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Sociologia, Problemas e Práticas

versión impresa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  n.64 Oeiras sep. 2010

 

Ecos da estação Lisboa

O exílio das esquerdas brasileiras em Portugal

 

Américo Freire

Professor associado e pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV)/Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC). E-mail: americo.freire@fgv.br

 

Resumo

O texto tem como objectivo explorar duas ordens de questões relativas ao exílio das esquerdas brasileiras em Portugal no período compreendido entre o “25 de abril” e a aprovação da Lei da Anistia no Brasil (1979). Em primeiro lugar, examina a maneira pela qual o Estado português lidou com a presença de dezenas de exilados brasileiros em seu território, muitos deles egressos de organizações revolucionárias. Em seguida, acompanha a luta política empreendida pelos exilados junto ao Comité Pró-Amnistia Geral no Brasil, uma entidade que reuniu o apoio de figuras-chave da intelectualidade e dos meios políticos portugueses.

Palavras-chave história política, exílio, relações diplomáticas Brasil-Portugal, anistia.

 

Echoes of the Lisbon station: the Brazilian left-wing movements in exile in Portugal

Abstract

This essay explores two issues regarding the exile of left-wing Brazilians in Portugal between the April 25th Revolution and the promulgation of the Amnesty Act in Brazil (1979). At first it examines the ways the Portuguese state dealt with the presence of dozens of Brazilian exiles in its territory. Then it analyses the political strategies of the exiles in the “Comité Pró-Amnistia Geral no Brasil” (Committee for a General Amnesty in Brazil), an organisation that received the support of important Portuguese intellectuals and politicians.

Key-words political history, exile, diplomatic relations between Brazil and Portugal, amnesty.

 

Échos de la station Lisbonne: l’exil des gauches brésiliennes au Portugal

Résumé

Le texte aborde deux questions relatives à l’exil des gauches brésiliennes au Portugal pendant la période comprise entre le 25 avril 1974 au Portugal et l’adoption de la Loi d’Amnistie au Brésil (1979). Il examine tout d’abord la manière dont l’État portugais a géré la présence de dizaines d’exilés brésiliens sur son territoire, beaucoup d’entre eux issus d’organisations révolutionnaires. Il analyse ensuite la lutte politique menée par les exilés au sein du Comité Pró-Amnistia Geral no Brasil, une organisation qui comptait sur le soutien d’intellectuels et hommes politiques de premier plan.

Mots-clés histoire politique, exil, relations diplomatiques Brésil-Portugal, amnistie.

 

Ecos de la estación Lisboa: el exilio de las izquierdas brasileñas en Portugal

Resumen

El texto tiene como objetivo explorar dos órdenes de cuestiones relativas al exilio de las izquierdas brasileñas en Portugal en el periodo comprendido entre el 25 de Abril 1974 en Portugal y la aprobación de la Ley de la Amnistía en Brasil (1979). En primer lugar, se examina la manera por la cual el Estado portugués lidió con la presencia de decenas de exilados brasileños en su territorio, muchos de ellos egresados de organizaciones revolucionarias. Posteriormente, acompaña la lucha política emprendida por los exilados junto al Comité Pro-Amnistía General en Brasil, una entidad que reunió el apoyo de figuras-clave de la intelectualidad y de los medios políticos portugueses.

Palabras-clave historia política, exilio, relaciones diplomáticas Brasil-Portugal, amnistía

 

Introdução

Exílio, muitos já disseram, é encruzilhada — é tempo de reflexões, definições e mudanças. Exatamente por isso, é tema recorrente na literatura e nas ciências sociais do século passado, com especial presença na obra de figuras públicas e intelectuais originários de sociedades que por décadas enfrentaram o peso dos Estados autoritários, como as ibero-americanas.

No caso brasileiro, em fins dos anos 70 e na década seguinte, o tema do exílio aparece através do testemunho, do depoimento pessoal dos seus protagonistas, da produção de narrativas subjetivas que colocam em xeque o discurso oficial e denunciam as arbitrariedades da ditadura militar.[1] Nos anos 90, o exílio começa a entrar na pauta dos estudos acadêmicos, fenômeno esse que pode ser associado ao considerável impulso dos estudos historiográficos sobre a trajetória das esquerdas brasileiras, cuja prova inconteste é a publicação, em 2007, da obra coletiva As Esquerdas no Brasil, uma alentada coleção dirigida pelos historiadores Jorge Ferreira e Daniel Aarão Reis.[2]

Em meus estudos, voltados nos últimos anos para examinar a recomposição político-doutrinária de uma importante corrente das esquerdas brasileiras, a qual tem sido denominada o “novo trabalhismo”, o tema do exílio é incontornável e bastante fértil, dado que foi no exterior, mais especificamente em Lisboa, que foi cimentada uma aliança entre diferentes grupos e personalidades políticas que serviu de base para tal processo.

Na literatura brasileira a respeito do tema, costuma-se dividir a experiência do exílio das esquerdas em duas fases bem marcadas. A primeira delas confunde-se com a presença dos brasileiros em países sul-americanos, em particular no Uruguai e no Chile. Enquanto o Uruguai serviu de refúgio preferencial para alguns dos mais importantes líderes do regime derrubado pelo golpe de 1964, como o ex-presidente João Goulart e o ex-governador Leonel Brizola, o Chile de Salvador Allende abrigou todas as facções das esquerdas brasileiras, fossem elas as chamadas “tradicionais”, ou seja, os comunistas e trabalhistas, fossem elas as organizações revolucionárias de extrema-esquerda que foram criadas no Brasil ao longo dos anos 60 e começo da década seguinte. Com a derrubada do regime socialista no Chile, houve a dispersão das esquerdas brasileiras pelo mundo, ainda que a maior parte de seus membros se tenha concentrado em países da América do Norte e Europa. Na chamada fase da “diáspora”, a França terminaria por reunir a maior parte dos exilados brasileiros.[3]

O exílio das esquerdas brasileiras em Portugal tomou impulso com o advento do 25 de Abril. Ao cabo de um ano e meio, a colônia compreendia personalidades e ex-militantes de diversos matizes das esquerdas brasileiras. Reunia, entre outros, figuras como o almirante Cândido Aragão — um dos líderes da corrente nacionalista militar radical que fora varrida pelo regime de 64; o jornalista e escritor Márcio Moreira Alves, de amplo trânsito entre lideranças civis e militares do novo regime português; assim como cerca de duas a três dezenas de ex-militantes egressos de organizações comunistas revolucionárias que haviam se envolvido diretamente na luta armada contra a ditadura brasileira. Coube particularmente a esse grupo um papel central na articulação com intelectuais e políticos portugueses para a criação — e manutenção — do Comité Pró-Amnistia Geral no Brasil.

A vitória da Revolução dos Cravos possibilitou ainda o deslocamento para Portugal de militantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Enquanto os primeiros puderam contar com a estrutura e os contatos nos meios políticos e intelectuais do Partido Comunista Português (PCP) — na ocasião, uma agremiação de ampla penetração social e política —, os militantes do PCdoB, conduzidos por um dos seus principais dirigentes — Diógenes Arruda —, passariam a manter estreitos laços com agremiações maoístas portuguesas. Em ambos os casos, os militantes dessas organizações, por razões de segurança, optaram por manter distância das atividades desenvolvidas pelo Comité Pró-Amnistia, como também de boa parte dos membros da colônia brasileira.

