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Sociologia

Print version ISSN 0872-3419

Sociologia vol.38  Porto Dec. 2019

https://doi.org/10.21747/08723419/soc38a5 

ARTIGOS

Trabalho de equipa em saúde como processo de relação formal potenciador da satisfação e motivação laboral

Teamwork in Health as a Formal Relationship Process Enhancer of Job Satisfaction and Motivation

Le Travail d’Equipe en Santé Comme Processus de Relation Formelle qui Améliore la Satisfaction au Travail et la Motivation

Trabajo en equipo de salud como un proceso de relación formal que mejora la satisfacción laboral y la motivación

1, 2 Ana Teresa Nogueira Jeremias, 2Pedro Miguel Alves Ribeiro Correia

1 Exército Português

2 Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas

 

Endereço de correspondência

 


RESUMO

O trabalho de equipa em saúde é amplamente utilizado, mas continua a ser um desafio e as suas consequências na satisfação e motivação no trabalho são ambíguas. De modo a minimizar esta incerteza, realizou-se uma revisão sistemática da literatura com dezoito periódicos de cinco bases de dados científicas. Em geral, concluiu-se que a evidência ainda é limitada, contudo os dados sumariados de publicações de média a alta qualidade, permitem reconhecer o trabalho de equipa, essencialmente a colaboração, como um processo de relação formal entre trabalhadores, potenciador da satisfação e motivação.

Palavras-chave : trabalho em equipa em saúde; satisfação laboral; motivação laboral.

 


ABSTRAT

Team health work is widely used but remains a challenge and its consequences on job satisfaction and motivation are ambiguous. In order to minimize this uncertainty, a systematic r eview of the literature was carried out with eighteen journals from five scientific databases. In general, it was concluded that the evidence is still limited, but the summary data of medium to high-quality publications allow team work, essentially collaboration, to be recognized as a process of formal relationship between workers enhancing satisfaction and motivation.

Key-words : teamwork in health; job satisfaction; work motivation.

 


RÉSUMÉ

Le travail d’équipe en santé est largement utilisé mais reste un défi et ses conséquences sur la satisfaction et la motivation au travail sont ambiguës. Afin de minimiser cette incertitude, une revue systématique de la littérature a été réalisée avec 18 revues de cinq bases de données scientifiques. En général, il a été conclu que les preuves étaient encore limitées, mais les données résumées des publications de qualité moyenne à élevée permettaient de reconnaître le travail d’équipe, essentiellement la collaboration, comme un comme un processus de relation formelle entre les travailleurs d’amélioration de satisfaction et de motivation.

Mots-clés : travail d’équipe en santé; satisfaction au travail; motivation au travail.

 


RESUMEN

El trabajo de salud en equipo se usa ampliamente, pero sigue siendo un desafío y sus consecuencias en la satisfacción laboral y la motivación son ambiguas. Para minimizar esta incertidumbre, se realizó una revisión sistemática de la literatura con dieciocho revistas de cinco bases de datos científicas. En general, se concluyó que la evidencia aún es limitada, pero los datos de resumen de las publicaciones de calidad media a alta permiten que el trabajo en equipo, esencialmente la colaboración, sea reconocido como un proceso de relación formal entre los trabajadores que mejora la satisfacción y la motivación.

Palabras clave : trabajo en equipo en salud; satisfacción laboral; motivación laboral.

 


1. INTRODUÇÃO

O trabalho de equipa (TE) pode ter vários entendimentos, mas em geral é considerado o trabalho gerado pela ação de duas ou mais pessoas com formação e habilidades complementares, organizadas, alinhadas e mobilizadas no sentido de objetivos comuns (Espinoza et al. 2018; Nancarrow et al., 2013). Este trabalho traduz um processo de relação formal entre os intervenientes, em que as condutas pessoais e sociais, e procedimentos no trabalho são estabelecidos tendo em conta a concretização os objetivos organizacionais comuns (Blau et al., 2003:5). Em organizações públicas de saúde, a implementação do TE é controversa com desfechos ambíguos na satisfação e motivação laborais (Bryson et al., 2014; Emery et al., 2014), face à influência de inúmeras variáveis (Kabene et al., 2006; Körner et al., 2016; Xyrichis et al., 2008). Perante esta incerteza, o presente estudo visa reunir, analisar e sintetizar sistematicamente a evidência publicada entre 2000 e 2018, de modo a descrever as consequências (perceções, relações e efeitos) do TE (em geral) e de cada uma de suas abordagens, sobre satisfação e motivação no trabalho.

