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Sociologia, Problemas e Práticas

versión impresa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  no.67 Oeiras dic. 2011

 

Caminhos limitados ou mobilidade bloqueada? A mobilidade socioprofissional dos imigrantes brasileiros em Portugal

 

Catarina Egreja* e João Peixoto**

* Socius, Instituto Superior de Economia e Gestão, Universidade Técnica de Lisboa. E-mail: catarina.egreja@sapo.pt

**Socius, Instituto Superior de Economia e Gestão, Universidade Técnica de Lisboa. E-mail: jpeixoto@iseg.utl.pt

 

Resumo

Apesar de haver em Portugal uma longa tradição de estudos sobre migrações, a análise específica da mobilidade socioprofissional dos imigrantes tem sido alvo de reduzida atenção. Este texto, baseado num inquérito a 1398 imigrantes brasileiros realizado em 2009, pretende aprofundar essa temática, observando os seus padrões de inserção em três momentos: antes da migração, à chegada e no momento da inquirição. As principais questões em debate são avaliar se as trajectórias de mobilidade ascendente existem mas são limitadas, como tem sido sugerido pela investigação disponível; se é apropriado falar em bloqueios a esses percursos; e se existem factores que os podem influenciar. Os resultados apontam para trajectórias ascendentes limitadas, embora a consideração do ano de chegada e de algumas características dos imigrantes permita antever trajectos mais positivos.

Palavras-chave imigração, imigrantes brasileiros, mobilidade socioprofissional, mercado de trabalho.

 

Limited options or blocked mobility? The socio-professional mobility of Brazilian immigrants in Portugal

Abstract

 Though there is a long tradition of migration studies in Portugal, specific analysis of the socio-professional mobility of immigrants has received limited attention. Based on a survey that was carried out in 2009 and involved 1398 Brazilian immigrants, this text seeks to examine this topic in greater depth by observing their integration patterns at three points in time: before migration, on arrival and at the  moment of the survey. The main issues in question are to assess whether trajectories of upward mobility exist, albeit to a limited degree, as the research available has suggested; whether it is correct to speak of barriers to these courses of development; and whether factors that may influence them exist. The results point towards limited upward trajectories, though consideration of the year of arrival and certain characteristics of the immigrants allows us to predict more positive progression.

Keywords immigration, Brazilian immigrants, socio-professional mobility, labour market

 

Chemins limités ou mobilité bloquée? La mobilité socioprofessionnelle des immigrés Brésiliens au Portugal

Résumé

Bien qu'il y ait au Portugal une longue tradition d'études sur les migrations, l'analyse particulière de la mobilité socioprofessionnelle des immigrés n'a guère suscité d'intérêt. Cet article, rédigé à partir d'une enquête menée auprès de 1398 immigrés brésiliens en 2009, vient approfondir cet aspect en observant les modèles d'insertion à trois moments: avant la migration, à l'arrivée et au moment de l’enquête. Les principales questions visent à savoir si les trajectoires de mobilité ascendante existent mais sont limitées, comme le suggèrent les recherches disponibles; si l'on peut parler de blocages sur ces parcours; et s'il existe des facteurs susceptibles de les influencer. Les résultats montrent que les trajectoires ascendantes sont limitées, même si l'influence de l'année d'arrivée et du profil des immigrés peut faire fonctionner l'ascenseur social.

Mots-clés immigration, immigrés brésiliens, mobilité socioprofessionnelle, marché du travail.

 

Caminos limitados o movilidad bloqueada?  Movilidad socioprofesional de los inmigrantes Brasileños en Portugal

Resumen

 A pesar de existir, en Portugal, una larga tradición de estudios sobre migraciones, el análisis específico de la movilidad socioprofesional de los inmigrantes ha sido objeto de una reducida atención. Este texto, basado en una encuesta realizada a 1398 inmigrantes brasileños, aplicada en 2009, pretende profundizar esa temática, observando  sus patrones de inserción en tres momentos: antes de la migración, a la llegada y  aquando de la encuesta. Las principales cuestiones en debate son evaluar si las trayectorias de mobilidad ascendente existen pero son limitadas, como ha sido sugerido por la investigación disponible; si es apropiado hablar em bloqueios a esses percursos; y si existen factores que los pueden influenciar. Los resultados apuntan hacia trayectorias ascendentes limitadas, aunque la consideración del año de llegada y de algunas características de los inmigrantes permita antever trayectos más positivos.

Palabras-clave inmigración, inmigrantes brasileños, movilidad socioprofesional, mercado de trabajo

 

Introdução

Apesar de haver em Portugal uma longa tradição de estudos sobre migrações, a análise específica da mobilidade social e, em particular, das trajectórias profissionais dos imigrantes tem sido alvo de reduzida atenção. Tal sucede tanto no âmbito da mobilidade intrageracional, relativa aos trajectos sociais e profissionais dos imigrantes, como intergeracional, contemplando as comummente designadas “segundas gerações”. A escassez de referências parece resultar da escassez de dados estatísticos sobre o tema e, também, da dimensão temporal ainda reduzida de Portugal enquanto país de acolhimento de indivíduos e trabalhadores estrangeiros. Como notam Machado e Abranches (2005: 70), “a escassa informação disponível sobre trajectórias sociais de imigrantes é devida não só à falta de quem as estude, mas também à relativa inexistência, até há alguns anos, do que estudar”.[1]

A nível internacional, porém, existem correntes teóricas bem consolidadas que se debruçam sobre estes temas. Curiosamente, a investigação tem sido mais frequente no contexto norte-americano do que no europeu. Tal parece resultar do maior tempo de permanência dos imigrantes, no primeiro caso, e do entendimento inicial dos imigrantes como “temporários”, no segundo. Enquanto nos Estados Unidos da América o estudo da imigração tem sido sempre efectuado na perspectiva da mobilidade socioprofissional das primeiras gerações e dos seus descendentes (ver, entre outros, Chiswick, 1978; Portes, 1995 e 1999; Papademetriou e outros, 2009), na Europa a mobilidade das primeiras gerações tem sido alvo de reduzida atenção e só recentemente o tema das segundas gerações ganhou relevo (ver, entre outros, Bommes e Kolb, 2006; King e outros, 2006). Apesar de, em termos institucionais, o estudo da mobilidade social e o das migrações pouco se cruzarem, por o primeiro estar sobretudo ligado às teorias das classes e estratificação social, as trajectórias dos migrantes têm sido analisadas sob as perspectivas alternativas da incorporação no mercado de trabalho, da integração social e das segundas gerações.

