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Sociologia, Problemas e Práticas

versão impressa ISSN 0873-6529

Sociologia, Problemas e Práticas  n.34 Oeiras dez. 2000

 

CLASSES SOCIAIS NA EUROPA

António Firmino da Costa, Rosário Mauritti, Susana da Cruz Martins, Fernando Luís Machado e João Ferreira de Almeida*

 

 

Resumo O actual contexto de globalização coloca novas questões à análise das relações de classe. Clarificando o posicionamento teórico e as possibilidades operatórias da actual sociologia das classes sociais e da estratificação, o presente artigo procura dar contributos para essa análise, procedendo a um exame comparativo, no âmbito da União Europeia, de um conjunto seleccionado de indicadores de recomposição social. Um dos principais eixos da análise prende-se com o confronto entre parâmetros nacionais e globais de estruturação das relações de classe.

Palavras-chave Classes sociais, recomposições sociais, globalização, União Europeia.

 

 

Introdução

O presente artigo pretende apresentar um conjunto de contributos, sintéticos mas integrados, para a análise dos processos de recomposição das estruturas de classe actuais na União Europeia, com a preocupação particular de situar a sociedade portuguesa nesse contexto.1

A escassez de trabalhos com este âmbito — em termos de escala e de problematização — constitui, por si só, razão suficiente para sistematizar informação empírica pertinente a tal respeito e para suscitar, a propósito dela, um certo número de hipóteses, de interrogações ou, mais modestamente, de simples chamadas de atenção analíticas. É o que se faz aqui, de maneira necessariamente breve e parcelar, assumindo que muitas dimensões de análise adicionais seriam necessárias para uma abordagem mais satisfatória do tema.

A ausência dessas outras dimensões, pelo menos em termos de referências empíricas de carácter extensivo, deve-se a duas ordens de razões: por um lado, muito simplesmente, à indisponibilidade dos indicadores correspondentes; por outro lado, às opções teórico-analíticas aqui tomadas, num texto em que se teria de ser sempre bastante restritivo nos aspectos a seleccionar.

A indisponibilidade de indicadores tem várias causas, desde as que decorrem de lacunas na produção de informação estatística institucional, ou de dificuldades no respectivo acesso, até às que têm a ver com determinados aspectos da realidade social em questão. São causas, aliás, em certa medida interdependentes. Por exemplo, muitas das actividades económicas informais e das situações profissionais precarizadas não são facilmente susceptíveis de registo extensivo, estandardizado e comparável, pelas próprias características sociais de tais fenómenos e pelas orientações que têm presidido à formatação dos sistemas de indicadores institucionais.

Quanto às opções de delimitação selectiva das dimensões a contemplar de maneira central na análise, se tiveram de atender às restrições informativas assinaladas, seguiram como principais critérios o de procurar alicerçá-las em fundamentos teóricos sólidos e o de fazê-las corresponder a uma potencialidade cognitiva elevada sobre o domínio substantivo em investigação.

Quer isto dizer que não se dá conta aqui de tudo o que seria importante analisar, mas tal não é razão para preferir a ignorância de algo que se pode conhecer. O que se analisa de seguida não é uma parte ignorável ou menosprezável da realidade social. Pelo contrário, ver-se-á que se trata de um conjunto de vertentes nucleares de estruturação das relações sociais contemporâneas, em torno das quais muitas outras se organizam — o que não significa que estas se reduzam àquelas ou que delas possam ser simplesmente deduzidas.

 

Algumas clarificações sobre a actual sociologia das classes sociais

Será talvez necessário, perante a tendência recorrente para argumentos menos pertinentes ou menos informados a este respeito, insistir no ponto anterior.

A concepção sociológica de classes sociais aqui utilizada não parte do princípio de que todas as facetas relevantes da realidade social sejam redutíveis às relações de classe ou necessariamente delas decorram, muito menos de maneira directa e linear, sem mediações. E também não entende que as relações de classe possam ser reduzidas, de modo apriorístico e imutável, a uma determinada dimensão de estruturação social, por mais relevante que ela seja, em concreto, neste ou naquele contexto.

Mas o que se acabou de afirmar, por sua vez, não significa, como qualquer um pode compreender, que as condições de existência das pessoas tenham deixado de ser condicionadas por relações assimétricas de poderes e por distribuições diferenciadas de recursos e oportunidades. Nas sociedades actuais, os sistemas estruturados de desigualdades e distinções sociais não deixaram de ser, entre outros, elementos constitutivos fundamentais dessas sociedades. A jusante, por seu turno, essas diferentes condições de existência continuam a estruturar, também diferencialmente, os valores e os comportamentos dos actores sociais.

É este duplo entendimento — no que rejeita e no que salvaguarda — que preside à análise aqui apresentada, numa linha de elaboração conceptual e operatória, assim como de investigação empírica, desenvolvida ao longo de trabalhos de diversos âmbitos como, entre outros, Almeida (1986), Costa (1987), Almeida, Costa e Machado (1988), Machado, Costa e Almeida (1989), Costa, Machado e Almeida (1990), Almeida, Costa e Machado (1994), Machado, Ávila e Costa (1995), Machado (1998), Machado e Costa (1998), Costa (1999) ou Almeida, Capucha, Costa, Machado e Torres (2000).

No mesmo sentido geral, aliás, vão as concepções que podem ser encontradas na maior parte dos especialistas actuais neste domínio, tais como são referenciáveis, nomeadamente, para mencionar apenas algumas das obras mais significativas da última década, em Eder (1993), Scott (1996), Bourdieu (1994, 1997), Marshall (1997), Wright (1997), Levy, Joye, Guye e Kaufmann (1997) ou Milner (1999) — apesar das diferenças nos respectivos quadros teóricos ou nas terminologias por eles preferidas.

As declarações, periodicamente renascidas, sobre supostos "fins" das relações de classe não revelam qualquer consistência conceptual nem recolhem em sua corroboração qualquer tipo de verificação empírica pertinente. Em vários casos, trata-se de ressurgimentos, eventualmente sob novas expressões retóricas, de velhos reflexos de preconceito ideológico ou profetismo social. Podem também decorrer de uma atitude de "limpeza de imagem", por parte de alguns, preocupados acima de tudo em dar sinal público do seu afastamento de versões redutoras ultrapassadas, das quais tinham sido antes porta-vozes veementes, em igual tom de afirmatividade dogmática.

Esta atitude vem muitas vezes sintonizada, aliás, com a constelação ideológica actual do "novo espírito do capitalismo", bem diagnosticada em trabalho recente de Boltanski e Chiapello (1999), na qual a promoção da noção de "redes" como metáfora omnipresente vai de par com uma rejeição apriorística e um esforço de desconstrução a todo o custo das representações categoriais dos mais diversos tipos — o que é, no mínimo, epistemologicamente inconsequente.

Tudo isto pode traduzir-se na procura apressada de "fins" para as mais variadas coisas, não só fim das classes mas também fim das ideologias, fim da história, fim dos valores, fim da família, fim do trabalho, fim do social, etc., etc. "Fins" estes que só por absurdo, excesso de voluntarismo terminológico ou reificação ingénua de vagas metáforas, se poderiam tomar como enunciados cognitivos caracterizadores da realidade social contemporânea.

Noutros casos ainda, de maneira mais séria, o questionamento das análises de classes corresponde a uma necessidade efectiva de reconceptualização actualizada, mas realizada por vezes em moldes tributários de algum desfasamento em relação ao que é hoje o "estado da arte" no domínio especializado da sociologia das classes sociais e da estratificação, supondo-a ainda presa de concepções reducionistas e rigidificantes, nela predominantemente ultrapassadas, ou ignorando algumas das aquisições científicas mais importantes nos desenvolvimentos recentes desta área de investigação.

Seja como for, não só a crítica apropriada à hipotética perda de actualidade e pertinência das análises de classes está feita, nomeadamente em Lee e Turner (1996), Marshall (1997), Milner (1999) ou Costa (1999), entre muitos outros, como essa actualidade e pertinência são evidenciadas por múltiplos trabalhos que se têm vindo a desenvolver directamente neste domínio ou em clara intersecção com ele — por exemplo, limitando a referência a publicações portuguesas recentes, para além das dos autores deste texto, os de Grácio (1997), Cabral (1998), Queiroz (1999), Pereira (1999), Pinto (2000) ou Estanque (2000).

No conjunto, pouco haverá de mais fundamentado teoricamente e verificado empiricamente, no campo da sociologia, do que serem as relações assimétricas de poderes e as distribuições inigualitárias de recursos e oportunidades, ou, noutros termos, os sistemas estruturados de desigualdades e distinções sociais — ou, ainda, nas designações mais usuais neste domínio, as estruturas de classe e as hierarquias de estratificação — elementos constitutivos fundamentais das sociedades contemporâneas.

Interessa, por conseguinte, tentar conhecer as configurações que eles assumem e as transformações por que passam, as dimensões mais relevantes que os estruturam e as modalidades em que estas se inter-relacionam, os factores e as dinâmicas que os influenciam e os vão reconfigurando, as situações e os processos que, por sua vez, eles contribuem para gerar. Mas só é adequado fazê-lo assumindo que as respostas não estão dadas de uma vez por todas em qualquer sede teórica apriorística, sendo necessário investigar, em cada caso, seja ele de maior ou de menor amplitude, como é que estes aspectos se concretizam.

Interessa também analisar as articulações que estes sistemas de desigualdades e distinções estabelecem com outros parâmetros da vida social e as maneiras como se interligam com os diversos campos específicos de relações sociais, em regime de maior ou menor autonomia recíproca. São questões a submeter igualmente a investigação, atendendo aos referentes substantivos em causa.

Importa, enfim, investigá-los quanto ao grau e ao modo — variáveis — como condicionam e potenciam a existência, o pensamento e a acção dos protagonistas sociais, as suas práticas individuais e as suas formas de acção colectiva. Assim como, em sentido inverso, importa investigar o grau e o modo — igualmente variáveis — como a acção individual e colectiva dos protagonistas sociais vai contribuindo para reproduzir ou transformar as relações assimétricas de poderes e as distribuições desiguais de recursos e oportunidades.

Tudo isto representa, assim, um domínio de problematização e um campo de pesquisa e não um qualquer eventual reportório de repostas pré-fabricadas. É precisamente esse o âmbito, por excelência, da investigação sociológica contemporânea sobre classes sociais e estratificação social. A sociologia tem vindo a produzir uma importante acumulação cognitiva neste domínio, quanto a conhecimentos substantivos e quanto a instrumentos teóricos e operatórios, sem que isso conduza, nos desenvolvimentos recentes, ao enquistamento numa qualquer dogmática. Bem pelo contrário, tem levado a uma capacidade progressivamente maior de desenhar e conduzir programas de investigação amadurecidos.

