implícito que o seu comportamento “deve” obedecer aos padrões dominantes:

No contrato de trabalho está escrito: das 9 às 18h. &#91…&#93 Se o meu chefe chegar ao pé de mim e disser: “olhe, eu preciso que fique aqui até à meia-noite a acabar um trabalho”, eu não vou dizer: “Ai, não, porque o meu contrato de trabalho diz que eu acabo às 6 da tarde.” Porque, se eu disser isto, eu vou ser posta na prateleira. Nesta empresa ou noutra qualquer. Acho que a pessoa começa a ser olhada de lado: “Não é um bom colaborador, não tem o espírito da empresa”, há uma série de desculpas para porem a pessoa na prateleira &#91…&#93.&#91O que&#93 passa, por exemplo, por não ir a ações de formação, por não ser promovido, ou… Nós temos avaliações de desempenho trimestrais, que, no final, se vão traduzir na remuneração… Há uma série de penalizações dentro da empresa que prejudicam a carreira profissional da pessoa. &#91Ana, diretora do departamento de recursos humanos numa empresa do segmento das TIC, nascida em 1974, licenciada em gestão, casada, sem filhos/as&#93

Também o depoimento da Rita dá conta das longas horas dedicadas à atividade profissional:

Eu trabalho horas extraordinárias porque quero. Nesta fase trabalho 8, 9 horas por dia. Mas, quando nós temos muito trabalho, não tem limite: 13, 14, 15 horas por dia. &#91…&#93 A perceção que eu tenho daquilo que os meus colegas me dizem é que quanto mais horas um empregado trabalhar, melhor é. E aquilo que eu vejo é uma tendência atualmente… as pessoas têm tanto receio de conseguir manter um posto de efetividade que acabam por trabalhar dia e noite até conseguirem ter uma situação financeiramente estável… Eu, eu não, eu não faço só por isso. Eu faço porque gosto… &#91Rita, gestora comercial numa empresa do segmento das TIC, nascida em 1978, licenciada em antropologia, casada, sem filhos/as&#93

Depois de casada há seis anos e com uma carreira profissional em clara ascensão, Margarida decidiu-se pela maternidade por volta dos 30 anos, esclarecendo:

Fui casada seis anos sem ter filhos. Essencialmente porque foi o período da carreira. Trabalhei loucamente, sem fins de semana, muitas vezes. Fazia uma média de 14, 15 viagens por ano &#91…&#93. &#91Trabalhava por dia&#93 11 horas. Normalmente, 11, 12. Tanto que eu, normalmente, quando vejo os sindicatos queixar-se que as 40 horas e das 60 horas, dá-me vontade de rir. Não conheço quase ninguém nas tecnologias da informação nem em empresas privadas que só trabalhe 40 horas. Aliás, as pessoas que trabalham 40 horas são mal vistas porque, aqui… também depende um bocadinho das empresas mas, normalmente, há o culto do número de horas que se trabalha. &#91…&#93 a empresa valoriza muito o trabalho presencial &#91…&#93. &#91Margarida, diretora de marketing, nascida em 1970, licenciada em línguas, casada e mãe de uma criança de dois anos&#93

A modalidade de “teletrabalho” permitiu que permanecesse “presente” na empresa durante o período correspondente à licença por maternidade — situação que perspetiva como muito positiva, sublinhando que “as mulheres são sempre penalizadas pelo afastamento”:

O meu envolvimento nessa altura foi um bocadinho mais profundo do que é normal. As mulheres foram sempre penalizadas, sempre, sempre, pelo afastamento. E eu nunca quis que me acontecesse isso porque tinha visto as outras experiências numa altura em que estava a começar a ver nitidamente um período de crise a aproximar-se. E é assim, não interessa se a pessoa dedicou seis ou sete anos dos seus melhores anos, do seu esforço, etc. Na altura em que desaparece, desaparece mesmo e é esquecida. E eu também não quis isso. E, depois, há funções mais substituíveis do que outras. Eu, por exemplo, se tivesse uma função administrativa &#91…&#93 Agora substituir uma diretora de marketing na empresa em que eu estava era virtualmente impossível &#91…&#93 … Reduzi ligeiramente as atividades mas reduzi para aí 10%, portanto, 90% manteve-se. &#91…&#93 Não fiz o primeiro ano de aleitação do meu filho.

