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Sociologia, Problemas e Práticas

versión impresa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  n.61 Oeiras dic. 2009

 

Sociologia da experiência e lutas por reconhecimento

Associações de geração de trabalho e renda no sul do Brasil

Ricardo Mayer*

 

Resumo

Este trabalho propõe uma sociologia da experiência em associações de geração de trabalho e renda no sul do Brasil. Para tanto, decompomos a racionalidade da ação em associações de trabalhadores num tríplice registro, onde investigamos: a) as formas de inserção e integração sociais configuradas pelas relações de solidariedade; b) a dimensão da racionalidade estratégica de cada associação de catadores traduzida nas lutas por reconhecimento; e, c) os processos de subjetivação expressos na afirmação identitária de cada coletivo de trabalhadores. A partir da pesquisa de campo nas associações, constatou-se um processo de subjetivação caracterizado por aquilo que passamos a denominar de uma “lógica do respeito”, a qual possui uma dupla inflexão, ou seja, por um lado, busca romper no âmbito da esfera privada com a dominação masculina expressa num código de honra, cuja conseqüência mais dramática se traduz na violência doméstica, e, por outro lado, se constata um movimento em direção à esfera pública, a partir da articulação de uma associação com um movimento social traduzindo desta maneira a reivindicação pelo reconhecimento da dignidade de indivíduos sujeitos a todo tipo de reconhecimento recusado.

Palavras-chave reconhecimento, solidariedade, lógicas da ação, lógica do respeito, economia solidária.

 

Sociology of the experience and struggles for recognition. The associations for work and income generation in southern Brazil

Abstract

This paper/work considers a sociology of the experience in associations for work and income generation in the south of Brazil. For this, we decompose the rationality of the action in worker associations into a triple register, where we investigate: a) the forms of social insertion and integration configured by relations of solidarity; b) the dimension of the strategic rationality of each group expressed/reflected in the struggles for recognition; and c) the subjectivation processes expressed in the affirmation of identity in each specific group of workers. From the field research in the associations, we ascertained a process of subjectivation characterized by what we now call of a “logic of respect”, which possesses a double inflection, i. e., on the one hand, the search in the the private sphere to break with the masculine domination expressed in a code of honor whose most dramatic consequence is reflected in domestic violence and, on the other hand, we ascertained a movement towards the public sphere, on the basis of the connection/combination of an association with a social movement, which thus translates the claim for recognition of the dignity of individuals subjected to all kinds of rejected recognition.

Key-words recognition, solidarity, logics of action, logic of respect, solidary economy.

 

Sociologie de l’expérience et des luttes pour la reconnaissance. Les associations de création d’emploi et de revenus dans le sud du Brésil

Résumé

Ce travail propose une sociologie de l’expérience au sein d’associations de création d’emploi et de revenus dans le sud du Brésil. L’auteur décompose la rationalité de l’action au sein d’associations de travailleurs selon trois registres: a) les modes d’insertion et d’intégration sociales configurés par les relations de solidarité, b) la dimension de la rationalité stratégique de chaque association de nettoyeurs traduite dans les luttes pour la reconnaissance, et, c) les processus de subjectivation exprimés dans l’affirmation identitaire de chaque collectif de travailleurs. À partir de la recherche de terrain au sein des associations, l’auteur a constaté un processus de subjectivation caractérisé par ce qu’il a appelé une “ logique du respect ”, qui possède une double inflexion, c’est-à-dire, d’une part, la recherche de rupture dans le cadre de la sphère privé avec la domination masculine exprimée dans un code d’honneur, dont la conséquence la plus dramatique mène à la violence domestique, et, d’autre part, un mouvement vers la sphère publique à partir de l’articulation d’une association avec un mouvement social traduisant la revendication de la reconnaissance de la dignité des individus soumis à toute sorte de reconnaissance refusée.

Mots-clés reconnaissance, solidarité, logiques de l’action, logique du respect, économie solidaire.

 

Sociología de la experiencia y luchas por el reconocimiento. Asociaciones de generación de trabajo y renta en el sur de Brasil

Resumen

Este trabajo propone una sociología de la experiencia en asociaciones de generación de trabajo y renta en el sur de Brasil. Para lo cual, descompusimos la racionalidad de la acción en asociaciones de trabajadores en un triple registro, donde investigamos: a) las formas de inserción e integración sociales configuradas por las relaciones de solidaridad, b) la dimensión de la racionalidad estratégica de cada asociación de catadores traducida en las luchas por reconocimiento, y, c) los procesos de subjetivación enunciados en la afirmación de identidad de cada colectivo de trabajadores. A partir de la búsqueda de campo en las asociaciones, se constató un proceso de subjetivación caracterizado por aquello que denominamos una “lógica del respeto”, la cual tiene una doble inflexión, o sea, por un lado busca romper en el ámbito de la esfera privada con la dominación masculina expresa en un código de honra, cuya consecuencia más dramática se traduce en la violencia doméstica, y por otro lado se constata un movimiento en dirección a la esfera pública a partir de la articulación de una asociación con un movimiento social traduciendo de esta manera la reivindicación por el reconocimiento de la dignidad de individuos sujetos a todo tipo de reconocimiento recusado.

Palabras-llave reconocimiento, solidaridad, lógicas de la acción, lógica del respeto, economía solidaria.

 

 

Introdução

Os chamados processos de invalidação social dizem respeito a uma parcela cada vez maior de trabalhadores que não atendem mais aos requerimentos dos novos parâmetros de produtividade e competitividade que acompanham os processos de integração assimétrica das economias nacionais. Se, por um lado, tal fato remete para os processos de dissociação de trabalhadores, que antes pertenciam a uma dada estrutura produtiva, revelando desta forma uma crise das formas de inserção social assentadas no assalariamento da força de trabalho, por outro, diz pouco acerca daquele contingente de trabalhadores que nunca possuíram um emprego formal e por conseqüência direitos trabalhistas reconhecidos. Esses, sempre estiveram desfiliados e seu estatuto os remeteu a uma condição próxima a de párias sociais vivendo uma situação de subcidadania.

No Brasil, sua origem remonta a dois processos excludentes, a saber: o primeiro está associado à constituição de um mercado de trabalho livre na transição da ordem escravocrata à ordem competitiva; e o segundo ao êxodo rural decorrente da expulsão de trabalhadores do campo que se segue à modernização capitalista do país na segunda metade do século XX. Tais processos conjugados produziram uma espécie de subclasse habitando a periferia das grandes cidades do país. Para tais indivíduos, o desemprego crônico naturalizou-se, habituando-os a estratégias variadas de subsistência a partir da ocupação corrente de subempregos. Alijados das condições mínimas de cidadania para uma vida decente, esses trabalhadores vieram a ocupar zonas periféricas do espaço urbano formando favelas marcadas quase sempre por um deficit generalizado de políticas públicas.