Não é evidentemente este o local oportuno para proceder ao exame alargado das questões teóricas, metodológicas e substantivas mais importantes que se colocam hoje neste domínio. Quando muito, é possível assinalar alguns dos traços fortes que balizam actualmente este campo de investigação sociológica, remetendo o leitor interessado para tratamentos mais desenvolvidos (Costa, 1999: 208-225). Em jeito de inventariação sumária, podem destacar-se:

1)    uma focalização nos protagonistas sociais (na sua caracterização em termos de composição social) e nas mediações que estes estabelecem entre estrutura e acção; ou, num registo mais operatório, a focalização em análises de três tipos e, muito em especial, na exploração das virtualidades cognitivas da articulação entre elas — em concreto, as análises dos efeitos das transformações estruturais nas recomposições sociais das populações (as classes sociais como "variáveis dependentes"), as análises dos efeitos destas últimas na pluralidade de práticas e representações observáveis no quotidiano (as classes sociais como "variáveis independentes") e, ainda, as análises dos protagonistas e processos da acção colectiva, nomeadamente naquilo que tenham a ver, como causa e como efeito, com as referidas recomposições sociais;

2)    uma concepção multidimensional, estrutural e relacional, procurando determinar, para cada configuração em estudo, quais os parâmetros relevantes do espaço social das classes e quais as articulações que estabelecem entre si, atendendo à prioridade conceptual das posições relativas sobre as condições de existência intrínsecas e das relações de classe sobre os conjuntos sociais mais ou menos nitidamente delimitáveis (estes últimos, convém insistir, não são entidades fixas, teoricamente pressupostas, mas sim construções sociais contingentes, acerca das quais se impõe, em cada caso, investigar o grau de estruturação e os contornos específicos);

3)    uma orientação forte no sentido de integrar elaboração teórica aprofundada com investigação empírica rigorosa; integração para a qual se recorre, entre outros procedimentos, tanto aos estudos de caso intensivos como aos inquéritos extensivos, tanto à análise multivariada como à construção cuidadosa de sistemas de indicadores com grande densidade dimensional (designadamente indicadores socioprofissionais e indicadores socioeducacionais, para as sociedades contemporâneas), susceptíveis de proporcionar a operacionalização de diversos quadros conceptuais, em parte diferenciados, mas também com importantes sobreposições quanto a áreas de problematização e referentes substantivos;

4)    uma tendência para a integração reflectida e criativa de referências teóricas com origens distintas, num domínio de problematização que se desdobra em diferentes níveis de análise (de âmbitos mais ou menos amplos) e em diversos tipos de objectos de estudo preferenciais; contam-se entre estes, nomeadamente, as estruturas de classes, os processos de mobilidade e fechamento social, as instâncias e os processos de formação de classes, as hierarquias simbólicas de posição social, assim como as articulações (variáveis) das classes com os campos diferenciados de relações sociais, com as estratégias sociais e as formas de acção colectiva, incluindo as que se estruturam em movimentos sociais, com as práticas e representações quotidianas, com as identidades culturais e os estilos de vida.

A análise de que este artigo se ocupa não abrange, claro está, todo este domínio de problematização. Mas procura tê-lo sempre presente, como pano de fundo, na abordagem do objecto específico de que se ocupa.

Definido de maneira mais precisa, o objecto de estudo centra-se aqui na recomposição das estruturas de classes observáveis na União Europeia, tais como podem ser caracterizadas a partir de um conjunto limitado mas crucial de indicadores socioprofissionais e socioeducacionais, e problematizando a pertinência actual, perante os processos de globalização contemporâneos, das unidades geográficas de análise nacionais e supranacionais neste género de investigações. Dá-se particular atenção ao posicionamento da realidade social portuguesa no referido contexto europeu.

 

A análise de classes em contexto de globalização

A análise dos processos contemporâneos de globalização tem incidido sobre um conjunto de aspectos, nomeadamente económicos e tecnológicos, políticos e ideológicos, comunicacionais e culturais, ambientais e migratórios, institucionais e militares. Quais as repercussões destes processos em termos de classes sociais? E de que modos estas os influenciam?

Em certo sentido, logo desde as primeiras propostas de teorização relevantes, as análises sobre classes sociais equacionaram-nas a vários níveis — e em particular, no que aqui está mais directamente em causa, como contendo, de modo não trivial, importantes dimensões tanto nacionais como transnacionais. Na obra de Marx isso é notório, nomeadamente quando se refere à emergência do capitalismo, aos processos do seu desenvolvimento e à acção revolucionária do proletariado — como se encontra expresso, de maneira muito clara, por exemplo, em Marx e Engels (1848, 1969) ou Marx (1867, 1977). Mais tarde, para mencionar apenas outro dos marcos fundadores deste domínio analítico, apareceram com a sociologia empírica de matriz funcionalista, tendo-se tornado referência obrigatória, os estudos comparativos internacionais de composição estrutural e mobilidade social, como os de Lipset e Zetterberg (1956, 1967) ou de Mayer (1964, 1967), entre muitos outros.

De modo mais geral, a necessidade de considerar diversos níveis analíticos e de prestar particular atenção às respectivas articulações, mesmo quando, como é corrente, os objectos de estudo se situam privilegiadamente num deles, representa um pressuposto teórico partilhado pelas principais orientações paradigmáticas que incidem neste domínio de problematização e investigação. Em termos operatórios, isto tem tradução, entre outros aspectos, nas escalas espaciais e nas amplitudes temporais adoptadas.

Mas o equacionamento dos níveis de análise pertinentes para a investigação de determinados objectos de estudo é, antes de mais, um problema de ordem substantiva, relativo portanto às dimensões conceptuais fundamentais que esses objectos de estudo integram, de acordo com a perspectiva analítica adoptada. Não se reduz nem se confunde, pois, com a delimitação de unidades de observação, nomeadamente das unidades geográficas de recolha sistemática de informação empírica, por mais importante que esta última operação também seja. Por exemplo, há diversos trabalhos neste domínio cuja pesquisa observacional é conduzida sobretudo a escalas locais ou regionais, mas que se reportam a objectos de estudo, no sentido conceptual, implicando (também) estruturas e dinâmicas cuja constituição remete para níveis mais amplos — como acontece, entre muitos outros, nos estudos de caso locais de Pinto (1985), Almeida (1986), Almeida (1993), Costa (1999) e Estanque (2000), ou nas análises extensivas operacionalizadas à escala do concelho para o conjunto do território nacional de Ferrão (1982; 1985).

O quadro nacional-estatal tem constituído o horizonte de referência principal de boa parte das pesquisas sobre classes sociais, pelo menos como unidade geográfica de análise empírica. Há, por um lado, razões teórico-substantivas pertinentes para isso, se se considerar que, em grande medida, as estruturas, instituições e processos que contribuem para a formação de relações de classe se têm estabelecido no contexto dos estados nacionais, em consonância com o carácter crucial destes na configuração das condições sociais da modernidade, em sentido amplo, incluindo o período contemporâneo.

Mas há também, por outro lado, um conjunto de problemas aqui implicados. A operação de pesquisa que consiste em tomar o quadro social nacional-estatal como unidade geográfica de observação — nomeadamente em casos de análises extensivas de tipo quantitativo — nem sempre é acompanhada de uma problematização da respectiva relação com o objecto de estudo em sentido conceptual, e submetida teoricamente a esta. O contexto nacional-estatal tende assim a ser "naturalizado" e "absolutizado", como se não fosse necessário averiguar se é pertinente, ou suficiente, para a análise dos fenómenos em estudo, ou como se os seus modos de relação com outros níveis de estruturação das relações sociais não fossem historicamente variáveis. Se este é um problema a ter sempre em conta, coloca-se ainda com mais acuidade em contexto de globalização.

Não são muitas as análises que se tenham debruçado de maneira directa e aprofundada sobre as relações entre "classes sociais" e "globalização" — ou, dito de outro modo, sobre como é que as relações sociais de classe se reconfiguram e se repercutem socialmente no âmbito dos processos contemporâneos que se têm vindo a subsumir sob o termo de globalização. Em todo o caso, é possível localizar dois tipos de contributos relevantes.

O primeiro tipo tem a ver com contributos não pertencentes ao domínio especializado das análises de classes, mas que, ao ocuparem-se do estudo de processos contemporâneos de mudança social à escala planetária, enfrentam um certo número de processos com incidência importante nas relações de classe. Entre outras, são particularmente interessantes as análises de tendências para a constituição de relações de classe a nível mundial, e mesmo, em certa medida, de novas classes, ou classes reconstituídas em novos moldes, de âmbito global. Encontram-se em diversas pesquisas ou ensaios, alguns bem conhecidos.

É o caso, por exemplo, das referências de Reich (1991, 1993) à condição eminentemente cosmopolita dos "analistas simbólicos", na nova segmentação socioprofissional prevalecente a nível mundial. É o caso das anotações do Grupo de Lisboa (1994) sobre as "novas elites globalizadas" constituídas por círculos de investidores, gestores e técnicos de empresas multinacionais, funcionários e peritos de instituições supranacionais e de organizações não governamentais, de jornalistas, cientistas e outros "viajantes globais". É o caso, também, de análises como a de Portes (1999) sobre a crescente importância das "comunidades transnacionais", envolvendo fluxos de empresários e trabalhadores entre diversos países ou continentes, ou como a de Peixoto (1999) sobre a actual "mobilidade internacional dos quadros". Isto para já não falar das extensas análises de Castells (1996; 1997; 1998), para quem se verifica, na "sociedade de rede" da "era de informação", uma efectiva e intensa interdependência global que atravessa e dinamiza os processos de recomposição das estruturas do emprego e de transformação das relações de classe a nível mundial, reconfigurando os sistemas de clivagens sociais. Para ele não se pode no entanto falar por ora de uma força de trabalho global, excepto em relação a um conjunto restrito mas crescente de quadros, técnicos e cientistas.

Pelo seu lado, na sociologia das classes sociais contemporânea, alguns trabalhos têm também fornecido contributos valiosos. É o caso, nomeadamente, de pesquisas importantes, com elevado nível de elaboração teórica e metodológica, nas quais se procede a estudos comparativos, de âmbito alargado, entre diversas sociedades nacionais. De entre elas, podem destacar-se as de Erikson e Goldthorpe (1993), de Esping-Andersen (1993) ou de Wright (1997). Correspondem a problematizações teóricas, soluções operatórias e horizontes empíricos diferentes entre si, mas qualquer delas acabou por constituir-se em referência decisiva na área.

Acontece que essas pesquisas — tomando como objectos de estudo aspectos como as estruturas de classe, as dinâmicas de mobilidade social, os processos de recomposição social ou os quadros de valores e representações — debruçam-se, com maior ou menor desenvolvimento, sobre repercussões de processos constituídos à escala global na reconfiguração das estruturas, culturas e práticas de classe, tais como elas ocorrem a nível de diversas sociedades nacionais. Mas não é de modo nenhum líquido que a actual análise das relações de classe possa ficar por aí.

