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Medicina Interna

versão impressa ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.24 no.2 Lisboa jun. 2017

 

CARTA AO EDITOR / LETTER TO THE EDITOR

Biopsia Hepática Percutânea: Algumas Reflexões sobre uma Série Nacional

Percutaneous Liver Biopsy: Some Reflections on a National Series

Fernando Guimarães

Medicina Interna - Hospital de Vila Real - Centro Hospitalar Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal

Correspondência

 

Palavras-chave:Fígado/patologia; Biópsia Guiada por Imagem; Doenças do Fígado/patologia.

 


Keywords:Image-Guided Biopsy; Liver/pathology; Liver Diseases/pathology.

 


 

Começo por saudar a recente publicação do bem concebido estudo sobre biopsia hepática percutânea (BHP) num hospital português, de Ana C. Sousa et al.1 Trata-se de um estudo retrospetivo de 137 biopsias consecutivas com técnica de Menghini em adultos entre 2005 e 2013, que mostrou rentabilidade de 86,1% (resultado histológico inconclusivo de 13,9%, por amostra insuficiente ou com alterações inespecíficas); a taxa de complicações resumiu-se a um pneumotórax num paciente admitido em cuidados intensivos, e subsequente óbito. Não fica claro se os pacientes foram convocados eletivamente para BHP, em regime ambulatório ou em internamento; 12% tiveram alta no próprio dia, por ausência de complicações. Cerca de ¼ das BHP foram realizadas por imagiologistas; em 29% o intuito foi a avaliação de massas, o que presume procedimento guiado por ecografia.

Seria interessante conhecer a distribuição da BHP ao longo dos nove anos quanto ao número, indicação, utilização de ecografia, experiência do executante, realização eletiva em ambulatório, número de amostras colhidas por procedimento (poderia haver mais amostras satisfatórias com agulha tipo Trucut ou se fossem colhidos dois fragmentos com Menghini). Infelizmente, a insuficiência de registos em alguns aspetos do estudo, reconhecida pelos AA, diminui o rigor dos resultados. É particularmente elucidativa a ausência de dor, que ocorre em cerca de 30% em várias séries após o procedimento,2 e a hipotensão ou reação vasovagal, menos frequentes. No estudo não foi possível estabelecer diferenças entre os pacientes que fizeram BHP em ambulatório e em internamento. Contudo, aqueles foram certamente selecionados por terem caraterísticas mais favoráveis.

A BHP é um meio invasivo de grande valor no diagnóstico de numerosas afeções hepáticas difusas ou focais há várias décadas, e mais recentemente na condução do tratamento e no prognóstico. Contudo, estudos prospetivos mostraram que no estudo de alterações crónicas de testes hepáticos os resultados histológicos alteraram o tratamento em menos dum terço dos casos.3,4 O avanço do conhecimento, o desenvolvimento e o refinamento de múltiplos e valiosos meios complementares de diagnóstico, serológicos, moleculares, imagiológicos, incluindo a elastografia transitória, exigem a maior ponderação na indicação e na avaliação do balanço benefício / risco do procedimento. Em certos casos, o bom senso, a correlação de todos os dados disponíveis e a vigilância da evolução durante algum tempo podem permitir o diagnóstico ou a dispensabilidade da BHP.

Tem sido cada vez mais usado o apoio de imagem para definir o melhor local ou para guiar o procedimento, e para pronta avaliação em caso de complicação. Esta abordagem parece oferecer maior garantia para a segurança da BHP e para obtenção de amostra mais representativa, embora não haja consenso no caso das doenças hepáticas difusas.2,5

Os AA consideram que a sua série mostra baixa taxa de complicações graves, o que seria verdade se omitíssemos o óbito, pois não foram registadas outras complicações relacionadas com a BHP. Duas séries portuguesas referidas pelos AA não tiveram mortalidade, à semelhança de algumas séries internacionais, mas não de outras, que apresentam taxas entre 0,1% (1/1000) e 0,5% (1/200), como consta numa tabela das recomendações da AASLD em 2009,5 embora o texto diga que a taxa mais comumente referida é menor ou igual a 1/10 000 (!). Noutro ponto quantifica-se a hemorragia grave (requerendo transfusão ou intervenção) devida à BHP nas doenças difusas do fígado entre 1/2500 e 1/10 000.5

Concordo com os autores quanto a considerar a BHP técnica segura e de grande valor e quanto ao interesse dum registo prospetivo organizado. São essenciais o respeito das contraindicações, a preparação prévia (eco, INR, plaquetas) e a experiência do profissional. Seria interessante a publicação de séries nacionais de centros com grande experiência.

 

Referencias

1. Sousa AC, Pires S, Jacinto M, Abreu TT. Biopsia Hepática Percutânea: segurança e utilidade em 137 procedimentos consecutivos. Med Interna. 2016;23:11-5.         [ Links ]

2. Grant A, Neuberger J, Day C, Saxseena S. Guidelines on the use of liver biopsy in clinical practice. London: British Society of Gastroenterology Guidelines; 2004.         [ Links ]

3. Sorbi D, McGill DB, Thistle JL, Therneau TM, Henry J, Lindor KD. An assessment of the role of biopsies in asymptomatic patients with chronic liver tests abnormalities. Am J Gastroenterol. 2000;95:3206-10.         [ Links ]

4. Skelly MM, James PD, Ryder SD. Findings on liver biopsy to investigate abnormal liver function tests in the absence of diagnostic serology. J Hepatol. 2001;35:195-9.         [ Links ]

5. Rockey DC, Caldwell SH, Goodman ZD, Nelson RC, Smith AD (AALSD Position Paper). Liver Biopsy. J Hepatol. 2009;49:1017-44.         [ Links ]

 

Correspondência:: Fernando Guimarães fernandoguimaraes.a@gmail.com

Serviço de Medicina Interna, Hospital de Vila Real, Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal
Av. Noruega, Lordelo, 5000-508 - Vila Real

 

Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho.

Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo.

 

Recebido: 13/03/2017

Aceite: 19/03/2017

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