Assim, se a questão da inserção social através do trabalho ganha evidência nos dias de hoje é porque somos confrontados com as fraturas de uma sociedade que sequer chegou a incorporar ao longo dos processos de modernização capitalista a grande parcela dos trabalhadores que disputam entre si as oportunidades precárias situadas nas franjas de mercados de trabalho marcadamente seletivos. Mas o que resta para este contingente de trabalhadores cuja exclusão é algo permanente e que nunca tiveram contato mesmo com a cultura do trabalho assalariado? Tal questão remete para o surgimento na década de 90 do século passado do fenômeno da formação de várias experiências de organização associativa de trabalhadores da economia informal1 com vistas num primeiro momento, de provisão dos meios de subsistência através da geração de trabalho e renda; e num segundo momento, de assunção de um caráter sociopolítico ao constituir novos atores sociais reivindicando o reconhecimento de seus direitos sociais. Mais especificamente, estamos tratando do processo de constituição de associações de catadores, de materiais recicláveis em várias cidades do Brasil durante a última década. Trata-se, portanto, da organização de setores da população urbana marginalizada, cujo movimento associativo parece ir à contramão dos processos históricos de dominação política através da patronagem e do clientelismo a que estas populações estavam submetidas. Ademais, com a constituição das associações de catadores, nos deparamos com uma recomposição das relações de solidariedade, ou seja, para aqueles indivíduos cuja vinculação social se restringia ao universo das sociabilidades primárias desenha-se um novo campo de possíveis, no que tange a configuração de sociabilidades secundárias, de um novo tipo de relação social caracterizada pela norma impessoal, pela igualdade e pela democracia.

No que segue, iremos analisar o fenômeno associativo a partir de um objeto empírico constituído por associações de geração de trabalho e renda voltadas para a reciclagem de lixo2 procurando analisar a configuração das lógicas de ação em curso nestas associações. Ou, mais detidamente, iremos esquadrinhar: as relações de solidariedade preponderantes em cada associação; as suas demandas por reconhecimento; e, por fim, os processos de subjetivação dos trabalhadores vinculados a cada associação. Trata-se aqui de organizações constituídas voluntariamente, mobilizadas em tese em torno de objetivos comuns definidos mediante processos democráticos de organização interna, tendo como pressuposto a possibilidade de participação de todos os membros em todos os cargos da estrutura associativa mediante eleições, bem como a transparência de todo o processo decisório e de gestão dos recursos e bens coletivos da associação.

 

As lógicas da ação

Para dar conta das sociabilidades desdobradas no âmbito das associações que elegemos como objeto empírico de nossa análise, começamos por decompor a lógica de sua ação num tríplice registro, qual seja: a integração social, a ação estratégica e a subjetivação, que culminam, por seu turno, em diferentes tipos de relação social. Para evitar uma concepção de ação social na qual algo como um sujeito “ultra-socializado” acaba por sucumbir a toda sorte de determinismos estruturais, um tipo de ação previamente determinada, quase que programada por um sistema social, nos apoiamos na sociologia da experiência de François Dubet (1987; 1996), Aqui, a noção de experiência social se revela mais apropriada na própria medida em que não é mais possível reduzir a ação social à simples interiorização de papéis, nem tampouco a pura persecução de interesses individuais. Tal noção remete antes ao fato de que na modernidade tardia os atores são compelidos a gerir várias lógicas de ação simultaneamente estruturadas por princípios autônomos. Ao mesmo tempo, a conjugação das lógicas da ação que organizam a experiência social não possui centro algum, sua combinatória não está ancorada ou subordinada a uma lógica fundamental. Ou seja, sua unidade não está dada, mas resulta de uma experiência socialmente construída a partir da heterogeneidade das lógicas e racionalidades da ação. Nesse sentido, uma ação é coincidentemente uma orientação subjetiva e uma relação, e sua articulação definirá não só a lógica da ação, mas também a própria natureza das relações sociais.

Deste modo, cada experiência social irá se constituir a partir da articulação das três lógicas e racionalidades da ação acima elencadas. Neste registro tríplice das lógicas de ação teremos, esquematicamente, a seguinte configuração: a primeira lógica da ação é constituída pelo pertencimento. Ou seja, pela inserção na comunidade traduzida através da noção de encaixe3 numa densa rede de relações de parentesco e vizinhança. Neste registro de sociabilidade, prevalecerá a questão das formas de solidariedade que tornam possível algum tipo de integração social que poderá ser de natureza comunitária ou societária.4 É aqui que se pode conceber a coalescência dos vínculos sociais marcados por sociabilidades primárias ou secundárias, por relações sociais horizontais ou verticais, ou mesmo ainda por diferentes tipos de relações de solidariedade.5 Da mesma forma, as questões relativas aos possíveis déficits de integração social poderão ser tratadas como patologias sociais a partir da noção de anomia, pois um sistema de relações sociais pode se decompor quando entra em crise se desorganizando e engendrando situações de marginalização, exclusão e invalidação social, as mais diversas.6

Mas as relações sociais não se resumem somente à questão da integração social. Na segunda lógica da ação iremos nos deparar com o sistema político e com processos institucionais de legitimação política desencadeados entre o Estado e a sociedade civil. Pode-se falar então numa esfera política que compreende formas variadas de pressão, influência e participação política, através de associações, sindicatos ou partidos políticos, tendo em vista a disputa pela redistribuição de bens públicos, o reconhecimento de direitos sociais e/ou culturais ou mesmo a luta pelo poder político. Aqui, as questões relacionadas à preservação do status quo ou a demandas por reconhecimento social poderão deflagrar, por exemplo, conflitos e mobilizações políticas pela defesa ou reivindicação de direitos sociais, através da definição de uma ação estratégica7 com vistas à consecução dos objetivos políticos perseguidos pelas organizações em liça. A título de ilustração, nos casos adiante analisados, os destinatários das ações políticas levadas a efeito pelas associações são, em grande medida, constituídos pelos poderes públicos instituídos, seja para o reconhecimento da atividade profissional, seja para a gestão dos resíduos passíveis de reciclagem. Já as patologias referidas a esta lógica da ação estarão relacionadas à obstrução da ação a partir do cerceamento do seu campo de possíveis, bem como as crises de legitimação da ação a partir da incoerência entre os fins e os meios empregados para perseguí-los.

