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Sociologia, Problemas e Práticas

versión impresa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  n.60 Oeiras mayo 2009

 

Infância e risco social

Retratos da imprensa portuguesa

Maria João Leote de Carvalho* e Levina Ferreira**

 

Resumo

Neste artigo apresentam-se os primeiros resultados de um projecto de investigação sobre a cobertura noticiosa de crianças em risco social na imprensa diária portuguesa em 2005. Nos quatro jornais em estudo constatou-se uma construção de peças semelhante em função da prevalência dos temas, sendo evidente a tensão existente na conciliação do direito ao exercício da liberdade de informação e do direito à intimidade e reserva da vida privada da criança. A manutenção das fronteiras entre o denunciar e o expor, assim como o exercício de uma cidadania mais pró-activa por parte dos leitores acabaram por se revelar ainda demasiado frágeis neste contexto.

Palavras-chave infância, risco social, comunicação social, cidadania, direitos das crianças.

 

Childhood and social risk: images from the Portuguese press

Abstract

In this article are presented the first results of an investigation project about the press covering of children in social risk in the Portuguese press in 2005. In the first four journals was found a similar construction of the articles based on the prevalence of the subjects and it was obvious the existing tension between the conciliation of the right to free information and the right to intimacy and preservation of the private life of the child. The boundaries between accusation and exposition as well as a more pro-active activity revealed by the readers are still too fragile in this context.

Key-words childhood, social risk, mass media, citizenship, children’s rights.

 

De l’enfance et du risque social: portraits de le presse portugaise

Résumé

Dans cet article nous présentons les premiers résultats d’un projet de recherche sur la quantité d’information sur les enfants qui se trouvent en situation de risque social, dans la presse quotidienne portugaise en 2005. Dans les quatre journaux que nous avons étudiés, nous avons constaté une construction de pièces semblable, en fonction des thèmes qui prédominent, en étant évident la tension qui existe dans la conciliation du droit à l’exercice de la liberté de l’information et du droit à l’intimité  en préservant la vie privée de l’enfant. La gestion des frontières entre la délation et l’exposition, ainsi comme l’exercice d’une citoyenneté plus active se sont revelés encore trop fragiles dans ce contexte.

Mots-clés enfance, risque social, communication sociale, citoyenneté, droits des enfants.

 

Infancia y riesgo social: retratos de la prensa portuguesa

Resumen

En este artículo se presentan los primeros resultados de un proyecto de investigación sobre la cobertura noticiosa de niños en riesgo social en la prensa diaria portuguesa en 2005. De los cuatro periódicos en estudio se constató una construcción semejante de piezas, en función de la prevalencia de los temas, siendo evidente la tensión existente en la conciliación del derecho al ejercicio de la libertad de información y el derecho a la intimidad y reserva de la vida privada del niño. La permanencia de las fronteras entre la denuncia y la exposición, así como, el ejercicio de una ciudadanía más pro-activa por parte de los lectores se revelaron aún muy frágiles en este contexto.

Palabras-llave infancia, riesgo social, comunicación social, ciudadanía, derechos de los niños.

 

Introdução

Em contextos marcados por paradoxos, incertezas e riscos socialmente produzidos, procura-se informação e orientação junto de especialistas e sistemas periciais nos quais se deposita confiança (Giddens, 1991). As notícias produzidas pelos média em torno da infância surgem como um dos territórios de conhecimento onde têm lugar vozes organizadas, fontes públicas e institucionais de diferentes áreas, e constituem uma porta de acesso privilegiado a temáticas que, de outra forma, estarão distantes de muitos indivíduos e grupos (Ponte e Afonso, 2008). Deste modo, não é de estranhar a importância crescente dos média na informação e sensibilização das comunidades para os problemas sociais que afectam crianças, através da visibilidade dada a situações que, mesmo em tempos recentes, não eram objecto de notícia.

As questões em torno dos riscos sociais que atravessam a condição da infância têm vindo a ocupar um lugar central de discussão junto da opinião pública na sociedade portuguesa. Tal é manifesto na emergência de discursos de natureza diversa que apontam para um vasto leque de percepções, práticas e atitudes individuais e colectivas. A vivência quotidiana está impregnada de representações acerca desses riscos, que surgem como fonte de informação constante na comunicação social de acordo com linhas de orientação diferenciadas, e sob as mais variadas formas, independentemente do grau efectivo de conhecimento científico que se possua a seu respeito.

As sucessivas (re)construções sobre o conceito de infância reenviam para diversas formas de conhecimento da realidade social, reflectindo os passos de uma evolução entendida à semelhança de um percurso de vida que se vai manifestando nas múltiplas condições de ser criança em contextos histórica e socialmente definidos. Se, por um lado, não se contesta actualmente a sua relevância, o estatuto social que, ao longo dos tempos, esteve reservado à criança apresentou fortes variações: de sujeito ignorado a objecto sacralizado da civilização em diversas partes do mundo; simplesmente um bem ou valor económico noutras. Neste conjunto de situações, algumas das quais diametralmente opostas, nas sociedades contemporâneas as crianças são titulares de direitos próprios cuja negação ou violação poderá corresponder à aplicação de sanções.

Em Portugal este estatuto parece colocar-se com uma cuidada certeza em diversas áreas, com uma especial incidência para o plano sociojurídico, onde se vêem consagrados direitos à luz de princípios definidos internacionalmente. No entanto, como entre o legislado e o vivido quotidianamente em muitos contextos existe uma grande distância, com este artigo pretende dar-se a conhecer os primeiros resultados de um projecto de investigação centrado na problematização da cobertura jornalística sobre infância em risco social na imprensa portuguesa em 2005.1

Infância e risco social

Os olhares sociológicos desenvolvidos acerca da infância nas sociedades ocidentais têm vindo a destacar um certo paradoxo: quanto menor é o seu peso demográfico no total da população, maior parece ser o interesse sobre a sua situação. Pode afirmar-se que quanto mais os adultos dizem desejar e gostar de crianças, cada vez são menos as que nascem e é reduzido o tempo de que dispõem para estar com elas (Qvortrup, 1999). Este interesse sobre a infância remete para uma valorização construída à luz de factores de natureza sociopolítica que trazem à superfície um conjunto de problemáticas que mais afectarão as crianças. A representação social da infância moderna está enquadrada por um conjunto de princípios relativos ao exercício de uma cidadania plena que a todos sugere uma definição de “bem-estar infantil(Almeida, 2000: 20). Contudo, as dificuldades começam quando, partindo do próprio ponto de vista das crianças, se percebe como esse bem-estar é um dado longe de estar adquirido por muitas (Carvalho, 2004).

Nesta dualidade entre o individual e o social emerge uma ambiguidade estrutural das sociedades, tornando-se necessário entender as razões que levam as trajectórias de muitas a serem atravessadas por problemas sociais de ordem diversa quando, paradoxalmente, nunca como agora se dispôs de tanta informação e de tantos meios para efectivar a melhoria das condições de vida de todos os grupos da população (Wyness, Harrison e Buchanan, 2004).

Em sociedades fortemente mediatizadas os sistemas simbólicos adquirem uma função primordial na ordenação das questões sociais e das visões colectivas sobre o mundo, constituindo parte fundamental da própria realidade. Ultrapassa-se neste posicionamento a questão de saber se são os riscos que, objectivamente, terão aumentado ou se, antes pelo contrário, o que se verifica é a intensificação e alargamento da sua percepção (Beck, 1992). Porque um e outro ponto representam duas faces de um mesmo objecto, a análise social sobre a infância terá de atender à convergência e ao cruzamento entre ambos.