Em 1978, Leonel Brizola desembarca em Lisboa e capitaneia a chegada de uma nova leva de exilados para Portugal. Na ocasião, Brizola, depois de amargar um longo exílio no Uruguai e ver-se obrigado a sair às pressas daquele país, encontrava-se em um momento particularmente favorável de sua atribulada carreira política: já deixara de lado a vestimenta de comandante revolucionário para se apresentar como líder moderno e inconteste do trabalhismo brasileiro. Para isso, passou inclusive a contar com a boa vontade — e o apoio político e material — de Mário Soares, primeiro-ministro português e um dos principais líderes da Internacional Socialista.

O ano da chegada de Brizola em Portugal foi também um momento de inflexão na agenda política das esquerdas brasileiras, seja no Brasil, seja no exterior, dado que o regime militar, a despeito das suas divisões internas e de suas indefinições, acenava com medidas que deveriam acelerar o processo de distensão política, tais como a edição de uma nova Lei de Segurança Nacional, a aprovação de uma anistia parcial, além da extinção do sistema bipartidário. Em razão disso, tornou-se intensa a movimentação dos atores políticos no sentido de construir estratégias para os novos tempos que estariam por vir. Para alguns, por exemplo, era a hora de resistir à imposição da agenda governamental mantendo-se na frente oposicionista legal — o MDB, depois PMDB. Para outros, era o momento de uma maior afirmação político-ideológica por meio da criação de um Partido Socialista que agrupasse diferentes grupos e facções das esquerdas. Nesse novo contexto, Brizola busca em Lisboa — e depois, em toda a Europa — firmar posições para levar adiante o seu projeto de reconstrução do trabalhismo.

De uma maneira geral, é possível afirmar que a estratégia de Brizola terminou por surtir efeito, pelo menos junto aos exilados brasileiros em Lisboa. Prova disso foi o envolvimento de vários membros da colônia — fossem eles do grupo dos intelectuais, fossem eles da “geração 68” — na preparação e depois na realização, em junho de 1979, do Encontro de Lisboa — o evento que serviu de marco para a reorganização da corrente trabalhista e para o relançamento da liderança de Brizola no cenário nacional brasileiro.[4]

Neste texto, fruto de uma pesquisa ainda em curso, trabalho com dois conjuntos de questões. Em primeiro lugar, examino a maneira pela qual as autoridades portuguesas, no âmbito das relações diplomáticas luso-brasileiras, lidaram com a presença de exilados brasileiros em seu território, grande parte deles, como vimos acima, oriundos de organizações revolucionárias de esquerda.[5] Em seguida, ao deslocar o foco para o estudo da dinâmica política interna da colônia brasileira, busco verificar como os exilados, ou pelo menos parte deles, se envolveram na campanha pela anistia por intermédio do Comité Pró-Amnistia Geral no Brasil.

Quanto ao levantamento documental, a investigação tem sido realizada em arquivos portugueses e brasileiros. Em Portugal, foram consultados fundos no Arquivo Histórico do Ministério dos Negócios Exteriores, na Torre do Tombo, na Casa do Brasil de Lisboa, na Fundação Mário Soares e no Centro 25 de Abril, da Universidade de Coimbra. Já no Brasil, a pesquisa, até o momento, concentra-se no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getulio Vargas e no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro.[6]

Diplomacia, fiscalização e controle

Os estudos em torno das relações diplomáticas luso-brasileiras costumam chamar a atenção para a nova etapa que se estabeleceu no relacionamento entre os dois países proporcionada pela posse do general Ernesto Geisel na presidência do Brasil, em março de 1974, assim como pela vitória do Movimento das Forças Armadas em Portugal, no mês seguinte.

No caso brasileiro, o presidente Geisel, ainda antes de assumir o poder, passou a emitir sinais nos meios de comunicação de que iria promover alterações na agenda entre os dois países, particularmente no tocante a uma melhor demarcação da diplomacia brasileira frente à tradicional política ultramarina lusa, até então baseada na manutenção, a qualquer custo, do controle sobre as suas possessões em África. Para o general-presidente, não havia por que manter o apoio político, ainda que constrangido, a uma política “atrasada”, “ultrapassada”, que não atendia aos interesses nacionais brasileiros.[7] Nesse contexto, é de fácil entendimento a pressa com a qual a diplomacia brasileira se adiantou em reconhecer o novo governo luso oriundo do 25 de Abril.

Já no caso português, o advento da Revolução dos Cravos colocou em pauta a elaboração de uma política externa que reposicionasse o país no concerto internacional, o que na prática significava abandonar o isolacionismo salazarista com vistas à promoção de um programa de retirada ordenada de Portugal do continente africano. Pari passu, a nova chancelaria portuguesa tratou também de formular estratégias no sentido de buscar uma maior aproximação com os principais países do bloco europeu.[8] Quanto às relações com o Brasil, a postura da diplomacia lusa foi de início a de manter um certo distanciamento político, ainda que nos discursos o ministro dos Negócios Estrangeiros, Mário Soares, fizesse questão de registrar o protocolar interesse do governo em estreitar os “laços fraternais entre os dois países”. Entre os possíveis fatores a explicar esse distanciamento, há que registrar o interesse do governo luso em buscar neutralizar uma política mais agressiva por parte da diplomacia brasileira em direção à África de origem portuguesa, haja vista, por exemplo, o incidente proporcionado pela atitude do governo brasileiro de reconhecer a Guiné-Bissau como Estado independente antes mesmo de serem ultimadas as negociações em curso entre as forças do movimento rebelde e a chancelaria portuguesa.[9]

No decorrer de 1974 e no ano seguinte, o clima de distanciamento entre os países deslizou para uma situação de tensão aberta, em virtude, entre outras razões, da percepção negativa por parte do governo do general Geisel dos rumos da situação política portuguesa, cuja guinada à esquerda tornou-se evidente a partir da queda do general António de Spínola, em setembro de 1974, e a consequente afirmação de correntes militares interessadas em levar adiante um projeto revolucionário e popular, contando para isso com o apoio explícito do PCP e de diferentes forças de extrema-esquerda.[10]

Além disso, o encaminhamento nas relações diplomáticas luso-brasileiras também esbarrou em problemas decorrentes da escolha, no Brasil, do general Carlos Alberto Fontoura, ex-diretor do Serviço Nacional de Informações e homem identificado com a chamada “linha dura” do regime militar, para o cargo de embaixador em Portugal. Com o advento do 25 de Abril, o nome de Fontoura, que ainda não assumira o posto, passou a sofrer críticas diretas por parte de diversos setores da esquerda portuguesa, fato esse que levou a nova chancelaria lusa, já sob o comando de Mário Soares, a realizar gestões junto ao governo brasileiro no sentido de substituir Fontoura. Em reação, o presidente Geisel não apenas não aceitou o veto português, como chegou a ameaçar, em represália, deixar de nomear um representante brasileiro em Lisboa, reação essa que levou a chancelaria portuguesa a recuar de sua posição inicial.[11]

A despeito dessa situação, o ministro das Relações Exteriores, Azeredo da Silveira, tendo em vista o interesse do governo Geisel em manter abertos canais de negociação com o governo luso, aceitou o convite de Mário Soares para promover, em dezembro de 1974, a primeira visita de um alto dirigente brasileiro ao “novo Portugal”. Na agenda a ser discutida entre os chanceleres, figuraram temas como: a situação política interna em Portugal, o processo de descolonização das antigas possessões lusas em África, além da questão das “atividades políticas dos nacionais de uma parte do território no território de outra parte”. Ou seja, haveria uma discussão específica sobre como os governos brasileiro e português deveriam lidar com os exilados de parte a parte — o exílio cruzado luso-brasileiro.