1.1. O Paradoxo do Trabalho de Equipa

Para compreender a polémica, importa considerar a organização como uma unidade social ampla e complexa, onde o todo é maior que a soma das partes (Blau et al., 2003:1; Heugens et al., 2009). Segundo esta perspetiva, as organizações de saúde são organizações complexas, em grande parte devido a um grau cada vez mais elaborado na estrutura e nos processos (Arnaud et al., 2013; Yeboah-Assiamah et al., 2016). Para lidar com a complexidade e custos crescentes (Kabene et al., 2006), a maioria dos serviços públicos de saúde tende a adotar o TE (Nancarrow et al., 2013; World Health Organization, 2010). No entanto, a conciliação de esforços entre componentes nem sempre é fácil (Blau et al., 2003:1; Crozier et al., 1977: 43).

Sugere-se que o TE é facilitado quando as múltiplas variáveis ao se relacionarem evidenciam aprovação, coordenação, unidade, consentimento, consistência e harmonia, ou seja, convergência de interesses entre trabalhadores e entre trabalhadores e organizações (Arnaud et al., 2013; Chiavenato, 2004:305; Heugens et al., 2009). Nesse caso, presume-se estarem reunidas condições para controlar o conflito, um componente da atividade organizacional, e consequentemente proporcionar maior satisfação e motivação organizacional (Bryson et al., 2014; Chiavenato, 2004: 315; Perry et al., 2010).

Por outro lado, a interação entre variáveis pode levar à colisão de ideias, sentimentos, atitudes ou interesses, e consequentemente desfavorecer o TE (Arnaud et al., 2013; Chiavenato, 2004: 305). Este tipo de situações parece contribuir para distúrbios na satisfação, com repercussões na motivação (Emery et al., 2014; Rockmann et al., 2007). Consequentemente, um contexto de menor satisfação e motivação pode contribuir para uma maior taxa de absenteísmo, presentismo, rotatividade ou mesmo saída de profissionais com consequente impacto negativo no desempenho, afetando a eficácia, eficiência e qualidade da prestação de serviços (Patrician et al., 2010; Suter et al., 2012).

Assim, face à diversidade de entendimentos de TE e contradições teóricas em torno das suas consequências na satisfação e motivação laboral, permanece por clarificar se, em contexto organizacional de saúde, o TE poderá ser utilizado enquanto processo de relação formal entre trabalhadores potenciador da satisfação e motivação no trabalho, e qual a abordagem a adotar nesse sentido.

2. METODOLOGIA

2.1. Desenho e Paradigma de Estudo

O presente estudo traduz uma revisão sistemática da literatura de acordo com um paradigma misto, e arbitrada (as diferentes etapas) por dois investigadores.

A pesquisa foi efetuada entre julho de 2017 e dezembro de 2018 em bases de dados científicas eletrónicas, nomeadamente: PubMed; B-ON; JSTOR; OMICS internacional;e SSRN. Nestas, utilizou-se um conjunto de palavras-chave e operadores booleanos, sendo exemplos: "teamwork"; “modalities of teamwork in healthcare”; “Types of teamwork in healthcare”; “Approaches of teamwork in healthcare”; "multidisciplinary" AND "work" AND "Motivation" AND "Professionals"; “Approaches" AND " Satisfaction" AND "Professionals". Incluíram-se os estudos que demonstraram o seguinte conjunto de critérios: artigo científico periódico; publicação entre 1 de janeiro de 2000 a 31 de dezembro de 2018; acesso gratuito ou com protocolo com a Universidade de Lisboa (UL); texto completo disponível em inglês; amostra de profissionais de serviços de saúde; estudos de abordagens de TE; estudos de TE (geral); consequência na satisfação e motivação no trabalho; todos os tipos e desenhos de estudo, instrumentos de recolha de dados e análises de dados.