Que sentido fazem ainda, em contexto de globalização, as análises de classes a nível nacional? Que articulações se podem estabelecer entre estas e as análises de classes a níveis supranacionais?

Como salientam Breen e Rottman (1998), estão aí problemas susceptíveis de debate teórico e de investigação empírica. Os desenvolvimentos que se seguem, centrados na análise substantiva de estruturas de classe e processos de recomposição social na União Europeia, poderão contribuir para o respectivo exame, mesmo que de maneira circunscrita e exploratória.

 

Parâmetros de recomposição social na União Europeia

As relações estruturais e os processos de recomposição social aqui em análise ocorrem num contexto sui generis, o espaço de integração supranacional que se designa hoje por União Europeia. Uma das suas particularidades é que se trata de "um universo em expansão". Actualmente a União Europeia tem uma população que ronda os 370 milhões de habitantes. Tomando como referência o período que vem desde 1986, ano da inserção de Portugal neste espaço, verifica-se que o acréscimo populacional entretanto verificado se ficou a dever sobretudo à adesão de três novos países (Áustria, Finlândia e Suécia) e à incorporação na Alemanha da antiga RDA.

Pelo seu lado, o crescimento demográfico (saldos natural e migratório) nos doze países membros em 1986 foi comparativamente bastante pequeno, embora em quase todos eles a população tenha aumentado um pouco (quadro 1). Deste último ponto de vista, Portugal apresenta-se como excepção, com um pequeno decréscimo, se bem que marginal. A reduzida taxa de natalidade neste período (Almeida, Capucha, Costa, Machado e Torres, 2000) e a persistência dos movimentos de emigração, por vezes subavaliados mas efectivos (Baganha e Peixoto, 1997; Peixoto, 1999), foram dois factores desta estagnação populacional, mal contrabalançados por outras duas tendências: o aumento gradual da esperança de vida e a crescente recepção de imigrantes, tendo estes, no entanto, um peso relativo ainda bastante reduzido no conjunto da população (Machado, 1997; Machado, 1999; Pires, 1999).

 

Quadro1 Indicadores de recomposição social na União Europeia,1986-1998 (em percentagens)

 

A estrutura etária da população da UE envelheceu um pouco na base e no topo, isto é, a percentagem de crianças e jovens com menos de 15 anos diminuiu e a de pessoas com 65 e mais anos aumentou. Observa-se, por outro lado, a estabilidade da faixa populacional compreendida entre 15 e 64 anos.

As diferenças a este respeito entre os diversos países não podem ser menosprezadas. As tendências de envelhecimento na base e no topo da estrutura etária ocorrem mais acentuadamente neste período em Portugal, assim como nos outros países da Europa do Sul (e em certa medida na Irlanda), ao contrário da relativa estabilidade verificada nos restantes. Portugal é também um dos poucos países em que a faixa etária "central" (15-64 anos) regista acréscimos percentuais significativos, acompanhado nalguma medida pela Espanha e, sobretudo, pela Irlanda.

São diferenças que correspondem a conhecidos fenómenos, nomeadamente de entrada mais tardia destes países do Sul europeu em processo de decréscimo rápido e acentuado das taxas de natalidade, numa altura em que os países da Europa atlântica e setentrional começavam, neste domínio, a estabilizar nos patamares entretanto atingidos, ou mesmo a registar ligeiros acréscimos. Isto, ao mesmo tempo que, em vários deles, a incorporação de imigrantes atingia pesos percentuais bastante superiores aos verificados nos países da Europa meridional.

Tão ou mais importante, quanto aos parâmetros fundamentais que balizam os processos de recomposição social na União Europeia desde meados da década de 80 até à actualidade, é a evolução das taxas de actividade. Os dados do quadro 1 a este respeito são relativos às taxas de actividade na faixa populacional dos 15 aos 64 anos, a qual é hoje correntemente considerada como a "população potencialmente activa" do ponto de vista profissional.

Note-se, de passagem, que tal assunção tem vindo a ser, cada vez mais, submetida a questionamento, na sequência, precisamente, de processos de recomposição social que se encontram hoje na ordem do dia. Com efeito, entre os mais novos, está em causa o prolongamento da escolarização inicial e, de modo mais geral, o alongamento dos processos de transição para a vida adulta, aliás com variantes nacionais perceptíveis no contexto europeu (Lewis, Smithson, Brannen, Guerreiro, Kugelberg, Nilsen, e O’Connor, 1999). Entre os mais velhos, pelo seu lado, verificam-se actualmente tendências de sinal contrário, tais como, nuns casos, a antecipação da saída da actividade profissional, em geral compulsiva, e, noutros casos, o respectivo adiamento, parte dele sob a pressão da necessidade material, mas cada vez mais, também, enquanto manifestação assumida de vontade de prolongamento activo de vivência pessoal e estatuto social plenos, numa população com vida mais longa e saudável do que nas gerações anteriores.

Em todo o caso, a faixa etária dos 15 aos 64 anos é, sem dúvida, a mais importante para o ângulo de análise que de momento aqui importa desenvolver. É também aquela para a qual são mais seguros os indicadores comparativos disponíveis. Além disso, em registo metodológico, permite que as diferenças de estrutura demográfica atrás assinaladas não interfiram nas comparações entre países.

Como evoluiu então, nesta faixa etária, a repartição entre população profissionalmente activa e população profissionalmente inactiva? O quadro 1 evidencia, a este respeito, vários traços importantes. De entre eles destaca-se o facto de, na União Europeia, a taxa de actividade crescer um pouco, mas na confluência de dois processos de sentido inverso: alguma diminuição da taxa de actividade masculina e aumento mais do que compensatório da taxa de actividade feminina. A diferença entre ambas é agora de 20 pontos percentuais quando, menos de década e meia antes, era de 30. É a acentuação de um processo de recomposição social do maior alcance e da mais ampla repercussão em praticamente todos os planos da vida social: o da aquisição alargada por parte das mulheres de um elemento essencial do estatuto social de cidadania plena nas sociedades contemporâneas, o estatuto profissional.

Só por caricatura ou distorção ideológica levada ao limite se pode subvalorizar a importância do trabalho — ou, em termos sociológicos talvez mais precisos, da esfera profissional — nos modos de vida e nas configurações de sociedade actuais. Basta reparar em aspectos, por demais conhecidos, como as relações entre qualificações profissionais e estilos de vida ou entre desemprego e exclusão social, como a centralidade das políticas de emprego no debate público, nas prioridades de governação e nas estratégias de competitividade internacionais contemporâneas, ou como as exigências crescentes de realização pessoal enquanto horizonte de expectativas na vida profissional. O processo de inserção alargada das mulheres na esfera profissional constitui precisamente mais um destes aspectos, porventura dos de maior relevo actual.

Mas se esta é uma tendência geral na União Europeia, observam-se igualmente contrastes nacionais acentuados. Aliás, se há algumas variações nas taxas de actividade masculina, as principais diferenças registam-se nas taxas de actividade feminina. Entre países escandinavos como a Dinamarca, a Suécia ou a Finlândia, de um lado, e países mediterrânicos como a Itália, a Espanha ou a Grécia, do outro, a distância chega a quase 30 pontos percentuais a favor dos primeiros. Em meados da década de 80, o fosso ainda era maior, tendo a subida daí para cá sido muito mais intensa na Espanha do que na Itália, com a Grécia entre elas, apesar de as taxas permanecerem comparativamente baixas em qualquer destes países.

Próximo destes é o caso da Irlanda, com uma taxa de actividade feminina à partida muito reduzida e tendência de crescimento recente bastante forte. A Bélgica, com taxas igualmente em aumento substancial, não atingiu valores muito diferentes da Irlanda, apesar de ter partido de situação mais favorável. Verificou-se, do mesmo modo, crescimento significativo da presença feminina na esfera profissional em países onde ela já era relativamente alta (como o Reino Unido ou a França) e sobretudo onde tinha valores intermédios (como nos casos da Holanda e da Alemanha).

Vale a pena destacar, neste contexto, a "excepcionalidade portuguesa", onde a taxa de actividade feminina era, já em 1986, mais elevada do que os valores médios europeus, muito acima das dos outros países da Europa do Sul, em princípio mais próximos em termos socioeconómicos e socioculturais. Para isso terão contribuído os processos de emigração e mobilização militar dos homens nas décadas de 60 e 70, combinando-se mais recentemente a premência de necessidades de consumo básico perante padrões de vida em mutação com dinâmicas de procura de autonomia e emancipação pessoais por parte das mulheres (Almeida, Capucha, Costa, Machado e Torres, 2000).

O crescimento continuou intenso daí para cá, estando a taxa de actividade feminina em Portugal, no final da década de 90, próxima da de países como a Alemanha, Áustria, França e Holanda. Só os países nórdicos e, em certa medida, o Reino Unido, se situam num patamar um tanto superior. A maior incidência de profissionalização das mulheres portuguesas torna-se ainda mais notória se se atender a que predomina largamente o trabalho a tempo inteiro, em comparação com as proporções elevadas de tempo parcial na maioria dos países com taxas de actividade feminina mais alta, e se se atender também ao valor comparativamente muito elevado que a actividade profissional a tempo inteiro assume entre as mulheres portuguesas com filhos menores (Almeida, Guerreiro, Lobo, Torres e Wall, 1998).

Este percurso rápido por alguns dos parâmetros básicos dos processos de recomposição social na União Europeia não poderia deixar de fazer uma primeira referência aos níveis de escolaridade. A educação formal é hoje um dos elementos mais decisivos, tanto de organização dos quotidianos e dos trajectos de vida pessoais como de configuração das sociedades e dos seus processos de desenvolvimento. Constitui, actualmente, do mesmo modo, um dos mais importantes eixos segundo os quais se hierarquizam as distribuições desiguais de poderes, recursos e oportunidades, a nível pessoal e a nível societal.

Os processos de recomposição social — nomeadamente no que têm a ver com mobilidade social, qualificação profissional, capacitação cultural e mutação dos estilos de vida — têm sido em grande medida impulsionados pelas dinâmicas de alargamento da escolarização, quanto à amplitude dos universos sociais abrangidos e quanto aos níveis de escolarização atingidos. Do mesmo passo, estas dinâmicas não deixaram de arrastar consigo novas subalternizações ou mesmo novas exclusões sociais.

No quadro 1 toma-se como indicador simples a aquisição, pela população entre os 25 e os 64 anos, de pelo menos um grau equivalente ao ensino secundário, cada vez mais considerado como requisito minimamente ajustado aos horizontes contemporâneos de uma sociedade da informação e do conhecimento. A média europeia de escolarização secundária e superior, nesta faixa etária, é relativamente elevada, tendo passado de um pouco mais de 50%, no princípio da década de 90, para quase 60%, à medida que a década se aproximava do fim.