Ao pesquisar a documentação portuguesa sobre essa reunião, encontrei um relato detalhado, elaborado pelo secretário do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, dos diálogos que foram travados entre Soares e Silveira sobre os pontos acima mencionados.[12] Vejamos o que ambos disseram sobre o tema do exílio.

Segundo o relato, a reunião foi aberta pelo chanceler Mário Soares, que, depois de discorrer sobre os dois primeiros temas acima especificados, passou a dedicar-se à questão dos exilados. Para ele, o governo português não poderia adotar uma postura de rechaçar os “emigrantes políticos brasileiros, tal como não foram muitos portugueses que ao longo de quatro décadas lá encontraram abrigo, e isso só honra o Brasil”. E continua: “Hoje vivem no Brasil algumas personalidades do antigo regime (português). Acho isso natural e não faremos qualquer pressão sobre o governo brasileiro a esse respeito. Nada faremos para atrair aqui os brasileiros pois alguns poderiam vir a tornar-se incômodos para nós. Vamos velar para que Portugal não seja um ponto de ataque.”[13]

Azeredo da Silveira, por seu turno, mostrou-se mais incisivo do que Soares quando lidou com o tema. Segundo Silveira, o governo brasileiro “recebeu exilados portugueses sem restrições, apenas nunca se permitiu que esses exilados fossem ‘fator de agitação’ para a vida política portuguesa e não se permitirá agora”. Com base nisso, destoando um pouco da linguagem contida da diplomacia, Silveira afirma sem subterfúgios:

O Brasil pretende o mesmo de Portugal; é chocante a sobrevalorização aparente de elementos brasileiros sem significado no Brasil. Isso tem criado certas dificuldades nas relações entre ambos os países e é preciso que sejam revistas certas atitudes. O próprio presidente da República pedira-lhe que solicitasse junto ao governo português o maior cuidado para se evitarem certos incidentes, pois casos como aqueles transportam cargas emocionais que podem dar origem a acidentes de estrada nas relações bilaterais.[14]

Soares, ao responder às observações de Silveira, fez questão de registrar a disposição do governo português em enfrentar o problema. Afirmou que iria emitir uma nota ao Conselho de Ministros para que se evitasse constrangimentos com o governo brasileiro, sem contudo excluir a idéia de que Portugal seria um país de exílio por uma questão de solidariedade fosse para quem fosse. Ao término de sua exposição sobre o tema, Soares selou o compromisso ao afirmar que Portugal não seria um “santuário dos exilados brasileiros”.[15]

Sobre o diálogo acima, é possível explorar algumas questões com vistas a situar melhor a maneira pela qual os respectivos governos, ao longo do tempo, passaram a lidar com a questão do exílio. No que se refere à posição brasileira, há que considerar o seguinte quadro:

- coube à diplomacia brasileira, por gestão do embaixador Fontoura, colocar na agenda da visita o tema dos exilados brasileiros, o que, obviamente, fez com que o governo português adotasse uma posição defensiva como a vista acima;[16]

- a discussão sobre o tema, ainda que lateral no âmbito das negociações luso-brasileiras, então marcadas, como vimos acima, pela discussão de assuntos relativos à nova geopolítica da antiga África portuguesa, serviu para dar um tom político-ideológico ao encontro, a saber, deixou explícito o posicionamento anticomunista e “antiterrorista” do governo brasileiro, bem a gosto do general Fontoura e dos grupos da direita militar radical que lhe davam sustentação no Brasil;

- em suma, foi o preço a ser pago pelos dois interlocutores para dar resposta aos reclamos dos chamados “bolsões sinceros, mas radicais” brasileiros,[17] então em posição desconfortável com aquela situação, fosse pela guinada da política externa brasileira, fosse diante dos rumos da Revolução Portuguesa, fosse enfim, diante da livre movimentação dos exilados brasileiros de esquerda em Portugal.

Quanto ao posicionamento português, coube a Mário Soares, tão-somente, uma posição defensiva, retórica, na qual se comprometeu com algo que, aquela altura, tinha consciência de que não poderia cumprir: se o Estado português tinha dificuldade em assegurar minimamente a ordem e a segurança internas, muito mais difícil seria o exercício de uma política de supervisão dos exilados, fossem eles brasileiros, espanhóis ou de qualquer outra nacionalidade.[18] De efetivo para o enfrentamento desse novo padrão de relações com o Brasil, a diplomacia portuguesa tomou como medida a nomeação para o posto de embaixador no Brasil de um dos mais importantes quadros, Vasco Futscher, ex-embaixador do país na Alemanha.

O tom ideológico imposto pelo embaixador Fontoura, e então avalizado pelo conjunto do governo brasileiro, ainda que estivesse em nítido contraste com a diretriz-chave da diplomacia brasileira de então — não por acaso denominada “pragmatismo responsável” —, estendeu-se por um bom tempo e terminou por marcar uma importante face das relações entre os dois países até o ano de 1979, quando houve enfim o retorno dos exilados para o Brasil.[19]

Nesse lapso de tempo, foram muitos os desencontros, ainda que nenhum deles tivesse afetado sobremaneira a relação entre os dois países. Por parte da embaixada brasileira, foi mantida a postura ofensiva acima assinalada, a qual se expressaria tanto no acompanhamento direto das atividades dos exilados, como na diuturna cobrança às autoridades lusas para a adoção de medidas contrárias à livre ação dos exilados (na imprensa, na Universidade, nos meios de comunicação). Já por parte da diplomacia lusa, manteve-se a política reativa, a qual se resumia, quando muito, em responder aos ofícios brasileiros com algumas explicações acerca das dificuldades encontradas por um governo de cariz democrático para intervir em instituições livres e autônomas da sociedade portuguesa.

