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Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. v.17 n.5 Lisboa set. 2010

 

Recomendações para o tratamento de doentes com hemorragia digestiva alta de causa não varicosa

 

Sociedade Portuguesa de Endoscopia Digestiva

Julho, 2010

 

1. INTRODUÇÃO

A hemorragia digestiva alta não varicosa (HDA) é uma causa frequente de emergência. A incidência anual está compreendida entre 48 e 160 casos por 100000 adultos por ano, oscilando a mortalidade entre 10% e 14%5,6. Nos Estados Unidos da América, para pacientes com e sem complicações de HDA, a duração média do internamento foi de 4,4 e de 2,7 dias respectivamente, e os custos de 5632 dólares e 3402 dólares respectivamente

As normas relativas ao processamento de pacientes com HDA publicadas em 20031 foram recentemente revistas por um amplo grupo de peritos 2, daí decorrendo estas recomendações.

As recomendações estão divididas em cinco secções: ressuscitação, avaliação do risco e processamento pré-endoscópico, processamento endoscópico, processamento farmacológico, processamento intra-hospitalar não endoscópico e não farmacológico e após a alta. Em cada secção procedeu-se ao agrupamento das recomendações em dois grupos consoante o grau de recomendação, chamando-se a atenção para o facto de serem diferentes os sistemas adoptados nas recomendações de 2003 e de 20101,2. Em duas das secções, “processamento farmacológico” e “após a alta”, constatou-se o elevado grau de todas as recomendações produzidas.

 

2. RECOMENDAÇÕES

 

A. RESSUSCITAÇÃO, AVALIAÇÃO DO RISCO E PROCESSAMENTO PRÉ-ENDOSCÓPICO

 

A. 1. Mais elevado grau de recomendação

 

A.1.1. Avaliação imediata e início da ressuscitação.

A.1.2. As escalas de prognóstico estão recomendadas na estratificação precoce dos pacientes em categorias de alto e baixo risco de recidiva do sangramento e mortalidade.

A.1.3. Considerar a colocação de sonda naso-gástrica em alguns doentes dado que os achados poderão ter valor prognóstico.

A.1.4. A transfusão deverá ser administrada quando o valor de hemoglobina é igual ou inferior a 7g/dl.

A1.5. Doentes seleccionados com hemorragia aguda por úlcera que têm baixo risco de recidiva hemorrágica com base em critérios clínicos e endoscópicos podem ter alta imediatamente depois da endoscopia.

A1.6. Tratamento pré-endoscópico com Inibidores de Bomba de Protões pode ser considerado para melhorar o estádio da lesão endoscópica e diminuir a necessidade de intervenção endoscópica, mas não deve atrasar a endoscopia.

 

A. 2. Menos elevado grau de recomendação

 

A.2.1. Em pacientes sob terapêutica anti-coagulante, a correcção da coagulopatia está recomendada mas não deverá atrasar a endoscopia.

A.2.2. Os agentes procinéticos não deverão ser rotineiramente utilizados a preceder a endoscopia com o objectivo de melhorar a acuidade diagnóstica.

 

B. PROCESSAMENTO ENDOSCÓPICO

 

B. 1. Mais elevado grau de recomendação

 

B.1.1. Os hospitais devem desenvolver protocolos específicos para processamento multidisciplinar, que devem incluir a disponibilidade de gastrenterologista treinado em hemostase endoscópica.

B.1.2. O pessoal treinado para auxiliar na endoscopia deverá estar disponível para a realização de endoscopia urgente.

B.1.3. Endoscopia precoce (dentro de 24 h após a apresentação) é recomendada para a maioria dos doentes com hemorragia gastrointestinal alta aguda.

B.1.4. A realização de hemostase endoscópica não está indicada em pacientes com estigmas endoscópicos de baixo risco (base de úlcera limpa ou mancha pigmentada não protuberante no leito da úlcera).

B.1.5. A realização de hemostase endoscópica está indicada em pacientes que apresentam estigmas endoscópicos de alto risco (sangramento activo ou vaso visível no leito da úlcera).

B.1.6. A injecção de adrenalina isolada tem reduzida eficácia e deve ser combinada com outro método.

B.1.7. Nenhum método térmico é superior a outro.

B.1.8. Clips, termocoagulação, ou injecção esclerosante devem ser usadas em doentes com lesões de alto risco, isoladamente ou em combinação com a injecção de adrenalina.

B.1.9. Uma segunda tentativa de realização de terapêutica endoscópica está geralmente recomendada em caso de recidiva hemorrágica.