Mas as desigualdades entre países europeus são, neste plano, muito acentuadas. No terceiro quartel da década de 90, a situação variava entre percentagens de 80% e 70%, em países como a Alemanha, Dinamarca, Suécia, Áustria e Finlândia, passando por outros com valores entre os 65% e os 55%, casos da Holanda, França, Bélgica ou Reino Unido, até outros que ainda não ultrapassavam os 50%, descendo daí até a alguns pontos acima dos 30%, nos quais se incluem a Irlanda, Luxemburgo, Grécia, Itália e Espanha. Continuando por ordem decrescente, abaixo só surge um país, Portugal, ainda pouco acima dos 20%.

Entre os extremos a diferença é abissal: vai dos 80% (Alemanha) aos 22% (Portugal). Nas outras dimensões acima examinadas, apesar das diferenças, poder-se-ia ainda assim considerar estar-se perante estruturas demográficas convergentes e níveis de profissionalização não muito dissemelhantes. Mesmo para as taxas de actividade feminina, onde os perfis são mais diferenciados, o intervalo entre os valores máximo (Dinamarca) e mínimo (Itália) não passa dos 30 pontos percentuais. Mas quanto aos níveis de escolaridade os contrastes são enormes.

A questão é tanto mais importante quanto é em grande medida neste domínio que se jogam hoje as estratégias de competitividade e as políticas de desenvolvimento — o que tem implicações fortes a nível das sociedades nacionais (no que elas têm de unidades diferenciadas) e, por consequência, nas relações que estabelecem entre si. De outro ponto de vista, é também um dos parâmetros mais decisivos segundo os quais se posicionam, em termos de hierarquias de capacidades, de oportunidades e até, tendencialmente, de qualidade de vida, as pessoas e os segmentos populacionais que integram a União Europeia, tomada no seu conjunto, enquanto unidade agregada supranacional.

Acresce ainda que, no período considerado, Portugal foi dos países em que menos aumentou a percentagem de população adulta com estes graus de escolaridade, apesar do crescimento rápido do número de alunos matriculados nesses níveis de ensino. No entanto, como se vê, tal crescimento ainda não produziu efeitos de recuperação significativa das distâncias que separam as taxas de escolarização secundária e superior da população portuguesa relativamente às médias europeias. A maioria dos outros membros da União Europeia não permaneceu estática, aliás, a este respeito. Países que, no período considerado, partiam igualmente de níveis baixos, embora não tanto, como a Itália, Irlanda, Espanha, Grécia ou Luxemburgo, aumentaram bastante mais. Mesmo a Bélgica ou o Reino Unido, em que os níveis anteriores eram claramente mais altos, registaram subidas bem maiores no período em causa.

Resta mencionar que, na União Europeia como um todo, as percentagens de escolaridade secundária e superior são um pouco mais elevadas nos homens do que nas mulheres, embora essa assimetria tenha vindo a atenuar-se. Mas também aqui as diferenças nacionais são significativas. Segundo os dados recolhidos para o quadro 1, na Suécia, Finlândia e Irlanda, estes níveis de escolarização registam percentagens mais elevadas nas mulheres do que nos homens.

Em Portugal, as percentagens são praticamente idênticas, tendendo as mulheres a passar para a frente, sobretudo por força da frequência do ensino superior, com cerca de mais 20% de mulheres do que de homens no terceiro quartel da década de 90 (PNUD, 2000). Em países como a Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Grécia, Itália e Luxemburgo, as mulheres ainda apresentam percentagens alguns pontos mais baixas do que os homens, mas a tendência de aproximação é clara. Noutros casos, finalmente, como os da Alemanha, Áustria, Holanda e Reino Unido, as assimetrias são ainda bastante fortes em desfavor das mulheres.

 

Lugares de classe e recomposições socioprofissionais

A partir deste primeiro panorama, os processos de recomposição social na União Europeia tornam-se susceptíveis de análise um pouco mais fina, sendo o recurso aos indicadores socioprofissionais de classe de grande utilidade. Com efeito, estes indicadores permitem combinar de maneira sintética diversas dimensões essenciais de estruturação das relações sociais de classe contemporâneas.

O indicador socioprofissional aqui utilizado (quadro 2), integra, como variáveis principais, a profissão e a situação na profissão. Além disso, de maneira complementar, inclui informação relativa a aspectos da condição perante o trabalho, da qualificação profissional, da posição hierárquica e do sector de actividade.2 Do modo como foi construído, isto é, com as dimensões de análise que agrega e com a tipologia classificatória em que se desdobra, consegue dar tradução operatória a distinções conceptuais teoricamente nucleares neste domínio e, ao mesmo tempo, corresponder às configurações empíricas mais importantes na actualidade, em termos de escalas de grande amplitude societal. Por outro lado, pode tomar como dados de base os que estão hoje correntemente disponíveis nas estatísticas institucionais.

 

Quadro 2 Recomposições socioprofissionais na União Europeia, 1986-1997 (em percentagens)

 

Além disso, esse indicador socioprofissional possibilita a operacionalização de questões controversas no debate entre diversos quadros teóricos relevantes no âmbito deste campo de investigação. Aliás, os pontos de contacto com outras tipologias classificatórias, como as de Goldthorpe (Erickson e Goldthorpe, 1993), Esping-Andersen (1993) ou Wright (1997), são facilmente identificáveis, assim como não custará reconhecer as vantagens conceptuais e operatórias do presente sistema de categorias, aqui retomado na sequência de vários trabalhos anteriores (Almeida, Costa e Machado, 1994; Machado, Ávila e Costa, 1995; Benavente, Rosa, Costa e Ávila, 1996; Machado e Costa, 1998; Machado, 1998; Costa, 1999; Almeida, Capucha, Costa, Machado e Torres, 2000).3

Podem referir-se, muito brevemente, algumas dessas vantagens. Por comparação com o de Goldthorpe, este modelo tem o carácter de uma segmentação tipológica teoricamente alicerçada, e não meramente descritiva. Vem permitir, assim, remissões dos resultados empíricos para análises situadas em planos mais abstractos de problematização e, em termos operatórios, admite agregações destinadas à investigação do efeito relativo e dos modos de articulação de um conjunto de dimensões de fundo das relações de classe, dimensões essas analiticamente distinguíveis, mas às quais as categorias de Goldthorpe são em boa medida opacas.

Quanto à comparação com a tipologia de Esping-Andersen, as vantagens radicam basicamente na multidimensionalidade do indicador socioprofissional que aqui se utiliza, e também, de algum modo, na não associação apriorística de certas categorias a configurações separadas e datadas das estruturas de classes contemporâneas. Se, no primeiro aspecto, os ganhos são de ordem semelhante aos que se podem obter perante as classificações de Goldthorpe, no segundo estão em permitir analisar as articulações de conjunto das categorias socioprofissionais, atendendo às transformações de conteúdo substantivo e de posição relativa pelas quais essas categorias podem passar sob efeito das evoluções de vectores económicos, tecnológicos, institucionais e culturais estruturantes das sociedades contemporâneas.

Em relação às propostas de Wright, as vantagens da tipologia aqui utilizada têm a ver, sobretudo, com uma maior desagregação das categorias assalariadas de base, questão importante em vários planos. No plano teórico, possibilita a inclusão de dimensões de análise por esse autor descuradas. No plano empírico, atende a dinâmicas hoje em muitos aspectos claramente diferenciadas entre os assalariados de base da indústria e dos serviços. E, no plano operatório, evita categorias com efectivos completamente desproporcionados entre si, o que, quando acontece, como com as de Wright, para além de conduzir na prática a trabalhar com escalas diferentes num mesmo conjunto classificatório, torna problemáticas, em análises quantitativas, as operações estatísticas.

A mesma lógica de construção do indicador socioprofissional de classe de que se faz uso neste texto pode aplicar-se a diferentes unidades de análise (individual ou familiar, nomeadamente), pode abranger situações de pluriactividade e pode traduzir-se em maiores desdobramentos ou maiores agregações categoriais, consoante o objecto de estudo e o nível de análise.

No caso presente, o indicador possível, a partir das fontes estatísticas institucionais, sofre de várias restrições: é um indicador individual (não permite estabelecer relações entre membros dos grupos domésticos), sincrónico (não fornece indicações sobre trajectórias pessoais de mobilidade social), relativo à ocupação profissional principal (não capta as situações de pluriactividade) e deixa de fora uma parte não aferível da economia informal. Além disso, esta versão da tipologia classificatória é muito agregada, em sete categorias apenas. Cada uma delas abrange, inevitavelmente, grande diversidade interna. Mas possibilita, do mesmo passo, uma análise de conjunto viável à escala pretendida. Tudo está em dotar as categorias de conteúdo conceptual pertinente e controlável. Em estudos diferentes deste, a desagregação poderá e deverá ser maior, assim como noutros convirá um grau ainda superior de agregação.

Os indicadores socioprofissionais, este incluído, não recobrem toda a amplitude dimensional que as relações de classe podem conter. Mas nem por isso deixam de operacionalizar aspectos decisivos dessas relações. Recorde-se que os dados apresentados abrangem uma grande maioria da população adulta, como se viu no ponto anterior. Não representam, pois, informação respeitante apenas a uma qualquer hipotética minoria, de importância secundária no tecido social ou em processo de extinção, como pretendem fazer crer algumas teses apressadas sobre o "fim do emprego".

O aspecto porventura mais saliente, para a União Europeia como um todo, é o aumento rápido e significativo, verificado entre meados dos anos 80 e o terceiro quartel da década de 90, do peso percentual atingido pelas duas categorias melhor posicionadas na estrutura social: os "empresários, dirigentes e profissionais liberais", situados no topo das distribuições sociais de recursos, poderes e status, e os "profissionais técnicos e de enquadramento", basicamente as novas classes médias assalariadas, dotadas de níveis significativos de qualificações (técnicas, científicas e culturais) e/ou ocupando lugares intermédios nas hierarquias organizacionais. Em conjunto, representam agora quase 30% da população com actividade profissional. Em meados da década anterior pouco passavam dos 20%.

Na primeira dessas categorias, o acréscimo (da ordem dos 8% para a dos 14%) tem sobretudo a ver com a proliferação de pequenas e médias empresas, correspondente às dinâmicas de reorganização das unidades empresariais nos anos 80 e 90: focagem e externalização, concentração e subcontratação, nova empresarialidade tecnológica e auto-emprego de recurso. Em todos os países o acréscimo foi intenso, mantendo-se aproximadamente as posições relativas, com um máximo no Reino Unido (quase 20%) e um mínimo no Luxemburgo (perto de 10%). Portugal quase triplicou o peso percentual desta categoria, atingindo os 11,5%. Outra evolução importante, a nível da União Europeia e de cada um dos países, deu-se na relação entre homens e mulheres. É uma categoria ainda muito maioritariamente masculina (os homens são mais do dobro das mulheres), mas importa sublinhar que a distância se encurtou de maneira visível (na data anterior a relação era cerca de quatro para uma).