Mais do que o eventual aumento dos riscos sociais, aquilo a que se poderá estar a assistir nos dias de hoje será antes a um potencial aumento da sua representação no quotidiano, em função da crescente visibilidade que certos actos adquirem, em parte fruto de uma mediatização permanente (Beck, 1992). A explosão de uma sociedade mediática com acesso massivo, e em simultâneo, à mesma informação em qualquer ponto do mundo, acarreta a divulgação e promoção de estilos de vida, superando-se em todos os aspectos os limites da territorialidade. Os modos de vida na contemporaneidade estruturam-se em torno de um ideal de ordem social que se afasta dos tradicionais e onde a transnacionalização dos problemas sociais e a percepção de risco são determinantes.

Em certos casos, como no da sociedade portuguesa, o risco será mais percepcionado e vivido como uma ameaça do que como uma oportunidade ou desafio. Tal decorrerá de uma enfatização do processo de politização dos riscos com consequências morais e políticas (Carapinheiro, 2001), emergindo a ideia de que a “sociedade de risco” se converterá, potencialmente, na “sociedade da catástrofe”, na medida em que muitos dos riscos só são debatidos politicamente e só ganham visibilidade quando os efeitos da sua disseminação já se consolidaram (Beck, 1992).

Regulação da cobertura jornalística sobre infância

Se até ao início da década de 1980 a protecção da infância e a administração da justiça tutelar de menores eram assuntos da competência única dos estados, não existindo documentos no plano internacional que favorecessem uma concertação relativamente a intervenções a desenvolver, as duas décadas seguintes foram decisivas para inverter esta situação. Desde então regista-se uma significativa produção de textos fundamentais de cariz supranacional, que apontam para uma nova representação da condição social da criança, na qual se evidencia a necessidade de garantir melhor a promoção e a protecção dos seus direitos. Nesta linha, diferentes instrumentos internacionais vieram a ser adoptados em Portugal, visando assegurar a aplicação de princípios fundamentais de liberdade, igualdade, legalidade e privacidade nas intervenções a desenvolver no campo da infância.

Neste conjunto de normativos alguns destacam o papel dos média no enquadramento da cobertura jornalística da infância, trazendo à superfície uma série de preocupações até então pouco debatidas (isto é, os direitos de participação, consentimento e audição das crianças e a difusão de informação relativa à prevenção de riscos sociais) e linhas de orientação concretas pelas quais se devem guiar (isto é, protecção da identidade e reserva da vida privada). Estão neste caso as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores-Beijing (1985), a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (1989), as Directrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil-Riade (1990) e as Recomendação N.º R (1993)2, Rec(2001)16, Rec(2003)13 e Rec(2005)5 do Conselho da Europa relativas, respectivamente, a aspectos médico-sociais do mau-trato infantil, à protecção das crianças contra a exploração sexual e à difusão de informação sobre processos penais e aos direitos das crianças acolhidas em instituição. Decorrentes dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ONU, 2000) foram adoptados dois protocolos facultativos, um sobre o envolvimento de crianças em conflitos armados, outro sobre venda de crianças, prostituição e pornografia infantil. Neles foram estabelecidas medidas que asseguram a consagração de direitos de protecção das crianças envolvidas nestas situações e, simultaneamente, evidencia-se a importância dos média no desenvolvimento de uma acção preventiva concretizada pela difusão de informação específica sobre as mesmas.

As intervenções sociais e judiciárias que estas problemáticas suscitam em Portugal vêm a realizar-se no quadro de uma jurisdição especial de protecção da infância, que integra os princípios e normas consagrados em diversos diplomas internacionais e outros nacionais, como a Constituição da República Portuguesa e o Código Civil Português. Duas novas leis sobre a infância foram aprovadas pela Assembleia da República, em 1999: a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (Ministério do Trabalho e da Solidariedade) e a Lei Tutelar Educativa (Ministério da Justiça). Tendo entrado em vigor no dia 1 de Janeiro de 2001, ambas têm subjacente um novo paradigma que visa a promoção de intervenções claramente diferenciadas: de protecção junto de crianças vítimas de diversas circunstâncias pessoais e sociais; de responsabilização e de “educação para o direito para aquelas que, com idade igual ou superior a 12 anos e inferior aos 16, tenham praticado factos que, à luz da lei penal, seriam considerados crimes.

No que diz respeito à cobertura jornalística as leis são claras, impedindo qualquer divulgação de dados que permita a identificação de crianças em perigo ou envolvidas em práticas ilícitas, sob pena de os seus agentes incorrerem na prática de crime de desobediência. As restrições não se limitam às relações dos órgãos de comunicação social com o tribunal e com as comissões de protecção (actos processuais), mas abrangem todas e quaisquer situações enquadradas pelos respectivos sistemas. Como aponta Bolieiro (2005: 206), estas “limitações à publicidade que aqui se pretendem preservar têm como justificação primeira, não a concretização do interesse público da administração da justiça, em ordem a uma eficaz investigação e acção processual de promoção e protecção, mas a tutela de direitos fundamentais da criança e do jovem”.

Decorrente da produção legislativa mencionada algumas entidades mais directamente ligadas ao jornalismo vieram a mostrar a sua preocupação nesta área, sobretudo a partir da década de 1990. A Federação Internacional de Jornalistas adquiriu um maior protagonismo através da produção de documentos como Prime Time for Children: Media, Ethics and Reporting Sexual Exploitation (1996), que surgiu na sequência do Congresso Mundial sobre Exploração Comercial e Sexual das Crianças, realizado em Estocolmo. Dois anos mais tarde foi apresentada a resolução Information and Child Rights: the Challenge of Media Engagement (1998), aprovada na Conferência Mundial que decorreu no Recife. Nela identificaram-se os principais contornos a observar na cobertura jornalística sobre infância a nível mundial e traçaram-se linhas de orientação legislativa. Para além disso foram analisados os códigos deontológicos de 54 países, constatando-se que era reduzido o número daqueles que continham orientações expressas para esta área. Foi também reconhecido que entre os profissionais de informação era escasso o conhecimento sobre a Convenção sobre os Direitos da Criança e sobre outros documentos legais, pelo que, no ano 2000, foi lançado um programa para três anos, Journalism 2000: Child Rights and the Media, através do qual se procurou colmatar grande parte das lacunas sentidas. Neste âmbito, foi produzido um documento orientador de fundamental importância, o guião The Media and the Child Rights.

Perpassa por todos estes documentos a assunção da responsabilidade social dos jornalistas através do exercício da função central de informar, ao que se associa o dever de identificar quer falhas, quer aspectos positivos no campo dos direitos humanos. Na tentativa de dar corpo a estas preocupações começaram a surgir diversas organizações em torno dos média, das quais se salientam a MediaPress, no Reino Unido, e a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI), no Brasil. A nível nacional destacam-se as orientações do Sindicato de Jornalistas e do seu Conselho Deontológico e da Alta Autoridade para a Comunicação Social, nomeadamente sobre abuso sexual, acolhimento institucional e delinquência. Fica a ideia de que não será por falta de normativos nacionais e internacionais que no tratamento noticioso dos temas relacionados com crianças os seus direitos não são respeitados.