Esta questão remete para a constatação de mais um paradoxo: mesmo aquelas trabalhadoras que estão protegidas da precariedade, dos riscos inerentes à flexibilidade numérica e que gozam de condições de emprego “privilegiadas” (p. ex. remunerações elevadas, funções qualificadas, segurança económica…) estão sujeitas a um modelo de gestão do tempo que parece condicionar fortemente a sua qualidade da vida (Casaca, 2005).

O conflito entre os dois mundos, o laboral e o familiar, e a perceção de “fome de tempo” (Hochschild, 1997), que recai preponderantemente sobre as mulheres, não são fatores alheios às novas opções reprodutivas e à queda dos níveis de fecundidade (Perista, Chagas Lopes e outros/as, 1999; Torres, Mendes e Lapa, 2007). Esta é, de resto, uma tendência que percorre a Europa e que obviamente acarreta custos demográficos e sociais consideráveis. Os testemunhos anteriores exprimem bem as dificuldades de articulação com que se confrontam as mulheres que optaram por uma carreira profissional no setor das TIC. Todas as entrevistadas que exercem profissões muito qualificadas e de enquadramento optaram por uma das duas possibilidades: o adiamento da maternidade para uma fase mais consolidada da carreira profissional ou mesmo a renúncia a um projeto reprodutivo. Tal sucede porque, como procurámos descrever, impõe-se-lhes a conformidade com o modelo de tempo “androcêntrico” dominante (cf. Silvera, 2002).

 

Conclusão

Além de uma participação no mercado de trabalho relativamente extensiva (elevada taxa de emprego) e intensiva, as trabalhadoras portuguesas estão entre aquelas que, no quadro da União Europeia, mais exibem um envolvimento laboral contínuo. No entanto, é fraca a qualidade da relação de emprego e das condições de trabalho em geral: as mulheres são mais atingidas pela precariedade e pelo desemprego, tendem a ocupar postos de trabalho socialmente menos valorizados e reconhecidos, e auferem salários inferiores aos dos homens, mesmo quando detêm o mesmo nível de qualificação (Casaca, 2005; 2010; 2012a).

Não obstante as conhecidas teses que associam o desenvolvido de “novos” setores da economia ao desmantelamento da cultura patriarcal e da divisão sexual do trabalho nas empresas e organizações em geral (Castells, 2000 &#911996&#93), a verdade é que as mulheres enfrentam menores oportunidades de enquadramento sociolaboral e de desenvolvimento profissional (Casaca, 2005; 2006). Além disso, como aqui procurámos evidenciar, os seus testemunhos evidenciam estilos de vida muito diferenciados e condições (objetivas e subjetivas) desiguais no que se refere às práticas de articulação entre a vida laboral/profissional e a familiar. As novas temporalidades de trabalho surgem, no nosso estudo, como realidades indissociáveis de um processo de reconfiguração das desigualdades, quer entre homens e mulheres (ibidem), quer no interior de cada grupo sexual (como aqui demonstrámos). O segmento do “novo comércio”, e muito em particular o da grande distribuição, vislumbra-se como o mais “sombrio” no quadro dos “novos” setores analisados (Casaca, 2012b), sendo também aquele que mais congrega força de trabalho feminina. As mulheres assalariadas que prestam serviço nas grandes superfícies comerciais parecem assim testemunhar uma nova forma de exploração; em virtude dos horários flexíveis e irregulares, a disponibilidade total faz parte integrante dos respetivos contratos de trabalho, no âmbito dos quais ficam obrigadas a permanecer disponíveis perante qualquer chamada da entidade empregadora. As dificuldades na articulação com a vida familiar agravam-se porque, em virtude dos baixos salários, estas trabalhadoras dificilmente conseguem custear os mecanismos formais de apoio (veja-se p. ex. Maruani, 1991; Scott, 1994; Cruz, 2003; Casaca, 2005).

