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Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. vol.19 no.3 Lisboa maio 2012

 

Uso do infliximab na consulta de gastrenterologia pediátrica

 

The use of infliximab in a pediatric gastroenterology consultation

 

Rita Marques, Filipa Caldeira, Cláudia Costa, José da Cunha e Maria Gomes Ferreira

Serviço Pediatria, Hospital Garcia de Orta, Almada, Portugal

*Autor para correspondência

 

Resumo

Introdução: O infliximab e um anticorpo monoclonal utilizado na doença inflamatória intestinal (DII) refrataria.

Objetivo: Avaliar a resposta clinica e os efeitos adversos da terapêutica com infliximab na DII em doentes pediátricos.

Métodos: Estudo descritivo, analítico e transversal dos doentes da consulta de gastrenterologia pediátrica que ingressaram em protocolo terapêutico com infliximab.

Resultados: Dos 6 doentes que realizam terapêutica monoclonal com infliximab, 5 apresentam doença de Crohn moderada a grave e um colite ulcerosa. Verificou-se remissão clinica em 5 doentes. Observou-se resolução das alterações analíticas apos 6 meses de terapêutica. Verificaram-se 2 reações alérgicas ligeiras e uma elevação transitória das transaminases.

Conclusões: Em concordância com o descrito na literatura, na nossa população a terapeutica com infliximab tem sido bem tolerada e eficaz no controlo da doença.

PALAVRA-CHAVE Infliximab; Doença inflamatória intestinal; Pediatria

 

Abstract

Introduction: Infliximab is a monoclonal antibody used in refractory inflammatory bowel disease (IBD).

Aim: To evaluate the clinical response and adverse effects of infliximab therapy in paediatric IBD patients.

Methods: Analytic, descriptive and cross sectional study of Outpatient Clinic of Pediatric Gastroenterology treated with infliximab.

Results: Of six patients treated with infliximab, five have moderate to severe Crohn’s disease and one present Ulcerative Colitis. There was clinical remission in five patients. Resolution in analytical changes was observed after 6 months of therapy. There were two mild allergic reactions and a transient elevation of transaminases.

Conclusions: In accordance with the literature, in our population, infliximab therapy has been well tolerated and effective in disease control.

KEYWORDS Infliximab; Inflammatory bowel disease; Pediatric

 

 

Introdução

O infliximab e um anticorpo monoclonal com afinidade elevada ao fator de necrose tumoral α (TNF-α). Esta citocina participa em múltiplas vias pro-inflamatórias e proliferativas da doença inflamatória intestinal (DII).

Dois estudos foram importantes no conhecimento desta terapêutica biológica. O primeiro foi o estudo randomizado e multicêntrico REACH para a avaliação da segurança e eficácia da terapêutica com infliximab em doentes pediátricos com doença de Crohn moderada e severa1. Este estudo levou a aprovação oficial pela FDA deste fármaco em doentes pediátricos. O segundo trabalho refere-se a um estudo randomizado e cego, SONIC, que demonstrou que o infliximab em monoterapia e a terapêutica combinada de infliximab mais azatioprina, em comparação com a azatioprina isolada, conduziram a uma taxa significativamente mais elevada de remissão clinica sem corticosteroide nos doentes com doença de Crohn moderada a grave2.

Em 2010 foi aprovada pelo Infarmed a utilização desta terapêutica biológica para o tratamento da doença de Crohn ativa, grave, em doentes com idades compreendidas entre os 6 e os 17 anos, que não apresentassem resposta a terapêutica convencional.

Embora o tratamento com infliximab nao esteja aprovado para a colite ulcerosa, a sua eficácia nesta doença foi demonstrada nos estudos ACT-1 e ACT-2 (Active ulcerative colitis trial)3.

Os autores pretendem com este estudo avaliar a resposta clinica e os efeitos adversos da terapêutica com infliximab na DII em doentes pediátricos.

 

Material e métodos

Foram incluídos todos os doentes pediátricos com DII submetidos a tratamento com infliximab ate março de 2011. Foi realizado um estudo descritivo, analítico e transversal efetuado através da consulta dos processos clínicos dos doentes da consulta de gastrenterologia pediátrica do Hospital Garcia de Orta, que ingressaram em protocolo terapêutico com infliximab. A terapêutica monoclonal e realizada as 0, 2 e 6 semanas e posteriormente de 8/8 semanas, na dose de 5 mg/kg por via endovenosa. Todos os doentes que ingressaram em protocolo terapêutico apresentavam doença ativa e refrataria a terapêutica convencional e a sua utilização foi aprovada pela Comissão de Ética deste hospital. O diagnostico de doença de Crohn foi estabelecido de acordo com os critérios do Porto. Nos pacientes com doença de Crohn a resposta clinica foi avaliada através da escala Pediatric Crohnˇıs Disease Activity Index (PCDAI) no início e apos 6 meses de terapêutica e classificada em 3 categorias: remissão clinica, resposta parcial e ausência de resposta. Definimos remissão clinica como PCDAI final inferior a 10. Nos casos com PCDAI final superior a 10 mas descida igual ou superior a 15 valores da avaliação inicial, consideramos a resposta como parcial. Para avaliação da resposta clinica no único doente com colite ulcerosa foi utilizada a escala Pediatric Ulcerative Colitis Activity Index (PUCAI), sendo considerada remissão clinica um PUCAI final inferior a 10. Para a analise estatística utilizou-se o SPSS v.19.0 e o nível de significância estabelecido foi de p < 0,05.

