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Sociologia

versão impressa ISSN 0872-3419

Sociologia vol.27  Porto jan. 2014

 

ARTIGOS

A nova morfologia do trabalho e as formas diferenciadas da reestruturação produtiva no Brasil dos anos 19901

The new morphology of labour and the different forms of productive restructuring in Brazil in the 1990s

La nouveaux morphologie de travaux et les différentes formes de restructuration productive au Brésil dans les années 1990

La nueva morfología del trabajo y las diferentes formas de reestructuración productiva en Brasil en la década de 1990

Ricardo Antunes2

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas


 

RESUMO

Este texto pretende apresentar alguns elementos que caracterizam a reestruturação produtiva no Brasil recente, com ênfase em suas consequências no processo de informalização e desenho da nova morfologia do trabalho. Apresentamos uma fenomenologia da informalidade no Brasil e, posteriormente, as principais tendências da reestruturação produtiva em relação ao mundo do trabalho junto aos setores automobilístico, telecomunicações e telemarketing, bancário, têxtil e confeções, calçados, trabalhadores do canto erudito e trabalhadores informais, buscando apreender seu desenho multiforme no que concerne ao mundo do trabalho.

Palavras-chave: flexibilização e terceirização do trabalho; fordismo; toyotismo e reestruturação produtiva no Brasil; nova morfologia do trabalho.


ABSTRACT

This paper presents some elements that characterize the recent restructuring of production in Brazil, with emphasis on its impact on the process of casualisation and design of the new morphology of labour. We present a phenomenology of informality in Brazil and later the main trends of productive restructuring in relation to the world of labour with the automotive, telecommunications and telemarketing, banking, textile and dress-making, footwear, artist sector and informal workers, seeking to understand your drawing multiform regarding the world of labour.

Keywords: flexible labor and outsourcing; fordism; toyotism and productive restructuring in Brazil; new morphology of labour.


RESUMÉ

Cet article présente quelques éléments qui caracterisent la restructuration productive au Brésil actuel, en soulignant leurs effets dans le processus de’informalisation et dans le dessin de la nouvelle morphologie du travail. D’abord on va présenter une phénoménologie de l’informalité au Brésil et les principaux tendences de la restructuration procuctive par rapport au monde du travail surtout aux secteurs automobilistique, de télécommunications et télémarketing, bancaire, téxtil et de vêtements, de chaussures, les chanteurs lyriques et les travailleurs informels, en cherchant apprendre son dessin multiforme dan ce que concerne le monde du travail.

Mots-clés: flexibilisation et sous-traitence du travail; fordisme; toyotisme et restructuration productive au Brésil; nouvelle morphologie du travail.


RESUMEN

Este artículo presenta algunos elementos que caracterizan a la reciente reestructuración de la producción en Brasil, con énfasis en su impacto en el proceso de informalización y el diseño de la nueva morfología del trabajo. Se presenta una fenomenología de la informalidad en Brasil y posteriormente las principales tendencias de la reestructuración productiva en el automóvil, las telecomunicaciones y telemarketing, bancario, industria textil y de confección, calzados, artistas y trabajadores informales, tratando de entender su multiforme diseño en relación con el mundo laboral.

Palabras clave: trabajo flexible y la subcontratación; fordismo; toyotismo y la reestructuración productiva en Brasil; nueva morfología del trabajo.


 