Na segunda das categorias referidas, a dos profissionais técnicos e de enquadramento, a subida de 10 pontos percentuais (da ordem dos 14% para a dos 24%) acompanha as tendências de fundo da chamada sociedade da informação e do conhecimento, com incorporação crescente de tecnicidade — operatória e relacional, simbólica e analítica — numa parte significativa das actividades económicas e dos serviços públicos. Acompanha igualmente outra tendência pesada, relativa à expansão dos "consumos qualitativos": lúdicos e culturais, estéticos e desportivos, de educação e saúde, entre outros. As duas tendências têm, aliás, conexões fortes entre si.

O peso relativo destes profissionais qualificados parece ser particularmente sintomático dos níveis de modernização das estruturas sociais e das capacidades competitivas das populações num mundo de crescente interdependência global. Noutros termos, tende a traduzir o respectivo posicionamento relativo, mais ou menos favorável, conseguido perante os processos interligados de inovação tecnológica e de globalização, no contexto dos quais a redistribuição das actividades profissionais — dos segmentos mais qualificados e remunerados, como estes, por um lado, e dos que o são bastante menos, por outro — se faz em termos planetários, cada vez com maior intensidade e de forma muito polarizada.

Os dados de recomposição socioprofissional apresentados no quadro 2 evidenciam os modos relativamente privilegiados de inserção da União Europeia neste contexto mundial. Mostram também que, no seu interior, a situação está longe de ser homogénea. Entre a Suécia, Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Holanda e Luxemburgo, com cerca de 30% de profissionais técnicos e de enquadramento, e os menos de 15% da Grécia e Portugal, a distância é muito grande. A Espanha, Itália e Irlanda estão um pouco acima, aproximando-se dos 20%, patamar já alcançado pelo Reino Unido ou pela Áustria. A Bélgica e a França ultrapassam um pouco os 25%.

Portugal, no período considerado, parte dos níveis mais baixos e duplica o peso relativo da categoria, subindo cerca de 7 pontos percentuais (da ordem dos 7% para a dos 14%). A Espanha, saindo aproximadamente do mesmo nível, sobe bastante mais; e a Grécia, começando melhor, atinge apenas situação idêntica à portuguesa. Na maioria dos outros países, pelo menos até onde é possível fazer comparações diacrónicas, os acréscimos variam entre cerca de 5 pontos percentuais e, em bastantes casos, perto de 10, ou mesmo bastante acima. São subidas tanto mais significativas quanto se reportam a casos em que os pesos relativos de partida eram já, na altura, bastante elevados. Destacam-se aqui exemplos como os da Bélgica, França ou Holanda, e, mais ainda, Luxemburgo e Alemanha.4

Os profissionais técnicos e de enquadramento são uma das categorias socioprofissionais em que a presença de ambos os sexos é mais equilibrada. Já na década de 80 a diferença não era enorme e aproxima-se agora de valores paritários, no conjunto da União Europeia. As dinâmicas de escolarização feminina contribuem decisivamente para este processo, numa categoria socioprofissional em que, cada vez mais, a detenção de níveis elevados de educação formal é condição de acesso. Em países como a Dinamarca, Finlândia e Suécia verifica-se mesmo, no terceiro quartel dos anos 90, uma presença feminina maioritária, no que são acompanhados de resto por Portugal, possivelmente numa manifestação mais da "excepcionalidade" atrás referida.

O outro conjunto mais importante na estrutura dos lugares de classe da União Europeia, tal como é possível captá-la através de indicadores socioprofissionais com as características deste, é constituído também por duas categorias, a dos "operários industriais" e a dos "empregados executantes". São ambas formadas por assalariados de base, sem qualificações elevadas nem poderes hierárquicos significativos. Os primeiros desempenham tarefas de produção fabril, oficinal, de estaleiro e de transporte; os segundos ocupam-se de actividades administrativas, comerciais, de segurança e de serviços pessoais variados.

Há várias objecções fortes à conhecida proposta de Wright (1997) a este respeito, de indistinção destas duas categorias num amplo "proletariado" actual. Com efeito, elas evidenciam atributos bastante distintos entre si: quanto à especificação técnica do trabalho que executam, quanto ao contexto relacional em que o desenvolvem, quanto às carreiras profissionais prováveis, quanto a tendências pesadas da sua evolução quantitativa, quanto à composição por sexos dos efectivos de cada uma e ainda quanto às suas auto-imagens de classe. Isto, não obstante a partilha de uma mesma condição assalariada de base e os laços sociais que as interligam no quotidiano profissional e extraprofissional. Torna-se, pois, analiticamente mais produtivo, poder-se examiná-las em separado, sempre que isso seja pertinente, não perdendo assim de vista aspectos significativos dos processos contemporâneos de estruturação social. É sempre possível agregá-las quanto ao que nelas se inscreva de condição comum.

No período em análise, o conjunto das duas categorias passa, na União Europeia, de perto de dois terços da população profissionalmente activa para pouco mais de metade. Ainda é, de longe, o segmento mais numeroso das pessoas com actividade profissional. Mas o decréscimo é muito significativo.

Mais especificamente, os operários passam de quase 30% para pouco mais de 23%, o que corresponde a processos conhecidos, tanto de intensificação tecnológica da produção industrial como de transferência de unidades fabris para áreas do globo em industrialização recente, com custos de mão-de-obra — directos e indirectos — muito mais baixos. Claro está que as variações nacionais não podem, também aqui, ser menosprezadas. Há uma diferença efectiva entre os mais de 25% de operários no tecido socioprofissional de países como a Alemanha, Áustria, Espanha ou Portugal, num extremo, e os menos de 20% da Holanda, Reino Unido e Grécia, no outro.

Estas diferenças, em todo o caso, não podem ser tomadas como indicadores lineares de níveis de desenvolvimento das estruturas sociais. Basta reparar nos dois subconjuntos de países acima assinalados, com as suas heterogeneidades internas, para dar conta de que o que está em causa é algo de mais complexo. O que se passa é a combinação de tendências gerais, manifestando-se em termos de conjunto a nível da União Europeia — em concreto, uma diminuição sistemática do peso relativo do operariado industrial —, com especificidades nacionais, respeitantes quer aos padrões de especialização produtiva, quer aos graus de modernização do tecido económico prevalecentes em cada país. Nem a omissão apriorística, na análise, daquelas tendências globais, nem a destas especificidades nacionais, conduzem a resultados cognitivos esclarecedores.

A descida do peso relativo dos empregados executantes é porventura mais surpreendente ou, pelo menos, tem sido menos analisada. Teses variadas, relativas a uma nova proletarização alargada nos países europeus, desta vez pela expansão crescente de um "proletariado pós-industrial", terciarizado e feminizado, não se viram completamente confirmadas nesta última década, pelo menos nas suas versões mais correntes.

É certo que a categoria socioprofissional dos empregados executantes — assalariados de base dos escritórios, comércio e serviços — esteve em crescimento até há pouco tempo na generalidade dos países da actual União Europeia (o que de algum modo justifica a proposta de teses como as referidas), tendo atingido, em todos estes países, uma das posições maioritárias na estrutura social, quase a par ou mesmo acima do operariado industrial. Ao contrário deste, no entanto, constituiu-se como categoria socioprofissional de dominante feminina. Foi através dela que, em grande parte, se processou a entrada maciça das mulheres na esfera profissional.

Mas, pelo menos desde a década de 90, a tendência de conjunto começou a inverter-se, como algum tempo antes tinha acontecido com o operariado industrial. Aliás, em países como Portugal e Grécia, onde a expansão dos empregados executantes é mais recente, ainda se verificou um certo crescimento no período em análise, correspondente sobretudo a uma intensificação do processo de feminização da categoria. Na Espanha, pelo seu lado, uma estabilização aparente dos empregados executantes esconde também uma feminização interna. Em quase todos os outros países, o movimento é de descida, nalguns casos bastante forte, como na Alemanha, França, Holanda, Luxemburgo ou Reino Unido. Nestes casos, mesmo a componente feminina, maioritária, começa a diminuir, dando o tom geral à União Europeia. Uma excepção é a Dinamarca, com um certo acréscimo do peso relativo da categoria em causa, devido à sua componente feminina.

No conjunto, estas tendências parecem apontar para a confluência de dois processos importantes. Do lado do tecido económico, tudo indica que, também nos serviços, embora de maneira internamente diferenciada e gradual, tenha finalmente começado a assistir-se a acréscimos significativos de produtividade, acompanhando a introdução das novas tecnologias da informação. Do lado do tecido social, como já se viu atrás, o aumento dos níveis de qualificação escolar das populações foi também bastante intenso.

Os dois processos convergem, na maior parte dos países europeus, numa reorganização da divisão social do trabalho, em direcção a taxas crescentes, na população activa, de profissionais de níveis médios ou elevados de qualificação, não só na produção fabril mas também nas funções administrativas, nas actividades comerciais, nos serviços prestados às empresas, nos serviços pessoais e nos serviços públicos, com correspondente perda de peso percentual dos empregados executantes. Tudo isto acontece em graus diferentes, consoante os sectores e os países, e acarreta, aliás, do outro lado da moeda, desvalorização relativa de segmentos mais ou menos extensos das actividades assalariadas de base, nos serviços como na indústria.

Poderá estar também interligado com estes um processo adicional, o de relocalização, noutras regiões do globo, de tarefas executantes dos serviços, com remunerações muito abaixo das praticadas na União Europeia, mesmo nos países que, como Portugal, têm níveis de rendimento dos trabalhadores consideravelmente inferiores à média europeia.

Apesar de esta relocalização ser, à partida, bastante menos generalizável do que no caso da produção industrial, devido ao carácter face-a-face de muitos serviços, verifica-se que uma parte crescente deles pode ser prestada à distância, com apoio nos dispositivos tecnológicos baseados na informática e nas telecomunicações. São tarefas comandadas e encomendadas a partir de zonas mais desenvolvidas do planeta, nomeadamente o espaço europeu, onde tendem a concentrar-se componentes destes serviços mais intensas em concepção técnica e estética, assim como em funções de coordenação. É muito difícil avaliar o grau em que tal processo será já responsável por parte do retrocesso percentual dos empregados executantes europeus, no essencial a favor dos profissionais técnicos e de enquadramento, mas a tendência está inscrita nas dinâmicas de globalização actualmente observáveis.

Aliás, um processo paralelo a este, integrante da mesma lógica global, é a relocalização de sentido inverso, através da mobilidade internacional de força-de-trabalho proveniente de países menos desenvolvidos, com inserção de parte significativa dos e das imigrantes em segmentos pouco qualificados, precários e mal remunerados do trabalho disponível, nomeadamente do emprego executante dos serviços.