No que se refere à mobilidade profissional — objecto deste texto —, grande parte da discussão tem resultado do confronto entre perspectivas que acentuam a autonomia dos migrantes e outras que relevam as condicionantes estruturais. Alguns dos contributos resultam da aplicação do modelo clássico de assimilação, sobretudo considerando os ganhos em capital humano por parte dos migrantes.[2] Autores como Chiswick (1978; ver também Chiswick e outros, 2005) foram pioneiros nesta área, admitindo que o processo de migração é caracterizado por um declínio inicial do estatuto socioprofissional, seguido de um progressivo aumento, na sequência do maior envolvimento dos migrantes na sociedade de destino, passando pelo domínio da língua, melhor acesso a informação sobre o mercado de trabalho, reconhecimento de diplomas e aquisição de novas competências.[3] Os contributos alternativos têm destacado os limites estruturais à mobilidade. Portes (1995 e 1999, entre outros) é um dos autores mais relevantes neste domínio, por ter caracterizado os limites à mobilidade decorrentes dos diferentes modos de incorporação no mercado de trabalho e, mais em geral, por ter teorizado o modelo da assimilação segmentada. Devido à segmentação laboral e à desigualdade de recursos, muitos dos imigrantes e dos seus descendentes ficam retidos nos segmentos mais desfavorecidos do mercado de trabalho, não lhes sendo habitualmente possível efectuar percursos ascendentes significativos.

Qualquer que seja o contributo teórico adoptado, o impacto das trajectórias de mobilidade profissional nos padrões de integração social é enorme. É relativamente frequente que, na primeira inserção no mercado de trabalho, os imigrantes exerçam funções nos sectores mais desqualificados da economia, efectuando por isso um percurso descendente em relação ao seu país de origem (pelo menos considerando a sua posição na hierarquia social desse país). Contudo, a sua permanência nesses segmentos ao longo dos anos evidencia um problema de integração, situação que corre um elevado risco de ser reproduzida pela geração seguinte. Por esta razão, os processos de mobilidade ascendente, de espectro bastante variável, são de particular interesse, pelo que importa tentar conhecer a sua amplitude e as variáveis que determinam a ocorrência dessas situações.

Este texto pretende aprofundar a temática da mobilidade socioprofissional dos imigrantes em Portugal, adoptando uma perspectiva intrageracional. Serão destacados os padrões de inserção profissional em três momentos: antes da migração, à chegada a Portugal e à data do inquérito. O caso estudado é o dos imigrantes brasileiros, com base num inquérito realizado em 2009 a cerca de 1400 indivíduos de nacionalidade brasileira que residiam ou trabalhavam em Portugal (ver Góis e outros, 2009). Nas secções seguintes serão, primeiro, apresentados os principais resultados disponíveis da investigação sobre mobilidade e trajectórias socioprofissionais em Portugal. Depois, serão revistos os principais dados resultantes do inquérito, realçando os percursos de mobilidade relativos à condição perante o trabalho, situação na profissão, grupos profissionais e sector de actividade. Neste ponto serão, ainda, discutidos alguns percursos-tipo que emergem da evidência recolhida. Finalmente, serão apresentadas algumas notas conclusivas.

 

Mobilidade socioprofissional dos imigrantes em Portugal: a investigação disponível

Segundo Machado e Azevedo (2008: 26), a mobilidade social é um dos processos “pouco ou nada” investigados na área da imigração e etnicidade em Portugal. As trajectórias profissionais, um dos vectores centrais dessa mobilidade, têm sido observadas algumas vezes, embora raramente de forma sistemática. Alguns dos contributos mais explícitos para o estudo da mobilidade socioprofissional são os de Machado e Abranches (2005), Carneiro (2006) e Machado (2008). O tema tem sido ainda analisado como parte de objectivos mais amplos por outros autores. Entre outros, podem ser referidos contributos como os de Machado e outros (2007) e Pereira (2010), sobre imigrantes africanos; Casa do Brasil de Lisboa (2004), Malheiros (2007) e Xavier (2007), acerca da imigração brasileira; Baganha e outros (2004 e 2010) e Mendes (2010), sobre imigrantes leste-europeus; e Oliveira (2005), acerca das estratégias empresariais dos imigrantes.

A evidência recolhida nestes trabalhos é muito diversa, por incluir indivíduos com um tempo de permanência em Portugal muito variado, estratégias migratórias de diferente tipo, imigrantes com níveis educacionais e profissões anteriores muito heterogéneos. Os percursos profissionais observados têm incluído tanto a colocação directa em lugares de topo como, maioritariamente, a ocupação de segmentos pouco favorecidos do mercado de trabalho, bem como várias trajectórias posteriores. Apesar da diversidade, a investigação tem apontado para um percurso mais comum: depois de uma mobilidade descendente logo após a chegada, existe alguma ascensão profissional por parte dos imigrantes, bem como dos seus descendentes, mas os caminhos percorridos são limitados. Nos termos utilizados por Machado (2008: 129), “as pesquisas realizadas mostram que muitos migrantes, apesar de trajectos longos, têm uma mobilidade profissional limitada, que os mantém dentro dos segmentos laborais menos valorizados, embora com algumas mudanças de ramo e alguma melhoria das condições de trabalho”.

Consideremos, em pormenor, alguns dos estudos acima referidos. Machado e Abranches (2005) partiram de uma pesquisa incidindo sobre cabo-verdianos e indianos hindus, e procuraram perceber se a condição socioprofissional desses imigrantes seria então (em 2004), semelhante ou contrastante com a que apresentavam logo após a chegada a Portugal. Foi aplicado um inquérito a 600 indivíduos, que permitiu a reconstituição das suas trajectórias socioprofissionais, tomando como referência o posicionamento dos inquiridos em quatro momentos distintos: os dois últimos anos antes da vinda para Portugal; um ano após a chegada; o ano de meio percurso; e o ano de aplicação do inquérito. Posteriormente, observaram-se os processos de mobilidade estrutural e trajectórias individuais típicas, através da comparação de um mesmo conjunto de indicadores (condição perante o trabalho, sector de actividade e categoria profissional), nesses quatro momentos.

Referindo-nos à empregabilidade dos cabo-verdianos, o estudo mostra que o trabalho assalariado era não só a condição perante o trabalho mais comum antes da partida, como continua a sê-lo logo após a chegada, sobretudo em modalidades de trabalho precário — o que revela continuidade social. Com poucos recursos escolares e económicos, os cabo-verdianos encontram trabalho sobretudo na construção civil (os homens) ou no serviço doméstico (as mulheres), sectores historicamente mais receptivos a enquadrarem os trabalhadores menos qualificados. Já o trabalho por conta própria praticamente deixa de existir.

