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Sociologia

Print version ISSN 0872-3419

Sociologia  no.tematico4 Porto  2014

 

NOTA DE APRESENTAÇÃO

Nota de apresentação

Maria Manuela Mendes e Olga Magano 2014


(Coordenadoras do número temático)

 

A ideia da compilação deste conjunto de artigos para a Sociologia, Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto emergiu no contexto da organização de dois painéis por iniciativa das coordenadoras desta edição – Maria Manuela Mendes e Olga Magano – mais concretamente, o Painel 27 ( Ciganos na Península Ibérica e Brasil) e o Painel 56 (Ciganos e políticas públicas em Portugal, Espanha e Brasil), que decorreram no âmbito do V Congresso da Associação Portuguesa de Antropologia, que teve lugar na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, na cidade de Vila Real, em Setembro de 2013. Este número temático resulta, assim, da partilha de saberes sobre as pessoas ciganas em Portugal e de outros países que mantêm com Portugal relações de proximidade, como Espanha e Brasil. Esta reflexão e discussão que agora se dá à estampa organiza-se em torno de dois eixos temáticos: por um lado, os estudos mais recentes sobre as pessoas e famílias ciganas; por outro, a análise centrada nos impactos das políticas públicas sobre estas pessoas em Portugal, Espanha e Brasil. Esta discussão é oportuna na medida em que, nas últimas três décadas, têm sido implementadas medidas e políticas públicas promotoras de bem-estar social mais consentâneas com um Estado social moderno e democrático, principalmente no território da Península Ibérica.
Algumas destas medidas, embora não especificamente dirigidas a indivíduos e a famílias ciganas, têm produzido efeitos importantes, mas ainda pouco conhecidos, sobre as trajetórias de vida das famílias ciganas, com impactos na sua cultura e nos seus processos de construção identitária. Assim, procurámos dar a conhecer medidas e políticas públicas, bem como projetos e estratégias de intervenção mobilizados por serviços públicos, mas também por Organizações Não Governamentais promotores de mudança social e de uma maior igualdade de acesso ao exercício efetivo da cidadania entre pessoas e família ciganas. Pretendeu-se, desse modo, questionar e discutir, no referente às realidades destes três países, qual a situação atual e estratégias reprodutivas, produtivas, migratórias e identitárias que os ciganos enfrentam/constroem e resistem em face de tal situação, e quais os efeitos deste património de saber já acumulado na produção e na implementação de medidas e políticas sociais promotoras de uma maior coesão social, assim como questionar qual o envolvimento e a participação dos ciganos nos estudos efetuados.
Este domínio de estudos aparece geralmente como subsidiário de outras áreas e linhas de investigação, tendendo a ocupar uma posição marginal e até invisível, aparecendo ora associado aos estudos sobre imigrantes, ora a outras temáticas convexas. As coordenadoras desta edição têm vindo a tentar autonomizar esta linha de investigação enquanto área científica das Ciências Sociais, sobretudo na Sociologia e na Antropologia, tendo em vista a compreensão dos contornos históricos, políticos, culturais, sociais e económicos no que se refere ao aprofundamento de algumas dimensões de análise pouco exploradas em Portugal, mas que se revelam, de igual modo, importantes para a compreensão global de regularidades, mas sobretudo de configurações singulares ínsitas ao fenómeno social e facto sociológico que é a persistência da exclusão dos ciganos e das desigualdades sociais.
Este número temático da Sociologia, Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto estrutura-se em torno de dez artigos que se focalizam sobre os contornos e configurações singulares das condições de existência das pessoas e famílias ciganas residentes em Portugal (seis artigos), Espanha (três artigos) e Brasil (um artigo).
No primeiro artigo intitulado “Ciganos e políticas sociais em Portugal”, da autoria de Olga Magano e de Maria Manuela Mendes, é abordada a relação complexa e não isenta de ambiguidades entre ciganos e políticas sociais. Mais concretamente discute-se os impactos de algumas políticas sociais sobre as condições de vida das pessoas ciganas e também sobre a sua reconfiguração identitária.
Numa perspetiva de complementaridade e aprofundamento, encontra-se o artigo “O Rendimento Social de Inserção e os beneficiários ciganos: o caso do concelho de Faro”, de Sofia Rebelo Santos e João Filipe Marques, que se centra na análise da política social ativa do Rendimento Social de Inserção, entrecruzando a perspetiva dos técnicos responsáveis pela atribuição e gestão desta prestação social e a perspetiva dos beneficiários no concelho de Faro.
Ainda sobre este território mais a sul de Portugal, no artigo de Vânia Martins e Emilio Lucio-Villegas (“Teatro do oprimido como ferramenta de inclusão social no bairro Horta da Areia em Faro”) é explorada a metodologia “teatro do oprimido” como ferramenta de inclusão social.