Ao contrário dos anteriores, este último processo poderia contrariar, em alguma medida, a diminuição do peso relativo dos empregados executantes. Mas, nomeadamente em casos como Portugal, não só a importância percentual destes imigrantes no conjunto da população activa, apesar de crescente, permanece bastante reduzida, como parte deles, colocada em situações muito vulneráveis de trabalho informal, torna-se invisível à informação estatística institucional. Seja como for, à escala da União Europeia, o facto de, apesar deste fluxo imigratório, ser nítida a descida proporcional dos empregados executantes, vem sublinhar ainda mais o carácter estrutural dessa tendência.

Quanto aos "trabalhadores independentes", desenvolvendo actividade por conta própria nos sectores secundário e terciário,5 apesar de uma significativa persistência intersticial na estrutura socioeconómica (Freire, 1995; Wright, 1997), não deixam de, no período em estudo, parecer estar em queda proporcional na União Europeia, ao contrário do que tem sido convicção frequente. No conjunto, ficam aquém dos 5% da população activa. A situação varia bastante, no entanto, de país para país. Destacam-se, com taxas da ordem dos 10%, a Grécia e a Itália. A seguir, em torno dos 7%, aparecem Portugal, Espanha e Áustria.

Falta mencionar que os "assalariados agrícolas" se tornaram completamente residuais no espaço da União Europeia. Os "agricultores independentes" também atingiram níveis de peso percentual no conjunto da população activa bastante reduzidos, embora isso não signifique que tenham passado a ser socialmente insignificantes, longe disso, em termos económicos, políticos, sociais e ambientais. A situação não é igual em todos os países, salientando-se o peso relativo que os agricultores independentes ainda têm na Grécia, um tanto menos em Portugal e, de certo modo, na Irlanda.

Aliás, em países como estes, não se pode fazer justiça à importância efectiva da actividade agrícola no plano social, mesmo que não tanto no plano económico, se não se atender à larga mancha de pluriactividade envolvendo ligação complementar à agricultura. É um aspecto não captável por indicadores que se baseiam apenas na profissão principal, como o aqui utilizado. Os dados estatísticos relativos a actividades profissionais complementares, sobretudo com incidência comparativa, ou não existem, ou são pouco fiáveis. Mas os estudos de caso monográficos são elucidativos a esse respeito (por exemplo, para Portugal: Pinto, 1985; Almeida, 1986; Silva, 1994; Silva, 1998).

 

Formação de classes e recomposições socioeducacionais

A educação formal é hoje um dos elementos fulcrais tanto da organização dos quotidianos e dos trajectos de vida pessoais como da configuração das sociedades e dos seus processos de desenvolvimento. Constitui, do mesmo modo, um dos eixos actualmente decisivos de estruturação das distribuições desiguais de recursos, poderes e oportunidades, condicionando e capacitando diferentemente as pessoas para a vida social e contribuindo, de maneira cada vez mais acentuada, para a estruturação das relações de classe.

A distinção clássica — operada, aliás, por diversos paradigmas teóricos — entre os lugares nas estruturas de classes ou nos sistemas de estratificação, por um lado, e as distribuições das pessoas por esses lugares, por outro lado, não pode ser tomada senão como um expediente analítico, um "parêntese metodológico" (para retomar um conceito processual de Giddens), destinado a viabilizar a concentração analítica em aspectos específicos dos objectos de estudo, mas na condição de se ter sempre bem presente o carácter provisório da distinção. Algumas abordagens, hoje ultrapassadas, reificaram os termos da polaridade, tendendo a absolutizar redutoramente um deles, fossem as estruturas sociais, fossem os processos de mobilidade. Em contraponto, tornou-se há já bastante tempo aquisição teórica integrante da sociologia das classes sociais e da estratificação o reconhecimento de que os dois aspectos se interligam substancialmente no âmago mesmo da constituição das relações de classe.

Nenhum aspecto ilustra hoje melhor essa articulação entre estruturas de lugares de classe e processos de formação das classes — no que nestes últimos respeita, especificamente, às principais instâncias e dinâmicas que limitam e habilitam as pessoas no acesso a diferentes posições relativas no espaço social — do que a aquisição de formação escolar e a obtenção dos respectivos certificados. Os graus de escolaridade não são, evidentemente, o único recurso socialmente relevante distribuído desigualmente nas sociedades contemporâneas. Mas tornaram-se um dos mais importantes e, possivelmente, daqueles que têm vindo a provocar impacte mais profundo e mais alargado nas reconfigurações do espaço social.

É também um dos domínios em que se observam, com clareza, quer a importância crescente dos processos transversais que hoje ocorrem a nível mundial, em contexto de globalização, quer a presença persistente das diferenças nacionais, se bem que elas próprias igualmente em transformação. Entre estas salientam-se tanto os diferentes padrões socioculturais que se vão estabelecendo nas diversas sociedades (com as suas sedimentações de longo prazo e as suas mutações mais ou menos rápidas), como o impacte das diferentes configurações institucionais e das diferentes políticas públicas de âmbito estatal — duplo conjunto de factores este, aliás, acerca do qual está ainda por esclarecer, de maneira satisfatória, qual o peso relativo de cada um e quais os modos de articulação entre ambos nos processos de desenvolvimento por que têm passado os diversos países.

 

Quadro 3 Recomposições socioeducacionais na União Europeia, 1992-1997 (em percentagens)

 

Seja como for, os dados que se apresentam no quadro 3 são esclarecedores acerca dos efeitos simultâneos, neste domínio, das dinâmicas partilhadas a nível da União Europeia como um todo e das configurações específicas, institucionais e socioculturais, das diversas sociedades nacionais-estatais dela integrantes. Não fazem mais, aliás, do que tratar com pormenor adicional (em termos de escalões etários e de graus de ensino) a informação que, a este respeito, consta do quadro 1. Seria redundante, pois, retomar aqui toda a análise feita atrás a propósito dessa informação.

Entre a primeira e a segunda metade da década de 90, a população europeia, na faixa etária dos 25 aos 64 anos, aumentou os níveis de escolaridade de maneira que se pode considerar significativa, tendo em conta o curto período analisado. Tanto os valores do nível secundário como os do nível superior cresceram 2 ou mais pontos percentuais cada um. O que quer dizer que, hoje, quase 20% da população adulta da União Europeia tem o ensino superior, perto de 40% o ensino secundário e cerca de 40% o ensino básico.

Na faixa etária mais nova considerada, entre os 25 e os 34 anos, esses valores são mais avançados: aproximadamente 22% para o superior e 46% para o secundário; só 32% tinham escolaridade inferior, no fundamental o ensino básico. A melhoria gradual dos níveis de escolarização fica evidente comparando esta distribuição com as dos dois escalões etários imediatamente mais velhos. Por exemplo, tomando como comparação o escalão dos 45 aos 54 anos, verifica-se que a percentagem dos que alcançaram o ensino superior subiu quase 4 pontos percentuais e a dos que atingiram o ensino secundário cresceu à volta de 11 pontos.

As diferenças entre os diversos países são muitos grandes, neste plano, traduzindo percursos históricos, padrões socioculturais e políticas de ensino de carácter bastante diferenciado. Têm, por outro lado, implicações não menos relevantes no presente imediato e no futuro a médio prazo, nomeadamente em termos de posicionamento relativo perante um contexto de sociedade da informação e do conhecimento. Implicações importantes, também, são as que daqui decorrem quanto aos diferentes perfis de composição social nos países respectivos.

Assim, as principais variantes na escolarização actual dos países da União Europeia, a par dos patamares atingidos pelos valores agregados do ensino secundário com o ensino superior, atrás analisados (ver quadro 1), encontram-se na proporção relativa destes dois níveis de ensino. É de ter em conta, no entanto, que os graus de ensino são cumulativos, havendo sempre valores implícitos de ensino secundário subsumidos nos do ensino superior.

Quer nos casos em que o conjunto das percentagens de ensino superior e ensino secundário são das mais altas, quer naqueles em que estes valores são intermédios, as proporções relativas desses dois graus não são sempre idênticas, em correlação com estruturas económicas, sistemas de ensino-formação e perfis culturais de atribuição de status bastante variáveis.

Um caso extremo, por exemplo, é o da Áustria, com fortíssima formação de nível secundário e taxas relativamente pequenas de ensino superior. Exemplo inverso é o da Bélgica, com níveis de ensino superior dos mais elevados, mas com percentagens de ensino secundário abaixo da média europeia. Os dois graus de escolaridade são em simultâneo dos mais altos em países como a Alemanha, Dinamarca e Suécia, e ainda, em certa medida, como a Finlândia e a Holanda. Um pouco abaixo, as proporções relativas no Reino Unido e na França são de sentido inverso, o primeiro com valores mais elevados do que a segunda no ensino superior mas acontecendo o contrário quanto ao ensino secundário.

Nos países com mais baixos perfis de escolarização a situação também não é homogénea. Destes, a Irlanda é o que maiores valores apresenta, no conjunto, e dos que têm também percentagens mais próximas nos dois níveis, secundário e superior. A Espanha apresenta valores mais altos no superior do que no secundário, acontecendo o contrário com a Grécia e, sobretudo, com a Itália. Portugal tem percentagens aproximadamente iguais para estes dois graus de ensino, sendo desse ponto de vista mais parecido com a Irlanda, mas com metade ou menos das percentagens. Em concreto: 11% no superior e 11% no secundário, o que significa 78% da população considerada com, no máximo, o ensino básico completo. Comparando com a média europeia de, aproximadamente, 19%, 39% e 42%, respectivamente, a distância é enorme. Isto para já não falar do que se passa relativamente a vários países do centro e do norte da Europa.

Mesmo em confronto com a Espanha ou com a Grécia, as distâncias são significativas. Tanto mais quanto, no período de referência, a percentagem de população portuguesa entre os 25 e os 64 anos com ensino superior só subiu meio ponto percentual, enquanto na Espanha subiu 6 pontos e na Grécia mais de 3. Quanto ao ensino secundário, Portugal aumentou perto de 2 pontos percentuais, enquanto na Espanha o aumento foi de 3 e na Grécia quase de 6. São discrepâncias crescentes, pelo menos por enquanto, o que é corroborado pelo facto de, em relação a estes dois países, as distâncias a que se encontra Portugal serem ainda maiores no escalão etário mais novo (25-34 anos), apesar de, internamente à população portuguesa, aqueles valores terem, num intervalo de vinte anos (isto é, comparando com o escalão etário dos 45 aos 54 anos), quase triplicado quanto ao ensino secundário e aumentado em cerca de 50% quanto ao ensino superior.