No histórico desses incidentes, o de maior repercussão junto à opinião pública portuguesa deu-se no período compreendido entre o fim do ano de 1976 e o primeiro semestre de 1977, quando, sob o impacto da denúncia do assassinato pelas forças de repressão brasileira de três altos dirigentes do Partido Comunista do Brasil — no episódio que ficaria conhecido na imprensa como o “massacre da Lapa” —[20]o poder legislativo luso, a Assembleia da República, aprovou por unanimidade uma moção de protesto e pesar contra o ocorrido dirigida ao governo brasileiro. A moção recebeu o voto de congratulação do Comité Pró-Amnistia Geral no Brasil em Portugal e foi encaminhada em ofício à embaixada brasileira em Lisboa. Em abril, o embaixador Fontoura, em correspondência à diplomacia lusa, solicitou ao MNE que devolvesse o ofício da Assembleia, sob a seguinte alegação: “seus termos obviamente inadmissíveis e o procedimento de sua entrega é inaceitável à luz da prática internacional e da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas”.[21] Nos meses seguintes, a situação política só fez piorar: duas novas moções de protesto com teor semelhante foram aprovadas pela Assembleia da República e, uma vez mais, foram encaminhadas à embaixada brasileira.

Para além dos problemas específicos com o governo brasileiro, as autoridades lusas, ao longo dos anos de 1975 e 1976, no âmbito de um programa de redesenho político-institucional do Estado português, começaram a levar adiante uma nova política de segurança pública para o país, ficando sob a responsabilidade do Ministério da Administração Interna (MAI) determinadas atribuições como a de zelar pela ordem pública interna, assim como a de criar mecanismos de supervisão e controle da presença de estrangeiros no país, entre os quais os exilados políticos.

Sobre os exilados, há que considerar os seguintes aspectos da política lusa. A partir do advento do 25 de Abril, com a chegada da primeira leva de refugiados brasileiros e hispano-americanos, coube tão-somente a uma entidade civil — a Comissão Nacional de Apoio aos Refugiados Políticos Antifascistas (CNARPA), formada por ex-militantes antisalazaristas — a adoção de medidas de caráter emergencial e humanitário que fizessem frente às necessidades básicas desses refugiados, os quais, segundo dados de maio de 1975, alcançavam a um total de 150 pessoas, entre homens, mulheres e 30 crianças.[22] Ultrapassada essa primeira fase de indefinições, coube ao governo português a iniciativa de tomar a si o problema, o que fez com base em princípios consagrados pela Convenção de Genebra, de 1951, e pelo Protocolo de Nova Iorque, de 1967, que definiram as linhas gerais da relação dos Estados Nacionais com os refugiados políticos. Em 1976, no contexto da promulgação da nova Constituição portuguesa, os direitos dos refugiados políticos ficaram assim expressos: “É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência da sua atividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.”[23]

Passemos agora a nos deter na aplicação prática da nova política lusa para os chamados refugiados. Com base em levantamento preliminar realizado em publicações, arquivos do MAI e entrevistas, pudemos verificar que:

- no período tratado na pesquisa (1974-1979), houve duas fases no que concerne aos pedidos de asilo político para Portugal; na primeira fase, nos anos 1974 e 1977, a grande maioria dos pedidos de asilo foi de exilados brasileiros, latino-americanos e espanhóis, perfazendo um total geral de 142 pedidos; já na segunda, nos dois anos seguintes, a grande demanda de pedidos de asilo concentrou-se em populações oriundas das ex-colônias portuguesas na África, perfazendo um total geral de 2092 requerimentos;[24]

- de uma maneira geral, o Estado luso mostrou-se bastante parcimonioso na concessão do asilo político, haja vista, por exemplo, o pequeno número concedido aos angolanos: de um total geral de 996 requerimentos nos anos de 1978 e 1979, foram atendidos apenas 22 pedidos, ou seja, cerca de 2% do total;[25]

- uma exceção digna de nota nesse contexto foi o caso chileno; para um total de 34 requerimentos de asilo para o período em questão, nove deles foram aprovados pelo Estado português;[26]

- em compensação, nenhum dos 48 requerimentos apresentados pelos exilados brasileiros foi aprovado pelo governo luso.[27]

Dito isto, tratemos por ora de nos deter no “caso brasileiro”. Em nossos levantamentos preliminares, não conseguimos ainda ter acesso direto aos processos relativos aos pedidos de asilo político apresentados pelos exilados, fato esse que, por óbvio, não nos assegura um melhor entendimento da política lusa frente a essa questão. Por outro lado, a documentação até agora encontrada nos permite supor que o governo português, neste caso, teria adotado uma postura ambígua, o que, ao nosso ver, tanto dava margem a uma situação de insegurança para alguns exilados, como assegurava ampla margem de manobra às autoridades lusas no controle e monitoramento dos exilados. Para melhor entender essa política de ambiguidades, tratemos de explorar os seguintes pontos.

Ao nosso ver, é preciso examinar com cuidado o dado acima exposto relativo à postura do governo luso em não conceder asilo político aos brasileiros, em nítido contraste com o caso chileno. Sem deixar de considerar a literatura que chama a atenção para a situação excepcional do “problema chileno”, transformado a partir de meados de 1973 em “questão internacional” para as esquerdas europeias,[28] cabe observar que, no que diz respeito aos exilados brasileiros, a atitude das autoridades lusas não deve, à primeira vista, ser lida como parte de uma política de governo com vistas à adoção de medidas de caráter repressivo ou mesmo de sistemática recusa de pedidos de asilo por parte dos brasileiros. De um número total de 49 requerimentos, houve somente três pedidos de asilo recusados pelas autoridades lusas.[29] Dos 46 restantes, houve ainda um total de 23 desistências, número bem próximo do apresentado pelos espanhóis: em um total de 53 pedidos, houve 24 desistências.

Creio que uma das chaves para um melhor entendimento dessa situação está na postura das autoridades lusas, de dar respostas diferentes aos problemas que se apresentavam. Explico. Para o “problema chileno”, o governo português seguiu o padrão de “solidariedade europeia” acima aludido. Já para os exilados das ex-colônias portuguesas, ao adotar uma política bastante rígida na concessão do asilo, as autoridades lusas tinham como um dos seus objetivos desestimular a crescente pressão dos “retornados”, ou seja, das grandes levas de populações africanas que se transferiam para a antiga metrópole devido aos problemas políticos e militares em seus países de origem.[30] Finalmente, no que se refere aos casos espanhol e brasileiro — muito semelhantes nos números de pedidos, desistência e concessão — há que supor que as autoridades lusas, por cautela, optaram por estratégias de protelação. Tal atitude seria decorrente, por um lado, da crescente instabilidade da situação política espanhola nos anos que antecederam à queda do regime franquista, e de outro, do alto grau de mobilidade por parte dos exilados brasileiros, em constante trânsito para outros países europeus.