O projecto “Crianças e Jovens em Notícia”

Animados pela Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), vários movimentos sociais têm vindo a pugnar por uma maior visibilidade e debate das questões que envolvem a infância, e diversos estudos nacionais e internacionais apontam para o aumento de notícias sobre crianças nas páginas de jornais de informação geral e nos noticiários de televisão desde essa altura (Ponte e Afonso, 2008). Em sociedades marcadas pelos “paradoxos da infância” (Qvortrup, 1999) emerge uma ambivalência entre a retórica de discursos públicos que fazem a apologia do ideal romântico da criança e do seu lugar na família, e as práticas políticas, económicas e sociais que dificultam o seu bem-estar. Seja associadas a uma condição de vitimação, seja no lugar de agentes (culturas da infância), as crianças tornaram-se um pólo de atracção para os média. A informação produzida tende a reflectir uma certa contaminação pela lógica do espectáculo, assistindo-se também ao crescimento de um “discurso do medo”, onde são especialmente valorizadas como objecto de preocupação e ansiedade parental (Altheide cit. em Ponte e Afonso, 2008).

É neste enquadramento que se situa o projecto “Crianças e Jovens em Notícia” aprovado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (POCTI/COM/60020/2004) 2 e assegurado por uma equipa de investigadores de diferentes áreas e instituições. 3 Trata-se de uma pesquisa que assentou em duas linhas de orientação: 1) analisar e problematizar a produção dos média em notícias relacionadas com a condição da infância e juventude em Portugal; 2) identificar e analisar os modos e formas de recepção dessa mesma produção por parte de crianças e jovens em diversos contextos sociais.

Neste artigo dá-se a conhecer alguns dos resultados obtidos na primeira linha de orientação, definida na continuidade de uma pesquisa longitudinal realizada anteriormente sobre a noticiabilidade das crianças (0-14 anos) na imprensa portuguesa de informação geral, no período compreendido entre 1970 e 2000. Em intervalos de cinco anos analisou-se então o Diário de Notícias tendo-se incluído no último ano o Público (Ponte, 2005).4 Essa pesquisa evidenciou linhas de mudança e de continuidade nos tempos sociais e nas considerações sobre a infância e assinalou um notório aumento do número de peças nos anos mais recentes, 1995 e 2000, sobretudo centradas em questões de educação e de risco social. Partindo dos resultados aí obtidos, procurou-se actualizar a análise das notícias sobre crianças publicadas nesses dois jornais “de referência” mantendo o intervalo de cinco anos, o que levou à selecção do ano de 2005. Simultaneamente, pretendeu-se ir um pouco mais longe, trazendo para a pesquisa outros dois jornais, ditos “populares”, o Jornal de Notícias e o Correio da Manhã. Nesta linha, quis-se averiguar se nesta cobertura sobre crianças e infâncias teria sentido falar de uma imprensa de referência e de uma imprensa popular, com diferentes escolhas temáticas e formas de tratamento.

Porque o conceito de criança não é uniforme em todas as áreas de intervenção, optou-se por adoptar o que está definido na Convenção sobre os Direitos da Criança e que constitui direito interno português, ainda que com discrepâncias relativamente à sua aplicação, como acontece com a idade de imputabilidade penal (16 anos).5 A pertinência desta opção residiu na necessidade de abordagem destes aparentes paradoxos em torno dos diferentes posicionamentos que a criança adquire em diferentes campos de acção.

Dada a pluralidade de formas e meios de se viver a infância, definiram-se seis grandes áreas para análise: “risco social”; “educação”; “comportamentos, culturas e consumos”; “saúde, assistência e população”; “prevenção e segurança”; “insólitos e fait-divers”. Cada uma constituiu um ângulo de visão privilegiado sobre o objecto de estudo, tendo uma certa correspondência com as categorias definidas no estudo anterior, necessariamente reformuladas à luz das mudanças sociais em curso, reflectidas em estudos e estatísticas nacionais e internacionais.

Relativamente ao “risco social” a abordagem centrou-se nas situações e problemáticas em que a vida das crianças ou o seu bem-estar e desenvolvimento físico, psíquico e emocional se encontravam em risco por influência do meio social, e onde se incluíam os casos definidos por lei, relativos aos sistemas de promoção e protecção e tutelar educativo. Como refere Santos (2001), as mais recentes (re)configurações do tecido social português assentam em patamares que são, simultaneamente, de sobreposição e de integração numa dada comunidade, mas também de fragmentação social pelas pertenças paralelas a diferentes grupos, de massificação e ao mesmo tempo de individualização, de selecção e exclusão social. É a gestão complexa das associações nestes diferentes patamares em torno de diferentes pertenças que surge como um dos riscos mais importantes a que importa atender quando se centra o olhar na infância. Assim sendo, para este estudo levantaram-se as seguintes questões orientadoras:

  • que representações da(s) infância(s) em risco social surge(m) representada(s) na imprensa diária em Portugal?
  • que situações nacionais e internacionais emergem nessas peças?
  • quais os contornos da sua construção por jornal?

Pela necessidade de procurar leituras dinâmicas da realidade social, na operacionalização da investigação articularam-se metodologias quantitativas com outras de carácter mais qualitativo, ainda que neste artigo a apresentação de resultados se centre apenas na abordagem quantitativa de algumas das áreas abordadas.

Aspectos metodológicos

Como procedimento prévio à recolha e à sistematização da informação, optou-se por criar um quadro categorial cuja definição de variáveis e respectivas modalidades resultou de pesquisa bibliográfica sobre as problemáticas em estudo, tendo sido estabelecidas duas dimensões de análise: uma relativa ao estilo jornalístico das peças, cujas variáveis são comuns aos restantes temas da investigação mais alargada;6 outra de carácter sociológico, na análise dos riscos sociais apresentados a partir dos traços de caracterização dos contextos e das crianças neles retratadas.7

Com vista à recolha dos dados levada a cabo por uma técnica da área das ciências da comunicação seleccionaram-se as peças de informação e de opinião nas edições diárias dos quatro jornais que focavam situações e eventos que envolvessem directamente crianças, com idade até aos 18 anos, na qualidade de protagonistas ou quando afectados pela intervenção directa de algo ou de alguém. Foram também considerados estudos, estatísticas e outros conteúdos sobre a situação da infância. Uma vez que a tendência gráfica dos jornais é para uma fragmentação da informação pela página, agregando à peça chamadas, destaques, gráficos e outros estímulos visuais, houve que dar uma particular atenção ao processo de delimitação da unidade de redacção. Desta forma, a delimitação da peça aqui definida como unidade de redacção e de contagem decorreu da autonomia do seu conteúdo: informação ou comentário sobre um determinado tema. Um mesmo material de base, de carácter informativo, ainda que apresentado em textos separados, foi contabilizado apenas uma vez quando teve por base a mesma forma de tratamento noticioso, o que permite que seja possível sublinhar o espaço que lhe foi atribuído nos jornais. Neste caso, a peça é identificada pelo título principal. De assinalar que foram excluídos desta opção os textos jornalísticos de opinião (comentários de colunistas, editoriais, etc.), de forma a que fosse possível dar conta de um tipo de texto de carácter diferente do informativo, que avalia ou comenta a situação. Essa unidade de redacção foi contabilizada singularmente e apresentada como conectada à unidade informativa.