Os hindus, por sua vez, inseriam-se esmagadoramente no sector do comércio (83%) antes da vinda. No entanto, 21% dos homens à chegada encontraram emprego no sector da construção civil, situação que a maioria conseguiu inverter (o seu valor recua para os 6% em 2004): ainda que mantendo a condição de assalariados, conseguem retornar às actividades comerciais ao longo do tempo. Na verdade, muitos dos inquiridos nestas circunstâncias são assalariados de outros hindus que mantiveram o estatuto de pequenos empregadores à chegada a Portugal ou que o (re)conquistaram já no curso da estadia no país. No caso hindu, é justamente ao nível do trabalho por conta própria, com ou sem empregados, que se verifica uma notável continuidade, sendo de destacar o crescimento contínuo do pessoal dos serviços e vendedores.

Em conclusão, Machado e Abranches (2005) afirmam que ambos são caminhos limitados de integração social, embora os hindus se encontrem numa situação mais vantajosa do que a dos cabo-verdianos. Enquanto os primeiros conseguiram, em larga escala, reconstituir em Portugal a minoria intermediária[4] que eram em Moçambique (sobretudo mediante a internalização gradual dos assalariados externos, promovendo o emprego co-étnico), os últimos não se conseguiram afastar verdadeiramente do mercado de trabalho secundário, o que levanta questões acerca das consequências negativas que esta fraca integração pode acarretar para as gerações futuras. A permanência da grande maioria dos imigrantes cabo-verdianos no sector secundário do mercado de trabalho e a reconstituição progressiva dos hindus como minoria intermediária foram adicionalmente comprovadas através da identificação das trajectórias individuais mais comuns nas duas populações.

Um ano após esta pesquisa foram publicados os resultados do estudo coordenado por Carneiro (2006). Este baseia-se numa metodologia plural, que incluiu a consulta das bases de dados dos Quadros de Pessoal (para avaliar a mobilidade dos estrangeiros em 2000 e 2002), bases de dados do IDICT[5] (para avaliação da mobilidade dos estrangeiros comparando dois contratos de trabalho ao longo do tempo) e a aplicação de um inquérito a uma amostra da população imigrante em Portugal, num total de 1588 inquiridos com 18 e mais anos de idade, dos quais 19% eram provenientes do Brasil.

Este último inquérito, aplicado entre Dezembro de 2004 e Janeiro de 2005, veio revelar as características da primeira inserção no mercado de trabalho em Portugal. Nesta fase, os imigrantes concentram-se em profissões não qualificadas (49,9%), ou então especializadas (44%), sendo a importância relativa de quadros superiores e médios bastante residual. O cruzamento das profissões com o nível de escolaridade evidencia uma desadequação entre as duas realidades. A título de exemplo, metade dos imigrantes com nível universitário aceitou empregos não qualificados na sua primeira inserção no mercado de trabalho português. Ou seja, o estudo apresenta evidências de uma forte desqualificação no momento de entrada no mercado de trabalho em Portugal, sobretudo por via de uma forte integração em sectores de mão-de-obra intensiva, como a construção civil e obras públicas.

Os resultados do inquérito indicam que os sectores de actividade mais relevantes num primeiro momento são a construção civil e obras públicas (37%), os serviços de limpeza (15,5%), a restauração e hotelaria (12, 1%) e outros serviços (20%).

Após a primeira inserção no mercado de trabalho nacional, caracterizaram-se os trajectos de mobilidade em relação ao último ou actual emprego dos imigrantes. Baseando-se em dados do IDICT, a equipa coordenada por Carneiro (2006) construiu uma série de matrizes e de índices que permitiu concluir que as profissões de menor qualificação foram as que mais conseguiram reter os imigrantes ao longo do período em análise, sendo as profissões de técnicos e profissionais de nível intermédio e pessoal administrativo as mais permeáveis à mobilidade dos trabalhadores imigrantes. Por nacionalidade, os autores referem que os brasileiros são dos mais propícios a terem uma inserção muito desqualificada à chegada, se bem que numa fase posterior se encontrem entre os que registam um maior índice de mobilidade ocupacional — tratando-se, quase sempre, de mobilidade em sentido ascendente.

Em conclusão, os dados de diversas fontes que foram analisadas por Carneiro (2006) levam à observação de que existe uma tendência para que os imigrantes se insiram inicialmente em profissões e sectores de qualificação inferior aos que ocupavam nos países de origem, seguindo-se uma melhoria das condições de emprego seguintes. Porém, o grau de sucesso das trajectórias varia muito em função da nacionalidade dos imigrantes.

No cômputo geral, os autores inclinam-se para a refutação da hipótese inicialmente avançada sobre o trajecto em “curva em U”:

Embora se verifique um potencial e lento ajustamento às habilitações/qualificações detidas no país de origem, ainda subsiste uma desadequação entre os empregos obtidos e as habilitações detidas, como se o movimento ascendente da curva do “U” estivesse ainda incompleto e em progressão inicial. Este gradual ajustamento tem uma incidência significativamente diferente consoante a origem do grupo imigrante em presença, verificado pela […] mais célere adequação da actual ocupação/qualificação às habilitações/profissões anteriormente detidas pela população oriunda de países da Europa de Leste e China. (Carneiro, 2006: 134)

Mais recentemente, Machado (2008) publicou o artigo “Filhos de imigrantes africanos no mercado de trabalho: acessos, perfis e trajectos”. Este também se debruça sobre questões de mobilidade profissional, se bem que a base de comparação seja geracional: isto é, compara-se o posicionamento actual dos filhos com o posicionamento actual dos pais. Ainda assim, uma pequena parte do estudo foca a mobilidade dos indivíduos (neste caso, dos jovens), comparando a categoria profissional da primeira ocupação com a actual. A metodologia, neste caso, foi a realização de um inquérito a 1000 indivíduos com idade compreendida entre os 15 e os 29 anos, residentes na região de Lisboa e Vale do Tejo, para além de algumas entrevistas em profundidade.

Em traços gerais, no que diz respeito à mobilidade profissional dos jovens, Machado (2008) conclui que houve alguma mobilidade ascendente: ou seja, havia um maior número de jovens em profissões menos qualificadas (em sectores como a construção civil e os serviços) no início do seu percurso laboral do que na altura da inquirição, enquanto a presença nas categorias mais qualificadas registava um acréscimo. Porém, o autor ressalva que o facto de se verificar alguma melhoria a este nível não significa que os trajectos destes jovens deixem de ser marcados pela instabilidade e precariedade dos vínculos laborais.

Ao comparar as trajectórias de pais e filhos, Machado (2008) apresenta quatro tipologias: (1) trajectórias estacionárias “em baixo”, isto é, empregabilidade de pais e filhos nas categorias menos qualificadas; (2) trajectórias em que as mudanças ocorrem entre categorias próximas (por exemplo, quando os pais são operários da construção e os filhos trabalhadores dos serviços e vendedores); (3) trajectórias de mobilidade descendente, muito residuais; e, por fim, (4) trajectórias de mobilidade ascendente. Relativamente a estas últimas, é apresentado um perfil de caracterização dos indivíduos que se compara com o perfil dos filhos de imigrantes das classes populares em geral, concluindo-se que aquelas trajectórias de mobilidade ascendente são caracterizadas por uma maior percentagem de mulheres, escolaridade mais elevada e maior preponderância de detenção de nacionalidade portuguesa.