Por fim, a lógica da ação mais abstrata é configurada por relações sociais que atravessam o tecido social por inteiro. Trata-se de relações sociais que perpassam as formas de integração social e os conflitos político-institucionais, imprimindo nas hierarquias e estratificações sociais existentes seu caráter de classe. Além de traduzirem um processo de subjetivação, tais relações irão concorrer para conformar o próprio campo de possíveis da ação coletiva em termos das relações de solidariedade, da definição das estratégias de intervenção e dos objetivos no âmbito da esfera política e da própria possibilidade da sua constituição como atores sociais a partir da afirmação de sua identidade de classe. As patologias que atingem os processos de subjetivação estão relacionadas, por seu turno, às formas de alienação que tolhem a capacidade de agir dos atores. Assim, a cisão entre concepção e execução, entre o trabalhador e sua obra, implica na reificação das relações sociais que se apresentam como forças e mecanismos incompreensíveis que se abatem sobre o sujeito tal qual leis naturais. Ou seja, a alienação também é a perda de sentido, é o desencantamento do mundo corroído pela racionalidade instrumental, é a percepção do mundo e suas relações sociais como relações entre coisas.

 

A lógica da integração social

A natureza do trabalho de triagem de resíduos sólidos nas associações investigadas não apresenta complexidade no tocante a sua organização. No entanto, se o mesmo não chega a se constituir num processo de trabalho com grande diferenciação em termos das tarefas que o compõem, não podemos, ao mesmo tempo, desconsiderar a importância das relações de reciprocidade tramadas ao longo das rotinas e jornadas de trabalho diário que terminam por criar e estreitar vínculos, bem como regulações recíprocas em torno do comprometimento coletivo em relação à triagem e seleção dos resíduos. Essas relações de reciprocidade constituem um dos suportes dos vínculos de pertencimento dos trabalhadores às associações. O outro fundamento da lógica da integração social nas associações de catadores de lixo poderá ser caracterizado a partir da aceitação, do consentimento de seus membros em relação a modos de dominação que, como veremos a seguir serão de ordem carismática e de ordem racional-legal.8 Para Bajoit (1992), a possibilidade de substituição, de permutabilidade de todos os membros de um coletivo enseja um tipo de relação de solidariedade que pode ser definida como sendo algo semelhante à série, ou noutras palavras, como algo também relativo a quem executa tarefas similares e de pouca complexidade.9 Nesta situação, o que acabará exercendo um papel fundamental para manter e assegurar a coesão do grupo acabará sendo ou o carisma de uma liderança forte ou a legitimidade de uma “base de acordos” capaz de regular suas relações sociais. Tal situação se manifesta diferentemente nas duas associações pesquisadas: na primeira associação (doravante identificada como associação da Vila Bom Jesus), existe uma acentuada dependência de todos os associados em relação a uma liderança comunitária que literalmente “construiu” a associação a partir de um processo de apoderamento no qual passou a politizar as questões que afetavam a comunidade. Assim, sua participação nos movimento comunitário e de mulheres culminou na constituição da associação de catadores da Vila Bom Jesus como estratégia de geração de trabalho e renda de modo a proporcionar uma alternativa de subsistência às mulheres vítimas da violência doméstica, então moeda corrente naquela comunidade. Para tanto, a questão ecológica proporcionou o mote legitimador a partir do qual buscou-se articular a reciclagem de resíduos com a preservação do meio ambiente na criação da associação.

Mas, se a capacidade de mobilização e agenciamento desta liderança comunitária foi fundamental para a constituição da associação da Vila Bom Jesus, há que se registrar, de outra parte, sua notável ascendência sobre os demais membros da associação, configurando mesmo, em termos ideal-típicos, uma forma de dominação carismática que constitui, por sua vez, o fundamento da solidariedade serial já aludida anteriormente. A luta contra a discriminação social esteve em grande medida ancorada na reconstrução da auto-imagem das mulheres a partir da construção de uma mística que fornecia os elementos para a elaboração de uma nova imagem de si. Tal narrativa, assentada na questão ecológica, segundo as próprias palavras da presidente da associação da Vila Bom Jesus, afirmava: “(…) nós somos os salvadores do planeta; nós viemos pra essa terra, nós não viemos pra sofrer, Deus não fez o sofrimento, não existe castigo”. A elaboração de tal narrativa buscava desconstruir os padrões sociais de representação androcêntricos traduzidos num reconhecimento denegado das mulheres e de suas questões no espaço público. De uma dominação que se tornava opaca por não ser reconhecida enquanto tal. A superação deste tipo de dominação pressupunha a desconstrução das orientações culturais subjacentes às práticas sexistas o que acabou implicando naquilo que poderíamos definir, a partir de Fraser (2001), numa estratégia de contra-hegemonia no sentido da constituição de contrapúblicos, cujo objetivo foi propor visões alternativas ao senso comum dominante sobre a imagem e auto-estima aviltada pelas representações dominantes, que de resto também acabavam por se constituir em estratégias de apoderamento das mulheres deste coletivo.

Na segunda associação investigada (doravante identificada como associação da Vila Cavalhada), nos deparamos com uma situação diversa. De um grupo de famílias que trabalhavam com a reciclagem de lixo em antigas vilas de Porto Alegre constituiu-se uma associação como alternativa de geração de trabalho e renda para uma parcela do contingente de trabalhadores desempregados dessas comunidades após seu reassentamento num loteamento planejado pela prefeitura municipal na zona sul da cidade. Com a constituição da associação, os catadores desta comunidade percorreram uma trajetória caracterizada pela ampliação dos níveis de organicidade associativa em âmbito estadual que, terminou culminando na participação, em Junho de 2001, no 1.º Congresso Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, que reuniu de catadores de lixo a moradores de rua.10 Resultou deste primeiro encontro nacional de catadores de lixo a fundação do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis — MNCR. Segundo sua declaração de princípios, o objetivo primordial deste movimento social é a auto-organização — com democracia direta — dos catadores de lixo baseada na “independência e solidariedade de classe”. Tal descrição busca ressaltar a conformação de um projeto totalizador que irá se constituir num dos suportes das relações de solidariedade que caracterizam as associações vinculadas a este movimento social. Tais relações de solidariedade são predominantes em determinados momentos, principalmente aqueles marcados pela ebulição e efervescência que caracterizam a ação coletiva em períodos de mobilização e conflagração social. Estamos diante de relações sociais que podem ser caracterizadas, seguindo Bajoit (1992), como uma solidariedade do grupo em fusão baseada na ação direta e na ética da convicção.11 O grupo em fusão subsume as individualidades amalgamando-as na práxis e a coesão não é devida à dominação carismática, mas caucionada por um princípio de totalidade a partir do qual se define aquilo que está em jogo no curso de um conflito social. No entanto, os vínculos de solidariedade de “grupo em fusão” perduram apenas enquanto durar a ação. De modo que, a partir do momento que os objetivos do grupo são alcançados, as relações de solidariedade tendem a ser substituídas por outras formas de solidariedade.

