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Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. v.18 n.4 Lisboa jul. 2011

 

A importância de um Centro de Registo de Dados

 

António Curado1

1Presidente da Comissão Coordenadora do CEREGA; Centro Hospitalar das Caldas da Rainha; E-mail: curado.a@gmail.com

 

Quando preparamos uma comunicação sobre determinada patologia e queremos fazer referência à sua frequência estatística, é comum socorrermo-nos de dados epidemiológicos da literatura internacional. Afirmamos frequentemente que em Portugal não existem dados estatísticos seguros sobre as mais variadas patologias.

Os registos nacionais são inexistentes ou insuficientes.

Por outro lado, constata-se também a raridade da publicação de estudos multicêntricos portugueses, nomeadamente na área da Gastrenterologia.

É certamente reconhecida por todos a importância e a necessidade do conhecimento da realidade nacional no que respeita à patologia do foro gastrenterológico.

Para dar resposta a essas necessidades, a Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia (SPG), sob a presidência do Prof. Carlos Sofia, criou (a 18 de Março de 2006) o Centro de Registo de Dados de Gastrenterologia (CEREGA), tendo a sua logística sido inaugurada a 5 de Maio de 2007.

Este organismo da SPG visa apoiar o desenvolvimento de estudos sobre doenças do aparelho digestivo, apontando os seus estatutos para o desenvolvimento de registos nacionais, estudos epidemiológicos e clínicos, e estudos multicêntricos.

As preocupações com o vazio de estudos e registos epidemiológicos nacionais são comuns a outras especialidades e algumas delas já têm vindo a desenvolver bom trabalho no terreno.

A Sociedade Portuguesa de Cardiologia (SPC), por exemplo, criou, em 2001, o Centro Nacional de Colecção de Dados em Cardiologia (CNCDC) com o objectivo de promover e facilitar a realização de estudos cooperativos nacionais. E esse objectivo parece ter sido conseguido dado que, segundo informações recolhidas no site da SPC, mais de uma centena de comunicações científicas resultaram dos registos efectuados, nomeadamente do Registo Nacional de Síndromas Coronárias Agudas e do Registo Nacional de Cardiologia de Intervenção, entre outros.

Também a Sociedade Portuguesa de Reumatologia valorizou os registos nacionais, existindo actualmente, pelo menos, cinco registos para as patologias inflamatórias, nomeadamente para os doentes com artrite reumatóide, espondilite anquilosante, artrite idiopática juvenil e artrite psoriática, sendo cada vez mais representativo o registo nacional de doentes com artrite reumatóide que utilizam terapêuticas biotecnológicas (BioRePortAR). Deste último estudo pode inferir-se o quanto será importante para as próprias autoridades de saúde (Direcção-Geral da Saúde e Infarmed) a existência dos Registos Nacionais.

Ainda outros exemplos: a Sociedade Portuguesa de Pneumologia tem disponíveis Bases de dados electrónicas para Registo de Doenças Difusas, de Tumores Torácicos, de Bronquiectasias e Défice de a1-antitripsina.

No âmbito da Saúde em geral, o Observatório Nacional de Saúde (ONSA), agora denominado Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (www.insa.pt), desenvolveu “trabalhos de análise e síntese de diversos dados e indicadores relativos ao estado de saúde e seus determinantes da população residente em Portugal”.

Obtendo os dados directamente da população (inquéritos) ou indirectamente, recorrendo à colaboração dos prestadores de cuidados de saúde dos vários sectores, foi possível coligir informação que contribuiu para aprofundar o conhecimento de como se adoece e morre em Portugal.

No entanto, esse conhecimento continua a ser muito limitado nalgumas áreas, e nomeadamente na da Gastrenterologia.

Fazendo uma breve pesquisa sobre as patologias gastrenterológicas registadas ao longo dos últimos anos por esse Observatório, constatei que a informação disponível é muito esparsa.

Há a referência a um estudo de incidência de hepatite B e C relativo ao período de 1995-1997 e um estudo de 2003, em colaboração com o Centro de Farmacoepidemiologia da Associação Nacional das Farmácias sobre Regimes terapêuticos para a Úlcera péptica e o Helicobacter pylori.