Uma outra linha de raciocínio a respeito dessa questão, provavelmente mais abalizada, é exposta por Maurício Paiva em seu livro de memórias intitulado O Sonho Exilado. Nele, Paiva, exilado brasileiro em Portugal de 1974 a 1979 e ex-militante da Vanguarda Popular Revolucionária, relata a enorme dificuldade que encontrou para regularizar a sua situação em Portugal. Para ele, o problema se resumia ao seguinte:

Não chegavam contudo, a três dezenas os exilados que permaneciam em situação irregular em Portugal. Seria, pois, muito fácil resolver o problema […]. Por que, então, essa foi uma eterna e insolúvel questão? Não foi somente porque nos constituímos a última das prioridades de quem estava a braços com problemas internos e nas ex-colônias, como pensávamos no começo. Não se tratava de negligência, e sim de uma decisão política. Dificultando-nos a vida, matavam dois coelhos com uma só cajadada: desencorajava-se a transferência para Lisboa de refugiados em outros países europeus e empurrava-se para estes os que estavam em Portugal. E o sucesso dessa política pode ser evidenciado pelo pequeno número de exilados latino-americanos em Portugal, comparado com outros países da Europa.[31]

Passemos agora a lidar com um outro aspecto da política lusa, o da fiscalização direta da atuação dos exilados. Para tanto, iremos nos valer de alguns relatórios produzidos pelo MAI nos anos de 1976 e 1977, que tinham por objetivo municiar de informações o governo português. Uma vez mais, tratemos de nos concentrar nos dados referentes aos exilados brasileiros.

Em julho de 1976, a direção de Serviços de Estrangeiros encaminou à chefia de gabinete do MAI um ofício sob o título “Actividades de brasileiros”. Nele, o funcionário do órgão registra o seguinte:

O diretor-geral dos Negócios Políticos do M. N. E. [Ministério dos Negócios Estrangeiros] informa-nos de que teve conhecimento, através do Embaixador do Brasil, de que brasileiros que pretendem asilo político em Portugal, estarão trabalhando juntamente com elementos do PC no sentido de criar condições que provoquem o agravamento das relações entre os dois países, precisamente porque actualmente se vislumbra a possibilidade dum reatamento de relações mais íntimas que só poderão trazer vantagens a Portugal.[32]

Em seguida ao alerta, o autor do ofício passa a municiar o ministro com dados sobre os brasileiros que estavam à espera do asilo político. Segundo ele, os brasileiros representavam, na ocasião, cerca de 30% do total dos pedidos. Desses, afirma:

17 estão referenciados como desenvolvendo actividades políticas tanto em locais onde trabalham como fora deles, havendo apenas 3 desses elementos que não desempenham quaisquer cargos conhecidos, enquanto que todos os outros têm emprego em organismos do Estado, companhias nacionalizadas ou jornais vários. Há alguns professores da Universidade de Lisboa e Coimbra e também há alguns que frequentam cursos nas mesmas universidades. […] Finalmente temos referenciados 4 elementos que embora sem profissão se dedicam a actividades políticas e também um elemento que não tendo pedido asilo político tem emprego num ministério e exerce actividade política.[33]

Pouco mais de um ano depois, o mesmo órgão fez chegar às mãos do ministro da Administração Interna um novo relatório com dados sobre atividades dos estrangeiros em Portugal, dando destaque à sua presença em funções públicas. No tocante à presença dos brasileiros, os números são eloquentes. Do total geral de 228 estrangeiros, havia 60 brasileiros ocupando cargos em funções públicas. Em órgãos do Ministério da Educação e Investigação Científica (MEIC), por exemplo, dos 162 estrangeiros, 41 eram brasileiros. O mesmo relatório registra ainda dados profissionais de estrangeiros referenciados como “de algum modo ligados a actividades suspeitas”. Do total de 20 nessa situação, 13 eram de brasileiros.[34]

Ao se coligir os dados acima apresentados com os da documentação diplomática para os anos compeendidos entre 1976 e 1978, portanto, nos anos de institucionalização da Revolução Portuguesa, o que se percebe é um nítido deslizamento do tema da esfera diplomática para a policial, para a área de segurança do Estado. Daí, explica-se, entre outros aspectos, o crescente interesse das autoridades lusas no controle da presença estrangeira em funções públicas, assim como no acompanhamento estrito de “exilados suspeitos”, quais sejam, os que, ainda no Brasil, tiveram envolvimento direto com a luta armada. Nesse contexto, as relações com a embaixada brasileira, assim como com as autoridades de segurança brasileira, ganharam novos contornos.

A despeito disso, não caberia aqui afimar que a política lusa restringiu sobremaneira a atuação dos exilados brasileiros, a ponto de verem-se obrigados a deixar o país por razões políticas ou de segurança.

Estação Lisboa: a luta pela anistia

Nesta seção, nosso foco de análise concentra-se no trabalho empreendido pelo Comité Pró-Amnistia Geral no Brasil (CAB), aqui entendido como o principal pólo de aglutinação e articulação política dos exilados brasileiros em terras lusas, até o retorno para o Brasil em 1979. Com vistas a examinar o papel político desempenhado pelo CAB, irei explorar duas linhas de análise. Em um primeiro momento, propõe-se um estudo dos argumentos que deram fundamento à formação da entidade; em seguida, é nosso objetivo mapear as forças que compuseram a direção do comitê, quais sejam, os grupos e personalidades da vida política e intelectual portuguesa que estiveram à frente do CAB. Um outro campo de análise diz respeito mais direto à linha editorial e à linguagem política do Amnistia, o jornal do CAB, as quais, conforme já apurado, estiveram fundamentalmente a cargo de exilados brasileiros. Isto posto, é razoável supor que Amnistia possa ser visto como uma fonte privilegida para os estudos relativos às estratégias políticas e discursivas dos exilados em Portugal no período em estudo.

O CAB foi lançado em 30 de maio de 1975. Na ocasião, marcaram presença diferentes figuras do campo político e intelectual português, tais como o militante antifascista e dirigente do Diário de Lisboa, Fernando Piteira Santos, o jornalista, militante comunista e ex-exilado no Brasil, Miguel Urbano Rodrigues, o historiador e dirigente do Movimento de Esquerda Socialista, César Oliveira, o padre José Felicidade Alves, principal nome da esquerda católica portuguesa, além de muitos outros. Na cerimônia, o tom das intervenções foi dado por Piteira Santos, o qual registrou a dívida de gratidão dos militantes antifascistas lusos com a acolhida recebida por eles no Brasil das décadas de 40 e 50. Nos dias de hoje, acrescentou, “ao termo de um longo pesadelo, quando a jovem democracia portuguesa se consolida, não podemos fechar os olhos ao terror policial que, desconhecendo os mais elementares Direitos do Homem, impera no Brasil, desde 1964”.[35]

Na prática, o CAB só começaria a funcionar em abril do ano seguinte, quando foi lançado o número zero do órgão de divulgação das atividades do comitê, o jornal Amnistia. Na primeira página do jornal, em texto assinado por Piteira Santos, define-se a linha política do CAB. Vejamos alguns de seus argumentos.

Para ele, as relações luso-brasileiras:

Não podem restringir-se ao quadro oficial, diplomático e académico. […] O passado comum, este falar na língua de Camões de Rui Barbosa, e na língua de Machado de Assis de Eça de Queiroz, dá-nos mais do que condições de uma convivência íntima — dá-nos a consciência de uma comunidade de cultura que constitui cimento de real fraternidade.

Em seguida, Piteira Santos faz menção ao exílio português no Brasil.