De acordo com os critérios definidos seleccionou-se o ano de 2005, considerando todas as edições dos jornais compreendidas entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro. Na sequência da codificação previamente estabelecida, os dados de 5421 peças recolhidas foram introduzidos pela mesma técnica numa base informática em SPSS. O tratamento da informação ficou a cargo das autoras deste artigo que, para tal, seleccionaram as peças existentes sobre o risco social (2161) e, após vários procedimentos de validação dos dados recolhidos, inclusivamente através da consulta das próprias peças, procederam ao tratamento da informação, numa primeira fase, pela análise estatística univariada e bivariada (tabelas cruzadas simples). Num segundo momento, e à luz dos resultados obtidos nas anteriores análises, procedeu-se à estatística multivariada (ANDAD). Dada a natureza das variáveis (nominais), optou-se pela análise factorial de correspondências múltiplas, que evidencia a estrutura interna dos dados e o modo como as variáveis se tendem a associar entre si: se numa perspectiva de proximidade, quando é maior a probabilidade de haver uma associação, se de afastamento, quando ocorre o contrário. A informação obtida é apresentada sob a forma de gráficos factoriais que resultaram da análise e da selecção das variáveis estatisticamente significativas, tendo em linha de conta a variância explicada pelos eixos, as contribuições absolutas e as contribuições relativas de cada categoria (Lisboa e Roque, 2006). Assim sendo, ficou de fora um leque considerável de indicadores estatisticamente menos pertinentes. O nível de variância obtido foi elevado.

O corpus em análise

No conjunto dos quatro jornais, o tema “risco social destaca-se claramente dos restantes cinco, representando cerca de 40% do total das peças recolhidas.8 Seguem-se os temas “educação” (23,9%), “comportamentos, culturas e consumos” (11,4%) e “saúde, assistência e população” (10,9%), “prevenção e segurança” (8,4%) e “insólitos e fait-divers” (5,5%).

Para todos os jornais, o “risco social” é o mais representado: perto de metade das peças no CM (48,4%), à volta de um terço no DN (33, 8%), e valores próximos no PB (36,8%) e no JN (34,4%). No entanto, quando se passa à estatística bivariada (tabelas cruzadas simples),  observando a diferença entre valores obtidos (N) e esperados (VE), regista-se que o CM é o único onde o “risco social” aparece sobrerrepresentado.

Em todos os jornais a “educação” surge em segundo lugar, ainda que no PB, no DN e no JN se verifique a sua sobrerrepresentação. É no PB (32,9%) que se encontram os valores mais altos, seguindo-se o DN (27,8%) e o JN (27,1%). No CM (14,6%), a sua expressão é muito mais baixa e os valores obtidos ficam significativamente abaixo do esperado.

O terceiro tema no corpus diz respeito a “comportamentos, culturas e consumos”. Contudo, só no DN e no JN aparece, de igual modo, em terceiro lugar, e em ambos ligeiramente acima do esperado. No PB aparece na quarta posição, depois das peças sobre “saúde, assistência e população”, e no CM em quinto, a seguir às de “saúde, assistência e população” e às de “prevenção e segurança”.

Se bem que os dois temas mais representados no corpus, “risco social” e “educação”, surjam numa mesma ordem nos quatro jornais, a sua variação em termos de peso relativo, assim como a diversidade de opções relativamente às restantes categorias, aponta para a existência de linhas de orientação editorial diferenciadas: se no CM é o “risco social” que se evidencia, nos restantes é a “educação”.

 

Quadro 1 - Distribuição das peças por tema principal, por jornal

 

Passando a centrar o interesse apenas nas 2161 peças sobre “risco social”, 19,3% são do PB, 13,3% do DN, 23,6% do JN e 43,7% do CM. Esta variável abrange doze temáticas definidas em função da natureza dos problemas sociais que lhes estão associados, tendo como pano de fundo, em larga medida, o definido nos quadros legais reportados à condição da infância em Portugal (figura 1).

 

Figura 1 - Risco social: distribuição das peças, por categorias

Fonte: Projecto "Crianças e Jovens em Notícia", Carvalho (2007).

 

Existem três temáticas que claramente se distanciam das restantes, correspondendo, em conjunto, a 74,1% do total: “violência sexual” é a mais representada (27,4%), seguida da “delinquência” (24,1%) e das “negligências, maus-tratos e abandono” (22,7%). Por ordem decrescente do valor percentual manifesto surgem depois as categorias de “vítima de guerras e/ou catástrofes naturais”, “criança objecto de disputa”, “funcionamento do sistema de protecção”, “crianças em instituição”, “outros riscos sociais”, “pobreza”, “tráfico de crianças”, “adopção” e “trabalho infantil”.

Esta definição de categorias resultou de um processo prolongado no tempo, em que se levantaram algumas questões nem sempre fáceis de ultrapassar. A mais complexa diz respeito à necessidade de colocar lado a lado duas linguagens, a jornalística e a jurídica que, debruçando-se sobre uma mesma realidade, recorrem a diferentes ângulos de observação, não sendo sempre coincidente o uso dos mesmos termos. Este foi um problema detectado em situações noticiadas pelos jornais, como maus-tratos ou negligências que, juridicamente, configurariam situações de outra natureza. Ainda que não se pretendesse uma análise da informação estritamente centrada nos quadros legais vigentes, a sua importância para a qualificação dos casos é determinante, não só para o estabelecimento de prioridades como para a percepção dos contornos da realidade social. Assim, teve de se agregar numa só categoria as negligências, os maus-tratos e o abandono”, casos que juridicamente são diferentes, mas cuja análise se revelava difícil de obter em separado pela não coincidência de significados. Optou-se, logo à partida, por daqui excluir os actos com cariz sexual explícito na notícia, incluindo-os noutra, a de “violência sexual”, por se tratar de situações em que à violência física e/ou emocional se sobrepõe uma de natureza sexual.

 

Quadro 2- Risco social: temáticas, por jornal

Fonte: Projecto "Crianças e Jovens em Notícia", Carvalho (2007)

 

Recorrendo à estatística bivariada (tabelas cruzadas simples) para conhecer a distribuição das temáticas por jornal, a “violência sexual”, apesar de ser a categoria mais expressiva em termos absolutos, é também sobrerrepresentada, no PB (30,6% do seu total) e no CM (28,8%). Em termos globais, a segunda é a “delinquência”, muito acima dos valores esperados no JN (29,7%). Tanto no PB (20,8%) como no CM (24,7%) surge como segunda temática, enquanto que no DN ocupa o terceiro lugar. Digno de registo, o facto de no CM o número de peças sobre este tema ficar dentro dos valores esperados e abaixo no PB e no DN. A terceira mais representada no geral é a de “negligências, maus-tratos e abandono”. No entanto, para o DN ocupa uma posição de destaque com o primeiro lugar no total das suas peças (29,3%); para os restantes, é o terceiro tema mais abordado, ainda que no PB acima dos valores esperados, enquanto nos outros dois acontece o inverso.

O tsunami no Sueste Asiático no final do ano de 2004 acaba por se reflectir nas notícias centradas na categoria “vítima de guerra e/ou catástrofes naturais”, a quarta mais expressiva, ainda que com valores muito distanciados das três primeiras. Mais de dois terços destas peças dizem respeito a situações decorrentes desse acontecimento, sendo muito poucas as relativas a guerras, essencialmente em países africanos, ou de catástrofes naturais em diferentes pontos do globo. Para os jornais de referência (PB e DN) esta categoria assume a quarta posição, no JN está fora dos cinco primeiros lugares e no CM é a quinta.