Algumas consequências são evidentes, no que respeita à formação de relações de classe na União Europeia e à posição da população portuguesa nelas. Começando por este último aspecto, uma dessas consequências é que a composição social que se vem formando em Portugal tende a assumir perfis bastante mais desqualificados, do ponto de vista das competências cognitivas e dos recursos profissionais, do que na maioria dos restantes países, se não mesmo em todos eles, pelo menos até ao terceiro quartel da década de 90. Outra é que, em países como Portugal, a estrutura de classes tende a constituir-se de maneira muito mais polarizada do que naqueles em que prevalecem distribuições mais avançadas de recursos educativos. Consequência ainda, ligada às anteriores, é que, considerando desta vez, não os diversos países, mas sim a União Europeia como um todo, a maioria da população portuguesa tende a concentrar-se nos lugares mais subalternos e desfavorecidos desse espaço social integrado — se bem que isso não aconteça com toda ela, como é óbvio.

Num outro plano, com implicações teóricas de carácter geral, o que mais uma vez se verifica, agora com a análise destes indicadores socioeducacionais, é que, nos processos actuais de formação de relações de classe observáveis na União Europeia, se combinam duas ordens de factores. Uns têm a ver com dinâmicas globais, de incidência transnacional, e traduzem-se no facto incontornável de que a formação das relações de classe passa hoje, em larga medida, por intensos processos de qualificação escolar — incluindo, importa não esquecer, o ónus redobrado que, neste contexto, passa a recair sobre as situações de subqualificação escolar ou mesmo de exclusão dessas qualificações.

Outros, não menos significativos, são factores relativos aos impactes de estruturas sociais e culturais específicas aos diversos países, bem como de instituições e políticas públicas nacionais diferenciadas, na formação das relações de classe. A medida em que essas estruturas, instituições e políticas se inscrevem no âmbito de regulação dos vários estados nacionais está em mutação mas permanece significativa, resultando nas diferenças bem marcantes entre países evidenciadas por estes indicadores, mesmo tão simples e parcelares como os que tem sido possível aqui utilizar.

Esta sobreposição de factores manifesta-se também, aliás, na composição socioeducacional por sexos. O processo de escolarização feminina, partindo de níveis inferiores às taxas masculinas mas tendendo a ultrapassá-las, é relativamente transversal ao espaço europeu, como se viu. Mas também aqui as variações nacionais se mostram bastante significativas. Mesmo considerando apenas a faixa etária mais jovem, o quadro 3 evidencia padrões distintos, desde casos em que as percentagens relativas ao ensino superior são claramente mais elevadas nas mulheres (como na Suécia, Dinamarca ou Finlândia, Bélgica ou França, Grécia ou Portugal), ou daqueles em que isso acontece tanto no secundário como no superior (Irlanda, Espanha, Itália), ou ainda apenas no secundário (Áustria, Holanda), até aos casos em que as taxas do sexo feminino são nitidamente mais baixas no superior (Alemanha), no secundário (Bélgica) ou em ambos (Reino Unido, Luxemburgo).

 

Novas desigualdades?

Uma das questões mais discutidas, neste domínio, ao longo da última década, é o surgimento de novas desigualdades sociais, em sobreposição ou mesmo em substituição das "antigas", entendendo-se por estas as de "classe". Como terá já ficado claro, há aqui um duplo equívoco, conceptual e factual.

No plano conceptual, isso significa entender a análise de classes de maneira ultrapassada, como um qualquer modelo explicativo unidimensional e redutor, ou mesmo como um simples sistema de categorias rígidas e inalteradas. Ora, a análise de classes, em vez de propor respostas pré-fabricadas, faz do tema das desigualdades, distinções e diferenças sociais um campo de problematização e investigação.

Procura, nomeadamente, investigar que relações assimétricas de poderes e que distribuições desiguais de recursos tendem a configurar-se em cada contexto, segundo que parâmetros, com que peso relativo recíproco e através de que modos de interinfluência entre eles, procurando também analisar causas e efeitos, assim como as articulações com outros domínios e outras dimensões do relacionamento social. Pode-se sempre fazer isto sem recorrer à terminologia de "classes" ou de "estratificação", embora seja em geral vantajoso na produção científica utilizar vocabulários conceptuais comunicáveis e produtivos. O que será certamente negativo, em todo o caso, é prescindir não só da terminologia mas também do conhecimento especializado desenvolvido, testado e acumulado neste domínio.

No plano factual, o que acontece é que muitas das supostas novas desigualdades não são nada novas e muitas das hipoteticamente desaparecidas antigas desigualdades estão bem presentes hoje em dia muito embora tenham mudado, evidentemente, em maior ou menor grau, de conteúdo e implicações. As hierarquias de status, as distinções associadas a diferentes estilos de vida, as desigualdades sociais entre homens e mulheres, a importância das clivagens étnicas, a autonomia relativa e os modos de constituição específicos das formas de acção colectiva perante as categorias de condições sociais de existência — tudo isso só por caricatura se pode considerar emergência recente. Basta relembrar, por exemplo, as contribuições fundadoras de Max Weber (1922, 1978) a respeito de muitos destes aspectos. No mundo actual assumem configurações diferentes e importâncias diversas de outras anteriores? É o que interessa precisamente investigar, em vez de apenas postular. A questão está em aferir como, em que medida e segundo que modalidades é que tal acontece, em vez de fechar prematuramente a análise com uma qualquer generalidade apriorística.

Por outro lado, indicadores como os que se têm vindo a analisar, entre vários outros possíveis, bem como múltiplos estudos em produção permanente, mostram bem que as desigualdades associadas a categorias socioprofissionais ou a formações escolares, por exemplo, estão longe de ter desaparecido da paisagem social contemporânea ou deixado de produzir efeitos marcantes na vida das pessoas e na organização das sociedades. Basta olhar as diferenças de oportunidades, de rendimentos, de possibilidades de consumo ou de realização pessoal, ou então as diferenças de sensibilidades, preferências e estilos que lhes estão associadas, não como monocausalidade determinista mas como alguns dos factores, mais ou menos decisivos, de tendências identificáveis em campos estruturados de possibilidades. Que reconfigurações estão em curso nestes aspectos? É também isso que importa investigar, em vez de, mais uma vez, os elidir aprioristicamente do horizonte de observação.

É sabido como são hoje importantes as fragmentações do tecido social, as polarizações de rendimentos, os processos de exclusão social, as precarizações profissionais, as oscilações de trajectória de vida. São fenómenos que ganham actualmente novos contornos, os quais carecem de pesquisa. Mas só quem não tenha um mínimo de perspectiva histórica ignorará que, poucas décadas atrás, em Portugal mas não só, a pobreza era endémica e as polarizações de rendimentos abissais, na generalidade o assalariamento era precário e as trajectórias de vida estavam maciçamente sujeitas às contingências da emigração e das reconversões rurais-urbanas. Convém, pois, investigar novas configurações, mas sem tomar as imediatamente anteriores por mundos quase eternos que de repente teriam desabado. Pelo contrário, essas situações sociais de referência comparativa não passaram, muitas vezes, de etapas com duração relativamente curta.

A absolutização como definitivos de processos em grande medida conjunturais tem levado a generalizar excessivamente, por exemplo, a respeito do problema do desemprego. São conhecidos pretensiosos edifícios teórico-especulativos construídos, nas últimas duas décadas, sobre a inevitabilidade do fim do emprego. Ora não só o trabalho assalariado de carácter minimamente formalizado estava efectivamente a aumentar de forma acentuada em termos mundiais (um dos aspectos da globalização), como nos países da União Europeia se assistia à entrada em larga escala da população feminina na esfera profissional — fenómeno socioculturalmente tão irreversível quanto o pode ser qualquer processo social. Isto para já não falar da diminuição significativa das taxas de desemprego no final da década de 90, designadamente na União Europeia.

Certo é que, também a este respeito, se combinam tendências globais, partilhadas, com situações específicas e percursos muito diversificados, tanto em termos nacionais como sectoriais, tal como se combinam oscilações de conjuntura com articulações fortemente estruturadas. O que interessa, do ponto de vista cognitivo, é analisar essas combinações e não postular simplificações. Os quadros 4, 5 e 6 contêm indicadores que permitem ilustrar estas combinações multidimensionais.

 

Quadro 4    Desemprego, emprego a tempo parcial e contratos a prazo na população dos 15 aos 64 anos, União Europeia, 1998 (em percentagens)

 

É possível observar por exemplo, no quadro 4, as importantes diferenças de desemprego nos diversos países em 1998, apesar da imersão comum tanto nos processos de globalização e inovação tecnológica como no quadro institucional da União Europeia. Dos mais de 11% de desempregados em Espanha, no total da população dos 15 aos 64 anos, aos menos de 2% no Luxemburgo, as diferenças nacionais não se podem considerar insignificantes.6 Em muitos países o desemprego feminino era maior que o masculino, mas noutros passava-se o inverso. Em quase todos o desemprego jovem era maior do que a média, mas nuns casos muito acima e noutros nem tanto. Além disso, em diversos países o desemprego de longa duração era mais de metade do total de desemprego, mas havia casos em que não passava de um terço ou menos.

Se o desemprego, apesar das diferenças de nível entre os diversos países, oscila com as conjunturas de maneira mais ou menos sincronizada em grande parte deles, já o trabalho a tempo parcial aparece mais enraizado em padrões nacionais, sexuais e etários relativamente persistentes, se bem que não imutáveis.

É possível, assim, verificar que o trabalho a tempo parcial é muito mais feminino do que masculino, no conjunto da União Europeia; que varia entre menos de 10% do conjunto de empregados nos países da Europa do Sul até quase 40% de toda a população empregada na Holanda, passando por valores também bastante altos em países como a Dinamarca, Suécia e Reino Unido, ou intermédios na generalidade dos outros; e que se está perante lógicas sociais claramente diferenciadas quando, de um lado, o emprego a tempo parcial é em grande medida característico de uma fase de juventude, como na Finlândia, Dinamarca ou Holanda, ou pelo menos assume nessa faixa etária maior importância percentual, como na maioria dos países europeus, e, de outro lado, predomina entre os mais velhos, como em Portugal, Áustria e Alemanha.

A percentagem de contratados a prazo é igualmente bastante variável, mais alta do que a média europeia em países com percentagens de desempregados também elevadas, como a Finlândia e sobretudo a Espanha, mas também mais alta em Portugal, onde os níveis de desemprego são comparativamente baixos. São situações que representam combinatórias diferentes de factores de precariedade no mercado de trabalho, correlativas, aliás, de modalidades e qualidades diferenciadas na prestação estatal de segurança social. Os casos de taxas de contratos a prazo claramente abaixo da média europeia — Áustria e Bélgica, Irlanda e Itália, Luxemburgo e Reino Unido — não remetem também para situações homogéneas entre si.

Mas se estes indicadores, em si mesmos, nos valores que apresentam, remetem tanto para processos oscilatórios em larga medida conjunturais como para vincadas particularidades nacionais de tecido sociocultural e de regulação institucional, já as relações que estabelecem com parâmetros fundamentais de caracterização social, como os analisados em pontos anteriores, se revelam fortemente estruturadas e acentuadamente transversais. Pondo a questão de outro modo, muitas vezes esses indicadores percebem-se melhor analisando as respectivas articulações, não raro bem identificáveis, com dimensões que se revelam, nas sociedades contemporâneas, profundamente organizadoras, no espaço e no tempo, das relações sociais. São destas exemplo privilegiado, como se viu atrás, as dimensões socioprofissionais e socioeducacionais.