As transformações ocorridas no capitalismo recente no Brasil, particularmente na década de 1990, foram de grande intensidade, impulsionadas pela nova divisão internacional do trabalho e pelas formulações definidas pelo Consenso de Washington e desencadearam uma onda enorme de desregulamentações nas mais distintas esferas do mundo do trabalho. Houve também um conjunto de transformações no plano da organização socio-técnica da produção, presenciando-se, ainda, um processo de reterritorialização e mesmo de desterritorialização da produção, entre tantas outras consequências da reestruturação produtiva e do redesenho da divisão internacional do trabalho e do capital. Vamos indicar, então, alguns traços particulares e singulares da nossa reestruturação produtiva do capital.
O capitalismo brasileiro, de desenvolvimento hipertardio quanto ao seu modo de ser, vivenciou, ao longo do século XX, um verdadeiro processo de acumulação industrial, especialmente a partir do getulismo. Pôde, então, efetivar seu primeiro salto verdadeiramente industrializante, uma vez que as formas anteriores de indústria eram prisioneiras de um processo de acumulação que se realizava dentro dos marcos da exportação do café, no qual a indústria tinha o papel de apêndice.
De corte fortemente estatal e feição nacionalista, a industrialização brasileira somente deslanchou a partir de 1930 e, posteriormente, com Juscelino Kubitschek, em meados da década de 1950, quando o padrão de acumulação industrial deu seu segundo salto. O terceiro salto foi experimentado a partir do golpe de 1964, quando se aceleraram fortemente a industrialização e a internacionalização do Brasil (Antunes, 1982 e 1992).
O país estruturava-se, então, com base em um desenho produtivo bifronte: de um lado, voltado para a produção de bens de consumo duráveis, como automóveis, eletrodomésticos etc., visando um mercado interno restrito e seletivo; de outro, prisioneiro que era de uma dependência estrutural ontogenética, o Brasil continuava também a desenvolver sua produção voltada para a exportação, tanto de produtos primários quanto de produtos industrializados.
No que concerne à dinâmica interna do padrão de acumulação industrial, estruturava-se pela vigência de um processo de superexploração da força de trabalho, dado pela articulação entre baixos salários, jornada de trabalho prolongada e fortíssima intensidade em seus ritmos, dentro de um patamar industrial significativo para um país que, apesar de sua inserção subordinada, chegou a alinhar-se, em dado momento, entre as oito grandes potências industriais.
Esse padrão de acumulação, desde Juscelino Kubitschek, e especialmente durante a ditadura militar, vivenciou amplos movimentos de expansão, com altas taxas de acumulação, entre os quais a fase do “milagre econômico” (1968-1973). O país vivia, então, sob o binômio ditadura e acumulação, arrocho e expansão.
Foi somente em meados da década de 1980, ao fim da ditadura militar e sob a chamada “Nova República” de Sarney, que esse padrão de acumulação – centrado no tripé setor produtivo estatal, capital nacional e capital internacional – começou a sofrer as primeiras alterações. Embora, em seus traços mais genéricos, muito ainda se mantenha em alguma medida vigente, foi possível presenciar o início das mutações organizacionais e tecnológicas no interior do processo produtivo e de serviços em nosso país, mesmo que num ritmo muito mais lento do que aqueles experimentados pelos países centrais, que viviam intensamente a reestruturação produtiva de capital e seu corolário ideopolítico neoliberal.
No fim da ditadura militar e durante o período Sarney, o Brasil ainda se encontrava relativamente distante do processo de reestruturação produtiva do capital e do projeto neoliberal, em curso acentuado nos países capitalistas centrais, mas já se faziam sentir os primeiros influxos da nova divisão internacional do trabalho.
A nossa singularidade começava a ser afetada pelos emergentes traços universais do sistema global do capital, redesenhando uma particularidade brasileira que pouco a pouco foi se diferenciando da fase anterior, inicialmente em alguns aspetos e, posteriormente, em muitos de seus traços essenciais.

Foi durante a década de 1980, que ocorreram os primeiros impulsos do nosso processo de reestruturação produtiva, levando as empresas a adotar, no início de modo restrito, novos padrões organizacionais e tecnológicos, novas formas de organização social do trabalho. Iniciou-se a utilização da informatização produtiva e do sistema just-in-time; germinou a produção baseada em team work, alicerçada nos programas de qualidade total, ampliando também o processo de difusão da microeletrônica.
Deu-se, também, o início da implantação dos métodos denominados “participativos”, mecanismos que procuram o “envolvimento” (na verdade, a adesão e a sujeição) dos trabalhadores com os planos das empresas. Estruturava-se, ainda que de modo incipiente, o processo de reengenharia industrial e organizacional, cujos principais determinantes foram decorrência:

    1) das imposições das empresas transnacionais, que levaram à adoção, por parte de suas subsidiárias no Brasil, de novos padrões organizacionais e tecnológicos, em maior ou menor medida inspirados no toyotismo e nas formas flexíveis de acumulação;
    2) da necessidade, no âmbito dos capitais e de seus novos mecanismos de concorrência, de as empresas brasileiras prepararem-se para a nova fase, marcada por forte “competitividade internacional” (Alves, 2000);
    3) da necessidade de as empresas nacionais responderem ao avanço do novo sindicalismo e das formas de confronto e de rebeldia dos trabalhadores que procuravam estruturar-se mais fortemente nos locais de trabalho, desde as históricas greves da região industrial do ABC e da cidade de São Paulo, no pós-1978.