Por sua vez, os artigos “Condições e trajetórias de vida de reclusos e reclusas de etnia cigana em Portugal”, de Sílvia Gomes e Manuel Carlos Silva, e “Mulheres ciganas, criminalidade e adaptação ao meio prisional”, de Nuno Segurado e Olga Magano, trazem um enfoque renovado sobre os ciganos em contexto de reclusão prisional. Mais em concreto, o artigo de Sílvia Gomes e de Manuel Carlos Silva analisa a relação entre as pessoas ciganas e o crime, estudando as suas posições de vida objetiva e as suas trajetórias de vida, enquanto o artigo de Nuno Segurado e de Olga Magano explora os perfis sociais das mulheres ciganas reclusas e o impacto da reclusão da mulher cigana na família.
Ainda sobre o território nacional, através de uma análise centrada na literatura infanto-juvenil portuguesa, no artigo “Representações do cigano na literatura juvenil portuguesa”, Maria da Conceição Tomé desvenda um conjunto de estereótipos sobre as pessoas ciganas que coloca à discussão de estudantes, propondo a edificação de todo um percurso de desconstrução dessas representações sociais.
Sobre os ciganos em Espanha contamos com três contributos: um sobre questões de educação; outro sobre organização social e políticas públicas; e outro sobre antropologia demográfica em grupos ciganos espanhóis.
Desta forma, o artigo da autoria de Belén Arranz Nuñez e Santiago González Avión, intitulado “Convivencia, expectativas educativas y éxito escolar en la población gitana en Vilaboa (Galicia)”, dá a conhecer uma experiência metodológica de intervenção intercultural numa escola da Galiza.
Por seu lado, Stefano Piemontese e Giuseppe Beluschi-Fabeni (em “Entre organización social y políticas públicas. Pautas residenciales de familias rumanas romaníes en Granada”) problematizam o direito à habitação por parte dos imigrantes em Espanha, concretamente por parte das famílias ciganas romenas em Granada, interligando este direito com a intervenção pública local e a etnicização da exclusão.
A fechar este conjunto de contributos sobre os ciganos em Espanha, Juan Gamella, Elisa Martín Carrasco-Muñoz e Alejandro Quesada Garrido (“New methodological approaches in the anthropological demography of Romani groups. An example from the study of the evolution of the infant and child mortality of the Gitanos or Calé of Spain (1871-2007)”) apresentam uma aproximação metodológica sobre a evolução demográfica dos ciganos neste país, abordando os processos de declínio quer da mortalidade infantil, quer dos níveis de fertilidade entre os ciganos, o que teve implicações na sua integração social.

Por último, sobre os ciganos brasileiros, Lisabete Coradini e Virgínia de Araújo Souza revelam no artigo “Os ciganos do Rio Grande do Norte: caminhos e trânsitos” que o incremento do número de trabalhos académicos sobre esta população se situa no final da década de 80 do século XX, partilhando os resultados derivados de uma investigação ainda exploratória, apresentando uma cartografia inicial sobre a população cigana neste estado brasileiro.
Pela riqueza de informação e diversidade de temas abordados no conjunto dos artigos, cremos que este será mais um contributo fundamental quer para o questionamento das imagens essencialistas e reificadas sobre as pessoas ciganas, quer para a ampliação do nosso entendimento sobre o pluralismo social e cultural nas sociedades hodiernas.

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