A título de ilustração, apenas, basta ver como as taxas de desemprego, mesmo nas conjunturas do passado próximo em que atingiram valores muito elevados, estão estruturalmente associadas aos níveis educacionais. O quadro 5, com dados de 1997, mostra que a relação é sistemática: quanto maior o grau de ensino, menor a taxa de desemprego. Isto tanto para a União Europeia no seu conjunto como para os diversos países, tanto para escalões etários muito amplos como só para os mais jovens, tanto para os homens como para as mulheres, e variando gradualmente no mesmo sentido ao longo dos diversos níveis educacionais.

 

Quadro 5 Taxas de desemprego segundo o nível educacional, União Europeia, em 1997 (em percentagens)

 

É claro que há padrões algo diferentes e pequenas excepções. Há países em que as taxas de desemprego registam maior quebra na passagem das pessoas com ensino básico para as que atingiram o secundário, mantendo-se depois relativamente estabilizadas, enquanto noutros, pelo contrário, o ganho principal de empregabilidade acontece na passagem do secundário para o superior. Noutros, ainda, os valores vão sempre variando regularmente, de grau para grau de ensino. É esta, aliás, a relação que se estabelece na União Europeia tomada como um todo.

As características de cada país, quanto aos respectivos tecidos económicos, sistemas de ensino-formação e percursos de escolarização das populações, ajudam a perceber as variantes, ou mesmo as excepções pontuais. Uma destas ocorre, aliás, em Portugal, com um pico mais elevado de taxa de desemprego no segmento com o ensino secundário. Traduz-se aqui o perfil muito pouco profissionalizante que este tem vindo a assumir no país, bem como a importância ainda nele vigente das actividades económicas que fazem apelo a trabalhadores com baixos níveis de qualificação.

No conjunto o padrão é claríssimo, não só no seu registo empírico, mas também na sua inteligiblidade analítica, como terá ficado suficientemente esclarecido ao longo das considerações feitas anteriormente acerca da crescente importância profissional dos recursos educacionais nas sociedades contemporâneas. De novo ressalta a imbricação de dimensões altamente estruturantes das relações de classe actuais, como as de ordem socioprofissional e socioeducacional.

 

Quadro 6 Condição perante o trabalho segundo o nível educaional na população dos 25 aos 59 anos, União Europeia, 1997 (em percentagens)

 

Os dados do quadro 6 corroboram esta análise e permitem ampliá-la. As relações examinadas valem para o confronto, não só da população empregada com a desempregada, mas também destes dois segmentos com o da população inactiva. Também neste aspecto se podem observar particularismos nacionais, mas no quadro de um padrão de relações global muito bem definido: entre os empregados os perfis de escolaridade tendem a ser melhores do que entre os desempregados, e os perfis de escolaridade dos inactivos são em regra ainda mais fracos.

Aliás, considerando em particular as taxas de escolarização no ensino superior, o posicionamento relativo destes dois últimos segmentos da população adulta (desempregados e inactivos) regista enorme regularidade: a única excepção surge na Suécia, suscitando, como em tantos outros casos, possibilidades de focagem analítica de grande interesse, mas que estão aqui, como é óbvio, fora de alcance e de oportunidade.

Note-se apenas, quanto a Portugal, que a grande diferença, nas percentagens relativas ao ensino superior, se manifesta entre os empregados e todos os restantes, aparecendo a população desempregada com perfil semelhante ao da população inactiva. Quanto às percentagens relativas ao ensino secundário, as maiores proximidades são, pelo contrário, entre empregados e desempregados — o que aponta quer para clivagens de exclusão difíceis de superar, quer para fluxos de circulação tendencialmente facilitados, consoante o posicionamento nas distribuições desiguais de recursos escolares.

 

Conclusão

A discussão a que aqui se procedeu, centrada na análise das tendências actuais de reconfiguração das estruturas de classes na União Europeia, não pôde deixar de aflorar, se bem que apenas de passagem, um certo número de questões de ordem geral, hoje em dia relevantes no âmbito da sociologia das classes sociais e da estratificação. Em especial, foi necessário fazer referência à questão substantiva da globalização, à questão teórica do alcance actual da análise de classes, à questão metodológica das unidades de análise pertinentes, à questão operatória das tipologias classificatórias e dos indicadores, à questão técnica das fontes de informação.

Quanto ao objecto de investigação propriamente dito, muitos indicadores adicionais poderiam ser convocados para uma abordagem mais completa dos temas a que se reporta. Seria evidentemente muito interessante fazê-lo, quer no sentido da elucidação mais fina dos aspectos atrás examinados das relações de classe, quer no da incorporação na análise de outros aspectos, não menos importantes, incidindo sobre fenómenos sociais presentemente relevantes, mas não tratados neste texto, ou nele apenas aflorados. Entre estes podem destacar-se, a título ilustrativo, aspectos como os da exclusão social e do exacerbamento da competição, da intensificação cognitiva e das conexões em rede, das homogeneizações e fragmentações concomitantes dos estilos de vida, do cosmopolitismo e do fundamentalismo nas suas formas actuais.

Terá sido possível, porém, clarificar o que se colocava aqui como questão principal. Em contexto de globalização, há tendências de estruturação das relações de classe que se configuram de maneira largamente transnacional, em particular a nível de espaços sociais alargados em crescente integração, como é o caso da União Europeia (Bradshaw e Wallace, 1996; Waters, 1999). No entanto, em simultâneo, as sociedades nacionais-estatais estão longe de se ter diluído, mesmo neste espaço integrado. As configurações institucionais, os modos de regulação estatal, os tecidos económicos e os padrões socioculturais, nas suas especificidades nacionais, produzem também efeitos decisivos nessa estruturação das relações de classe.

A persistência e o peso destes últimos factores, muitas vezes descartados com excessiva ligeireza da análise desde que a globalização entrou na ordem do dia científica e mediática, têm sido, aliás, objecto de importantes contributos recentes, no âmbito das ciências sociais, como, por exemplo, os de Mozzicafreddo (1997), Smith (1995, 1999), Esping-Andersen (1999), Ferrara, Hemerijck e Rhodes (2000). Tais contributos, embora desenvolvidos segundo perspectivas variadas, convergem na evidenciação do referido tipo de efeitos. Estes, por sua vez, não se concretizam ao abrigo dos processos de globalização, mas em múltiplas modalidades de interligação com eles, cuja análise aprofundada e sistemática apenas se começa a esboçar.

Trabalhando os indicadores referidos com base nos principais recursos teóricos e operatórios que têm vindo a ser desenvolvidos pela sociologia das classes sociais e da estratificação contemporânea, e procurando elaborar de maneira cuidadosa a informação captável através deles, foi possível lançar alguma luz sobre como, na União Europeia, se articulam duas vertentes fundamentais da formação das relações de classe: a constituição de "lugares de classe", na medida sobretudo em que ela está ligada a dinâmicas estruturantes do tecido económico-organizacional, e a constituição de "classes de agentes", cada vez mais tributária dos sistemas de educação/formação.

Ambos os processos, sem deixarem de comportar lógicas sociais específicas, estão, como se viu, profundamente interligados, confluindo designadamente nas recomposições das categorias socioprofissionais. Sublinhe-se, todavia, que nestas recomposições intervêm também outros factores, aqui não directamente analisados, relativos às lógicas sociopolíticas da acção colectiva e às lógicas simbólicas das classificações sociais.

Que ajustamentos e desajustamentos se verificam entre aqueles processos? De momento, a análise realizada chama sobretudo a atenção para que as dinâmicas observáveis na União Europeia são de carácter fortemente transnacional no que respeita às reconfigurações estruturais dos "lugares de classe", e mais dependentes dos quadros de regulação nacionais-estatais quanto às recomposições sociais associadas à formação de "classes de agentes" — para usar um par terminológico que peca por formalismo mas tem a virtude da concisão. Seria evidentemente redutor isolar os planos e descurar as imbricações mútuas. Além de que se trata, como é sempre verdade, de processos em aberto, sujeitos a tensões fortes e a possibilidades de mudança significativa em intervalos de tempo relativamente curtos. A análise sociológica respectiva está, a este propósito, a dar os primeiros passos.

 

 

Notas

1    O presente artigo resulta do projecto de investigação "A modernização das estruturas sociais", coordenado por João Ferreira de Almeida, realizado por uma equipa do CIES e apoiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (programa Praxis XXI). Uma primeira análise da informação empírica aqui apresentada foi objecto da comunicação de João Ferreira de Almeida, "Duas fotografias comparadas", ao 4º Congresso Português de Sociologia (APS, Coimbra, Abril de 2000).

2    Para uma especificação pormenorizada do modo de construção deste indicador, e de outros relacionados, pode consultar-se Costa (1999: 226-245).

3    Aliás outros autores com contributos recentes na área, sem aderirem ponto por ponto a estas propostas nem referirem expressamente os trabalhos aqui mencionados, acabam, eventualmente por influência delas, por apresentar e utilizar tipologias classificatórias muito próximas (Cabral, 1998).

4    No caso da Alemanha a comparação diacrónica é menos precisa, uma vez que os dados de 1986 referem-se apenas à antiga Alemanha ocidental e os de 1997 à Alemanha unificada.

5    Não se incluem aqui os profissionais liberais de qualificação, rendimento e status elevados, exercendo actividade por conta própria, considerados parte da categoria "empresários, dirigentes e profissionais liberais", atrás analisada.

6    Os valores de desemprego referidos no quadro 4 são as percentagens de desempregados no total da população dos 15 aos 64 anos e não as taxas de desemprego, como habitualmente consideradas, as quais se calculam como percentagens de desempregados por relação apenas à população activa. O indicador aqui utilizado tem, nas comparações internacionais, a vantagem analítica de não depender da taxa de actividade, ela própria bastante variável de país para país, e a vantagem operatória de, combinado com as taxas de actividade (quadro 1), permitir reconstituir directamente a decomposição da população nos três subconjuntos de empregados, desempregados e inactivos. Tem também desvantagens, mas são provavelmente cada vez menos importantes, à medida que as fronteiras entre população activa e inactiva vão ficando menos rígidas.

 

 

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*António Firmino da Costa, Fernando Luís Machado e João Ferreira de Almeida são sociólogos, professores do ISCTE e investigadores do CIES. Rosário Mauritti e Susana Martins são sociólogas e investigadoras do CIES. Contactos por e-mail: antonio.costa@iscte.pt; fernando.machado@iscte.pt; ferreira.almeida@iscte.pt; rosario.mauritti@iscte.pt; susana.martins@iscte.pt

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