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Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. v.18 n.2 Lisboa mar. 2011

 

Checklist

 

José Eduardo Mendonça Santos1

1Gastrenterologista; E-mail: josesantos@netcabo.pt.

 

O termo checklist, que se pode traduzir por “Lista de Verificação”, provém da década de 30 do século passado, da força aérea norte-americana, quando se percebeu que a complexidade crescente dos aviões provocava, devido a falhas de concentração ou de memória, acidentes fatais, os quais se mostrou que eram evitados com a criação de listas de verificação que devem ser rigorosamente cumpridas.

Podemos definir checklist como a verificação metódica de todas as etapas de um procedimento para que este se desenvolva com o máximo de segurança.

Apesar da inegável vantagem destas medidas para a aeronáutica tem sido surpreendentemente lenta a disseminação para outros ramos; de qualquer modo, a indústria mais especializada já as adoptou e hoje, até para ingresso nalgumas universidades portuguesas encontramos, nos respectivos sites, checklists para os candidatos não omitirem qualquer dado importante que possa comprometer o seu ingresso; também os bancos usam checklists para coisas tão simples como abertura de contas e até organismos oficiais, como a ARS Norte, apresentam checklists no seu relacionamento com o público através da internet.

Conexo com esta problemática temos, na Medicina, tudo o que se relaciona com o Erro Médico1 e a Medicina Baseada na Evidência2, que tem despertado a atenção de muitas figuras, de que cito, a título de exemplo e respectivamente, os Professores José Fragata e António Vaz Carneiro2,3 além, naturalmente, do trabalho da SPED que, em Novembro de 2008 levou a efeito um Simpósio intitulado “Qualidade em Endoscopia Digestiva. Da Formação à Prática: Que Futuro?”, o qual deu origem à publicação de um volume de normas de qualidade em endoscopia digestiva, distribuída na 6ª Reunião Nacional de Endoscopia Digestiva, realizada em Coimbra em Março de 2009.

A Organização Mundial de Saúde (WHO/OMS) publicou em 2008 guidelines para garantir a segurança dos doentes cirúrgicos em todo o Mundo e, no ano passado, divulgou online (www.who.int/safesurgery) o Implementation Manual WGOSurgical Safety Checklist 20094, coordenada por Atul Gawande, depois de vários estudos desencadeados por um notável trabalho de Peter Provonost, que mereceu honras de destaque no conhecido New Yorker 5, e que demonstrou que, nas Unidades de Cuidados Intensivos, a simples implementação de um rigoroso controlo do emprego das clássicas medidas de desinfecção na colocação de cateteres venosos centrais, causou uma baixa da mortalidade e das complicações, reduzindo igualmente o tempo de internamento; evidentemente este controlo implicou a designação de controladores, com poder para obrigar qualquer elemento a refazer todo o procedimento quando falhasse algum passo.

Em Portugal, foi decidido implementar na generalidade das unidades do SNS, a partir de 15 de Janeiro de 2010, com início no Hospital de Santa Marta, a checklist de segurança cirúrgica, baseada na referida directiva da OMS.

Parece claro que é chegada a hora de aproveitar estas grandes lições na Gastrenterologia, especialidade com inúmeras técnicas cada vez mais próximas ou comuns à cirurgia, em que a intervenção roça, com frequência, atitudes de séria complexidade e risco.

Na medida do possível, devemos minimizar, até ao limite, as possibilidades de erro, conferindo todos os passos indispensáveis bem como verificando previamente o material, as alterações de medicação (suspensão de anticoagulação ou, pelo contrário, instituição de antibioterapia), etc. Não é demais recordar que a institucionalização das checklists na cirurgia permitiu constatar que coisas tão simples e óbvias como a confirmação de que o doente a entrar para o bloco é mesmo o que está marcado ou a identificação correcta do local de intervenção, por exemplo, o lado de um ponto herniário, não eram frequentemente confirmados.

Para além de nos ajudar a tratar melhor os nossos doentes, a implementação das checklists pode-nos ajudar na defesa de processos judiciais que tenderão, inevitavelmente, a aumentar sendo que um dos pontos a serem conferidos (“checados”) será a confirmação da assinatura do consentimento informado, mas também que, dentro do humanamente possível, tudo foi feito para minimizar os riscos.

Obviamente será difícil a implementação das checklists, sendo esperadas, quase garantidas, resistências, pelo que se sugere a sua entrada progressiva, com ajuste dos itens indicados a cada instituição, mas partindo duma base geral e universal. Mais do que nomear pessoas, devem-se utilizar as que se sintam motivadas, tendo o apoio da Direcção de Serviço e da Administração do Hospital.

Devem ser incluídos os vários grupos, no caso concreto e para além dos médicos, obrigatoriamente os enfermeiros e pessoal auxiliar, como o(s) secretário(s) de unidade, etc, naturalmente em aspectos sectoriais das checklists, devendo sempre haver um responsável /coordenador; não devemos esquecer as especialidades que colaboram, directa ou indirectamente, como os anestesistas, cirurgiões, radiologistas e anátomo-patologistas.

A checklist deve ser o mais pequena e clara possível – idealmente de 5 a 9 pontos concisos em cada segmento, cada um dos quais verificável num minuto. Um segmento competirá ao secretariado – marcação correcta do exame com todas as indicações que se justifiquem, como vir acompanhado, trazer exames anteriores, não só da especialidade mas gerais, como análises, ECG, etc, outro, prévio ao início da sessão, será da competência dos enfermeiros de sala – verificar se está a postos tudo o que possa ser necessário, não só para as “rotinas” mas também e principalmente para casos urgentes, como hemorragias (adrenalina, polidocanol, etc, nas doses adequadas), outra dos gastrenterologistas, confirmando a medicação habitual, história de alergias, patologias associadas e, em exames programados, exactamente o que é esperado encontrar.

No final do exame, novamente deverão ser “checados” os procedimentos subsequentes – correcta rotulagem de frascos de biópsia, tempo sem comer ou conduzir viaturas, cuidados gerais e retoma de medicação suspensa, nova consulta, etc.

A verificação da checklist deve ser verbal, ainda que com a colocação de um sinal (V) no local respectivo.

É sempre aconselhado começar lentamente mas com passos seguros, com voluntários motivados, sendo a disseminação progressiva, à medida que se consigam cativar aderentes.

É tempo de avançar!

 

REFERÊNCIAS

1. Special eurobarometer: Medical Errors. Ed. European Commission 2005. http://ec.europa.eu/health/ph_information/documents/eb_64_en.pdf (Acesso em Abril 2011).

2. José Fragata, Luís Martins. O erro em medicina: perspectivas do indivíduo, da organização e da sociedade. Coimbra, Ed. Almedina, 2004.        [ Links ]

3. Risco Clínico - Complexidade e Performance. Pedro Pita Barros, José Fragata, Seabra Santos, Sofia Ferreira, Mercedes Bilbao, Isabel Fragata, Margarida França. Coimbra, Ed. Almedina, 2006.

4. Implementation Manual WGO Surgical Safety Checklist 2009. World Health Organization 2009. http://whqlibdoc.who.int/publications/2009/9789241598590_eng.pdf (Acesso em Abril 2011).

5. The New Yorker. The Checklist, Dec, 10, 2007, Arthur Gawande. http://www.newyorker.com/reporting/2007/12/10/071210fa_fact_gawande (Acesso em Abril 2011).