Não obstante, considerando a forte inserção comunitária das associações de catadores de lixo, também percebemos nelas, a partir de Caillé (2001), uma realidade sociocomunitária marcada por dois tipos de sociabilidade, a saber: sociabilidades primárias e sociabilidades secundárias operando segundo uma lógica de integração social. O primeiro tipo de sociabilidade é caracterizado por um princípio de personalização a partir do qual há a prioridade das pessoas sobre as funções que elas cumprem, e o segundo tipo de sociabilidade é caracterizado pela exigência de eficiência e eficácia funcional, independentemente de quem irá desempenhar uma determinada função. Situadas na imbricação dos dois tipos de sociabilidade, as associações de catadores de lixo conformariam neste sentido uma sociabilidade híbrida ao conjugar os dois tipos de racionalidade que ordenam as sociabilidades primárias e secundárias, respectivamente.

As solidariedades primárias preponderam na definição das relações de solidariedade da primeira associação. No entanto, na segunda associação as relações de solidariedade são polarizadas pelas sociabilidades secundárias marcadas, sobretudo, pela existência e domínio pelos associados de uma “base de acordos” que estabelece as regulações mínimas de sua convivência. Trata-se aqui, do domínio por todos associados de um regimento interno que ao regular sua participação no âmbito da associação expressa o fato que a relação social não se constitui apenas como uma relação mecânica ou como um equilíbrio de forças onde são contrapostos interesses materiais ou vontades pactuadas, mas antes como uma relação moral plena de obrigações recíprocas (Chanial, 2001), Ainda segundo Bajoit (1992), as relações de solidariedade perduram também por conta de mecanismos de controle social, ancorados, por exemplo, na existência de documentos escritos, tais como a “base de acordos” que são exercidos reciprocamente no interior de cada grupo. Ao ser admitido na associação, por indicação de algum associado, o novo membro deve aderir à “base de acordos”, o que também concorre para configurar um outro aspecto das relações de solidariedade que poderíamos chamar de contratual. Trata-se da observância das regras acordadas por todos que participam do grupo no sentido da regulação das atividades em comum. Tal compromisso com a manutenção das regras instituídas de forma legítima se constitui, portanto, numa das fontes das relações de solidariedade que caucionam a permanência do grupo social. A legitimidade da regulação social provém da deliberação coletiva e da forma reflexiva pela qual as normas foram fixadas. Por fim, o fato da associação da Vila Cavalhada vincular-se organicamente a um movimento social, o MNCR, enseja uma associação de caráter militante por parte dos seus membros, constituindo assim um outro fio na trama das relações de solidariedade. Como dito antes, trata-se de uma solidariedade que surge num grupo em fusão, onde o coletivo é unificado pelo projeto e os vínculos solidários preservados através da ação coletiva engajada politicamente. Ou seja, é também pela ação coletiva que o grupo mantém seus membros integrados, de modo que se pode dizer que a estratégia de controle social aqui implementada é acional, pois é através da práxis individual que o grupo reconhece seus membros e, por conseqüência, o não engajamento de um membro na ação coletiva irá constituir-se num critério para a sua exclusão do grupo. Essa exclusão não irá se configurar somente como o resultado de uma infração em relação a uma norma ou regra, mas antes no fato de que a recusa em participar das ações coletivas acaba revelando um déficit de integração e adesão em relação aos valores e a cultura do grupo.

 

As lutas por reconhecimento

Uma análise das relações sociais que ensejam a recusa ou a atribuição de respeito e auto-estima, nos termos uma sociologia política do reconhecimento, pode se constituir num esquema interpretativo seja para a compreensão da lógica da integração social, seja para o entendimento dos conflitos que perpassam as sociedades contemporâneas. Aqui, a questão do reconhecimento de determinados conflitos sociais não deve ser abordada de modo a restringi-la a sua dimensão socioeconômica. Ou seja, muitas vezes a questão do reconhecimento está ligada às aspirações de determinados grupos sociais, cujas reivindicações não podem ser interpretadas somente a luz do paradigma econômico da redistribuição. Pois, tais questões podem demarcar um tipo de injustiça de natureza cultural ou simbólica referida a padrões sociais de representação, interpretação e comunicação dominantes. A sujeição a padrões culturais de interpretação e comunicação aviltantes, o reconhecimento recusado — que ocorre quando há uma certa opacidade às práticas representacionais, comunicativas e interpretativas de uma cultura e o desrespeito — presente quando se é submetido à difamação e humilhação pelas representações públicas ou nas interações cotidianas, configuram formas de dominação e opressão que repercutem socioeconomicamente nas condições de vida de amplos extratos da população brasileira. Em tais situações, a desigualdade socioeconômica e o reconhecimento recusado encontram-se imbricados, correspondendo à abordagem que Charles Taylor (1998) propõe para esta questão ao afirmar que uma das formas de reconhecimento características das sociedades contemporâneas está calcada no princípio da dignidade e corresponde a expansão gradual e paulatina dos direitos sociais segundo as conjunturas politicoeconômicas e contextos históricos particulares de cada país.

No Brasil, a seletividade de seu processo de modernização12 contribuiu para a reprodução da desigualdade em ampla escala no que se relaciona ao acesso da maior parte da população à provisão de bens públicos gerando desta forma uma condição de subcidadania. Tal condição é tratada por Wanderley G. dos Santos (1998), como uma cidadania regulada, correspondendo a um sistema de estratificação ocupacional definido pelas normas legais. Ou seja, são considerados cidadãos todos aqueles indivíduos que se encontram inseridos em algumas das ocupações reconhecidas e definidas legalmente. A ampliação do estatuto de cidadão seria possível através da adição de novos direitos beneficiando determinadas categorias profissionais em detrimento de outros segmentos sociais. Nestes termos, o não reconhecimento de sua ocupação implicará ser remetido a uma condição de subcidadão, o que, por seu turno, será coroado pela marginalidade, pelo trabalho incerto e precário, pela habituação à informalidade, enfim, pela naturalização de trajetórias que caracterizam processos de discriminação e exclusão social.

Nestes termos, o reconhecimento da ocupação de catador de lixo com a descrição e regulamentação de sua atividade no âmbito da Classificação Brasileira das Ocupações — CBO (2000) contribui para romper com a invisibilidade social dos trabalhadores em associações de catadores de lixo, bem como dos próprios catadores independentes nos dados estatísticos oficiais sobre a População Economicamente Ativa — PEA. O reconhecimento da atividade de catador de lixo além de implicar no reconhecimento público de uma ocupação, contribui também para a conformação de uma identidade coletiva, questão que será desenvolvida mais adiante.

