SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.18 número5Terapêutica de Manutenção da Remissão na Colite Ulcerosa Moderada a Grave: Infliximab e Inverdade índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. vol.18 no.5 Lisboa set. 2011

 

A evidência dever-se-á sobrepor à convicção

 

Fernando Magro1 em nome dos autores do artigo: Terapêutica de manutenção da remissão na colite ulcerosa moderada a grave. GE-J Port Gastrenterol 2011;18:170-178.

1Instituto de Farmacologia e Terapêutica; Faculdade de Medicina do Porto; Serviço de Gastrenterologia, Hospital de São João, Porto

 

Agradecemos ao Prof. Fernando Tavarela Veloso a honra que nos concedeu na leitura do nosso artigo intitulado “Terapêutica de Manutenção da Remissão na Colite Ulcerosa (CU) Moderada a Grave”1 e do interesse que lhe suscitou, tendo dirigido uma carta ao Editor. As considerações que tece permitem que alguns pontos da terapêutica da colite ulcerosa sejam esclarecidos. O objectivo do grupo nominal foi centrado na imunossupressão começando com a pergunta “Existem subgrupos de doentes com CU com maior propensão para atitudes imunomoduladoras?”. Pelo facto “não foi considerada a terapêutica com salicilatos” contudo a sua importância não foi ignorada. Alguns autores Portugueses publicaram recentemente três artigos abordando esta problemática. Puderam demonstrar que: 1) em 2863 doentes com CU, o maior estudo de natureza transversal realizado em Portugal, “Thirty eight percent of patients had only take salicylates during the disease course of UC” 2, 2) em 1549 doentes com CU, reunindo os pacientes do norte de Portugal e Galiza, foi afirmado que “The majority of patients (53%) were treated only with mesalamine”3 e 3) num artigo de revisão recentemente publicado no IBD que analisou os estudos longitudinais de natureza populacional constatou que a administração de aminossalicilatos oscilou entre 63-90%4.

O autor da carta refere que “o infliximab foi introduzido recentemente no tratamento da CU”, contudo recordo que está na prática clínica, após aprovações regulamentares, desde 2005 no tratamento da CU e desde 1998 na doença de Crohn, tendo sido um fármaco, extensamente investigado e de intensa vigilância farmacológica, sem precedentes na farmacologia da DII. De facto, o TREAT registry5 reunindo dados de 6273 doentes com doença de Crohn (DC) demostrou que embora os doentes com DC a efectuar Infliximab tivessem uma maior gravidade a proporção de doenças malignas e a mortalidade foi semelhante aos que não receberam o fármaco. De salientar que em análise multivariada o risco de infecção foi associado à utilização de corticosteroids (HR 2,11; 95% CI 1,49, 3.00; p < 0,001).

Comenta, ainda, que no artigo por nós elaborado, existe evidência de que “tanto o infliximab como a azatioprina são fármacos úteis na manutenção da remissão da CU” e “O infliximab deve ser considerado o fármaco de 1ª linha em doentes com CU moderada refractários à azatioprina”. Estas afirmações são por nós obviamente reiteradas e a própria EMA, agencia europeia do medicamento, aprovou o Infliximab para “treatment of moderately to severely UC in patients who have had an inadequate response to conventional therapy including corticosteroids and 6-MP or azathioprine, or who are intolerant to or have medical contraindications for such therapies”. A mesma agência homologou a terapêutica de manutenção após comprovação de eficácia, isto é, após indução. Em seguida afirma que “Os estudos ACT1 e ACT27 avaliam a recidiva durante a extensão do período de follow-up, mas em nenhum deles é feita a re-randomização à semana 8, pelo que é impossível afirmar-se que o efeito de manutenção da remissão é devido ao infliximab”. É importante salientar que o ACT englobou 728 doentes com CU com actividade moderada a grave, é o maior estudo prospectivo, randomizado, controlado e de dupla ocultação jamais realizado na história da CU, e cerca de 40% dos doentes eram refractários aos imunomoduladores. O Infliximab foi mais eficaz que o placebo no respeitante ao end-point primário (resposta clinica à 8 semana) e secundários. A sua análise em “open-extension” às 152 semanas (cerca de 3 anos) evidenciou que 54.6% dos doentes não tinham actividade e em 89,5% a actividade era ligeira ou inexistente (avaliação em “Physician’s Global Assessment”)8. Em relação à impossibilidade de “afirmar-se que o efeito de manutenção da remissão é devido ao infliximab9”, no artigo que serve como fonte de citação referindo-se à indução da actividade, afirma que “there was a statistically significant benefit of infliximab over placebo, the NNT with infliximab to achieve remission in one patient with moderately or severely active UC was 4 (95% CI 3–8), and the RR of any adverse event was no higher with infliximab, and serious adverse events were lower”.