2.2. Qualidade da Evidencia e Síntese de Dados

Foram definidos níveis de evidência (NE) para hierarquizar a evidência da menor para a maior robustez: 1- sem controlo; 2- com controlo não experimental; 3- com controlo experimental (Ryan et al., 2013). Por outras palavras, face à metodologia caraterística de cada desenho de estudo, considera-se que os resultados com maior qualidade, fiabilidade e validade, provêm, por ordem crescente, de estudos não experimentais (sem grupo de controlo), quasi- experimentais (com grupo de controlo) e experimentais (com grupo de controlo e aleatorização) (Ryan et al., 2013). Com base em considerações de Rocco (2010), Ryan et al. (2013) e Thompson et al. (2005) foram ainda tidos em conta 4 aspetos e respetivos critérios para avaliação da qualidade das publicações selecionadas, tais como: verdadeiro valor (a verdade aproximada sobre relação causal, ou o impacto de uma variável sobre outra); aplicabilidade (grau que os resultados podem ser transferidos ou generalizados para outras definições, contextos, ou populações); fiabilidade (consistência dos resultados, ou seja, garantia de se verificarem os mesmos resultados em circunstâncias semelhantes); e neutralidade (medida em que os resultados da investigação podem ser confirmados ou corroborados por outros, ou seja, o grau em que um investigador representa a subjetividade individual ou a polarização). Para cada um, quando ausente foi atribuído o valor 0, quando parcialmente existente o valor 1 e o 2 quando totalmente presente. O score de qualidade global (QT) atribuído à publicação diz respeito à adição dos scores imputados a cada um dos aspetos observados, sendo-lhe ainda somado o nível de evidência. Por fim, para sintetizar a informação optou-se por uma agregação dos dados (Booth, 2016).

3. RESULTADOS

3.1. Seleção de Estudos

Filtraram-se 19952 artigos. Destes, foram incluídos 18 periódicos que cumpriram todos os critérios de inclusão (figura I).

 

 

Foram excluídos 26 estudos por não serem de acesso livre, não estarem acessíveis mediante protocolo com a UL e por o texto completo não estar disponível. Uma das publicações foi excluída por não ser um artigo científico periódico. Enquanto as restantes 19907 foram excluídas por não estudarem o TE (geral), não contemplarem abordagens de trabalho e não analisarem as suas consequências (perceções, relações ou efeitos) ao nível da satisfação e motivação a nível dos trabalhadores de serviços de saúde.

3.2. Qualidade, Síntese e Discussão da Evidência

O score de qualidade e dados extraídos são apresentados na tabela I, em anexo. De um modo geral destaca-se que o TE (geral) foi analisado com maior frequência (55.6%) do que as suas abordagens (50.0%). Relativamente a estas, a colaboração foi a mais estudada (33.3%). A maioria dos estudos incluídos estudou enfermeiros (38.9%) e médicos (33.3%). A globalidade abarcou o contexto hospitalar (44.4%) e foi realizada nos Estados Unidos da América (27.8%). Oito das publicações incluídas analisaram as consequências do TE (geral) ao nível da satisfação no trabalho, sendo que o estudo com qualidade mais robusta (nível 2 de evidencia e score de qualidade 9) e portanto com informação mais relevante sugere uma tendencia para um índice de satisfação laboral significativamente superior com o TE quando comparado com o trabalho sem ser em equipa (Ajeigbe et al., 2014). As publicações de Cunningham et al. (2018) e de Warmelink et al. (2015), (nível 1 de evidencia e 9 de qualidade), e ainda o estudo de Körner et al. (2016) (nível 1 de evidencia e 8 de qualidade) apresentam resultados concordantes com os de Ajeigbe et al. (2014). Estes resultados vão de encontro a estudos realizados noutros contextos, como na construção civil, em que se observou que o aumento do TE incrementou a satisfação laboral (Dhurupa et al., 2016). Apenas o estudo de Vera-Remartínez et al. (2009) com menor robustez e portanto resultados menos valorizáveis (nível 1 de evidencia e 8 de qualidade) obteve resultados que apesar de ter detetado uma associação positiva, a capacidade explicativa do modelo de satisfação relacionado com fatores associados ao TE proposto não foi estatisticamente significativa. Estes resultados podem ser justificados pelo facto da equipa ser constituida apenas por enfermeiros e abarcar um contexto que se destaca dos restantes, as prisões.