Com efeito, o engajamento nas associações de catadores de lixo se inscreve num processo de uma luta por reconhecimento, nos termos em que a questão é abordada por Axel Honneth (2002).13 Assim, nos deparamos com uma gramática de motivações que mobilizam indivíduos vitimas de processo de opressão e discriminação indexados, mormente pelas categorias de classe social, gênero, e etnia, mas que ao se constituírem em uma forma de não reconhecimento tornam opacas e invisíveis quase que naturalizando tais modos de opressão e dominação. O sentimento de exclusão está estampado na fala dos trabalhadores das associações, o que concorre para estabelecer uma inflexão política configurada nas lutas por reconhecimento levadas a cabo com mais ênfase por pelo menos uma das associações investigadas, o que serve para caracterizar a ação coletiva destes trabalhadores.

Mas, o que dizer no tocante à racionalidade individual destes atores? Indagamos aqui sobre os recursos mobilizados pelos atores no curso das interações sociais. Para esclarecer, uma rápida digressão nos permitirá expor melhor onde queremos chegar. Com referência à lógica da ação estratégica, podemos considerá-la a partir de vários registros teóricos: assim, aprendemos com Bourdieu (1996), no que tange à lógica da ação, que o habitus não se constitui somente num sistema de disposições duráveis a partir do qual o indivíduo interioriza o exterior e exterioriza o interior, mas é também um capital utilizado como recurso que possibilita a persecução de interesses e a definição de estratégias na medida em que os atores elejam seus fins. Para citar mais um exemplo, mas noutra perspectiva teórica, nos reportamos ainda ao modelo de ação dramatúrgica de Goffman (1996), cuja racionalidade também está assentada num paradigma de ação teleológica quando os atores mobilizam seus recursos identitários nas relações sociais em que estão envolvidos.14 Assim, nos apoiando em Bajoit (1992: 145) para decompor a ação dos trabalhadores no âmbito de sua racionalidade estratégica, nos deparamos com duas situações. Com efeito, a primeira opção que surge em relação a participação numa associação pode ser definida como um compromisso,15 como um engajamento em relação ao projeto de formação das associações. Trata-se de uma opção caracterizada pelo envolvimento ativo em relação aos valores e mesmo a um eventual projeto ideológico subjacente à constituição das associações. Trata-se ainda de vínculos que unindo os trabalhadores às associações forjam uma identidade e mesmo uma ligação emocional a este projeto. Não obstante, encontramos também uma atitude de resignação. Uma postura que ao mesmo tempo em que traduz uma certa apatia em relação à associação de catadores, também procura tirar algum proveito da situação, extrair alguma vantagem antes de poder optar pela saída da associação em busca de um emprego formal. Neste sentido, esta postura pode ser definida como um pragmatismo na medida em que o ator não adere e não se identifica mais com os objetivos da organização. Ele antes “explora o sistema” se furtando, se subtraindo ao comprometimento com as questões coletivas.

Assim, podemos dizer que há uma oscilação de uma postura mais pragmáticapredominante na primeira associação — porém, fortemente embebida num tipo de sociabilidade primária caracterizada pela personalização das relações sociais — para um acentuado comprometimento político na segunda associação. Tal compromisso é temperado pela participação em outros movimentos sociais, bem como dito antes, por uma certa ética da convicção que mobiliza os trabalhadores neste engajamento, ao menos aqueles mais próximos ao núcleo fundador e dirigente da associação.

 

A lógica do respeito e a esfera pública

O reconhecimento de direitos e por conseqüência do estatuto de cidadão nas sociedades modernas, republicanas e democráticas se consubstancia na noção universalista e igualitária da dignidade. Tal noção parte do pressuposto de algo que é comum a todos os seres humanos e que concorre para a institucionalização da igualdade através de definição de direitos expressos no conceito de cidadania. Neste sentido, a implementação de políticas sociais busca equalizar direitos, atenuar desigualdades e evitar estratificações perversas configuradas na distinção entre cidadãos e subcidadãos. Ao mesmo tempo, o princípio da dignidade se reporta à esfera pública e as sociabilidades secundárias que a caracterizam.

A lógica do respeito está referida antes de qualquer coisa a uma relação social de reconhecimento entre aqueles que participam da interação social, bem como uma tensão entre os princípios de hierarquia e igualdade. Para escapar da definição de respeito característica do senso comum nos valemos da abordagem proposta por Pharo (2001) que irá compreender tal noção a partir de uma definição operatória. Assim, o respeito poderá ser definido como uma relação social na qual temos uma limitação da liberdade de ação de modo a não ferir algo a que se confere valor — seja a reputação, a estima social, a moralidade, a honra ou a dignidade — reconhecido em alguém ou em um objeto.

Mas, o discurso em torno do respeito aos direitos civis e políticos pode se constituir numa mera ficção jurídica sem o estabelecimento das condições materiais para o seu exercício. Ou seja, a institucionalização dos direitos sociais só se efetiva historicamente a partir das pressões das classes trabalhadoras e é no âmbito da ampliação desta esfera dos direitos atribuídos historicamente que Axel Honneth (2002) conceberá as lutas por reconhecimento, ou seja, os conflitos derivados de uma experiência de reconhecimento recusado ou de desrespeito materializam disputas em torno do conteúdo material, bem como do alcance social do estatuto de uma pessoa de direito. Neste sentido, a experiência do reconhecimento formal de uma ocupação, por exemplo, pode traduzir, para os grupos sociais marginalizados, o reconhecimento público de seus direitos enquanto indivíduos moralmente imputáveis. O que, por seu turno, contribui para estabelecer sua condição de pertencimento como membros de uma sociedade que compartilha com os demais membros os mesmos direitos. Mas, a questão que subjaz a abordagem de Honneth (2002) está ligada ao fato concreto de que o reconhecimento é mais sentido pela sua ausência do que pela sua presença. Ou seja, tal noção só é percuciente epistemologicamente na sua forma negativa. O mesmo também é válido para uma fenomenologia do reconhecimento, dado que tal conceito é verificável empiricamente apenas em termos de déficit, de falta, de recusa. De modo que são as representações sociais da experiência de desrespeito que irão permitir inferir em que termos se constituem a auto-estima, o auto-respeito e o desrespeito que podem derivar tanto do reconhecimento, quanto de sua recusa.

De outra parte, nos termos das relações de reconhecimento social existe também um arbitrário cultural que privilegia as normas que constituem a identidade masculina em detrimento de uma identidade feminina. O que termina contribuindo para remeter as mulheres a uma condição subalterna. Mas, não estamos tratando somente da violência simbólica, mas principalmente das múltiplas formas de violência doméstica a que as mulheres são vitimadas. Tais situações de invalidação social irão repercutir no déficit de participação das mulheres na esfera pública, o que é atestado pelos depoimentos das mulheres ao exporem a resistência anteposta por seus maridos a sua participação nas associações. É aqui que o clamor por respeito invocado pela liderança feminina da associação da Vila Bom Jesus se configura num recurso fundamental para a afirmação e reivindicação dos direitos destes segmentos sociais. Ou seja, a demanda por respeito acaba configurando uma resposta prática às relações sociais de dominação tanto em relação à violência doméstica, quanto na reivindicação de reconhecimento social de sua existência enquanto setor organizado da população pelo estado, bem como demais estratos sociais dominantes no sentido da luta por dignidade.