Mas foi a partir dos anos 1990 que se intensificou o processo de reestruturação produtiva do capital no Brasil, processo que vem se efetivando mediante formas diferenciadas, configurando uma realidade que comporta tanto elementos de continuidade como de descontinuidade em relação às fases anteriores.
Nossa pesquisa demonstrou que há uma mescla nítida entre elementos do fordismo, que ainda encontram vigência acentuada, e elementos oriundos das novas formas de acumulação flexível e/ou influxos toyotistas no Brasil, que também são por demais evidentes.
No estágio atual do capitalismo brasileiro, enormes enxugamentos da força de trabalho combinam-se com mutações sociotécnicas no processo produtivo e na organização do controle social do trabalho. A flexibilização e a desregulamentação dos direitos sociais, bem como a terceirização e as novas formas de gestão da força de trabalho, implantadas no espaço produtivo, estão em curso acentuado e presentes em grande intensidade, coexistindo com o fordismo, que parece ainda preservado em vários ramos produtivos e de serviços.

Mas quando se olha o conjunto da estrutura produtiva, pode-se também constatar que o fordismo periférico e subordinado, que foi estruturado no Brasil, cada vez mais se mescla fortemente com novos processos produtivos, em grande expansão, consequência da liofilização organizacional, dos mecanismos próprios oriundos da acumulação flexível e das práticas toyotistas que foram assimiladas com vigor pelo setor produtivo brasileiro.
Se, por um lado, é verdade que a baixa remuneração da força de trabalho – que se caracteriza como fator de atração para o fluxo de capital estrangeiro produtivo no Brasil – pode-se constituir, em alguma medida, como elemento obstaculizador para o avanço tecnológico, devemos acrescentar, por outro, que a combinação entre padrões produtivos tecnologicamente mais avançados e uma melhor “qualificação” da força de trabalho oferece como resultante um aumento da superexploração da força de trabalho, traço constitutivo e marcante do capitalismo brasileiro. Isso porque, para os capitais produtivos (nacionais e transnacionais), interessa a mescla entre os equipamentos informacionais e a força de trabalho “qualificada”, “polivalente”, “multifuncional”, apta para operá-los, percebendo, entretanto, salários muito inferiores àqueles alcançados pelos trabalhadores das economias avançadas, além de regida por direitos sociais amplamente flexibilizados.
Ainda na década de 1990, no contexto da desregulamentação do comércio mundial, a indústria automobilística brasileira foi submetida a mudanças no regime de proteção alfandegária, com a redução das tarifas de importação de veículos. Desde então, as montadoras intensificaram o processo de reestruturação produtiva por meio das inovações tecnológicas, introduzindo, inicialmente, robôs e sistemas CAD/CAM – o que acarretou transformações no layout das empresas –, ou por meio da introdução de mudanças organizacionais, envolvendo uma relativa desverticalização, forte subcontratação e terceirização da força de trabalho, relativa redução de níveis hierárquicos, implantação de novas fábricas de tamanho reduzido, estruturadas com base em células produtivas, além da ampliação da rede de empresas fornecedoras. (Antunes e Silva, 2004; Alves, 2000; Druck, 1999).
As unidades produtivas mais antigas e tradicionais, como a Volkswagen, a Ford e a Mercedes-Benz, situadas no ABC paulista, também desenvolveram um forte programa de reestruturação, visando sua adequação aos novos imperativos do capital no que concerne aos níveis produtivos e tecnológicos e às formas de “envolvimento” da força de trabalho. A Volkswagen e a Mercedes-Benz foram objetos de investigação em nossa pesquisa. Na primeira montadora, o experimento de tentativa de controle, manipulação e interiorização dos trabalhadores, denominado “Coração Valente”, é exemplar de como a empresa pretendeu capturar a subjetividade do trabalho em benefício do aumento da produtividade.