As novas temporalidades de trabalho afiguram-se-nos dissonantes: por um lado, assumem um rótulo de flexibilidade e de maleabilidade no plano social e político, enquanto, por outro, as vivências e os testemunhos individuais exprimem sobretudo um registo de rigidez. Os diferentes tempos, tradicionalmente moldados a espaços plurais e diversificados, tendem a confluir na vivência de um tempo unidimensional, quase sempre determinado pela exigência de disponibilidade para as empresas e não pelas necessidades individuais dos/as trabalhadores/as. É sobretudo no segmento das tecnologias de informação e comunicação que a disponibilidade presencial se reveste de uma importância decisiva para o sucesso profissional; além das dificuldades trazidas para o domínio familiar e pessoal, a cultura do “presentismo” constitui, como referimos, uma barreira à igualdade de oportunidades, sugerindo ainda que a transformação das relações de género passa fundamentalmente pela adoção (ou sujeição) por parte deste grupo de mulheres ao modelo tradicional masculino (Amâncio, 2003). Com efeito, pese embora a tónica na flexibilidade de emprego em geral e na flexibilidade de tempo de trabalho em particular, as estruturas socioeconómicas dominantes continuam a obedecer à representação do trabalhador isento de responsabilidades familiares (veja-se p. ex. Silvera, 2002; Casaca, 2005; Guerreiro, Lourenço e Pereira, 2006). Este modelo, por seu turno, incorre no risco de agravar as desigualdades sociais e de género, e de acarretar outros custos sociais.

 

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Notas

1 A opção por esta designação é explicitada na secção que desenvolve as opções metodológicas.

2 Valores para o intervalo etário compreendido entre os 15 e os 64 anos de idade.

Fonte: Eurostat – Labour Force Survey, disponível em: http://epp.EUROSTAT.ec.europa.eu/portal/page/portal/statistics/search_database (consultado em 3/10/2011).

3 Fonte: Eurostat, LSF database; consultadoem20/09/2012. Relativamente a Portugal, há a destacar a quebra de série ocorrida no Inquérito ao Emprego (INE).

http://epp.EUROSTAT.ec.europa.eu/portal/page/portal/statistics/search_database

Nota: trata-se da percentagem do total de trabalhadores/as com idades compreendidas entre os 15 e os 64 anos, por sexo. No caso de Portugal, há a assinalar a quebra de série estatística em 2011.

4 Dados do Inquérito Europeu às Condições de Trabalho (European Working Conditions Survey 2010), da Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho/Eurofound), disponível em: http://www.eurofound.europa.eu/ (consultado em 29/9/2011).

5 Uma vez que os dados do Inquérito Europeu às Condições de Trabalho são referentes a 2010, optou-se, neste caso, por incluir os dados do INE (Inquérito ao Emprego), relativos ao mesmo ano.

6 Fifht European Working Conditions Survey — 2010 (EWCS 2010), Eurofound, disponível em: http://www.eurofound.europa.eu/ (consultado em 29/9/2011).

7 Este valor, porém, subestima a expressão efetiva da precariedade, na medida em que não contempla as situações de trabalho informais nem reflete a recorrente situação de “recibos verdes” (modalidade que encobre situações de falso “trabalho independente”) (Casaca, 2012a).

8 Fonte: Eurostat, LFS database, disponível em: http://epp.EUROSTAT.ec.europa.eu/portal/page/portal/statistics/search_database, (consultado em 20/9/2012).

Nota: trata-se da percentagem do total de trabalhadores/as com idades compreendidas entre os 15 e os 64 anos, por sexo. No caso de Portugal, há a assinalar a quebra de série estatística em 2011.

9 A percentagem de mulheres no total de trabalhadores/as não qualificados/as tem vindo a aumentar desde meados da década de 1990, perfazendo presentemente 72,9% do total dessa categoria (ano: 2011; INE, 2012).

10 O setor das tecnologias de informação e comunicação tem vindo a crescer nas economias da OCDE desde a década de 1990. Embora num registo mais tímido, a verdade é que tem também vindo a desenvolver-se em Portugal; dados relativos a 2002 indicam que as empresas do setor perfaziam 1,7% do total de empresas registadas no país, operando fundamentalmente no âmbito dos serviços (cf. OCDE, 2002; OSIC, 2004).A centragem na orientação para o cliente e para a qualidade dos produtos e serviços, a inovação tecnológica e as estratégias de racionalização organizacional, como é o caso da subcontratação e do outsourcing, são fatores que têm estado na base da expansão do segmento dos call centres, sobretudo a partir dos anos 1990 (Casaca, 2006; 2012b).