Incluíram-se também três trabalhos que analisaram resultados do TE (geral) ao nível da motivação no trabalho e que evidenciaram dados concordantes. Destaca-se em primeiro lugar os resultados do estudo com maior nível de qualidade (nível 1 de evidencia e 9 de qualidade) que sugerem a motivação como um efeito intermédio do TE (Cunningham et al. 2018). Estes resultados são corroborados pelos do estudo de Mahal (2009) (nível 1 de evidência e 8 de qualidade) que evidenciam uma relação positiva e significativa entre o TE e a motivação laboral. O estudo de Lelorain et al. (2017) (nível 1 de evidência 8 de qualidade) por um lado apresenta resultados concordantes com os restantes, ao identificar que a educação terapêutica do paciente efetuada por uma equipa multidisciplinar treinada como um fator -chave na motivação dos profissionais, por outro descreve interferência negativas na motivação relacionadas a constrangimentos do TE, tais como com a alta rotatividade nas equipas, a dificuldade de reunir a variadade de profissionais necessários para implementar a educação terapeutica, por vezes sentem que não há coesão e concordancia do trabalho efetuado entre todos os elementos, além disso reconhece-se que por vezes há filosofias de trabalho diferentes, e não aceitação por parte de outos profissionais da partilha de conhecimento e de tarefas. Isto vai de encontro aos pressupostos teóricos de que sugerem uma dificuldade na conciliação dos esforços entre componentes das organizações complexas, como as de saúde (Blau et al., 2003:1; Chiavenato, 2004:305). Relacionado sobretudo com a formação e identidade profissional (O’Reilly et al., 2017), consequentemente com o carácter competitivo e conflituoso inerente à partilha de poder, em termos da distribuição de práticas e funções e no planeamento e tomada de decisão entre profissionais (Crozier et al., 1977: 93; Nancarrow et al., 2013). Por conseguinte assiste-se a uma maior dificuldade na implementação do TE, gerando por sua vez maior desmotivação para a pressecussão da sua missão no local de trabalho (D’Amour et al., 2008; Emery et al., 2014).

Verificou-se que nove estudos especificaram abordagens de TE e respetivos resultados na satisfação e motivação no trabalho, tendo demonstrado uma consistência de resultados. De acordo com os resultados, do maior para o menor nível de evidência e de qualidade, sugere-se uma associação positiva e moderada entre a satisfação no trabalho e o TE interprofissional (Kaiser et al., 2018) Acrescenta-se que alguns dos motivos relacionados com a satisfação dos membros de equipas interprofissionais prendem-se com o envolvimento e compromisso para o cuidado centrado no paciente, comunicação, papéis e objetivos claros, e na presença de um líder transformacional para fortalecer o bem-estar, o diálogo e a inovação (Espinoza et al., 2018). De acordo com os resultados obtidos na investigação de Calderóna e colaboradores (2016) (nível 2 de evidência e 6 de qualidade), no estudo de Fleury et al. (2017) (1 de evidência e 7 de qualidade), e ainda na publicação de Sandhoff et al. (2008) (nível 1 de evidência e 4 de qualidade), a satisfação parece ser significativamente maior quando o trabalho se desenvolve em maior colaboração. Registando-se ainda no estudo de Konrad et al. (2004) e no de Chang et al. (2009) (ambos com nível 1 de evidência e 6 de qualidade), um efeito positivo e estatisticamente relevante da colaboração sobre a satísfação no trabalho. Os resultados aqui observados parecem ser concordantes com dados observados noutros contextos. No estudo de Jung (2013), por exemplo, com base numa amostra de 17676 funcionários públicos de 70 agências públicas dos Estados Unidos da América obteve-se resultados que sugerem que a colaboração interna explica significativamente uma variação positiva da satisfação laboral (Jung, 2013).