Por isso nas dificuldades políticas durante a noite do fascismo português, os nossos resistentes encontraram no Brasil — país irmão — lugar de exílio e de trabalho, lar e pão; por isso ontem eles, Liberdade, pela nossa Democracia, pela amnistia aos presos políticos, pelo regresso dos nossos exilados […].

E conclui:

Mas, entendamo-nos, não se trata apenas de pagar uma dívida à fraternidade antifascista brasileira. Quando hoje tomamos posição na denúncia e condenação da repressão no Brasil, quando exigimos uma ampla amnistia para os combatentes brasileiros da Liberdade, quando exigimos que na nossa terra eles encontrem uma segunda pátria — estamos, apenas a continuar o nosso próprio combate contra o tentacular fascismo. A luta pela Liberdade é indivisível. E, no plano da fraternidade luso-brasileira, é tempo de passarmos das palavras aos actos.

Em seu texto, Piteira Santos uma vez mais expõe com clareza os dois principais argumentos que sustentam a formação do CAB — o da gratidão e o do compromisso político com a luta pela liberdade. Para ele, esses temas mostram-se indissociáveis, daí o tom moral do seu discurso, a conclamar o povo português a associar-se à luta do povo brasileiro contra o “fascismo brasileiro”.

Nos anos que se seguiram, o CAB realizaria um conjunto de atividades e eventos em torno do tema em questão,[36] além de manter, com certa regularidade, o jornal Amnistia, com uma tiragem de 5.000 exemplares. À frente do jornal estiveram os principais nomes e forças políticas que deram sustentação ao comitê, a saber: o padre José Felicidade Alves, Piteira Santos, Vasco da Gama Fernandes, Frei Bento Domingues e António Reis. Vejamos, em seguida, um rápido perfil dos personagens que compõem essa galeria.

Desses cinco, dois deles, Felicidade Alves e Bento Domingues, eram lideranças católicas, ou melhor, faziam parte de facções das esquerdas católicas portuguesas que tomaram corpo na última década do regime salazarista. Alves, na juventude, fora prior do Mosteiro dos Jerônimos e homem de confiança do Cardeal Cerejeira — figura forte da tradicional Igreja Católica portuguesa. Em fins dos anos 60, rompeu com o seu mentor para deslocar-se à esquerda, tornando-se, como acima aludimos, um personagem-símbolo de setores de esquerda da Igreja Católica em confronto aberto contra a ditadura salazarista e marcelista.[37] Após o 25 de Abril, Alves, já afastado da Igreja, iria filiar-se ao Partido Comunista Português (PCP). Já Frei Bento tornar-se-ia, ao longo dos anos 60 e 70, um dos líderes de uma corrente da Igreja interessada no diálogo entre o cristianismo e o marxismo. Domingues, ao que tudo indica, manteve vínculos com setores da Igreja católica brasileira ligados à liderança de D. Helder Câmara.

Vasco da Gama Fernandes e António Reis compuseram a facção socialista do comitê. O primeiro era um antigo quadro das oposições democráticas e tradicional defensor dos direitos humanos em Portugal.[38] Com a vitória do 25 de Abril, já nas hostes do PS, tornar-se-ia, em 1976, o primeiro presidente da Assembleia da República portuguesa. A sua presença à frente do comitê, assim como nos eventos promovidos pelo CAB, dava, inegavelmente, um enorme peso político para a entidade. Talvez por isso o governo brasileiro, por meio da sua embaixada em Lisboa, fizesse questão de queixar-se às autoridades lusas acerca da sua participação em atividades da entidade. Logo em seguida a esses incidentes, o parlamentar socialista deixaria a direção do Amnistia, sendo substituído por um importante membro de uma geração mais nova do PS, António Reis.[39]

Piteira Santos, como vimos acima, fora um importante quadro da resistência antifascista ao salazarismo. Durante boa parte da vida, manteve relações tumultuadas com o PCP, tendo sido obrigado a exilar-se do país depois de envolver-se em um golpe para a derrubada do regime. Em seu longo exílio em Argel, manteve estreitos vínculos com Miguel Arraes e com vários membros da colônia brasileira naquele país. Com o 25 de Abril, retornou a Portugal para assumir a direção do Diário de Lisboa. A despeito de suas relações políticas e pessoais com o premier Mário Soares, manteve-se em posição crítica aos governos e à hegemonia do PS.[40] No CAB, exerceria nítida liderança, ditando a linha política e sempre ocupando espaços de direção.

O CAB era, portanto, um espaço de solidariedade e ação política criado por variadas forças das esquerdas portuguesas e voltado exclusivamente para o exercício da denúncia e da crítica contra os desmandos da ditadura brasileira. Pelo seu caráter eminentemente frentista, contando inclusive em sua direção com figuras do PS, o CAB, além de não lidar com questões políticas domésticas, buscaria ainda manter uma postura equidistante das tradicionais refregas político-partidárias existentes entre os diversos grupos de esquerda. Tal orientação e postura, a meu ver, pode ter influenciado a participação brasileira no comitê e no Amnistia. Vejamos.

Ao passarmos em revista os sete números do Amnistia, verificamos, em primeiro lugar, que a linha editorial da publicação, coerente com as diretrizes do CAB, concentra a sua atenção em um pequeno número de temas, a saber:

- denúncias de tortura e violência contra presos políticos ou mesmo contra a população brasileira;

- divulgação em destaque das atividades do CAB;

- acompanhamento dos movimentos sociais no Brasil (ênfase no movimento estudantil e na atuação da oposição sindical);

- a ação da Igreja Católica na luta contra o regime;

- análises da conjuntura política brasileira.

Os artigos e reportagens não são assinados — à exceção dos que são de autoria de membros da direção do CAB — e invariavelmente adotam um linguajar duro e direto. Em pauta, como vimos, os eixos básicos do CAB: as denúncias contra as injustiças perpetradas pelo regime e a divulgação das diversas formas de organização e resistência de amplos setores da sociedade brasileira. O jornal não dá ênfase aos problemas que marcaram as relações luso-brasileiras no período, como também não abre espaços para registrar a atuação de organizações revolucionárias de esquerda, nem as atividades dos dois partidos comunistas brasileiros. Por outro lado, Amnistia deu amplo destaque à campanha desencadeada por diversas forças de esquerda contra o regime militar brasileiro por conta do chamado “massacre da Lapa”, quando foram executados três dirigentes do PCdoB, em dezembro de 1976.[41]

Um aspecto interessante para se examinar as mudanças na linha política da publicação diz respeito à maneira pela qual Amnistia acompanhou a vida político-institucional brasileira, à época marcada pelas idas e vindas do processo de distensão do regime capitaneado pelo presidente Ernesto Geisel.

Nos primeiros números da publicação, datados de 1976, Amnistia dá pouco destaque à atuação do MDB — a chamada “oposição consentida” — na luta contra o regime. As eleições de 1976 são caracterizadas como “farsa”, demonstrando cabalmente, uma vez mais, a falta de perspectiva de uma luta política no campo legal. A despeito disso, o jornal não defende direta e abertamente a luta armada contra o regime, mostrando-se mesmo parcimonioso no uso da expressão “derrubada da ditadura”.