 

A lógica do respeito e a esfera privada

Remetida à esfera doméstica, a lógica do respeito pode revelar uma gramática da honra dando conta da significação social que tal noção pode assumir nas sociedades contemporâneas. Se, em épocas pré-modernas, a questão da construção da identidade dos indivíduos constituía-se a partir das posições estatutárias diferenciadas que conformavam as relações sociais de reconhecimento determinadas a partir das posições ocupadas pelos indivíduos na estratificação social destas sociedades, nas sociedades contemporâneas, a noção de honra enquanto relação de reconhecimento social irá tipificar especialmente as sociabilidades que se verificam na esfera privada. Ou seja, no universo das sociabilidades primárias, as relações sociais tendem a ser caracterizadas por uma forte assimetria. A distinção de cada posição — definida pelo lugar ocupado nas relações de aliança e filiação e pela valorização hierárquica diferencial segundo o gênero masculino ou feminino nesta relação hierárquica — está relacionada à construção e preservação da honra que se configura no valor a partir do qual cada família se percebe e é percebida no seio de uma comunidade pelas outras famílias. Deste modo, o respeito à honra configura um conceito relacional e coletivo que delimita um agrupamento social, um grupo de pessoas concretas e não indivíduos abstratos. Portanto, a honra de alguém irá depender de sua postura ante ao conjunto hierarquizado de regras às quais está submetida. Concretamente, a honra masculina e a honra feminina estão relacionadas e seu lugar será a esfera privada. Desta forma, por exemplo, a eventual desonra da mulher estará associada à ruptura com os valores que preservam uma identidade feminina sacralizada no âmbito da família e hierarquicamente sujeita ao poder masculino. Na mesma medida, a manutenção da honra masculina estará remetida aos limites entre a esfera privada e a esfera pública estando ligada a sua função de provedor enquanto chefe de família.

Assim, a honra não se configura apenas numa relação de reconhecimento expressa na noção de respeito, mas também num capital social a ser preservado traduzido por um conjunto de signos bem visíveis, derivados de uma estrutura social desigual e hierárquica. Ou dito de outra forma, se por um lado às solidariedades familiares e comunitárias se constituem num elemento gerador de integração social, por outro, deve-se reconhecer suas coerções, principalmente no tocante a questão de gênero.

Não obstante, o engajamento associativo acabou concorrendo para romper com um determinado padrão cultural caracterizado pela dominação masculina no âmbito das sociabilidades primárias. A possibilidade de constituir novas relações sociais, de forjar um tipo de sociabilidade secundária no qual as hierarquias são reconfiguradas, a partir do questionamento da tutela masculina propõe uma nova inflexão à lógica do respeito em direção ao reconhecimento do princípio da dignidade e mesmo do princípio da autenticidade expresso no entendimento de que cada um de nós possui uma maneira própria de viver a vida, que deve ser experimentada de modo original e autêntico.

 

A construção da identidade

Abordaremos a questão da identidade a partir da configuração dos três registros a partir dos quais estamos desenvolvendo nossa análise, quais sejam: o registro da integração social, o registro da ação estratégica e o registro da subjetivação. No âmbito do primeiro registro, a identidade dos trabalhadores em associações de reciclagem de lixo se conforma a partir dos modos de inserção social predominantes no curso dos processos de socialização. Neste caso, a conformação da identidade de gênero é mais nítida na primeira associação, pois, tendo em vista que as associações são constituídas em sua maioria por mulheres, a admissão pode implicar na ruptura com as formas de sujeição preponderantes na esfera doméstica com a assunção de uma identidade de gênero. Esta questão é desenvolvida numas das associações, a partir da discussão de direitos, com o intuito de romper com as formas de discriminação e invalidação social das mulheres ainda presentes na comunidade. Entretanto, tal inflexão na definição de uma identidade de gênero permanece restrita nesta associação à redefinição das sociabilidades primárias, ou seja, trata-se de um movimento em direção ao espaço doméstico da comunidade, não engendrando formas de ação coletiva que sejam indexadas por outras categorias que não a de gênero, tendo em vista mesmo a extrapolação do universo da comunidade. Tais questões também são objeto de discussão na segunda associação, entretanto, ao invés de nelas ficar encerrada, há a definição da identidade no âmbito da racionalidade estratégica. É nestes termos que os trabalhadores desta associação reivindicaram o reconhecimento de sua identidade enquanto catadores, justamente para demarcar sua condição ante a outros possíveis termos de identificação marcados por uma acepção mais “neutra” ou mesmo técnica de sua ocupação. É interessante notar a representação que uma catadora faz sobre a palavra “trabalhador”: segundo seu entendimento seriam trabalhadores todos aqueles que possuem um salário fixo, o que de fato não contempla a figura daqueles que vivem ao sabor da incerteza numa situação extremamente precária. Assim, os catadores ao afirmarem sua identidade perseguem o reconhecimento de sua dignidade, bem como a própria condição de cidadão, que, do ponto de vista dos direitos sociais, lhes é negada.

Poder-se-ia relacionar ainda a teorização acerca do reconhecimento social com a afirmação identitária presente nas lutas levadas a cabo pelos catadores organizados nas associações de reciclagem de lixo. O que clama por reconhecimento nestes termos seria a identidade cultural específica de determinados grupos sociais, pois, o reconhecimento recusado se consubstancia na depreciação de tal identidade pelos indivíduos pertencentes aos grupos sociais dominantes e por conseqüência no dano moral infligido aos indivíduos pertencentes ao grupo social subalterno. A proposição da identidade de catador de lixo se inscreve num movimento que busca corrigir os efeitos nocivos e prejudiciais na auto-imagem dos trabalhadores em associações de reciclagem de lixo mediante a refutação do eventual conteúdo pejorativo desta imagem projetada pela representação cultural dominante. Mas tal reivindicação de uma identidade como a de catador passa ao largo de uma política identitária, pois não estamos tratando aqui propriamente da afirmação de identidades coletivas, mas antes, conforme Fraser (2001; 2003; 2005), do reconhecimento de um estatuto social. Ou seja, trata-se de uma determinada ordenação das relações sociais resultantes de padrões culturais institucionalizados que configuram um estatuto depreciado para alguns indivíduos e grupos sociais face aos indivíduos pertencentes aos grupos sociais dominantes nas interações sociais, estabelecendo desta forma um regime de interação hierárquico. Neste sentido, o reconhecimento recusado não implica necessariamente a depreciação e deformação de uma identidade coletiva, mas, sim, a sujeição e discriminação social, ou seja, o impedimento da participação igualitária na vida social. A reparação deste tipo de patologia social demanda uma política de reconhecimento, o que não significa propriamente a adoção de uma política identitária. Tal reivindicação de reconhecimento busca rever o processo de invalidação social presente num determinado estatuto social atribuído, para desta forma superar a discriminação e violência simbólica procurando recolocar determinados indivíduos, no nosso caso específico, os catadores de lixo, reconhecidos de maneira distorcida como membros de plenos direitos de uma sociedade que os avilta e despreza. Ou, dito de outra forma, com a reivindicação pelo reconhecimento de uma ocupação, enquanto catador de lixo, procura-se revisar as condições sociais que relegam determinados indivíduos a uma condição de subcidadania, de modo a possibilitar sua participação no mesmo patamar de igualdade dos outros cidadãos.