Apesar dos estudos incluídos na presente revisão não terem analisado o efeito do comprometimento sobre a satisfação de trabalhadores no contexto de serviços de saúde, conhecem-se estudos, como o de Dhurupa et al. (2016), que mediante uma analise de regressão logistica multivariada observou um efeito significativamente positivo das dimensões do comprometimento laboral sobre a satisfação no trabalho da construção civil. No trabalho colaborativo também parece predominar profissionais motivados (Kjellström et al., 2017). De acordo com os resultados do estudo de Kjellström et al., (2017) (nível 1 de evidência e 7 de qualidade) caracteristicas do trabalho colaborativo, como a bondade, o espírito de interajuda, o apreço e apoio entre colegas parecem estar na base da motivação laboral. Estes dados, apesar de suportarem argumentos teóricos que defendem que a colaboração é facilitada quando há convergência entre trabalhadores (Arnaud et al., 2013; Heugens et al., 2009; Chiavenato, 2004: 305; Crozier et al., 1977: 113). Por outro contrastam com os resultados do estudo de Campbell (2016) que realizado com base numa amostra de 687687 funcionários do serviço público dos Estados Unidos da América (taxa de resposta de 46,1%). Segundo análise de um modelo de equações estruturais obtiveram-se resultados que apontam para um efeito significativo negativo da colaboração entre unidades de trabalho na motivação no trabalho (Campbell, 2016). Os autores justificam o efeito direto negativo pela dificuldade de se efetivar este tipo de colaboração, em comparação com outros tipos de colaboração, dadas as diferenças fundamentais em metas, incentivos e estilos de comunicação (Campbell, 2016). Por fim, os resultados do estudo de Mahal (2009) (nível 1 de evidência e 8 de qualidade) sugerem ainda que a motivação no trabalho se associa forte e positivamente ao TE na modalidade de comprometimento. De acordo com a investigação de Kjellström et al. (2017) (nível 1 de evidência e 7 de qualidade) destacam-se caracteristicas do comprometimento que favorecem a motivação como o foco nos objetivos e na melhoria contínua, a proximidade com os gestores, e ainda o estímulo da criatividade, do intelecto, do envolvimento, da responsabilidade, da exigência e da autonomia nas decisões, e colocada aos profissionais na formulação de objetivos bem como soluções para os alcançar. Uma vez mais, estes dados suportam a evidência que alega uma relação forte e positiva entre o comprometimento e a motivação, como é exemplo o estudo de Camilleri et al. (2007), que tendo em conta uma amostra de 2431 de trabalhadores maltêses com cargos administrativos de todos os ministérios do governo maltês, verificou-se um efeito significativo positivo do comprometimento sobre a motivação.

Embora esta revisão não tivesse identificado em contexto de serviço de saúde a combinação de abordagens, conhecem-se estudos realizados noutros contextos, como o de Zhou et al. (2013), realizado com base em dados de profissionais de recursos humanos de empresas na China, que verificaram que quanto maior for a tendência para o compromisso organizacional maior predisposição para a colaboração. Os resultados do estudo de Smith (2009), obtidos através da aplicação de questionários a uma amostra de 547 municípios nos Estados Unidos da América, seguem a tendência referida na medida em que o comprometimento organizacional promoveu a probabilidade de interação repetida, aumentando assim o potencial de colaboração entre parceiros com ou sem confiança. Da mesma forma que no estudo de Morrow et al. (2012), numa amostra de 257 trabalhadores de diversos escritórios de serviços financeiros da região médio oeste nos Estados Unidos da América, verificou-se que o aumento de um valor da perceção de colaboração proporciona um aumento de aproximadamente 18% do comprometimento afetivo dos trabalhadores.

5. CONCLUSÃO

Globalmente sugere-se que o conhecimento científico sobre o TE, as suas abordagens e efeitos na satisfação e motivação dos trabalhadores é ainda limitado. Contudo, os dados aqui sumariados, proveniente de 18 publicações científicas com nível médio a elevado de qualidade, corroboram com a ideia de que o TE favorece a satisfação e motivação, pelo que ainda assim é possível reconhecer e recomendar o TE na prestação de serviços de saúde, essencialmente sob a forma de colaboração, enquanto processo de relação formal entre trabalhadores potenciador de satisfação e motivação laboral. Tendo em conta as consequências da menor satisfação e motivação dos trabalhadores (Emery et al., 2014; Rockmann et al., 2007), e consequentemente do aumento do absenteísmo, presentismo, rotatividade ou mesmo saída de profissionais (Patrician et al., 2010; Suter et al., 2012), ao mesmo tempo que se reconhecem constrangimentos ao nível das estratégias habituais para as contornar, entre os quais financeiras (Patrician et al., 2010), o esforço deve ser direcionado para um sistema motivador não financeiro ou material (Kabene et al., 2006; Perry et al., 2010). Neste sentido, recomenda-se o TE e a gestão dos eventuais conflitos mediante distribuição equitativa de poder durante este processo de relação formal entre intervenientes. Face à globalidade do fenómeno, este é um assunto que interessa tanto às organizações de saúde militares como civis, pelo que os indícios observados na presente investigação reúne, analisa e sumariza informação científica atual que permite por um lado, conhecer as possíveis consequências do TE (no geral), ao nível da satisfação e motivação dos trabalhadores de serviços de saúde militares ou civis, assim como as abordagens de TE utilizadas em contexto organizacional na área da saúde, e respetivas consequências na satisfação e motivação laborais.