Em 1977, é possível perceber uma inflexão na linha política acima exposta, haja vista, por exemplo, a maneira pela qual o CAB, em nota publicada em destaque no número 6 do jornal, defende a campanha liderada pelo MDB por uma “Constituinte Já”. Diz a nota:

Pela primeira vez em treze anos de opressão, o povo brasileiro vislumbra a possibilidade de uma saída democrática para a situação do país: a convocação de eleições para uma Assembleia Constituinte livre e soberana. A Campanha pela Constituinte, lançada no Brasil, no dia 20 de setembro, pelo Movimento Democrático Brasileiro [MDB] corresponde a uma avassaladora exigência nacional: pela primeira vez uma solução política reúne tamanha massa de adesões. […] O Comité Pró-Amnistia Geral apela ao povo português para a solidariedade activa com esta campanha. Trata-se de uma batalha decisiva do povo brasileiro que exige o fim da ditadura, o restabelecimento das liberdades democráticas, a amnistia geral e irrestrita e o restabelecimento do Estado de Direito.[42]

Ao lançar um manifesto de adesão ao movimento, o CAB, por intermédio do seu jornal, passa a respaldar uma linha política cujo eixo de ação é a defesa de campanhas unitárias e de massa, e cuja bandeira é a luta pelas liberdades democráticas, tática essa que se desdobra em assegurar uma centralidade à luta político-institucional, como também ao principal canal pelo qual esta luta deverá ser empreendida, o MDB. Para tanto, o manifesto do CAB vale-se de uma leitura de inspiração liberal para a noção de democracia, cujo corolário, como se percebe, é o estabelecimento do Estado de Direito.

Sobre essa inflexão política, há alguns dados a considerar. Creio, em primeiro lugar, que qualquer análise que se faça sobre essas mudanças, ainda que preliminar, deva levar em conta o caráter abrangente e plural que assumira em vários países europeus a luta pela anistia, luta essa que se valia tanto de estratégias de aproximação com o centro político, como de um vocabulário tributário de leituras democráticas do liberalismo, nas quais o tema da defesa dos direitos humanos assumia grande importância.[43] Ao que tudo indica, o CAB, naquela conjuntura, estava também a promover um deslizamento nesse mesmo sentido.

Em segundo lugar, há que considerar nesses sinais emitidos pelo CAB um outro dado de conjuntura que não deve ser desprezado: o quadro de instabilidade e crise por que passava o projeto oficial de distensão encaminhado pelo presidente Geisel, interpelado, à direita, por grupos militares contrários aos rumos da transição e, à esquerda, por movimentos sociais que colocavam em xeque as bases autoritárias do regime. Nesse bojo, dado o recuo estratégico por parte do governo, começam a ser criadas as condições para uma atuação mais ampla por parte dos diferentes grupos de esquerda, os quais passam a vislumbrar a possibilidade — premente — de ser implantado no país um regime de bases liberal-democráticas, no qual diferentes projetos políticos e de sociedade estariam em jogo. A luta pela Constituinte, a meu ver, é um dos ingredientes desse novo quadro político que, tudo levava a crer — ou tudo fazia crer —, apontava para a mudança.

Nos anos seguintes, 1978 e 1979, o CAB seguiria esse mesmo tom, mantendo-se, portanto, com um espaço político estratégico para a luta dos exilados brasileiros em Portugal.

Duas observações finais

Duas foram as linhas de investigação aqui apresentadas. A primeira delas refere-se a um tema clássico em estudos dessa natureza e diz respeito a como responder a uma questão precípua: como o Estado do país acolhedor se relacionou com os exilados? Para lidar com essa problemática, promoveu-se um breve estudo em torno das iniciativas adotadas pelo Estado português no sentido de construir uma política pública voltada para lidar com os refugiados políticos, entre os quais os brasileiros, levando-se em conta variáveis intervenientes como a dinâmica revolucionária portuguesa; a legislação internacional relativa aos refugiados e sua aplicação em Portugal; e, finalmente, mas não menos importante, as complexas relações diplomáticas dos governos portugueses com o regime militar brasileiro.

Nos dados até aqui levantados, observa-se que houve algumas modulações na forma pela qual as autoridades lusas lidaram com os exilados brasileiros, uma vez que, ao longo do tempo, a questão deslocou-se do campo político para o policial, particularmente nos anos que se sucederam à derrota do projeto revolucionário das esquerdas portuguesas. Por outro lado, coube ao governo luso, pelas mãos de Mário Soares, tomar a iniciativa de receber — e acolher — em território português determinadas personalidades políticas que tiveram papel central na luta contra o regime brasileiro, tais como Márcio Moreira Alves e Leonel Brizola.

Por parte do governo brasileiro, as relações com Portugal, no contexto acima descrito, são ressignificadas, abrindo possibilidades para a adoção de uma ação mais ofensiva com vistas a livrar-se de um parceiro visto até então como bastante incômodo. Daí, em decorrência do 25 de Abril, estabelece-se uma política bifronte, na qual, a par do discurso ideológico e anticomunista levado adiante pelo embaixador brasileiro em Portugal, firma-se uma orientação mais livre e desenvolta em relação às ex-colônias portuguesas, expressa, em outras medidas, no rápido reconhecimento dos govenos de Guiné-Bissau e Angola.

Ainda no âmbito desta problemática, há ainda uma outra questão — igualmente clássica — a ser considerada: qual o grau de liberdade de ação dos exilados brasileiros em Portugal diante do quadro ambíguo acima descrito? Por óbvio, há que investir em estudos comparados para responder adequadamente a essa questão. A título preliminar, porém, diante dos dados até aqui levantados, creio que é possível afirmar que os exilados brasileiros puderam atuar com ampla desenvoltura no território português, mesmo em conjunturas desfavoráveis aos grupos de esquerda, ou seja, no período correspondente ao pós-25 de Novembro. A despeito disso, também se deve sublinhar o fato de a colônia brasileira em Portugal ser bastante reduzida quando comparada às colônias em outros países europeus, como França e Suécia, entre outros. Tal fato se explica por fatores como a crise de empregos em Portugal, decorrente da debilidade econômica do país, assim como pela rígida política em relação à documentação e à concessão de vistos.

Uma boa prova dessa desenvoltura foi a constituição e a formação do Comité Pré-Amnistia Geral no Brasil, um dos mais ativos dos então existentes na Europa. Por meio dessa entidade, os exilados brasileiros firmaram alianças políticas internas e externas e fizeram valer sua voz na luta contra a ditadura militar. Por meio do estudo das atividades do comitê, assim como de suas publicações, tem-se um bom retrato da maneira pela qual alguns setores das esquerdas brasileiras conceberam a luta empreendida contra o regime militar. E, mais uma vez, percebe-se o trânsito de proposições mais radicais — de confrontação frontal com o regime — para a divulgação de teses e bandeiras que colocam em cena o tema da instalação no Brasil de um regime em bases liberal-democráticas. Daí, por exemplo, a crescente ênfase em temas relativos aos direitos humanos, ou ainda a defesa do estabelecimento de um Estado de Direito no país por intermédio da convocação de uma Assembleia Constituinte “legítima e soberana”. Nos dois lados do Atlântico — na América Latina, como na Europa — as esquerdas perdiam o fôlego revolucionário e caminhavam em direção ao reformismo político.