O Manual de integração distribuído pela Toyota para os trabalhadores que ingressam na empresa é outro exemplo. Sua denominação fala por si só (Lima, 2004).
Depois de um primeiro ensaio, sob o governo Fernando Collor, significativo, mas logo estancado pela crise política que se abateu sob seu governo, o processo de reestruturação produtiva deslanchou novamente, por meio do Plano Real, a partir de 1994, sob o governo Fernando Henrique Cardoso.
Quer mediante programas de qualidade total, dos sistemas just-in-time e kanban, quer mediante a introdução de ganhos salariais vinculados à lucratividade e à produtividade (de que é exemplo o PLR, programa de participação nos lucros e resultados), sob uma pragmática que se adequava fortemente aos desígnios neoliberais (ou social-liberais), finalmente o mundo produtivo encontrou uma contextualidade propícia para o deslanche vigoroso de sua reestruturação, do assim chamado enxugamento empresarial e da implementação de mecanismos estruturados em moldes mais flexíveis. Se o processo de reestruturação produtiva no Brasil, durante os anos 1980, teve uma tendência limitada e seletiva, foi especialmente a partir da década de 1990 que ele se ampliou sobremaneira.
Outro exemplo importante pode ser encontrado no setor financeiro, em cujo processo de reestruturação se presenciou um intenso impacto, evidenciando-se que os trabalhadores bancários foram fortemente atingidos pelas mudanças nos processos e rotinas de trabalho, fundamentadas e impulsionadas, principalmente, pelas tecnologias de base microeletrônica e pelas mutações organizacionais.
Novas políticas gerenciais foram instituídas nos bancos, sobretudo por meio de seus programas de “qualidade total” e de “remuneração variável”. As políticas de concessão de prêmios de produtividade aos bancários que superavam as metas de produção estabelecidas, acrescidas do desenvolvimento de um eficiente e sofisticado sistema de comunicação empresa-trabalhador por meio de jornais, revistas ou vídeos de ampla circulação nos ambientes de trabalho, bem como da ampliação do trabalho em equipe, acarretaram um significativo aumento da produtividade do capital financeiro, além de buscar também a “adesão” dos bancários às estratégias de autovalorização do capital, reproduzidas nas instituições bancárias.
Como consequência das práticas flexíveis de contratação da força de trabalho nos bancos (mediante a ampliação significativa da terceirização, da contratação de trabalhadores por tarefas ou em tempo parcial, da introdução dos call centers), presenciou-se uma ainda maior precarização dos empregos e redução de salários, aumentando o processo de desregulamentação do trabalho e de redução dos direitos sociais para os empregados em geral e, de modo ainda mais intenso, para os terceirizados, em particular no espaço dos bancos (Jinkings, 2002 e Venco, 2003).
Do ponto de vista do capital financeiro, essas formas de contratação possibilitaram (e ainda possibilitam) ganhos enormes de lucratividade, ao mesmo tempo em que procuraram obnubilar os laços de pertencimento de classe e diminuir a capacidade de resistência sindical dos bancários, dificultando sua organização no espaço de trabalho. A liofilização organizacional nos bancos, apoiada no incremento tecnoinformacional, implementando os programas de ajustes organizacionais nas agências, vem reduzindo a estrutura administrativa e os quadros funcionais das instituições financeiras, aumentando os mecanismos de individualização das relações de trabalho e de assalariamento.