Em síntese, estes estudos revelam a existência de alguns “caminhos limitados” de mobilidade, quer a nível intrageracional, quer intergeracional. Face ao reduzido tempo de estadia de muitos imigrantes em Portugal, em particular os de origem não africana, importa aprofundar estas observações, de forma a determinar se, com o aumento da duração da residência, aqueles caminhos se poderão alongar — como parece ser defendido por Carneiro (2006) para algumas nacionalidades — ou se, pelo contrário, enfrentarão obstáculos insuperáveis — como Machado e Abranches (2005) sugerem para muitos imigrantes cabo-verdianos. Noutros termos, tudo se irá jogar entre o prolongamento de trajectórias ascendentes, na sequência de um melhor uso dos recursos individuais, e a delimitação dos percursos a segmentos laborais bem determinados, em resultado da segmentação do mercado de trabalho e de constrangimentos específicos dos imigrantes. Enquanto no primeiro caso subsiste a expectativa de que, com o tempo, se conhecerão numerosos casos de sucesso, no segundo podemos falar em mobilidade bloqueada, sendo o sucesso da integração de imigrantes sempre diminuto.[6]

 

Mobilidade socioprofissional dos imigrantes brasileiros em Portugal: resultados de um projecto

 

Considerações metodológicas

Os dados apresentados nesta secção resultam de um inquérito a uma amostra de imigrantes brasileiros em Portugal, realizado em 2009 no âmbito de um projecto de investigação financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Nesta operação foram inquiridos cerca de 1400 indivíduos de nacionalidade brasileira que residiam ou trabalhavam em Portugal. O inquérito, que abrangeu o território nacional (todos os distritos do Continente e Regiões Autónomas da Madeira e Açores), foi aplicado entre Janeiro e Junho de 2009.[7] As questões foram previamente adaptadas à terminologia brasileira e a inquirição coube a cidadãos brasileiros, sob coordenação da equipa de investigação. A técnica de amostragem não aleatória utilizada foi a de “bola de neve”, o que se tornou necessário face à inexistência de uma lista que permitisse elaborar uma amostra representativa. A principal desvantagem desta técnica é a capacidade limitada para proceder a generalizações para todos os imigrantes brasileiros. Porém, o desenho final da amostra levou em conta os dados conhecidos sobre os brasileiros com estatuto legal em Portugal, em particular o sexo e o distrito de residência, o que permite validar as suas características face à informação disponível. A principal limitação do inquérito foi a abundância relativa de imigrantes recentes (entradas na última década), o que o torna pouco representativo das vagas de imigração mais antigas.

 

Inserção dos imigrantes brasileiros no mercado de trabalho

Nos próximos parágrafos serão analisadas as trajectórias profissionais dos imigrantes brasileiros em Portugal, tendo por referência a sua situação no momento anterior à partida, à chegada a Portugal, e no momento da inquirição, realizada em 2009. O conjunto de indicadores utilizados diz respeito à condição perante o trabalho, situação na profissão, categoria profissional e sector de actividade.

No que diz respeito à condição perante o trabalho no Brasil, no momento anterior à partida, 76,1% dos inquiridos eram activos e 19,9% inactivos. Apenas 10% dos activos se encontravam desempregados, o que significa que muitos dos que responderam à questão abandonaram os seus empregos antes de virem para Portugal. Só por si, este é um dado bastante relevante, pois mostra que os motivos conducentes à decisão de emigrar não se prendem apenas com a incapacidade de encontrar trabalho no país de origem. Comparando estes resultados com os que dizem respeito à condição perante o trabalho actual, verifica-se que a percentagem de activos aumentou em Portugal.[8] Contudo, enquanto o peso de indivíduos que exercem uma profissão se mantém praticamente inalterado, o número de desempregados praticamente duplicou, o que aponta para algum tipo de deterioração das condições de partida. O facto de o inquérito ter sido realizado em 2009, em plena conjuntura de recessão em Portugal, pode ter, porém, enviesado os resultados no sentido do aumento substancial do desemprego nessa altura. O número de inactivos, por seu lado, diminuiu bastante, sobretudo por conta dos estudantes que passaram a integrar o mercado de trabalho.

Com base nos dados da situação na profissão, focando os indivíduos com emprego, o mais comum no Brasil era a inserção como trabalhadores por conta de outrem (numa empresa) (59,6%), seguida dos trabalhadores por conta própria (isolados) (20,9%). Mas em Portugal o peso dos assalariados conhece um acréscimo considerável, absorvendo um grande número de trabalhadores que previamente se encontravam noutra situação. No momento da inquirição, são 74,3% os imigrantes que se encontram nessa situação. As restantes categorias diminuem de importância, com excepção do conjunto pouco claro de “outras situações”, mas que em grande parte se refere ao serviço doméstico. Noutros termos, verifica-se um grande fluxo proveniente das várias situações na profissão em direcção ao estatuto de assalariado em Portugal. Este é o percurso habitual de incorporação no mercado de trabalho português por parte dos imigrantes brasileiros.

Os dados sobre categorias profissionais permitem algumas conclusões relevantes. Considerando quatro grandes grupos de profissões, no Brasil cerca de metade dos inquiridos enquadrava-se no grupo dos técnicos, profissionais de nível intermédio, pessoal administrativo, dos serviços e vendedores (54,9%), seguindo-se os quadros superiores, dirigentes e especialistas (20,1%) (ver quadro 1).[9] Por seu lado, a proporção de trabalhadores não qualificados era bastante inferior (11,3%). Porém, as ocupações dos imigrantes à chegada a Portugal apontam para uma clara desqualificação — o que não causa surpresa, tendo em conta os estudos anteriores (Casa do Brasil de Lisboa, 2004; Malheiros, 2007). Embora a inserção no grupo dos técnicos consiga manter alguma continuidade face ao que se verificava no Brasil (47,4% à chegada), a proporção de trabalhadores não qualificados quase triplica (atingindo 29,8%) e, em contrapartida, os quadros atingem um valor verdadeiramente residual (4,4%). Tomando como referência a situação de emprego mais recente, os valores já se aproximam significativamente dos que se verificavam na origem. Porém, eles situam-se ainda aquém entre os mais qualificados — em 2009, os quadros representam 11,6% dos imigrantes —, enquanto os técnicos chegam aos 49,3% e os trabalhadores não qualificados apresentam um valor expressivo (21,2%).