Para concluir, cabe lembrar que Portugal foi, para dezenas de brasileiros, a última estação antes do retono ao Brasil. Em minhas pesquisas, entrevistei alguns exilados que, depois do 25 de Novembro, seguiram rumo às ex-colônias portuguesas na África com o intuito de participar do processo revolucionário desses países. Muitos deles, senão a maioria, terminaram por retornar a Portugal diante dos enormes problemas políticos enfrentados pelas novas nações africanas. Em fins de 1978 e no primeiro semestre do ano seguinte, Lisboa passou a receber uma última e pequena leva de exilados brasileiros. As discussões a respeito da aprovação de uma Lei de Amnistia no Brasil avançavam a passos largos, o que só aumentava a expectativa pelo retorno nas colônias brasileiras em toda Europa. Rumar de imediato para Portugal foi, para eles, uma forma de, pelo contato com a língua e com os velhos amigos brasileiros, “preparar as malas” e “já ir voltando”.

 

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Visita do Ministro de Estado a Lisboa. Agenda, CPDOC/FGV, AAS, MRE, RB, 23.05.1094, pasta 1.

 

Notas

[1] Sobre a produção memorial dos exilados brasileiros, ver Silva (2006). A respeito da “cultura da memória”, ver análise de Sarlo (2007).

[2] Cf. Ferreira e Reis (2007a; 2007b; 2007c).

[3] Para uma abordagem geral do exílio das esquerdas brasileiras nas décadas de 1960 e 1970, ver a obra seminal de Rollemberg (1999).

[4] Para um estudo das relações políticas entre Leonel Brizola e as esquerdas revolucionárias brasileiras, ver Freire (2007).

[5] Neste trabalho, o termo exilado diz respeito aos que se viram obrigados a abandonar o seu país de origem por razões de ordem política, independente da condição jurídica que possam ter assumido nos países que os receberam.

[6] A pesquisa foi realizada em estágio de pós-doutoramento e contou com o apoio da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-Capes. Em Portugal, foi desenvolvida junto ao CIES - Instituto Universitário de Lisboa, sob a supervisão do professor António Firmino da Costa.

[7] Cf. D’Araújo e Castro (1997: 343).

[8] Sobre as diretrizes da política externa portuguesa no pós 25de Abril, ver Telo (1998: 275-316).

[9] A respeito do tema, ver Magalhães e Cervo (2000: 92-96).

[10] Acompanhar processo de radicalização política portuguesa em Reis (1996: 19-39).

[11] Conferir CPDOC/FGV, ArquivoAAS, mre/rb 1974. 05. 23 (pasta 1). Ver ainda D´Araújo e Castro (1997: 344).

[12] Cf. Arquivo Histórico do MNE, Relações bilaterais de Portugal como Brasil. Visita a Portugal do Ministro das Relações Exteriores do Brasil Dr. Azeredo da Silveira, Relatório assinado pelo secretário da delegação portuguesa António de Campos. PEA (25) M764, pasta 10.

[13] Idem,p.7.

[14] Idem,p.12.

[15] Idem,p.14.

[16] Em telegrama de 14 de novembro de 1974 ao ministro Azeredo da Silveira com vistas à preparação de sua visita a Portugal, o embaixador Carlos A. da Fontoura registra que incluiu na agenda de discussões um item específico sobre o caso dos exilados nos dois países. Conferir Visita do Ministro de Estado a Lisboa, Agenda, CPDOC/FGV, AAS, MRE, RB, 23. 05. 1094, pasta 1.

[17] A expressão, introduzida no debate político pelo presidente Geisel, dizia respeito aos grupos da chamada “linha dura” militar contrários ao processo de liberalização controlada do regime.

[18] Sobre a gravidade da crise de Estado português, conferir estudo de Cerezales (2003).

[19] A respeito da coexistência de duas orientações na política externa do governo Geisel, conferir Saraiva (1999: 246) e Bandeira (1989: 199).

[20] Na ocasião, foram assassinados Pedro Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Drumond. A respeito da repercussão do episódio em Portugal, cf. folheto intitulado “Brasil irmão, teu povo vencerá”, publicado em Lisboa pelo Comité de Apoio às Lutas dos Povos da América Latina, n.º 1. Para verificar a posição do Partido Comunista Português (Reconstruído) sobre o episódio, ver Bandeira Vermelha (5/1/1977: 1).

[21] O ofício é assinado pelo embaixador Fontoura e datado de 13 de abril de 1977. Cf. em Anais da Assembleia da República (sessão de 7 de maio de 1977: 3538).

[22] Cf. primeira leva de exilados em Portugal em Vida Mundial, n.º 1862 (22/5/1975: 27).

[23] Cf. artigo 33.º da Constituição da República Portuguesa.

[24] Os números apresentados dizem respeito a requerimentos de exilados e seus agregados familiares. Verificar dados em Costa (1996: 138).

[25] Idem (pp. 137 e 145).

[26] Idem (pp. 302 e 335).

[27] Idem (pp. 302 e 335).

[28] Sobre o tema, ver ensaio de Rodrigues (2008a: 28-32).Da mesma autora, conferir “Les exils intelectuels brésiliens et chiliens en France lors des dictatures militaires: une ‘histoire croisée’” (2008b: 225-240).

[29] Cf. Costa (op. cit.: 342).

[30] O tema pode ser visto em “Retornados: uma ilha dentro do país”, Vida Mundial (23/10/1975: 40-42). Conferir ainda “Retornados: começou a revolta?”, Vida Mundial (6/5/1976: 14-16).

[31] Cf. Paiva (2004: 229).

[32] Cf. Serviço de Estrangeiros, Torre do Tombo, MAI.ACL.MAI.GM. SE007-12Cx. 0544 (1976).

[33] Idem.

[34] Conferir Serviço de Estrangeiros. Torre do Tombo, MAI. ACL. MAI. GM. SE 007-12 Cx. 0544 (1977).

[35] Conferir Diário de Lisboa (31/5/1975: 6).

[36] Dentre outros eventos, coube ao CAB a realização da Semana de Solidariedade como Povo Brasileiro, realizada em Lisboa em abril de 1977. Conferir Amnistia, 4, 1977. Sobre as atividades do CAB, ver Greco (2003: 191-194).

[37] Ver Alves (s/d) e Almeida (2008).

[38] Conferir trajetória política em Fernandes (1975).

[39] Sobre o tema, ver reportagem de Helena Salemem Amnistia. São Paulo,Editora Abril (1978: 44).

[40] Sobre a trajetória de Piteira Santos, ver Fiadeiro (2003).

[41] Amnistia, 4 (1977: 5).

[42] Amnistia (6/8/1977: 1).

[43] Sobre o tema dos direitos humanos e a campanha da anistia, conferir Greco (2003: 187-190).

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