Em 2005, o ONSA publicou um Relatório sobre doenças crónicas – “Uma observação sobre estimativas da prevalência de algumas doenças crónicas, em Portugal Continental”–, no qual se faz referência à prevalência de sintomas de Doença de refluxo gastro-esofágico e também ao diagnóstico da Doença de Crohn.

Qual foi o método utilizado? O relatório resulta de um inquérito realizado por entrevista telefónica, entre 25 de Novembro e 15 de Dezembro de 2004, a elementos de 18 e mais anos, residentes em Portugal. Foram contactadas telefonicamente 1211 unidades de alojamento e foram obtidos dados de 3434 indivíduos, sendo a partir daí extrapolados os resultados para a população portuguesa.

Mesmo sem questionarmos as metodologias, cabe afirmar mais uma vez: na área da Gastrenterologia são poucos os registos de dados nacionais.

É claro que há honrosas excepções. O que foi feito recentemente na área das doenças inflamatórias intestinais pelo GEDII (Grupo de Estudo da Doença Inflamatória Intestinal) merece os mais rasgados elogios.

Tenho consciência de que estou a correr o risco de ignorar outros bons estudos epidemiológicos feitos em Portugal. Terá havido estudos meritórios na área da epidemiologia das doenças gastrenterológicas, nomeadamente nas doenças hepáticas, mas, habitualmente, são estudos envolvendo poucos centros ou mesmo de um só centro.

Lembro aqui também como nota positiva o estudo publicado recentemente, promovido pelo NGHD (Núcleo de Gastrenterologia dos Hospitais Distritais), envolvendo 15 centros sobre hemorragias digestivas baixas agudas.

Fica, portanto, um enorme espaço para a implementação de estudos multicêntricos e de registos nacionais na área da Gastrenterologia.

O trabalho persistente do Prof. Rui Marinho na coordenação do CEREGA permitiu desbravar múltiplas dificuldades e abrir os primeiros caminhos.

Está no terreno um estudo multicêntrico respeitante ao registo nacional de hepatites tóxicas (estudo HEPTOX), que englobará pelo menos 22 centros. A ultimar os programas informáticos respectivos, pronto para ser apresentado e ir para o terreno, está o Registo Nacional das Hepatites Víricas.

Outros se seguirão, assim o esperamos.

Faz, por isso, todo o sentido relembrar aqui no GE – Jornal Português de Gastrenterologia, a existência deste organismo da SPG – o CEREGA, e sublinhar a sua importância junto de todos os gastrenterologistas, de quem esperamos uma crescente participação em estudos multicêntricos.

Para além dos estudos multicêntricos e dos Registos nacionais, talvez possamos vir a ser mais ambiciosos e criar uma estrutura com condições de apoiar a investigação, nomeadamente na área da concepção de estudos e análises estatísticas, e, até, porventura, desenvolver parcerias que permitam a criação de um biobanco nacional de patologias gastrenterológicas.

 

REFERÊNCIAS

1. Página da internet da Sociedade Portuguesa de Cardiologia e microsite do Centro Nacional de Colecção de Dados em Cardiologia. http://www.spc.pt/CNCDC/ (Acesso em Maio de 2011).        [ Links ]

2. Página da internet da Sociedade Portuguesa de Reumatologia e do Observatório Português de Reumatologia. http://www.spreumatologiapt/content/observatorio-de-doencas-reumaticas. (Acesso em Maio de 2011).        [ Links ]

3. Página da internet da Sociedade Portuguesa de Pneumologia – Bases de Dado. http://www.sppneumologia.pt/ (Acesso em Julho de 2011).        [ Links ]

4. Artigos e publicações, ONSA. http://www.onsa.pt/index_17.html (Acesso em Maio de 2011).        [ Links ]

5. Branco MJ, Nogueira P, Contreiras ( Julho, 2005). Uma observação sobre a prevalência de algumas doenças crónicas, em Portugal Continental. http://www.onsa.pt/conteu/rel_preval-doencas-cronicas_onsa.pdf (Acesso em Maio de 2011).        [ Links ]

6. Arroja B, Cremers I, Ramos R et al., Acute lower gastrointestinal bleeding management in Portugal: a multicentric prospective 1-year survey. Eurpean Journal of Gastroenterology & Hepatology 2011,23,317-322.        [ Links ]