 

Quadro 1 Categoria profissional dos imigrantes brasileiros no Brasil, à chegada a Portugal e à data do inquérito

 

Os indivíduos tendem, assim, a passar por um processo de desqualificação à chegada, conseguindo mais tarde reverter a situação, se bem que no cômputo geral pareçam sofrer uma mobilidade descendente face à sua situação de partida, o que levanta questões sobre o “saldo” do projecto migratório. É certo que o balanço deste projecto não se resume ao estatuto socioprofissional: factores como o aumento no poder de compra e a melhoria na qualidade de vida, entre outros, podem justificar para os imigrantes um percurso de sucesso que não seja avaliado apenas com base na sua mobilidade socioprofissional. Contudo, o tipo de inserção na hierarquia socioprofissional no país de acolhimento revela-se um factor decisivo no que diz respeito à integração a longo prazo.

Este retrato apresenta algumas semelhanças com o que tem sido descrito na bibliografia e o que tem sido apurado para o caso português. Do ponto de vista teórico, verifica-se parcialmente o efeito de “curva em U” assinalado anteriormente. Existe também alguma analogia com os percursos relatados para outros grupos imigrantes em Portugal. No geral, verifica-se a mesma rigidez ou falta de mobilidade nos percursos já encontrada nos estudos de Machado e Abranches (2005) e Carneiro (2006): os caminhos de mobilidade existem, mas são limitados. Contudo, existem diferenças face a outros perfis de inserção. É certo que as trajectórias de alguns imigrantes brasileiros encontram semelhanças com o perfil traçado para os imigrantes cabo-verdianos no estudo de Machado e Abranches (2005), perfil caracterizado por uma inserção prolongada no mercado de trabalho secundário. Mas a análise mais aprofundada dos percursos parece indicar uma maior facilidade por parte de outros imigrantes brasileiros em se libertarem dos segmentos mais desqualificados de emprego, aparentemente à semelhança do que foi retratado por Carneiro (2006) para os imigrantes da Europa de Leste.

O que em pesquisas anteriores não se fez — em parte, admitimos, por não se centrarem especificamente numa nacionalidade sobre a qual pudessem estabelecer períodos temporais correspondentes a vagas diferenciadas de migração — e que, por conseguinte, é inovador no presente estudo, é a avaliação das trajectórias por ano de chegada. Este aspecto é particularmente importante no caso da imigração brasileira, dada a existência de diferentes “vagas” de imigração (Malheiros, 2007; Góis e outros, 2009). Aí, tornam-se visíveis diferenças na evolução dos padrões de inserção dos grupos profissionais (ver figura 1).[10]

 

Figura 1 Evolução da pertença aos grupos profissionais — % de quadros, técnicos, operários ou trabalhadores não qualificados no total dos trabalhadores, por ano de chegada, nos momentos em análise

 

Em síntese, verificou-se uma fase de mobilidade ascendente acentuada entre os que chegaram durante as primeiras vagas modernas de imigração, até ao final da década de 1990. A chegada a Portugal não deixou de passar por uma fase de desqualificação, mas actualmente a maioria dos imigrantes que chegou nesse período encontra-se bastante melhor posicionada do que à partida.[11] Entre 1999 e 2008, o padrão é significativamente diferente: desqualificação à chegada com uma ligeira melhoria ao longo do tempo, mas sem nunca alcançar os valores (mais positivos) registados no Brasil. Por fim, é difícil avaliar o ano de 2009, uma vez que se trata de um ano isolado com um número de casos reduzido. Estes tipos diferentes de trajectórias podem suscitar, contudo, explicações não coincidentes. Por um lado, podem resultar da duração variável do percurso migratório. Neste caso, uma estadia mais longa favorece a subida na hierarquia social, o que vai ao encontro das teorias baseadas no capital humano. Por outro lado, podem estar ligadas ao tipo de empregos disponíveis: o facto de Portugal ter incorporado mais imigração qualificada até à viragem do século, privilegiando depois o recrutamento para tarefas não qualificadas (Malheiros, 2007; Peixoto e Figueiredo, 2007), pode ter favorecido os percursos de mobilidade dos primeiros migrantes e bloqueado os dos segundos.

Além dos anos de chegada, a observação incidiu também sobre as categorias profissionais presentes em cada momento (ver figura 1). A imigração de pessoal altamente qualificado, bastante presente até final da década de 1990, decresceu em termos relativos na década seguinte (se bem que o seu peso em 2009 tenha voltado a subir, ultrapassando os 25% entre o total de imigrantes que chegaram a Portugal nesse ano). A proporção dos técnicos, por seu lado, embora se tenha mantido relativamente constante relativamente ao seu peso no Brasil, tem vindo sempre a aumentar entre os profissionais que encontram trabalho em Portugal. Por sua vez, os operários mostram alguma heterogeneidade em função do ano de chegada: se entre os indivíduos que emigraram há mais tempo eles quase não existiam, nem sequer no momento de chegada, entre 1999 e 2003 houve uma grande vaga destes profissionais e uma grande absorção pelo mercado de trabalho, que se mantém em 2009. Nos anos entre 2003 e 2009, os números tendem a diminuir. Por fim, os trabalhadores não qualificados apresentam sempre uma distribuição “em U invertido”, qualquer que seja o ano de chegada: a preponderância deste tipo de ocupações é menor entre quem veio para Portugal até 1998 e atingiu o seu máximo dos três momentos considerados no período de 2004 a 2007. Os diferentes tipos de incorporação laboral dos brasileiros em sucessivas vagas de imigração, estudados por diferentes autores (Casa do Brasil de Lisboa, 2004; Malheiros, 2007; Peixoto e Figueiredo, 2007; Xavier, 2007; Góis e outros, 2009) ficam, deste modo, confirmados.

Do ponto de vista das categorias profissionais, os dados do inquérito indicam ainda que o género e as habilitações são variáveis a ter em conta. Em primeiro lugar, a intensidade da relação entre a ocupação profissional e o género é mais elevada em Portugal, o que parece apontar para uma maior segmentação da ocupação segundo o sexo no país de destino, sobretudo no momento de maior desqualificação: à chegada.[12] Em segundo lugar, se por um lado constatamos que em qualquer dos países os menos habilitados tendem a ocupar profissões menos qualificadas relativamente aos que têm níveis habilitacionais mais elevados, também é verdade que existe uma clara sobrequalificação dos imigrantes nas profissões que ocupam — o que vai ao encontro dos estudos anteriores (Casa do Brasil de Lisboa, 2004; Peixoto e Figueiredo, 2007) —, apesar de os níveis actuais já se aproximarem bastante dos registados no país de origem (quadro 2).