Nós sabemos que o ACT 1 e ACT 2, ensaios clínicos de indução e manutenção, têm um desenho que não considera a pré-seleção de doentes consoante a resposta ao tratamento de indução à 8 semana, contudo, foram analisados em “intention to treat” (ITT), o processo de avaliação mais conservador e exigente em ensaios clínicos. Isto é, doentes que tenham necessitado de recorrer a outros tratamentos ao longo do protocolo foram considerados não respondedores. Ao afirmar-se que “O papel da azatioprina na prevenção da recidiva é bem conhecido desde há mais de 3 décadas”, e que “está estabelecido que a azatioprina é o único imunossupressor com inquestionável evidencia científica”, é importante salientar que na análise deste fármaco: 1) existem seis estudos com apenas 286 doentes que comparam as purinas ao placebo ou outro comparador na terapêutica de manutenção, 2) só quatro estudos têm placebo, 3) a co-medicação com messalazina foi permitida pelo menos num estudo10, 4) exceptuando o estudo de Hawthorne et al10 em todos os restantes a randomização foi efectuada na fase activa, e a manutenção foi precedida de indução, 5) em dois estudos foram utilizados antibióticos durante a indução, 6) a metodologia (avaliada por Jadad) foi considerada insuficiente em quatro dos seis ensaios, 7) todos os estudos tinham poucos doentes (máximo de 80)11. As limitações são tão preocupantes que a revisão da Cochrane11 sobre azatioprina conclui que : “There is insufficient evidence to assess superiority of azathioprine alone, or azathioprine in addition to standard maintenance, as compared to standard maintenance with mesalazine or sulfasalazine only.” Gostariamos ainda de afirmar que a capacidade de cicatrização induzida pela azatioprina foi modestamente avaliada na CU e o melhor estudo neste contexto é o UC-success que à 16 semana (end-point secundário) evidenciou cicatrização da mucosa em 37% dos doentes tratados com azatioprina e em 55% dos que efectuaram terapeutica com Infliximab12.

Pelo exposto, reiteram os autores as conclusões no artigo publicado no GE1 e é seu dever reforçar as recomendações da European Crohn and Colitis Organization (ECCO): “In a patient responding to infliximab, infliximab is recommended for maintenance treatment [EL1b, RGA]13”. Salientamos, por último, que a nossa posição é bastante conservadora, à luz das questões científicas da actualidade, que questionam a monoterapia com Infliximab na indução e na manutenção da CU, uma vez que admitimos que “o infliximab deve ser considerado o fármaco de 1ª linha em doentes com CU moderada refractários à azatioprina” e nunca colocamos a hipótese de manutenção com biológico em doentes sem indução prévia com Infliximab.

 

 

REFERÊNCIAS

1. Magro F, Benito-Garcia E, Cremers I, et al. Terapêutica de manu­tenção da remissão na colite ulcerosa moderada a grave. GE-J Port Gastrenterol 2011;18:170-178.         [ Links ]

2. Portela F, Magro F, Lago P, et al. Ulcerative colitis in a Southern European country: a national perspective. Inflamm Bowel Dis. 2010;16:822-829.         [ Links ]

3. Barreiro-de Acosta M, Magro F, Carpio D, et al. GEDII; EIGA. Ulcerative colitis in northern Portugal and Galicia in Spain. Inflamm Bowel Dis. 2010;16:1227-38.         [ Links ]

4. Fernando Magro, Andreia Rodrigues, Ana Isabel Vieira, et al. Review of the Disease Course Among Adult Ulcerative Colitis Population-based Longitudinal Cohorts. Inflamm Bowel Dis 2011.         [ Links ]

5. Lichtenstein G, Cohen R, Feagan B, et al. Safety of infli­ximab and other Crohn’s disease therapies: TREAT TM Registry Data with 24,575 patient- years of follow-up. in 73rd Annual Scientific Meeting of the American College of Gastroenterology 2008. Orlando, Florida, USA.         [ Links ]

6. www.ema.europa.eu/docs/pt_PT/document_library/EPAR_-_Product_Information/human/000240/WC500050888.pdf

7. Rutgeerts P, Sandborn WJ, Feagan BG, et al. Infliximab for induction and maintenance therapy for ulcerative colitis. N Engl J Med 2005;353:2462–2476.         [ Links ]

8. Walter Reinisch, William J. Sandborn, Paul Rutgeerts, et al. Long-term Infliximab Maintenance Therapy for Ulcerative Colitis: The ACT-1 and -2 Extension Studies. Inflamm Bo­wel Dis 2011: oneline.         [ Links ]

9. Ford A C, Sandborn W J, Khan K J, et al. Efficacy of biologi­cal therapies in inflammatory bowel disease: systematic re­view and meta-analysis. Am J Gastroenterol 2011;106:644-659.         [ Links ]

10. Hawthorne AB, Logan RF, Hawkey CJ, et al. Randomised controlled trial of azathioprine withdrawal in ulcerative colitis. BMJ 1992;305(6844):20–22.         [ Links ]

11. Timmer A, McDonald JW, Macdonald JK. Azathioprine and 6-mercaptopurine for maintenance of remission in ulcerative colitis. Cochrane Database Syst Rev. 2007 Jan 24;(1):CD000478.         [ Links ]

12. Remo Panaccione, Subrata Ghosh, Stephen Middleton, et al. Infliximab, Azathioprine, or Infliximab and Azathiopri­ne for Treatment of Moderate to Severe Ulcerative Colitis: the UC SUCCESS Trial. JCC 2011: Oral presentation.         [ Links ]

13. Travis SPL, Stange EF, Lémann M, et al. On behalf of the Eu­ropean Crohn’s and Colitis Organisation (ECCO). European Evidence-based Consensus on the Management of Ulcerta­tive Colitis: Current Management. JCC 2008;2:24-62.         [ Links ]