A nível científico contribui para atualizar o estado da arte sobre a problemática do TE, da motivação e satisfação laborais e identificam-se questões sociológicas emergentes que podem servir para definir futuras linhas de investigação. No entanto, a presente revisão não foi isenta de limitações. Face à dimensão da amostra, 18 estudos, e pelo facto de se teres identificado apenas 6 estudos do tipo qualitativo, 11 do tipo quantitativo e 1 misto, reflete um conhecimento pouco aprofundado e representativo das problemáticas em assunto, colocado em destaque a necessidade de se desenvolver mais estudos, quer de acordo com raciocínio dedutivo quer indutivo, ambos são deficitários. Também é importante destacar, que os critérios de pesquisa utilizadas na presente revisão, as palavras- chave e a combinação entre as mesmas, também poderão ter conduzido a uma menor sensibilidade da pesquisa sido e serem corresponsáveis para a dimensão amostral do presente estudo e pelas revistas científicas onde foram publicados os estudos. Estudos futuros podem utilizar outras bases de dados, elétronicas e manuais, a inclusão de artigos pagos assim como outros idiomas e mais combinações de palavras-chave na pesquisa. Enaltece-se ainda que maioria dos estudos incluídos analisou amostras de médicos e enfermeiros, pelo que esta lacuna pode traduzir um viés nos resultados obtidos até então e condicionar a sua representatividade (O’Reilly et al., 2017). Da mesma forma, que se observa uma preeminência de investigações realizadas em contexto civil e nos Estados Unidos da América, não sendo, portanto, representativa da diversidade de culturas administrativas, nomeadamente militar, o que mais uma vez vem condicionar a extrapolação de resultados sobre a matéria em questão (O’Reilly et al., 2017). Investigações futuras, em contexto das organizações de saúde, devem por isso refletir todos os pontos de vista e experiências profissionais e abranger um leque maior de contextos e países (O’Reilly et al., 2017). O tipo e desenho diferentes dos estudos assim como os métodos e instrumentos de recolha e tratamento de dados, condicionam a comparação dos dados entre estudos, respetiva sistematização da informação e conclusões (Bowen et al., 1999), nomeadamente no que toca à identificação da abordagem de TE com maior efeito sobre a satisfação e motivação dos trabalhadores. Também a ausência de definições de TE e de abordagens, ou ao invés a sua diversidade, dificulta a seleção e análise dos dados. Assim, estudos futuros devem esforçar-se por uma convergência metodológica, pela clarificação dos conceitos utilizados e identificar a abordagem de TE mais efetiva na satisfação e motivação no trabalho. Deve-se ainda ponderar a combinação de abordagens, já que noutros contextos indicia- se uma possível relação entre por exemplo a colaborativa e o comprometimento (Li et al., 2013), e estudar o respetivo efeito na satisfação e motivação.

 

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Ana Teresa Nogueira Jeremias. (Autora de correspondência). Exército Português, Direção de Saúde/Unidade de Saúde II (Évora, Portugal). Doutoranda em Administração da Saúde do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, (Lisboa, Portugal). Endereço de correspondência R. D. Augusto Eduardo Nunes, nº17, 7000-651 Évora, Portugal. E-mail: ft.jeremias@gmail.com

Pedro Miguel Alves Ribeiro Correia. Investigador Integrado do Centro de Administração e Políticas Públicas do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Universidade de Lisboa (Lisboa, Portugal). e Políticas Públicas e Coordenador do Observatório Nacional de Administração Pública, (Lisboa, Portugal). Endereço de Correspondência: R. Almerindo Lessa, s/n, 1300-666 Lisboa, Portugal. E-mail: pcorreia@iscsp.ulisboa.pt

 

Artigo recebido em 20 de janeiro de 2019. Aprovado para publicação

 

ANEXO

 

Anexo

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