Como consequência, foram desativados ou bastante reduzidos grandes centros de computação, de serviços e de compensação de cheques, e setores inteiros foram extintos nas agências bancárias e centrais administrativas. Enquanto os grandes conglomerados financeiros privados cresciam em poderio econômico – com taxas de lucro enormes –, o número de bancários no país reduziu-se de aproximadamente 800 mil, no fim dos anos 80 do século XX, para pouco mais de 400 mil em 2005. Os planos de demissão voluntária tornaram-se regra nos bancos públicos, conforme pudemos analisar em nossa pesquisa no Banco do Brasil. Paralelamente, proliferaram os terceirizados no labor bancário (Jinkings, 2002).
Em relação à divisão sexual do trabalho, na medida em que se desenvolviam os processos de automatização e flexibilização do trabalho, presenciou-se um movimento de feminização dos bancários que, entretanto, não foi seguido por uma equalização da carreira e do salário entre homens e mulheres. Uma série de mecanismos sociais de discriminação – reproduzidos e intensificados nos ambientes de trabalho – estruturou relações de dominação e de exploração mais duras sobre o trabalho feminino, que se traduziram em desigualdades e segmentações entre gêneros (Segnini, 1998).
As mudanças apontadas nas características pessoais e profissionais dos bancários são, portanto, expressões da adequação às exigências da reestruturação produtiva em curso e de seus movimentos de tecnificação e racionalização do trabalho. Visando adequar sua força de trabalho às modalidades atuais do processo produtivo, as instituições financeiras passaram a exigir uma aparente “nova qualificação” para os trabalhadores do setor, que parece ter mais uma significação ideológica do que tecnofuncional (Jinkings, 2002).
Num contexto de crescente desemprego e de aumento de formas precárias de contratação, os assalariados bancários foram compelidos a desenvolver uma formação geral e polivalente, na tentativa de manter seus vínculos de trabalho, sendo submetidos à sobre-carga de tarefas e a jornadas de trabalho extenuantes. Agravaram-se os problemas de saúde no espaço de trabalho nas últimas décadas, e observou-se, ainda, um aumento sem precedentes das lesões por esforço repetitivo (LER), que reduzem a força muscular e comprometem os movimentos, configurando-se como doenças típicas da era da informatização do trabalho, conforme também constatamos na pesquisa realizada no universo bancário.
Os programas de qualidade total e de remuneração variável, amplamente difundidos no setor, recriaram estratégias de dominação do trabalho que procuram obscurecer e nublar a relação entre capital e trabalho. Os trabalhadores bancários foram constrangidos a tornar-se “parceiros”, “sócios”, “colaboradores” dos bancos e das instituições financeiras, num ideário e numa pragmática que aviltam ainda mais a condição laborativa.
Sob o movimento rápido e ágil das máquinas informatizadas, os homens e as mulheres realizam um conjunto infindável de operações de registro e transferência de valores. Transformam essa mercadoria-dinheiro em mais dinheiro, verdadeira fonte misteriosa, conforme a sugestiva referência de Marx. E, quanto mais “produzem”, em tempo cada vez mais virtual, mais bancários veem diminuir seus postos de trabalho por meio dos chamados planos de demissão voluntária (PDV) (Jinkings, 2002).
É nesse contexto que a greve dos bancários desencadeada em setembro/outubro de 2004 constituiu um evento bastante importante, uma vez que se trata da primeira ação de grande amplitude desencadeada pelos bancários depois do vastíssimo processo de reestruturação dos bancos. Quando tantos analistas diziam que os bancários tinham perdido a capacidade de resistência e ação, presenciamos um movimento que paralisou mais de 200 mil trabalhadores em várias partes do país, tanto em bancos públicos quanto em bancos privados.
Foi contra esse quadro de penalização do trabalho que os trabalhadores dos bancos desencadearam a paralisação, reivindicando a reposição da inflação e mais 17% de aumento real. Um mês depois, sem ganho real, mas tendo mostrado que algo novo se passava no espaço de trabalho dos bancos, a greve foi suspensa.
Se parece visível a derrota material da greve, o mesmo não se pode dizer no plano da política e da ação. Aqui houve uma resposta coletiva e sob a forma de greve, depois da monumental reestruturação vivenciada no interior do espaço dos bancos.
Outro setor que experimentou mudanças significativas foi o de calçados, situado em Franca, no interior de São Paulo, onde as técnicas de gerenciamento da força de trabalho foram implementadas em várias empresas, visando ao “envolvimento” dos trabalhadores no processo de reestruturação da produção, com a finalidade de aumentar a produtividade do trabalho (Navarro, 2003).
Como consequência desse processo, presenciou-se uma significativa redução de postos de trabalho, que oscilava em decorrência dos movimentos do mercado, além da reorganização produtiva, por meio da implantação de células de produção, introduzindo o denominado trabalho “polivalente” ou “multifuncional”, que, em verdade, mais se assemelha a um mecanismo responsável por níveis mais acentuados de intensificação e de exploração da força de trabalho.
Além das mudanças na organização produtiva, o setor calçadista vivenciou um intenso processo de terceirização por meio da ampliação do trabalho em domicílio, nas pequenas unidades produtivas, etc., o que contribuiu para o agravamento das condições de trabalho, uma vez que boa parte desse trabalho é realizada em locais precários e improvisados, dentro e fora das casas, alterando o espaço familiar e as suas condições de vivência.
A pesquisa constatou, ao estudar a indústria calçadista de Franca, interior do estado de São Paulo, também, uma degradação dos direitos sociais do trabalho, que se ampliou em função da externalização e da terceirização da produção. Direitos conquistados, como o descanso semanal remunerado, férias, o 13º salário, aposentadoria, etc, tornaram-se mais facilmente burláveis.
Houve, ainda, uma ampliação do trabalho infantil, consequência direta da transferência do trabalho produtivo do espaço fabril para o espaço domiciliar, onde o controle do trabalho infantil fica ainda mais difícil (Navarro, 2003).