A seguir surgem as peças sobre “crianças objecto de disputas”, fundamentalmente por parte de familiares. Independentemente do jornal, trata-se de uma categoria em que para cada caso abordado foi, tendencialmente, identificada mais do que uma peça. Nota-se uma preocupação sobre a evolução dos processos, iniciando-se a abordagem com uma descrição ou denúncia, ao que se seguem outras notícias durante as semanas seguintes, que relatam o desenrolar do caso até se chegar a uma aparente resolução. Em alguns, fica-se por um impasse, deixando então de constituir motivo de atenção. De entre estes, realça-se que um dos mais mediatizados em 2007 — “Esmeralda”— tenha sido objecto de notícia em 2005, na altura com destaque para a decisão judicial de entrega da menina ao pai biológico, sugerindo-se como ilegal o processo de acolhimento anterior. O CM é o jornal que mais destaque dá a este tipo de abordagem, tendo-o como quarto tema mais representado. Em todos os outros não está sequer nos cinco primeiros lugares.

Numa primeira leitura salienta-se que o PB e CM apresentam as três primeiras categorias na mesma ordem, tal como elas se apresentam em termos globais, variando nas duas seguintes. O JN coincide na escolha do segundo tema com o DN e na do terceiro com PB e CM, mas varia em todos os outros, sendo o único que apresenta uma não representada pelos restantes na quinta posição. O DN não coincide com qualquer outro jornal na ordem de representatividade dos seus primeiro e terceiro temas, mas apresenta no quarto e quinto lugares o mesmo que o PB. Globalmente, dos doze temas, sete aparecem nas cinco primeiras posições dos jornais, por diferentes ordens. Não se pode dizer que existe uma clara separação entre jornais de “referência” e “populares” na medida em que foram detectadas opções que ora aproximam, ora separam individualmente uns dos outros.

A distribuição das peças ao longo do ano não aconteceu de modo regular, registando-se grandes oscilações de um mês para outro, em larga medida devido à visibilidade que uns casos vieram a obter no tratamento noticioso em detrimento de outros. De entre estes, um dos que terá suscitado uma maior continuidade nos quatro jornais terá sido o caso “Joana”, em fase de julgamento durante 2005. Realce para o facto de as comemorações do Dia da Criança (Maio-Junho) e a proximidade do Natal (Novembro-Dezembro) constituírem os pólos de atracção para a apresentação de um número superior de notícias. O elevado número de peças em Novembro está fortemente associado à violência urbana em França, que mobilizou, por semanas, a atenção dos jornalistas e do público, sobretudo do DN e PB.

 

Figura 2 - Risco Social: distribuição das peças dos quatro jornais, por meses

Fonte: Projecto "Crianças e Jovens em Notícia", Carvalho (2007).

 

Alguns temas mantiveram-se sempre sob o alvo de especial olhar, constituindo importante foco na construção das peças em todos os jornais. Salientam-se, neste ponto, as notícias sobre “violência sexual”, presença constante e regular sobretudo na exposição ou denúncia de casos, mais o processo Casa Pia, objecto de maior atenção quando se tratou do início dos depoimentos das vítimas.

O maior número de peças em Janeiro deveu-se bastante ao tsunami ocorrido no final do ano anterior, dominante em todos os jornais. Seguindo um pouco o que as estatísticas oficiais sobre crianças em risco dizem, também aqui se nota uma quebra acentuada no período do Verão, como se estas situações se resolvessem por si mesmas ou desaparecessem nesta altura. Tal poderá evidenciar um ritmo sazonal, ao qual não será indiferente a coincidência com o final do ano lectivo, altura em que muitas crianças acabam por ficar remetidas a uma esfera de menor visibilidade social. Levanta-se a questão de saber até que ponto as denúncias ou sinalizações não estarão mais restritas a determinadas entidades, grupos ou figuras que nesta altura se encontrarão ausentes. É de questionar se este silenciamento, que em larga medida corresponderá a uma não exigência por parte dos leitores, não é, por si mesmo, um factor de uma certa alienação na sociedade portuguesa relativamente à dificuldade de olhar de frente e assumir a sua quota de responsabilidade sobre os contornos de exclusão social que, ainda hoje, marcam parte da condição da infância em Portugal (Carvalho e Serrão, 2008).

Maioritariamente, as peças em estudo são relativas ao contexto nacional (70,9%). Existe uma sobrerrepresentação de notícias de âmbito internacional no DN e o inverso no JN. “Negligências, maus-tratos e abandono”, “violência sexual”, “delinquência”, “crianças em instituição” e “funcionamento do sistema de protecção” encontram-se sobrerrepresentados nas de âmbito nacional, ao passo que “pobreza”, “trabalho infantil”, “tráfico de crianças” e “vítimas de catástrofes e guerras” situam-se significativamente no internacional.

Cerca de um terço das peças não são assinadas (32,6%). Quando assinadas por jornalistas sobrepõe-se ligeiramente o sexo feminino, ainda que existam certas diferenças por temas. Tal é o caso da delinquência, onde a maioria que assina é do sexo masculino. Nas participações externas (leitores e colunas de opinião) são os homens que aparecem mais representados. Relativamente à localização de peças em página aberta, evidencia-se o DN nas manchetes e o CM nas que aparecem na última página.

Caracterização das peças

Pela análise multivariada procurou-se detectar quais as principais associações entre as problemáticas e os contornos das peças no que diz respeito ao género jornalístico, âmbito nacional/internacional, extensão por parágrafos, hierarquia na página, localização em página aberta e em página interior, assinatura, valorização gráfica, número de fontes e óptica de investigação.9 À luz dos resultados obtidos na estatística bivariada, e atendendo às exigências técnicas da análise factorial de correspondências múltiplas, houve a necessidade de proceder à condensação de informação relativa a diversas variáveis. Efectuaram-se várias operações de agrupamento das categorias nas variáveis em causa, de modo a construir-se um corpo de dados simultaneamente consistente de um ponto de vista estatístico e coerente para a análise sociológica. Neste processo, salienta-se a recodificação da variável “problemáticas” que passou a contemplar apenas cinco categorias.10

Numa primeira leitura do gráfico (figura 3) e das contribuições de cada categoria, o que mais se evidencia, no plano inferior do lado esquerdo, é que o “risco social” poucas vezes foi abordado na forma de trabalhos de investigação com seis ou mais fontes, em mais de 20 parágrafos ou numa página. A modalidade mais próxima deste tipo de abordagem é a das “negligências, maus-tratos e abandono”, e num plano inverso as de “violência sexual” e “delinquência”.