Assim, a questão do reconhecimento a partir do estatuto social demanda a avaliação dos padrões culturais institucionalizados que definem os contornos da posição social ocupada pelos indivíduos. Nas situações em que tais padrões configuram os indivíduos como pares, com as mesmas condições de participar no mesmo patamar que os demais na vida social, estaremos diante de um reconhecimento recíproco e, portanto, de um regime de interação igualitário. Entretanto, quando nos deparamos com padrões culturalmente institucionalizados que definem alguns indivíduos como estando numa permanente condição de déficit, como subalternos ou marginais ou ainda imperceptíveis conforme as representações sociais dominantes, por conseqüência, como algo passível de menoscabo, de descrédito e depreciação na comparação possível com os membros plenos na interação social, então estamos diante do reconhecimento recusado e de uma subordinação estatutária.

Recapitulando a configuração das lógicas da ação, podemos apresentá-las sinteticamente através da figura que segue logo abaixo, na qual são ressaltadas as formas de integração e inserção sociais predominantes nas duas associações investigadas, ou seja, as relações de solidariedade que resultam da efervescência produzida pela mobilização e engajamento nas lutas sociais estipuladas no regimento interno de uma associação, também conhecido como “base de acordos”, e as relações de solidariedade que derivam da ascendência carismática exercida por uma liderança comunitária sobre uma das associações; os processos de subjetivação, no qual há a afirmação de uma identidade de gênero, bem como a reivindicação do estatuto de catador(a) de lixo, e, que culminam no âmbito da racionalidade estratégica, nas lutas por reconhecimento destes segmentos sociais marginalizados e discriminados socialmente. Neste aspecto, trata-se da reivindicação pelo reconhecimento de um estatuto social afirmado a partir do compromisso individual dos catadores principalmente quando se trata da associação da Vila Cavalhada, pois, quando se trata da associação da Vila Bom Jesus, constatamos a presença de certo pragmatismo no campo de possíveis de algumas das catadoras entrevistadas que permanecem na associação apenas por não encontrarem alternativa melhor de geração de renda. Obtem-se, assim, a configuração mostrada na figura 1.

 

Figura 1 - Configuração das lógicas da acção

 

Ao mesmo tempo, a análise do reconhecimento recusado contribui também para revelar regimes de interação hierárquicos que se reproduzem através de padrões culturais institucionalizados historicamente, e cuja presença se manifesta quando a relação social é condicionada de modo a impedir a participação igualitária. Os exemplos de tais práticas se distribuem em formas variadas de estigmatização social e denunciam quanto a interação social pode ser regulada por um padrão cultural institucionalizado que constitui algumas categorias de indivíduos como aceitáveis, outras como discrepantes em relação à norma. Por conseguinte, o não reconhecimento implica quase que na interdição para alguns indivíduos do próprio estatuto da cidadania na medida em que não podem exercer seus direitos plenamente, participando nas interações sociais no mesmo patamar de igualdade que os outros cidadãos. E quando isso ocorre se configura uma forma de injustiça social passível de demandar a reivindicação pelo reconhecimento da igualdade ou da diferença. É neste sentido, que, para Fraser (2003), a política de reconhecimento deve desinstitucionalizar os padrões culturais que impedem a participação igualitária, ensejando as condições para torná-la possível. Para tanto, seria preferível tratar o reconhecimento a partir do modelo de estatuto concentrando-se nos efeitos das normas institucionalizadas sobre as capacidades de interação ao invés de reificar-se uma identidade coletiva.

 

Considerações finais

O fato associativo pode ser tratado sociologicamente como um fenômeno situado entre a esfera privada e a esfera pública (Laville, 1997), Ou seja, se na sua origem as associações surgem para responder a demandas coletivas, a sua simples constituição ultrapassa os limites das sociabilidades produzidas no âmbito dos grupos informais, porquanto ao se formalizar ela termina se inscrevendo na esfera pública. Nesses termos, as associações são confrontadas com a necessidade de justificar16 suas ações, seja em relação ao contexto no qual estão inseridas, seja internamente entre seus membros. A questão da justificação está relacionada aqui às lógicas presentes na ação coletiva das associações. Tratam-se de lógicas institucionais dado que elas balizam a ação para além dos limites da sociabilidade primária a partir da qual os indivíduos poderiam talvez, preferencialmente, se orientar. O imperativo da justificação é operado no âmbito das interações que produzem os acordos entre os membros que compõem a associação. Constitui-se, por conseguinte, numa abordagem operada nos termos de uma micro-sociologia. Agora, para operar noutro nível de mediação teórica com uma noção correlata, podemos pensar nas questões relacionadas à legitimação da associação. Na mesma medida, a dimensão institucional da associação pode ser teorizada a partir de Touraine (1973) como uma organização capaz de participar do sistema institucional e político de modo a exercer alguma influência sobre as decisões políticas, bem como sobre a elaboração de leis e normas que lhe afetam segundo a lógica de uma racionalidade estratégica. Ação política que configuramos como uma demanda ou luta por reconhecimento. Com efeito, uma associação não pode se restringir, tal qual uma empresa, a uma legitimação fundada apenas na produção de bens e serviços. A própria perenidade da associação irá demandar, em termos de sua legitimação, a produção de relações de solidariedade a partir da elaboração de regras cujo intuito será regular as relações entre seus membros. Ao mesmo tempo essas relações de solidariedade também produzem uma forma de reconhecimento relativa ao próprio pertencimento dos trabalhadores na associação.