B.2. Menos elevado grau de recomendação

B.2.1. Encontrar um coágulo no fundo de uma úlcera justifica a irrigação para a sua deslocação e tratamento da lesão subjacente.

B.2.2. O papel do tratamento endoscópico para úlcera com coágulos aderentes é controverso. A terapêutica endoscópica pode ser considerada, embora o tratamento intensivo com IBP isolado possa ser suficiente.

B.2.3. Endoscopia second-look de rotina não é recomendada.

 

C. PROCESSAMENTO FARMACOLÓGICO

 

C.1. Mais elevado grau de recomendação

 

C.1.1. Os antagonistas dos receptores H2 da histamina não estão recomendados em pacientes com hemorragia activa por úlcera.

C.1.2. A somatostatina e o octreótido não estão recomendados em pacientes com hemorragia activa por úlcera.

C.1.3. Um bolus intravenoso seguido de uma perfusão contínua de IBP deve ser usado para diminuir a recidiva hemorrágica e a mortalidade em doentes com estigmas de alto risco que foram alvo de tratamento endoscópico com sucesso.

C.1.4. Os doentes devem ter alta medicados com IBP oral uma vez ao dia em dose “standard” durante um período de tempo ditado pela etiologia da situação clínica.

 

D. PROCESSAMENTO INTRA-HOSPITALAR NÃO ENDOSCÓPICO E NÃO FARMACOLÓGICO

 

D.1. Mais elevado grau de recomendação

 

D.1.1. Pacientes com baixo risco poderão iniciar a alimentação oral nas primeiras 24 horas.

D.1.2. A maioria dos doentes submetidos a hemostase endoscópica na sequência de lesões com sinais endoscópicos de alto risco hemorrágico, devem ter um período de internamento de pelo menos 72 horas.

D.1.3. Nos casos em que a terapêutica endoscópica falha deverá ser solicitada observação cirúrgica.

D.1.4. Os doentes com úlcera péptica sangrante devem ser testados para Helicobacter pylori e submetidos a terapêutica de erradicação se o teste for positivo, devendo ser confirmada a sua erradicação.

D.1.5. Os testes de diagnóstico de infecção pelo Helicobacter pylori obtidos na fase aguda devem ser confirmados.

 

D.2. Menos elevado grau de recomendação

 

D.2.1. Quando disponível, a embolização percutânea deve ser considerada como alternativa à cirurgia nos doentes em que houve falência da terapêutica endoscópica.

 

E. APÓS A ALTA; AAS E AINE

 

E.1. Mais elevado grau de recomendação

 

E.1.1. Em doentes com história prévia de hemorragia por úlcera com indicação para terapêutica com um AINE, deve ser reconhecido que os tratamentos com um AINE tradicional associado a IBP ou um AINE inibidor selectivo da COX-2 em monoterapia estão associados a um risco clinicamente importante de recorrência de hemorragia por úlcera.

 

E.1.2. Em doentes com história prévia de hemorragia ulcerosa com indicação para medicação com um AINE, a combinação de um IBP com um inibidor selectivo da COX-2 é recomendada para reduzir o risco de recorrência hemorrágica comparativamente com os inibidores selectivos da COX-2 em monoterapia.

E.1.3. Em doentes medicados com AAS em baixa dose, com hemorragia digestiva por úlcera péptica, a terapêutica com AAS deve ser reiniciada assim que se considerar que o risco de complicações cardiovasculares ultrapassa o risco hemorrágico.

E.1.4. Em doentes com indicação para profilaxia cardiovascular e história prévia de hemorragia digestiva por úlcera péptica, deve ser reconhecido que o clopidogrel em monoterapia confere maior risco de recorrência hemorrágica que o AAS associado a um IBP.

 

LEGENDA

AAS – ácido acetil-salicílico;

COX-2-cicloxigenase 2;

AINE – anti-inflamatório não esteróide;

IBP – inibidor da bomba de protões.

 

REFERÊNCIAS

1. Barkun A, Bardou M, Marshall JK. Nonvariceal Upper GI Bleeding Consensus Conference Group. Consensus recommendations for managing patients with nonvariceal upper gastrointestinal bleeding. Ann Intern Med 2003;139:843-857.        [ Links ]

2. Barkun AN, Bardou M, Kuipers EJ, et al. International Consensus Upper Gastrointestinal Bleeding Conference Group. International consensus recommendations on the management of patients with nonvariceal upper gastrointestinal bleeding. Ann Intern Med 2010;152:101-113.