 

Quadro 2 Percentagem de imigrantes brasileiros com escolaridade igual ou superior a licenciatura nas categorias profissionais de qualificações médias e baixas, nos três momentos

 

Sobre os sectores de actividade dos inquiridos no Brasil, a maioria indicou estar ligada ao comércio, alojamento e restauração, transportes e similares (34,4%) e a outras actividades de serviços (33%) (quadro 3).[13] Quanto ao sector em que se inseria a primeira ocupação exercida pelos respondentes em Portugal, além do comércio, alojamento e restauração, transportes e similares (40,4%), surgem com expressão bastante superior à que registavam no Brasil os sectores da construção (19,3%) e das actividades pessoais, familiares e domésticas (15,8%). A par das outras actividades de serviços, estes continuam a ser os principais sectores de actividade no momento da inquirição. Esta parece também ser a principal forma de inserção para a generalidade dos imigrantes em Portugal, tanto no momento de chegada como à data do inquérito, o que reforça a hipótese da inserção no mercado secundário de trabalho.

 

Quadro 3 Sector de actividade dos imigrantes brasileiros no Brasil, à chegada a Portugal e à data do inquérito

 

A análise por anos de chegada permite ainda tirar conclusões interessantes. Independentemente do ano de chegada, o sector do comércio e similares é sempre o que acolhe maior número de imigrantes. No entanto, emergem alguns padrões noutras áreas. Até 1998, os inquiridos provinham sobretudo das outras actividades de serviços e, nesse período, não emigrou ninguém que trabalhasse na construção. Para os que chegaram entre 1999 e 2003, o sector da construção teve, e continua a ter, grande visibilidade enquanto empregador. Para os que imigraram depois dessa data, a empregabilidade nessa área passou a ser menos expressiva. De 2004 a 2007, e em 2008, verifica-se entre os inquiridos um maior peso da inserção no sector das actividades pessoais, familiares e domésticas. Em 2008, cresce ainda a proporção de inquiridos nas outras actividades de serviços, o que volta a acontecer entre os que chegaram em 2009.[14] O forte peso dos fluxos de imigração feminina oriundos do Brasil (Padilla, 2007), bem como a variação conjuntural da procura no sector da construção, poderão explicar algumas destas tendências.

Existe ainda uma relação entre género e sector de actividade, tal como já se tinha verificado com os grupos profissionais. Apesar de no Brasil haver sectores mais masculinizados e outros mais feminizados, em Portugal as diferenças são sempre mais acentuadas.[15] Também por habilitações, além das diferenças entre sectores, encontram-se ainda diferenças nos três momentos de análise, nomeadamente ao nível dos sectores da construção, das actividades pessoais e das actividades financeiras. Os dois primeiros, em que tipicamente trabalham indivíduos com baixa escolaridade, são ocupados à chegada a Portugal por pessoas mais qualificadas do que no Brasil, o que indica um maior desfasamento entre escolarização e empregos qualificados. No entanto, enquanto os valores para o sector da construção se “normalizaram”, para as actividades pessoais mantêm-se, ainda hoje, ao nível do ensino secundário. No sector das actividades financeiras, que apresenta maior qualificação dos seus trabalhadores, encontramos actualmente uma recuperação da relação inicial com a escolaridade, ou até ligeiramente superior à que se verificava no Brasil, ainda que o número absoluto de pessoas neste sector tenha diminuído.

Procurou-se também entender que tipos de movimentações se verificam, entre sectores, ao longo do percurso migratório. A situação de percurso mais comum (36,7% dos casos) diz respeito a uma continuidade no mesmo sector de actividade nos três momentos, sobretudo entre os indivíduos provenientes do sector do comércio, alojamento e restauração, transportes e similares. Também bastante comum (36,0% dos casos) é a mudança de sector à chegada, face ao ocupado no Brasil, havendo depois continuidade nesse sector inicial ao longo do percurso em Portugal. É o caso da inserção à chegada nos sectores da construção ou actividades pessoais, familiares e domésticas, que se mantém, apesar de no Brasil os indivíduos trabalharem em áreas diferentes.

 

Trajectórias individuais típicas de mobilidade ocupacional

Procedemos ainda à observação das trajectórias individuais típicas destes imigrantes, tomando por referência a sua categoria profissional ao longo do percurso migratório. Com esta finalidade, recorremos a uma análise de clusters,[16] utilizando a variável “grupo profissional” em três momentos: à partida, à chegada e à data do inquérito. Reportando-se a essa mobilidade, os grupos daí resultantes foram designados como: “mobilidade descendente”, que agrega os casos que não se desviam muito do padrão tendencial da população (304 casos); “mobilidade ascendente” (50 casos); “recuperação” (35 casos), referente aos imigrantes que, após uma inserção bastante desqualificada à chegada, conseguiram retomar o tipo de actividades que executavam no Brasil; e “mobilidade descendente acentuada (quadros)” (22 casos). Estas designações correspondem aos motivos que facilmente se depreendem ao observarmos a composição de cada um dos clusters (ver figura 2).

 

Figura 2 Composição dos clusters (ocupação profissional de quatro grupos de imigrantes brasileiros no Brasil, à chegada e à data do inquérito)

 

A observação do cruzamento entre os clusters e outras variáveis permite detectar algumas regularidades, embora não tenha emergido daí qualquer relação estatisticamente significativa.[17] Verificamos que a distribuição por género é bastante equilibrada nos quatro clusters, embora as mulheres estejam comparativamente mais representadas nos grupos “recuperação” (60,0%) e “mobilidade descendente acentuada (quadros)” (59,1%).

O 12.º ano é a escolaridade predominante em todos os grupos, mas existem algumas diferenças interessantes por habilitações. Os inquiridos que apresentam um padrão de mobilidade socioprofissional ascendente têm, em média, habilitações inferiores aos restantes. Ainda que 14,6% tenham concluído um grau de ensino superior, este valor representa a proporção mais baixa de todos os clusters. Por seu lado, os que mantiveram o mesmo estatuto são tendencialmente os mais escolarizados, com 23,5% a terem concluído, no mínimo, o ensino superior, e apenas 11,7% que estudaram no máximo até ao 9.º ano. Não é surpreendente que os menos escolarizados apresentem um perfil de maior amplitude na mobilidade; uma vez que terão partido de piores condições estruturais, têm por consequência uma maior margem de aperfeiçoamento. Por seu lado, a recuperação do estatuto original entre os mais escolarizados aponta para uma maior facilidade de adaptação a uma nova realidade e de aceitação destes indivíduos pela sociedade de acolhimento que não pode ser dissociada dos seus recursos, nomeadamente escolares.