Verificou-se também nas associações investigadas, a existência de uma acentuada diferenciação em relação aos regimes de interação predominantes. Na primeira associação, as relações sociais permaneciam acentuadamente pessoalizadas. Se a participação das mulheres na associação concorreu de algum modo para desnaturalizar a violência doméstica que marcava o espaço doméstico, rompendo em parte com os valores que a legitimavam, não se pode afirmar que tal participação não venha carregada das hierarquias que caracterizam as sociabilidades primárias. Pois, constatamos em vários depoimentos de membros desta associação, uma nítida dependência deles em relação à liderança da associação, que acaba encarnando uma figura materna e protetora não somente contra o despotismo masculino, mas também contra o mundo abstrato e impessoal das normas e leis situado além da comunidade onde se enraíza a associação. Aqui, a definição, proposta por Dumont (1999), de hierarquia enquanto uma relação social onde há o englobamento do contrário está presente nas representações das relações tramadas na associação feitas pelas catadoras. Pode-se dizer, portanto, que prepondera nesta associação uma sociabilidade híbrida marcada pela ênfase de um regime de interação hierárquico.

Diferentemente desta última associação, a associação da Vila Cavalhada é caracterizada por regime de interação mais igualitário. Isso ficou patente nos depoimentos recolhidos dos catadores pertencentes a esta associação. A ênfase colocada na participação, bem como uma postura infensa às hierarquias que definiam a própria relação da presidente da associação da Vila Bom Jesus estabelece um posicionamento crítico no tocante as relações de poder e mando suscetíveis de caracterizar um espaço social marcado pela desigualdade e pela escassez material. De outra parte, esta associação constitui, nas palavras de seus associados, uma “base orgânica” do MNCR, o movimento nacional dos catadores de lixo. Tal alinhamento político se traduz, em termos da regulação das relações internas da associação, na definição — bastante enfatizada nas entrevistas pelos membros desta associação — de uma “base de acordos”, cuja função não se resume à regulação dos conflitos internos, tal como observado na primeira associação. Mas, trata-se antes de um documento político que busca estabelecer a autonomia, a participação avessa a todo tipo de hierarquia e a democracia direta como pressupostos da organização das associações ligadas a este movimento social. Tal documento distribuído a todos os associados contribui, nos termos de uma pedagogia política, para socializar os catadores que ingressam nesta associação numa cultura política de intenso engajamento e solidariedade de classe em relação a outros movimentos sociais com os quais a associação como “base orgânica” do MNCR mantém relação. Nestes termos, esta associação não se constitui apenas numa estratégia de subsistência para os moradores da Vila Cavalhada, mas também, numa forma de nucleação política de um segmento da população urbana marginalizada e discriminada socialmente. A “base de acordos” joga desta forma, um papel chave para converter estes trabalhadores, cuja trajetória ocupacional é caracterizada por um processo de desfiliação social, para utilizarmos a expressão de Castel (1998), em atores políticos. Na sua maior parte, nunca tiveram registro formal de trabalho, e antes do reconhecimento de sua ocupação, sequer eram contabilizados no contingente da população economicamente ativa do país. Ao se tornarem atores da sua própria existência, passam a se definir pela não conformidade em relação ao lugar que ocupam na estrutura de uma sociedade desigual e buscam alterar o contexto material e social no qual estão situados. Passam então a questionar a divisão do trabalho, os processos de decisão, as relações de dominação e mesmo as representações culturais hegemônicas buscando tornar-se senhores da sua própria história.

 

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Notas

1 Carroceiros e carrinheiros avulsos cujo trabalho consistia na coleta e reciclagem do lixo; mulheres ocupando formas variadas de subemprego; jovens que encontram na associação a primeira experiência de trabalho.

2 Trata-se de duas associações de reciclagem de lixo onde foram aplicados um total de 39 questionários semiestruturados: na época em que foram realizadas as entrevistas (segundo semestre de 2003) a associação da Vila Bom Jesus possuía 120 trabalhadores associados. Já a associação da Vila Cavalhada contava com 52 trabalhadores associados. A identificação de cada associação foi alterada para resguardar o anonimato dos informantes. Ambas associações estão localizadas no município de Porto Alegre.

3 Optamos aqui por “encaixe”, para expressar em português a noção de embeddedness. A sociologia francesa utiliza majoritariamente o termo encastrement, muito embora também seja aceito o termo enchâssement. Para mais detalhes ver os trabalhos de Polanyi (2000), Granovetter e Swedberg (1992), e Le Velly (2002).

4 Ver Dubar (1997: 87).

5 Alógica da integração encontrará sua primeira formulação teórica na sociologia durkheimiana.

6 Trata-se de situações caracterizadas pela ausência de perspectivas, de projeto individual ou coletivo que podem derivar da crise das formas de inserção social, seja pelo desemprego de longa duração, seja pela ruptura das relações de solidariedade primária. Sobre os processos de invalidação social, ver Castel (1998).

7 Aação é estratégica quando é ponderada a partir de critérios de escolha racional e da observância do grau de influência sobre as ações de outros atores sociais. Neste sentido, as relações sociais tambémpodemser percebidas a partir do modelo do mercado, porém, nãopodemser reduzidas a esta única dimensão de racionalidade. Ver Dubet (1996: 126), Dubet e Martuccelli (1999: 83) eHabermas (1987: 367).

8 Conforme Weber (1990).

9 Aqui a noção de uma solidariedade serial é correlata do conceito durkheimiano de solidariedade mecânica, e, neste sentido, a comunidade pode partilhar uma moralidade e valores comuns, de modo a configurar o que poderíamos chamar de uma consciência coletiva que coalesce os vínculos sociais.

10 Tal movimento de organização dos catadores de lixo já possui expressão latino-americana com a realização em janeiro de 2005 do II.º Congresso Latino-Americano de Catadores de Materiais Recicláveis em São Leopoldo-RS.

11 As noções de solidariedade serial e fusional embora tenham sido inspiradas originalmente em Sartre (2002), não conservamo mesmo significado conceptual enunciado n’A Crítica da Razão Dialética. Para maiores detalhes, ver Bajoit (1992).

12 Ver Souza (2000).

13 Muito embora, estes dois autores enfatizem a questão do reconhecimento em suas elaborações teóricas, tal demanda se faz, nos casos investigados, sempre conjugada com as lutas por redistribuição. Para um aprofundamento desta discussão ver a abordagem encetada por Fraser (2001; 2005).

14 Para uma abordagem crítica do modelo de ação dramatúrgica ver Habermas (1987: 131-136).

15 Segundo Goffman (1996: 148), a participação numa organização implica de partida compromisso e adesão.

16 Segundo Boltanski e Thévenot (1991), as condições de possibilidade de toda ação humana repousam sobre um imperativo de justificação para que sejam coordenadas ações em comum. Ou seja, as pessoas devem justificar seus atos aduzindo princípios de justiça consentâneos aos diferentes espaços sociais em que estão inseridas.

 

*Ricardo Mayer. Doutor em sociologia, professor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade Federal de Alagoas. E-mail: r.mayer@laposte.net.

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