Os exemplos anteriores já evidenciam como o universo do trabalho tem sido fortemente penalizado, em consequência dos mecanismos introduzidos pela liofilização organizacional. Se as formas da reestruturação produtiva têm sido diferenciadas, quando se toma a realidade cotidiana do trabalho, um traço praticamente constante tem sido a tendência ao aumento dos mecanismos de desregulamentação e a mesmo precarização da força de trabalho.
No setor têxtil, a processualidade da reestruturação produtiva foi muito intensa ao longo dos anos 1990, como consequência da política de abertura econômica e de liberalização comercial que desorganizou fortemente as indústrias desse setor, acarretando um enorme desemprego, com diminuição de mais de 50% de seu nível de emprego, na primeira metade da década, além de um alto grau de terceirização da força de trabalho.
Embora tenha havido, na região pesquisada, crescimento do número de empresas ao longo da década de 1990, esse aumento traz consigo o enorme processo de reestruturação das grandes empresas e transferência de amplos espaços produtivos para o universo das micro e pequenas empresas que proliferaram no setor.
O incremento tecnológico, as novas formas de organização da produção e a introdução ampliada da terceirização acabaram por acarretar altos níveis de desemprego e sub-emprego no setor têxtil, compensados apenas parcialmente pelo crescimento das pequenas e microempresas.
Na indústria de confeções, além dos baixos níveis de remuneração da força de trabalho, a terceirização tornou-se elemento estratégico central, implementado pelas empresas para reduzir os custos e aumentar a produtividade, sem desconsiderar a importante significação política dessa medida, que é tanto maior quanto mais combativos são os sindicatos.
Esse processo originou a ampliação do trabalho em domicílio, além das chamadas “cooperativas de trabalho”, responsáveis por formas acentuadas de subcontratação e precarização da força de trabalho, pela redução significativa da remuneração da força de trabalho e pelo descumprimento dos direitos trabalhistas.
A externalização do trabalho, o retorno de práticas pretéritas, como o putting out, ampliou-se enormemente nos setores têxtil e de confeções, acentuando as formas e os mecanismos que configuram uma ainda maior precarização do trabalho e o descumprimento dos direitos trabalhistas. Uma vez preservada a marca, na era do capitalismo dos signos, das embalagens, do involucral e do supérfluo, as empresas passaram a recorrer ainda mais à terceirização, reduzindo os custos da produção, acarretando um enorme desemprego e enfraquecendo a coesão e a solidariedade dos trabalhadores.
Na década de 1990, por exemplo, a Hering, em Santa Catarina, terceirizou mais de 50% da sua produção, acarretando o desemprego de cerca de 70% da sua força de trabalho, conforme dados oferecidos pela pesquisa. Processo similar ocorreu com a Levi Strauss do Brasil, que, na mesma década, criou uma “cooperativa”, eliminando praticamente todos os seus postos diretos de trabalho.