 

Resultados

Seis doentes pediátricos (4 do sexo feminino) iniciaram terapêutica com infliximab. 5 apresentavam doença de Crohn moderada a grave (PCDAI > 30), 4 com doença penetrante do ileon e/ou colon e um com doença estenosante a nível do duodeno. Um caso apresentava colite ulcerosa grave (PUCAI de 70) com pancolite. Todos apresentavam doença ativa, grave e refrataria a terapêutica convencional (corticoterapia e imunossupressão). A idade média de início do tratamento foi de 15,7 anos. O intervalo medio entre a data de diagnóstico e o início da instituição de terapêutica monoclonal foi de 3,5 anos. Verificou-se que quanto maior foi esse intervalo, maior repercussão existiu na altura (p = 0,032). A duração média de tratamento ate a data do estudo foi de 15,7 meses.

Verificou-se remissão clinica em 5 doentes. Um doente teve resposta clinica inicial parcial (descida PCDAI de 65 para 37,5) sendo necessário o encurtamento do esquema para de 6 em 6 semanas.

Verificou-se um aumento ponderal medio de 8 kg, assim como uma subida média de 0,58 valores no z-score de índice de massa corporal.

A data de início do tratamento 5 doentes apresentavam anemia e um padrão inflamatório com pico de _1/_2 na eletroforese de proteínas, com resolução analítica apos 6 meses de terapêutica. Em todos houve normalização da velocidade de sedimentação e da albumina.

Verificaram-se 2 reações alérgicas ligeiras e uma elevação transitória das transaminases (2 vezes os valores normais) num dos doentes, que não conduziram a interrupção da terapêutica. Não se detetaram infeções durante o tratamento.

Num dos doentes a terapêutica com infliximab foi suspensa ao fim de 2 anos pela melhoria clinica verificada, tendo no entanto sofrido uma recaída com necessidade de cirurgia para dissecção ileal ao fim de um ano. Noutro doente a terapêutica com infliximab foi substituída por adalimumab por comodidade de administração, com boa resposta clinica.

Na tabela 1 estão resumidos os resultados obtidos.

 

Tabela 1 Resumo dos resultados obtidos

 

Discussão

O infliximab, sendo a primeira terapia biológica aprovada para o tratamento da doença de Crohn em doentes pediátricos, surge como uma nova opção terapêutica nesta população. Os primeiros relatos sobre a sua segurança e eficácia demonstraram que as taxas de remissão eram francamente superiores quando comparados com a terapêutica convencional4-8. E curiosamente a eficácia era superior nas crianças quando comparadas com os adultos5,6.

No entanto, ainda depende mais do julgamento clinico do que de uma abordagem baseada na evidencia, a decisão de quais os pacientes que mais beneficiam desta terapêutica, se e melhor a sua utilização isolada ou em combinação, e a altura ideal para a sua introdução no decurso da doença9.

Embora os benefícios do infliximab estejam melhor estabelecidos para a doença de Crohn, houve uma resposta clinica e laboratorial favorável no nosso doente com colite ulcerosa.

Não podemos também esquecer que existe risco associado a esta terapêutica (hipersensibilidade, aumento do risco de infeção e potencial risco de malignização) pelo que os doentes em tratamento devem ter um acompanhamento regular e adequado. Contudo, e em concordância com o descrito na literatura, na nossa população e ate a data de conclusão do estudo, a terapêutica com infliximab tem sido bem tolerada e eficaz no controlo da doença.

No entanto, realçamos que o reduzido tamanho da amostra e o curto período de seguimento levam a que o nosso estudo apresente limitações importantes. Salientamos a necessidade de realização de futuros estudos multicêntricos para avaliar convenientemente a utilização do infliximab na DII da população pediátrica, tendo em conta o número reduzido de doentes nos diversos centros.

 

 

Bibliografia

1. Hyams J, Crandall W, Kugathasan S, Griffiths A, Olson A, Johanns J, et al. Induction and maintenance infliximab therapy for the treatment of moderate-to-severe crohn’s disease in children. Gastroenterology. 2007;132:863-73.         [ Links ]

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Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

 

*Autor para correspondência

Correio eletrónico: ritamarq@gmail.com (R. Marques).

 

Recebido a 22 de abril de 2011; aceite a 5 de novembro de 2011