 

Figura 3- Risco social: problemáticas e caracterização das peças

Legenda: NMTA – negligências, maus-tratos e abandono; VSEX – violência sexual; DELQ – delinquência; CJSP – outros temas com intervenção do sistema de protecção (adopção, crianças em instituições, funcionamento do sistema); RSOU – outros riscos sociais; NAC – nacional; INT – internacional; notb – notícia breve; notc – notícia; invj – peça de investigação jornalística, entrevista ou reportagem; gout – outros géneros jornalísticos; manc – manchete; cham – chamada de primeira página; ulpg – última página; Sass – peça não assinada; jorl – assinada por jornalistas; coln – peça de colunistas ou personalidades externas ao jornal; leit – peça de leitores; agif – agência de informação; imn – elementos de valorização gráfica (foto e outros); fccr – foto com crianças/jovens; fscr – foto sem crianças/jovens; puni – peça única; ppri – peça principal; psec – peça secundária; p>1p – peça com mais de uma página; prun – peça de um só parágrafo; p220 – peça 2-20 parágrafos; p>20 – peça com mais de 20 parágrafos; Sfon – sem fontes referenciadas; foun – uma única fonte; 6fo – menos de 6 fontes; p=6 f com 6 ou mais fontes; bsl – peça com busca de solução; den – peça de denúncia; exp – peça de exposição de factos

Fonte: Projecto “Crianças e Jovens em Notícia”, Carvalho (2007).

 

Apesar das mudanças sociais significativas nas últimas décadas no país, que têm contribuído para tornar visíveis situações que até recentemente tendiam a permanecer ocultas, a verdade é que estes dados sugerem que a sua cobertura jornalística ainda se encontrará sujeita a grandes dificuldades por, precisamente nestas peças, se colocar em causa os fundamentos da vida em sociedade e a ordem social estabelecida. Como é referido por diversos autores (Sarmento, 2000; Ponte, 2005; Tomás, 2007), os problemas sociais da infância, e em especial “as outras infâncias” atravessadas por estes riscos de natureza diversa, nunca terão suscitado interesse especial, quer por parte da população em geral, quer por parte dos próprios decisores políticos. Levanta-se a interrogação de saber até que ponto a sua apresentação não se restringirá a corresponder a esse não investimento sobre a infância que ainda marca sectores da sociedade portuguesa, mais ainda quando os quadros e contextos sociais retratados, bem como as crianças que são objecto de notícia, se encontram claramente afastados de um ideal de bem-estar infantil que as sociedades ocidentais tendem a desejar (Almeida, 2000).

A análise das projecções factoriais das cinco categorias permite confirmar diferenças no tratamento da informação, designadamente uma oposição entre os contornos das peças sobre “delinquência”, “outros riscos sociais” e “violência sexual” e as sobre “negligências, maus-tratos e abandono” e “crianças sob intervenção do sistema de protecção”. As primeiras situam-se do lado direito do plano factorial e as segundas do lado contrário. Os atributos que possibilitam melhor a distinção destes dois conjuntos são os descritos pelo eixo 1, nomeadamente, a extensão por parágrafos, a localização no interior do jornal, a assinatura, a óptica investigativa, a valorização gráfica e o estilo jornalístico. A variável “âmbito nacional e internacional” não é conclusiva, não permitindo a sua leitura.

Constata-se que a “violência sexual” tende a ser apresentada com recurso a uma fonte única ou tem como voz as agências de informação, ficando pela exposição de factos, ao passo que a “delinquência”, ainda que estando próxima dessas modalidades, apresenta uma maior possibilidade de ser noticiada em peças secundárias, não assinadas e sem fontes, sob a forma de notícias breves, em parágrafos únicos ou noutros géneros jornalísticos, suscitando quer chamadas de atenção de primeira página, quer a opinião dos leitores.

“Negligências, maus-tratos e abandono” e “crianças sob intervenção do sistema de protecção” são temas mais próximos de ser abordados por colunistas/personalidades exteriores aos jornais e de terem fotos com crianças, imagens e elementos de infografia numa perspectiva de busca de solução para o problema apresentado. São as peças que se apresentam em melhores condições de terem sido objecto de um tratamento jornalístico mais diferenciado, estando também mais próximas de um outro tipo representado na parte superior do mesmo lado, onde se evidencia um padrão quase típico em termos de abordagem: notícias de denúncia de situações assinadas por jornalistas, com imagens sem crianças, em peças únicas ou principais, com menos de seis fontes e extensão entre dois e 20 parágrafos.

Quando se analisou a distribuição das peças por jornal, e considerando que a representatividade no seio de cada um tem pesos diferentes, detectou-se que a construção da peça no que diz respeito aos seus contornos (forma) é transversal a todos sem grandes oscilações. Sempre que se introduzia a variável jornais na análise multivariada, o nível de variância descia consideravelmente, obstando a uma leitura discriminativa. Vale a pena indagar se esta aproximação não resultará de agendas noticiosas similares ou antes de um arrastamento entre jornais que se digladiam por melhores posições no mercado, não arriscando desvios aos modos e processos já implementados na abordagem destes temas. Sobressai a ideia de que, perante as mesmas problemáticas, o posicionamento das redacções na criação das peças surge de um modo já consolidado, por muitas diferenças que possam vir a ser, eventualmente, detectadas noutros campos.

Fontes

Globalmente, o número de peças que não apresenta fontes é de 28,5%. De entre as que apresentam a expressão mais elevada refere-se a fonte única (36,3%) e a seguir as que têm entre duas e cinco (29,8%). À medida que se avança nas categorias e se passa para um número superior, o valor percentual manifesto cai significativamente. Num primeiro olhar sobre o quadro 3, os jornais de referência destacam-se por terem uma expressão maior de peças com fontes, ao contrário dos populares. No entanto, quando se situa a análise bivariada na fonte única, o comportamento dos quatro jornais fica dentro do esperado, todos com valores aproximados no seu seio: PB e CM (37,1%), JN (36,9%) e DN (31,3%).

 

Quadro 3- Risco Social: número de fontes em peça, por jornal

 

Habitualmente considera-se que a existência de um maior número de fontes tenderá a traduzir um confronto de opiniões e de conhecimento sobre as situações noticiadas (Maropo, 2008). No entanto, na análise qualitativa viu-se que nem sempre isto se reflectia no mais adequado esclarecimento ou aprofundamento da informação. Por vezes, havia uma sobreposição de umas em relação a outras, noutros apareciam descontextualizadas, agravando-se a situação por serem aparentemente demasiadas para o tratamento registado.

Independentemente do jornal, as forças de segurança são as vozes mais ouvidas, tendo o maior peso no PB (26,3%), seguindo-se o CM (24,7%), o JN (22,9%) e o DN (20,9%). Seguem-se as fontes oficiais (estado), as segundas mais representadas no PB (19,1%), DN (18,1%) e JN (11,7%) estando o terceiro lugar reservado para organismos e figuras não oficiais: PB (17,7%), DN (17,4%) e JN (10,4%). O CM foge a esta lógica tendo as vozes dos familiares em segundo lugar (11,6%) e as do estado apenas em terceiro (9,7%).

Procurando perceber a relação entre o recurso a determinadas fontes, seu número e as problemáticas apresentadas nas peças, recorreu-se à análise multivariada, seleccionando para o efeito apenas as variáveis relativas a essas três dimensões. Na “delinquência” e na “violência sexual” destaca-se a fonte única ou nenhuma, enquanto que na “negligências, maus-tratos e abandono” e na “crianças sob intervenção do sistema de protecção” tende a usar-se um número maior. Esta última temática é a que fica mais próxima do recurso a seis ou mais fontes. Estas diferenças justificam uma atenção mais aprofundada, identificando-se uma dicotomia que coloca de um lado, isoladamente, as forças de segurança como quase exclusivas em peças de fonte única sobre “delinquência” e “violência sexual”, ao passo que do lado oposto se situam as restantes vozes, relativamente próximas umas das outras, geralmente em diferentes associações às problemáticas com excepção dos “outros riscos sociais”.