11 A informação aqui analisada resulta do estudo conducente à dissertação de doutoramento Flexibilidade de Emprego, Novas Temporalidades de Trabalho e Relações de Género (Casaca, 2005), que integrou o projeto mais abrangente As Formas Flexíveis de Trabalho e Emprego: Riscos e Oportunidades, coordenado por Ilona Kovács, realizado no âmbito do Socius/ISEG, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (POCTI n.º 33042/SOC/2000). A exploração dos dados secundários mais recentes decorre de um projeto coordenado pela autora e financiado pela FCT—Mudanças do Emprego e Relações de Género: Cruzando Quatro Eixos de Análise (Género, Classe, Idade e Etnicidade) (PTDC/SDE/66515/2006).

12 Os nomes apresentados são fictícios, de modo a salvaguardar o anonimato e a confidencialidade da informação prestada pelas pessoas entrevistadas.

13 Resultado do teste do qui quadrado: 2 = 38,027; gl = 10, p = 0,000, V = 0,657.

14 No nosso estudo, parte considerável das operadoras de linha de caixa, dadas as baixas qualificações, dificilmente encontraram oportunidades de mobilidade profissional e social ascendente. Nestes casos, a mudança de emprego tende a ocorrer em circuitos relativamente homogéneos e as condições atuais de trabalho (designadamente a flexibilidade de horários) dificultam a possibilidade de investimento em formação/qualificação, retendo-as quase sempre no segmento “sombrio”. Por outro lado, as mulheres que são operadoras de call centre, claramente mais escolarizadas (74% das inquiridas detêm um curso superior), tendem a perspetivar a situação atual (laboral e profissional) como temporária e, nalguns casos—como ilustraram algumas narrativas—, verifica-se mesmo que a passagem por um call centre não “fechou” a possibilidade de melhores alternativas laborais e de vida (cf. Casaca, 2005).

15 Situação que já não verifica desde outubro de 2010. Fora deste âmbito estavam aquelas situações consagradas legalmente como desvios ao regime-regra (decreto-lei n.º 48/96)—caso dos estabelecimentos em estações e terminais rodoviários, ferroviários, aéreos ou marítimos, abastecedores de combustíveis permanentes, que podiam (e podem ainda) chegar a operar 24 horas por dia; cafés, cervejarias, casas de chá, lojas de conveniência, que podem estar abertos até às 2 horas; e casas de fado, clubes, cabarés, dancings, boîtes, cujo horário pode ir até às 4 horas da madrugada (idem). Como se fez referência, presentemente (desde a entrada em vigor do decreto-lei n.º 111/2010), existe uniformização dos horários de funcionamento dos estabelecimentos comerciais, independentemente da respetiva área, prevendo-se um horário de abertura genérico compreendido entre as 6h e as 24h, todos os dias da semana, sem prejuízo de outros regimes especiais em vigor e da limitação ou ampliação prevista nos regulamentos municipais.

16 O CCT estabelece ainda a possibilidade de laboração em jornada partida ou jornada contínua. Na primeira situação, o período de trabalho diário é interrompido por um intervalo de duração não inferior a uma hora e não superior a duas, garantindo que o/a trabalhador/a em causa não labora mais de cinco horas consecutivas. No último caso, há um intervalo para uma refeição ligeira com a duração de 30 minutos, a qual conta como tempo de trabalho e tem de ser gozada no período compreendido entre 30% a 60% do período normal de trabalho (cf. CCT Super e Hipermercados, fornecido pelo CESL—Sindicato do Comércio, Escritórios e Serviços de Lisboa).

17 No estudo que realizámos (Casaca, 2005; 2006), verificámos que, no que diz respeito ao grupo socioprofissional de “quadros superiores”, as mulheres tendem a estar concentradas nos departamentos de recursos humanos, comunicação, relações públicas e marketing, em detrimento das divisões financeiras e de outras áreas estratégicas que, em contraponto, assumem um figurino predominantemente masculino (p. ex. coordenação de I&D, gestão/direção de unidades de negócios, gestão/direção de projetos, de inovação e desenvolvimento de produtos). Esta segregação sexual horizontal reflete-se, consequentemente, num significativo diferencial remuneratório, uma vez que as unidades funcionais “masculinas” são claramente mais valorizadas e recompensadas, seja em termos monetários e de benefícios sociais, seja em matéria de estatuto e prestígio social.

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