Por anos de chegada, registam-se ligeiras diferenças entre clusters. De referir que os indivíduos com um percurso de mobilidade descendente acentuada chegaram a Portugal, comparativamente mais que nos outros grupos, entre 2004 e 2007, e que ninguém neste grupo chegou até 1998 nem no ano da aplicação do inquérito (2009). Estes dados parecem traduzir as diferenças de perfil e trajectórias das diferentes vagas de imigrantes, bem como o impacto de um período acentuado de crise em meados da primeira década do novo século — que levou a uma desaceleração da imigração e possível nova mudança de perfil nos anos mais recentes.

A caracterização dos clusters através de outras variáveis sociográficas faz incidir luz sobre algumas pistas que podem ser importantes para explicar estas diferenças de trajectória. O facto de se ter um cônjuge/companheiro de nacionalidade portuguesa parece contribuir de algum modo para um percurso de maior sucesso — 39,1% dos casos no cluster “ascendente” e 45,5% no cluster “recuperação”, contra 15,2% no cluster “descendente” e 10,0% no “descendente acentuada (Quadros)”. Por outro lado, a existência de contactos em Portugal prévios à partida não parece ter muita influência no tipo de trajectória que os indivíduos constroem, ainda que a ausência de contactos seja mais notória entre os que acabam por ver a sua situação inicial bastante deteriorada (proporção mais elevada no conjunto de clusters, 20,0%), e que o conhecimento prévio de outros brasileiros além de familiares, colegas, sócios ou amigos em Portugal tenha importância no percurso daqueles que conseguem recuperar o seu estatuto original após uma inserção bastante desqualificada à chegada (proporção mais elevada no conjunto de clusters, 34,0%). Por outras palavras, a importância das redes sociais no contexto da inserção e posterior mobilidade fica, pelo menos parcialmente, confirmada (Padilla, 2006).

As variáveis relacionadas com a inserção no mercado de trabalho, como a situação na profissão actual, parecem ter algum poder explicativo. Verifica-se que os empregadores são os que mais se destacam no grupo da mobilidade ascendente, pela sua presença relativamente mais forte (mas, ainda assim, de apenas 12,0%), e no grupo da mobilidade descendente acentuada, pela sua ausência. Esta situação aponta para a importância do acesso à propriedade, factor importante de ascensão social na sociedade portuguesa, que parece também aplicar-se aos imigrantes. Já os trabalhadores isolados têm maior peso entre os que mantiveram o mesmo estatuto (22,9%).

Por sector, os resultados são bastante elucidativos. O da construção é bastante mais representativo na mobilidade descendente (17,6%) do que nos restantes grupos (abaixo dos 10%). Os clusters “ascendente” e “recuperação” têm distribuições semelhantes por sectores de actividades, com forte presença no comércio e similares (56,3% e 57,6%), mas este último apresenta um peso maior nas outras actividades de serviços (30,3% contra 12,5%). Por fim, 42,1% dos indivíduos que exibem uma mobilidade descendente acentuada (e que no Brasil no momento da partida eram quadros) trabalham actualmente no sector das actividades pessoais, familiares e domésticas.

 

Conclusão

O objectivo subjacente à construção deste texto foi a procura da compreensão dos trajectos de mobilidade socioprofissional trilhados pelos imigrantes brasileiros em Portugal. Para tal, apresentou-se em primeiro lugar uma breve síntese do estado da arte sobre a investigação em Portugal, à qual se seguiu a análise dos dados recolhidos através de um inquérito aplicado a cerca de 1400 imigrantes brasileiros em Portugal em 2009. As questões que nos permitiram avaliar o posicionamento destes indivíduos, em dois ou três momentos temporais distintos do seu percurso, referiam-se à condição perante o trabalho, situação na profissão, categoria profissional e sector de actividade.

Apesar da heterogeneidade da imigração brasileira e de algumas limitações metodológicas — sobretudo o carácter não representativo da amostra utilizada e a escassa representação das primeiras vagas da imigração brasileira, que entraram em Portugal até meados da década de 1990 —, este estudo confirma as conclusões de pesquisas anteriores sobre o tema. De facto, a tendência mais comum aponta para uma inserção inicial no mercado de trabalho bastante desqualificada, que a maioria dos imigrantes consegue ir revertendo, embora sem alcançarem globalmente uma mobilidade ascendente que atinja um nível igual ou superior ao estatuto socioprofissional anterior. Como o estudo de Carneiro (2006) constata, é como se o movimento ascendente da “curva em U” estivesse ainda incompleto e em progressão. A declaração de Machado (2008) mantém-se, assim, válida: a mobilidade profissional dos imigrantes em Portugal é ainda limitada.

Contudo, o presente estudo vai além dos anteriores, no sentido em que ajuda a esclarecer alguns aspectos que poderão influenciar as trajectórias, abrindo caminho a novas possibilidades de investigação. O ano de chegada — ou, noutra perspectiva, o tempo de residência — é sem dúvida um factor a ter em consideração. As entradas de imigrantes brasileiros há mais de 10 anos apresentaram um potencial de mobilidade bastante superior ao dos imigrantes mais recentes. Embora a degradação da conjuntura económica, bem como a escassez de emprego qualificado nos últimos anos, possam ter dificultado a mobilidade nas vagas mais recentes, é possível que o aumento de duração da residência se traduza por maiores probabilidades de sucesso socioprofissional. Neste sentido, não existem verdadeiros bloqueios à mobilidade. Ainda assim, face aos constrangimentos metodológicos apontados, permanece alguma dúvida sobre se o tempo de residência é condição suficiente para o alongamento dos trajectos de mobilidade ou se, em alternativa, a inserção nos segmentos mais frágeis do mercado de trabalho impõe constrangimentos a percursos mais consistentes. Esta questão exige mais tempo de observação antes de se realizar nova investigação.

Outros factores mostraram-se ainda relevantes para a existência de mobilidade. No plano das variáveis sociográficas, foi o caso da existência de um parceiro/cônjuge português, das redes sociais e, embora de forma nem sempre consistente, do grau de escolarização. Aspectos mais directamente relacionados com a inserção no mercado de trabalho, como a situação na profissão (em particular o acesso à propriedade) e o sector de actividade (inserção em actividades diferentes da construção e serviço doméstico), mostraram estar também relacionados com percursos de maior mobilidade. A verificação de alguns destes factores nos imigrantes poderá, assim, em conjunto com o aumento da duração da residência, beneficiar trajectórias ascendentes.

Apesar das limitações metodológicas do inquérito que esteve na base deste estudo, que obrigam a considerar os resultados com prudência, esta parece ser a realidade que se desenha para os imigrantes de nacionalidade brasileira. Como os estudos anteriores referiram, cada nacionalidade tem as suas especificidades de inserção no mercado de trabalho. É possível que, para outros grupos de imigrantes, o tipo de trajectórias e os factores que nelas influem sejam diferentes do retrato aqui apresentado. Para uns e outros, apenas mais investigação empírica poderá esclarecer o potencial e os obstáculos à mobilidade socioprofissional ascendente, isto é, a uma melhoria consolidada das condições de vida.