Nas empresas de telecomunicações, as alterações no universo do trabalho também foram de grande monta. A necessidade de inovar os processos, os produtos e os serviços ampliou em muito a importância da esfera comunicacional para a agilização do ciclo produtivo que agora opera em tempo virtual. Esse processo de mercadorização da informação possibilitou a direta e rápida incorporação dos novos dados e informações ao mundo produtivo, instrumental decisivo para a continuidade das chamadas “inovações produtivas”.
No caso da Sercomtel, empresa estatal com sede em Londrina, dada a sua condição de empresa pública que comportava uma certa estabilidade dos trabalhadores, a alternativa encontrada pela nova lógica gerencial, sob influxo privatista, foi a redução e o remanejamento de parcela dos assalariados por meio dos planos de aposentadoria e demissão voluntária, que possibilitaram reduzir o quadro de pessoal. O ritmo quase alucinante da terceirização e da automatização, que marcam o fetiche da tecnologia, acabou atuando também para dificultar os laços de solidariedade de classe, reforçando ainda mais a flexibilização e a consequente precarização do trabalho no setor de telecomunicações. No fluxo das tendências anteriormente analisadas, também a terceirização foi recorrente, sobretudo por meio da introdução de call center, que passou a se responsabilizar por todo o serviço de mediação do cliente com a empresa.
E a expansão desse novo universo – o das empresas de call center – nos levou a pesquisar o setor de telemarketing, onde pudemos constatar que a enorme ampliação de empregos é preenchida, predominantemente, por jornadas parciais, de seis horas diárias, cujas atividades são marcadas pela acentuada intensificação dos ritmos e pelo aumento da exploração da força de trabalho. Cabe lembrar, também, que esse setor (como se pode conferir no Grupo Atento-Brasil) tem seu contingente laborativo predominantemente feminino, com mais de 70% de mulheres, confirmando-se a tendência forte de feminização do mundo do trabalho em diversos setores e ramos.
Seu principal “produto” é dado pela prestação de serviços, por meio do atendimento telefônico, que visa à solução de dúvidas, ao oferecimento de informações, como endereços e telefones, à orientação de clientes na compra ou utilização de um produto, entre tantas possibilidades abertas pelo telemarketing (Nogueira, 2006).
E, para realizar essa jornada diária, as teleoperadoras, sempre com seu headset (fone de ouvido), ficam quase todo o tempo de trabalho sentadas, coladas no visor do microcomputador e no teclado, sob rígida vigilância das supervisoras, que exigem sempre maior produtividade e controlam o tempo médio de atendimento das trabalhadoras. Aqui também pudemos constatar o crescente adoecimento no trabalho, algo que tem sido constante no setor de telemarketing.
Quanto às condições de trabalho, pode-se testemunhar, com base na pesquisa, que, em muitas dessas empresas de call center e telemarketing, há inclusive “baias” que separam as trabalhadoras, para que elas não conversem e não diminuam os ritmos extenuantes de trabalho, rigorosamente cronometrados.