Notícias sobre “negligências, maus-tratos e abandono” têm mais presentes as vozes da comunidade (familiares, vizinhos, elementos do meio próximo da criança podendo estar incluída a própria) e as da justiça, quer num patamar de informação oficial das instâncias judiciais, quer da parte de advogados. Poder-se-á sugerir que em algumas se trata da fase inicial do caso a que terá correspondido a intervenção das forças de segurança na sequência da denúncia; noutras, a gravidade dos acontecimentos em si mesmos obrigou de imediato a uma acção das instâncias judiciárias, o que também justificará a maior expressão da comunidade próxima para um aprofundamento de informação. Por outro lado, incluem-se também aqui processos em fase de julgamento no ano de 2005 reportados a situações anteriormente fortemente mediatizadas.

Nas peças onde a acção oficial do sistema de protecção se evidencia, as vozes mais representadas são as do estado e as da justiça. Até um certo ponto, tal não é de estranhar, atendendo à natureza das questões aqui englobadas: adopção, acolhimento institucional, disputas familiares e funcionamento do sistema, correspondentes aos patamares mais elevados da pirâmide de intervenção neste campo. A proximidade com as categorias de mais do que uma fonte parece suscitar que, apesar da maior representatividade de fontes oficiais, outras existirão, ainda que com uma elevada dispersão. Finalmente, salientam-se as entidades não oficiais, especialistas ou outras figuras, situadas num plano transversal aos dois temas atrás abordados, aos “outros riscos sociais” e ao âmbito internacional.

Este padrão de uso das fontes associado a cada problemática é comum aos quatro jornais.

Traços de caracterização da criança

Quando se tentou traçar um perfil da criança objecto de notícia nestes temas, constatou-se a existência de duas linhas de orientação: no tratamento de “violência sexual”, “negligências, maus-tratos e abandono”, “delinquência” e “criança objecto de disputa” existe uma sobrerrepresentação de situações personalizadas, casos pessoais apresentados com maior detalhe; o tratamento de “pobreza”, “tráfico”, “vítima de guerras/catástrofes naturais”, “crianças em instituição”, “trabalho infantil” e “adopção” está mais centrado numa abordagem em termos globais, não existindo uma tendência para a discriminação pessoal. A pessoalização, mesmo constituindo uma violação do que se encontra legislado, parece fundamental para dar um rosto a determinadas problemáticas, nomeadamente as que envolvem, aparentemente, um maior grau de violência, ou aquelas em que o desfecho da situação foi o mais trágico, seja com as crianças no papel de vítimas, seja no de agressoras.

Da análise multivariada sobre este perfil emergiu uma condição específica de vitimação. Cada problemática retratada nos jornais foi discriminativa em função da idade e sexo, coincidindo, apenas até um certo ponto, com o que apontam as estatísticas oficiais. No entanto, o dado mais significativo que daqui emerge e que se tem de questionar prende-se com o facto de quase sempre só se descreverem situações que têm origem em agregados familiares das classes sociais mais desfavorecidas. Perpassa para o público a ideia que o risco social se reflecte exclusivamente nestes estratos, quase não havendo menção a outros, como se tais problemas ocorressem apenas junto de quem se encontra na pobreza ou em alguma forma de exclusão social.

“Negligências, maus-tratos e abandono” apresentam, essencialmente, crianças até aos cinco anos,11 seguidas do escalão seis-dez anos, fundamentalmente, do sexo feminino. Actos de violência sexual estão mais associados aos grupos dos 11-14 e 15-18 anos, isoladamente ou em combinação entre si, com maior probabilidade de vitimação do sexo masculino ou, em simultâneo, de ambos os sexos. Tentou perceber-se se tal, em larga medida, não resultaria do tratamento noticioso relevante dado ao processo Casa Pia, cujas vítimas se enquadram neste perfil. Pela sua representatividade estatística acabou por se verificar que esta ideia, por si só, não serve para explicar os graus de proximidade detectados entre estas categorias, havendo um padrão geral da vitimação sexual que é objecto de tratamento nos jornais, que segue estas tendências e que parece ocultar esta problemática até ao início da adolescência.

Na “delinquência” identificou-se uma maior probabilidade de encontrar peças sem marcas de idade e de sexo. Mais do que a individualização de casos é o conteúdo enquanto problema social que se vê reflectido e debatido em maior ou menor grau. O “arrastão na praia de Carcavelos” e a “violência urbana em França” são temas onde se detecta a clara dificuldade dos jornais na sua abordagem, numa oscilação de discurso que vai da perspectiva de responsabilização e culpabilização dos autores à semelhança dos adultos, até ao patamar inverso, da sua desculpabilização na qualidade de vítimas dos sistemas sociais.

Outro aspecto a destacar prende-se com os “outros riscos sociais” serem de âmbito internacional. Temas como “pobreza”, “trabalho infantil” ou “tráfico” são retratados, com uma forte incidência, a partir de situações no estrangeiro. Mesmo nos poucos reportados do contexto nacional, o principal enfoque das fontes é de carácter internacional (UNICEF, ONU ou entidades europeias). Apesar de estes problemas afectarem Portugal serão mais abordados quando o foco de atenção é considerado para além das fronteiras, como se caísse apenas nos “outros” ou fosse mais grave no exterior do que internamente.

Risco social: crianças em notícia

Da análise efectuada constatou-se a importância do papel da imprensa na sensibilização da comunidade para os problemas sociais que afectam a infância. No entanto, certos temas como maus-tratos e abandono, violência sexual e crianças objecto de disputas familiares parecem ter-se tornado alvos de especial interesse por proporcionarem um terreno fértil para a manipulação de emoções e de sentimentos (Martins, 2001; Penedo, 2003). São, sobretudo, evocados argumentos de interesse humano, várias vezes com base num forte apelo emocional, mas quase exclusivamente centrados nos estratos social e economicamente mais desfavorecidos.

Um dos maiores problemas prende-se com a reprodução deste e de outros estereótipos sobre a representação social da infância. Tende a ignorar-se a multidimensionalidade dos problemas sociais (Boudon, 1979) e não se questiona a sua transversalidade à estrutura social, nem se colocam em causa outras formas de risco. Existe uma clara sobrerrepresentação das problemáticas de abuso sexual e de mau-trato físico, ao passo que os abusos emocionais são praticamente ignorados. A negligência que, sob as mais diversas formas, estatisticamente é o problema que maior número de crianças afecta em Portugal, é um objecto desvalorizado, a não ser quando resulta em tragédia. São várias as manchetes e as chamadas de atenção de primeira e última páginas, baseadas numa linguagem quase sempre afirmativa e imperativa, à qual se alia, muitas vezes, um grafismo de uma certa violência, e quase inexistentes as peças nas secções nacional ou política. Trata-se de uma representação de uma infância fragilizada (da pré-modernidade), que tenderá a sair mais fragilizada pela exploração das fragilidades alheias (Almeida, 2000).

Uma das principais conclusões deste estudo aponta para a existência de uma tensão clara na conciliação do direito ao exercício da liberdade de informação e do direito à intimidade e reserva da vida privada da criança, aliado ao princípio da proporcionalidade que a Lei de Protecção e a Constituição definem. Tal acontece com vários dos casos ao longo de 2005 e em que o da bebé de Viseu será, eventualmente, o mais paradigmático, pelas sucessivas violações concretizadas, não apenas de jornalistas, mas também de técnicos ou especialistas ouvidos como fontes.