 

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Notas

[1] Este texto resulta do projecto de investigação Vagas Atlânticas: A Imigração Brasileira em Portugal, realizado entre 2008 e 2010 por uma equipa que integrou elementos do Socius, CIES/ISCTE-IUL e CES/Universidade de Coimbra, e financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (PTDC/SDE/68903/2006).Os autores agradecemos contributos da restante equipa de investigação (Beatriz Padilla, Filipa Palma, Thais França, José Carlos Marques e PedroGóis), bem como dos referees anónimos que avaliaram uma primeira versão deste texto. Este é dedicado à memória de Maria Ioannis Baganha, que iniciou mas não chegou a concluir o projecto.

[2] Para uma explicação breve dos modelos de assimilação, do modelo de desvantagem racial/étnica e do modelo da assimilação segmentada, ver Brown e Bean (2006).

[3] Segundo Carneiro (2006: 17), por exemplo, “a teoria mais actual sobre a mobilidade ocupacional do imigrante defende que existe um declínio do estatuto profissional do imigrante na sua transição do último emprego no país de origem para o primeiro emprego no país de acolhimento (destino), a que se segue um período de ascensão na carreira em função do tempo de permanência no novo país de residência. A este percurso foi dado o nome de ‘Curva-U’. […] Em média, quanto mais acentuado o declínio inicial mais acentuada será a ascensão subsequente.”

[4] Nos termos utilizados por Portes (1995), entre outros, as minorias intermediárias (middleman minorities) especializam-se na prestação de serviços comerciais ou financeiros a uma população mais extensa e habitualmente empobrecida. Estes grupos são distintos daqueles com que se relacionam por possuírem uma diferença nacional, migratória, cultural ou racial.

[5] Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho (IDICT), actualmente integrado na Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT).

[6] As semelhanças entre os padrões de imigração verificados, nos últimos anos, nos países da Europa do Sul tornariam interessante uma análise comparativa da mobilidade socioprofissional nestes contextos. Em Espanha, por exemplo, pesquisas recentes sugerem que existe uma elevada mobilidade socioprofissional nos primeiros anos após a chegada, sobretudo na sequência de processos de regularização, mas que as trajectórias ascendentes são limitadas: estas incluem sobretudo a saída da agricultura e do serviço doméstico para empregos ligeiramente mais qualificados no sector dos serviços (Arango e Finotelli, 2009). O aumento de duração da permanência da maioria dos imigrantes na Europa do Sul torna necessária, a breve prazo, a reavaliação da sua situação.

[7] O inquérito abrangia uma grande variedade de assuntos, incluindo caracterização sociográfica, estrutura familiar, inserção no mercado de trabalho, integração social, ligação como Brasil, entre outros. Neste texto serão apenas analisados os resultados relativos à mobilidade profissional. Para outros pormenores metodológicos e resultados do inquérito, ver Peixoto e outros (s.d.) e Góis e outros (2009).

[8] Esta questão não foi colocada tendo como referência o momento da chegada a Portugal, pelo que apenas se pode comparar a situação no Brasil com a existente à data do inquérito.

[9] Para as questões relativas às profissões dos inquiridos foi efectuada inicialmente uma recodificação em torno dos grandes grupos da Classificação Nacional de Profissões (CNP), que contemplam uma classificação a dois dígitos. Numa fase posterior, de forma a permitir uma melhor análise dos dados, agruparam-se os grandes grupos profissionais nas seguintes categorias: quadros superiores, dirigentes e especialistas (GG1+GG2); técnicos, profissionais de nível intermédio, pessoal administrativo, dos serviços e vendedores (GG3+GG4+GG5); operários, operadores, artífices e similares (GG7+GG8); e trabalhadores não qualificados (GG9). Por outro lado, omitiram-se nas análises mais aprofundadas o GG0 (membros das Forças Armadas) e o GG6 (trabalhadores da agricultura e pescas), residuais na amostra.

[10] As fases de imigração consideradas resultaram do conhecimento anterior sobre a imigração brasileira e da avaliação das características dos imigrantes inquiridos segundo o ano de chegada. A observação acabou por incidir sobre as vagas até 1998 (55 casos), 1999-2003 (329 casos), 2004-2007 (559 casos), 2008 (172 casos) e 2009 (54 casos). Os perfis destas duas últimas revelaram-se diferentes dos anteriores e diferentes entre si, pelo que foram tomadas autonomamente. Já os perfis das vagas de 1999-2003 e 2004-2007 são muito semelhantes, mas foi decidido separá-las devido à extensão de tempo envolvida.

[11] Deve lembrar-se, porém, que é para estas primeiras vagas de imigração, as mais qualificadas, que o inquérito é menos elucidativo. A grande maioria dos imigrantes inquiridos chegou a Portugal já durante a primeira década do novo século.

[12] No Brasil: X2 (3) = 46,728; p = 0,000; V de Cramer = 0,271.À chegada: X2 (3) = 185,321; p = 0,000; V de Cramer = 0,449. Actualmente: X2 (3) = 105,552; p = 0,000; V de Cramer = 0,375.

[13] No Brasil, estas últimas incluíam, por ordem decrescente, “outras actividades de serviços colectivos, sociais e pessoais”, “saúde e acção social”, “educação” e “administração pública, defesa e segurança social”.

[14] Este último ano é acentuadamente diferente dos restantes. O sector das actividades financeiras, serviços às empresas e similares torna-se num grande empregador, ao contrário do que acontece no sector da construção, e prima-se pela ausência de inquiridos que, no Brasil, estivessem inseridos no sector das actividades pessoais, familiares e domésticas.

[15] No Brasil: X2 (5) = 98,937; p = 0,000; V de Cramer = 0,332. À chegada: X2 (5) = 345,247; p = 0, 000; V de Cramer = 0,569. No momento da inquirição: X2 (5) = 189,299; p = 0,000; V de Cramer = 0,465.

[16] O método utilizado foi o hierárquico. A solução escolhida apresenta quatro clusters, tendo sido seleccionada pela sua melhor adequabilidade, quer do ponto de vista dos requisitos estatísticos, quer do ponto de vista da facilidade de interpretação dos perfis encontrados.

[17] Os resultados dos cruzamentos que se apresentam em seguida traduzem meramente uma caracterização descritiva dos grupos. Em vários casos surgem diferenças interessantes, mas ou os testes não cumprem as condições de aplicabilidade ou não revelam relações estatisticamente significativas. Os resultados apresentados nos parágrafos seguintes podem ser consultados em maior detalhe em Egreja e Peixoto (2010).

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