Existe um significativo número de peças sem fontes ou com fontes únicas, sem outro enquadramento, denotando-se dificuldades no equilíbrio entre o revelar, o denunciar e o expor e contextualizar. São problemáticas que suscitam uma abordagem que coloca em causa o cerne das relações sociais e, por isso, os cuidados com a sua contextualização deviam constituir uma prioridade. Nem sempre o processo de denúncia respeita os princípios éticos e os direitos da criança de forma a não se tornar também violador desses mesmos direitos, seja pela forma ou pelos conteúdos apresentados. Aquilo que é somente uma suspeita de mau-trato ou de abuso que carece de confirmação posterior, poucas vezes é assim revelado. O maior número de peças centra-se no mero registo factual e as violências e os desvios extremos tendem a sobrepor-se às notícias sobre prevenção. Na construção de peças os quatro jornais apresentam poucas diferenças e, para uma mesma problemática, tendem a criar o mesmo tipo de peças, com excepção da “delinquência” onde se registam maiores diferenças. O CM e o JN destacam-se por manifestaram uma maior diversidade de abordagens, capazes de potenciar, eventualmente, um maior conhecimento sobre alguns dos contornos da sociedade portuguesa que são ignorados no PB e no DN.

Em certas notícias detectou-se a exposição pública da criança pela divulgação de informação e imagens que, de modo directo ou indirecto, possibilitam a sua identificação. Noutras, as fotografias evidenciam-se como uma marca que se vê “promovida” diariamente, uma espécie de logótipo usado não apenas para se dar conta da evolução do caso, mas também como símbolo da infância em risco, numa tendência para a sobreposição de um discurso que promove a necessidade de uma condenação urgente de culpados que satisfaça a ordem e a moral estabelecidas, ignorando muitas vezes o respeito pela própria vítima ou o valor da reparação.

De notar que nas peças sobre delinquência existe uma menor exposição pública de agentes de ilícitos abrangidos pela Lei Tutelar Educativa (12-16 anos) e pelo Regime Penal (16 ou mais anos) quando comparados com as crianças seguidas no âmbito da Lei de Protecção. Sendo casos em que o ilícito, no âmbito desta última lei, deve ser encarado como expressão do perigo em que o seu autor se encontra, por isso mesmo em patamar de vitimação, acaba por se evidenciar uma dupla vitimação, desta vez centrada no protagonismo da criança na qualidade de agressora.

Na abordagem às questões não apenas jurídicas, mas fundamentalmente nestas, transparece, em muitas peças, uma ausência de conhecimento adequado do(s) jornalista(s) acerca do enquadramento da matéria. Emerge uma falta de clareza e cuidado na linguagem, numa confusa referência a leis e a situações diferenciadas com dificuldades na passagem de informação adequada. Um exemplo é o uso da expressão “Comissões de Protecção de Menores” que desde 2001 existem sob outro modelo e designação. Também é flagrante a confusão e sobreposição de alguns conceitos — por exemplo, abuso sexual e pedofilia — como se de sinónimos se tratasse. Estranha-se que, durante o período em análise, todos os jornais tenham tido a capacidade de apresentar peças bem construídas para, logo a seguir, sobretudo em casos de maior visibilidade ou gravidade, porem de lado essas qualidades e cuidados no tratamento noticioso. Verifica-se que existiu um padrão semelhante de erros cometidos, transparecendo a ideia de que sob maior pressão se seguem uns aos outros sem que tenha lugar um maior questionamento sobre as opções tomadas.

Os problemas sociais da infância parecem continuar a ser encarados em Portugal como um problema social menor, de menoridade (Rodrigues, 1999), e este é um dos aspectos que se vê traduzido nas páginas dos jornais. Nunca terão suscitado (e eventualmente não suscitam ainda…) grande interesse da generalidade da sociedade, ficando-se por uma certa superficialidade, um certo voyeurismo. Tal verifica-se pela frágil e inconsequente pressão da opinião pública sobre o poder decisor e as instâncias políticas para mudanças em termos de investimento e de políticas sociais e também sobre a própria comunicação social pela escassa participação dos leitores.

Termina-se este artigo com uma nota positiva, evidenciando o JN, que reflecte nas suas páginas um mais elevado grau de participação do seu público. Como se constatou na análise das notícias sobre a bebé de Viseu, relativamente à qual todos os jornais cometeram o mesmo tipo de erros, da reflexão interna do corpo redactorial articulada com a participação crítica e activa do público e de personalidades exteriores, este jornal acabou por desenvolver um processo reflexivo sobre a sua responsabilização e actuação nos factos que se prolongou pelo início do ano de 2006. Acredita-se que este exemplo é demonstrativo de um dos possíveis caminhos para que o tratamento noticioso sobre a infância em risco em Portugal possa atingir uma maior credibilidade e um outro estatuto no respeito pelos direitos das crianças.

 

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1 Este artigo decorre da participação das autoras no projecto de investigação “Crianças e Jovens em Notícia”, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (POCI/COM/60020/2004).

2 Desenvolvido no Centro de Investigação Media e Jornalismo, sob a Coordenação da prof. doutora Cristina Ponte, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa.

3 FCSH-Universidade Nova de Lisboa, Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, SociNova/CesNova, CIES em articulação directa com outros centros internacionais: ANDI (Brasil) e Children, Media, Literacy and Citizenship Group (Cardiff University, Reino Unido).

4 Analisados os anos de 1970, 1975, 1980, 1985, 1990, 1995, 2000.

5 No artigo 1.º da Convenção define-se “criança como todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo”.

6 As variáveis são: jornais, mês, dia, título, localização em páginas abertas, localização no interior do jornal, hierarquia na página, extensão horizontal da peça por colunas, valorização gráfica, extensão em parágrafos, conexão a peças de proximidade, assinatura, género jornalístico, vozes (desdobrada em várias), localização geográfica, tema principal, subtemas do risco social, óptica investigativa (ANDI).

7 As variáveis são: sexo da criança referida no texto, faixa etáriaemtexto, origem étnica da criança no texto, sexo da criança referida como delinquente no texto.

8 Os jornais passam a ser identificados pelas siglas: PB-Público; DN-Diário de Notícias; JN-Jornal de Notícias e CM-Correio da Manhã.

9 Relativamente à óptica investigativa segue-se o proposto pela ANDI em torno de três categorias: denúncia de casos, exposição de factos e peças com busca de solução.

10 Mantiveram-se, em separado, as três categorias mais expressivas estatisticamente e nas restantes agruparam-se numa só variável a “adopção”, “crianças em instituição” e “objecto de disputas” e o “funcionamento do sistema de protecção”, por terem de comum entre si o facto de se tratar de situações que se encontram já sob uma intervenção de segundo e terceiros níveis no sistema de protecção. As outras categorias—“pobreza”, “trabalho infantil”, “catástrofes naturais e guerras”, “tráfico de crianças” e “outros riscos sociais”— foram englobadas numa nova categoria designada por “outros riscos sociais”.

11 Com uma forte sobrerrepresentação até aos dois anos.

 

* Socinova/CesNova-Centro de Estudos de Sociologia, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa. E-mail: mjleotec@sapo.pt

** Licenciada em psicologia clínica, Instituto Superior de Psicologia Aplicada. E-mail: dutchyzinha@gmail.com

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