No universo dos trabalhadores da arte, no teatro lírico, também contemplados pela pesquisa, as relações de trabalho configuram cada vez mais uma ausência de regulamentação específica para o trabalho musical.
O trabalhador do canto lírico, bem como os músicos de orquestra, dada a feição de “prestação de serviços”, vivem sob a marca da instabilidade, que permite o desligamento dos artistas pela direção dos teatros sempre que não houver interesse na renovação dos contratos. Como estes são renovados periodicamente (a cada dois ou três meses), não se configura o reconhecimento do vínculo empregatício.
No contexto da flexibilização dos artistas dos coros, que anteriormente tinham maior estabilidade, processo de flexibilização que se intensifica ao longo dos anos 90 do século XX, pode-se perceber também uma precarização maior do trabalho, aumentando a busca por outras atividades, além de revelar uma dupla fragilidade na organização dos artistas, dada, por um lado, pela forte individualização do trabalho e, por outro, pela alta competição que marca a profissão, aumentando ainda mais o risco do desemprego.
Este breve retrato aqui oferecido nos permite observar um nítido crescimento de relações de trabalho mais desregulamentadas, distantes da legislação trabalhista, gerando uma massa de trabalhadores que passam da condição de assalariados com carteira para a de trabalhadores sem carteira assinada, especialmente durante a década de 1990.
Se nos anos 1980 era relativamente pequeno o número de empresas de terceirização, locadoras de força de trabalho de perfil temporário, na década seguinte esse número aumentou significativamente para atender à grande demanda por trabalhadores temporários, sem vínculo empregatício, sem registro formalizado.
Essas mutações, portanto, inseridas na lógica da racionalidade instrumental do mundo empresarial, estão intimamente relacionadas ao processo de reestruturação produtiva do capital, no qual as grandes empresas, por meio da flexibilização dos regimes de trabalho, da subcontratação e da terceirização, procuram aumentar sua competitividade fraturando e fragmentando ainda mais a classe-que-vive-do-trabalho.
A proliferação dos trabalhadores dos call centers, das empresas de telemarketing, dos trabalhadores em serviços cada vez mais inseridos na lógica produtiva, de agregação de valor, acabou por criar um novo contingente de trabalhadores, que Ursula Huws denominou cybertariat, o novo proletariado da era da cibernética, ou o que Ruy Braga e eu denominamos como infoproletariado (Antunes e Braga, 2009), composto por trabalhadores que procuram uma espécie de trabalho cada vez mais virtual em um mundo profundamente real, conforme o sugestivo título de seu livro (Huws, 2003), que trata de compreender os elementos que configuram o mundo do trabalho na era da informática, do telemarketing e da telemática.
O que nos permite afirmar que, em plena era da informatização do trabalho, do mundo maquinal da era da acumulação digital, estamos presenciando a época da informalização do trabalho, caracterizada pela ampliação dos terceirizados, pela expansão dos assalariados do call center, subcontratados, flexibilizados, trabalhadores em tempo parcial, teletrabalhadores, pelo cyberproletariado, o proletariado que trabalha com a informática e vivencia outra pragmática, moldada pela desrealização, pela vivência da precarização, daquilo que neste livro, sugestivamente, Luciano Vasapollo denominou trabalho atípico.
Uma fenomenologia preliminar dos modos de ser da informalidade no Brasil apresenta, então, uma gama acentuada de trabalhos submetidos a sucessivos contratos temporários, sem estabilidade, sem registro em carteira, trabalhando dentro ou fora do espaço produtivo das empresas, quer em atividades mais instáveis ou temporárias, quando não na condição de desempregado.3
Uma primeira modalidade de informalidade remete à figura dos trabalhadores informais tradicionais, “inseridos nas atividades que requerem baixa capitalização, buscando obter uma renda para consumo individual e familiar. Nesta atividade, vivem de sua força de trabalho, podendo se utilizar do auxílio de trabalho familiar ou de ajudantes temporários.” (Alves e Tavares, 2006: 431).
Neste universo encontramos “os menos ‘instáveis’, que possuem um mínimo de conhecimento profissional e os meios de trabalho e, na grande maioria dos casos, desenvolvem suas atividades no setor de prestação de serviços”, de que são exemplos as costureiras, pedreiros, jardineiros, vendedor ambulante de artigos de consumo mais imediato como alimentos, vestuário, calçados e de consumo pessoal, camelôs, empregado doméstico, sapateiros e oficinas de reparos (Idem: 431).
Há também os informais mais “instáveis”, recrutados temporariamente e frequentemente remunerados por peça ou por serviço realizado. Eles realizam trabalhos eventuais e contingenciais, pautados pela força física e pela realização de atividades dotadas de baixa qualificação, como carregadores, carroceiros e trabalhadores de rua e serviços em geral. Estes trabalhadores mais “instáveis” podem inclusive ser subempregados pelos trabalhadores informais mais “estáveis” (Idem: 431).
Nesta primeira modalidade – trabalhadores informais tradicionais – podemos incluir os trabalhadores “ocasionais” ou “ temporários”, que realizam atividades informais quando se encontram desempregados, mas que visam retornar ao trabalho assalariado. Segundo a caracterização de Alves e Tavares, “são trabalhadores que ora estão desempregados, ora são absorvidos pelas formas de trabalho precário, vivendo uma situação que, inicialmente, era provisória e se transformou em permanente. Há casos que combinam o trabalho regular com o ocasional, praticando os chamados bicos. Nesses casos obtém-se um baixo rendimento com essas atividades” (Alves e Tavares, 2006: 431), como os “vendedores de diversos produtos (limpeza, cosméticos, roupas), digitador, salgadeiras, faxineiras e confecção de artesanato nas horas de folga” (Idem: 431). Ainda neste espectro de atividades informais tradicionais encontram-se as pequenas oficinas de reparação e concertos, estruturadas e mantidas pela clientela do bairro ou relações pessoais (Idem: 431).
Inseridos na divisão social do trabalho capitalista, essa gama de trabalhadores informais “contribuem para que se efetive a circulação e consumo das mercadorias produzidas pelas empresas capitalistas. A forma de inserção no trabalho informal é extremamente precária e se caracteriza por uma renda muito baixa, além de não garantir o acesso aos direitos sociais e trabalhistas básicos, como aposentadoria, FGTS, auxílio-doença, licença-maternidade; se ficarem doentes são forçados a parar de trabalhar, perdendo integralmente sua fonte de renda” (Idem: 432).
Não há horário fixo de trabalho e as jornadas de trabalho levam frequentemente ao uso das horas vagas para aumentar a renda oriunda do trabalho. Acrescente-se, ainda, o fato de que, no trabalho por conta-própria, além do uso de seu trabalho, pode haver uso da força de trabalho de outros membros da família, com ou sem remuneração.
Uma segunda modalidade remete à figura dos trabalhadores informais assalariados sem registro, ao arrepio da legislação trabalhista, uma vez que perderam o estatuto de contratualidade e que passam da condição de assalariados com carteira assinada para a de assalariados sem carteira, excluindo-se do acesso das resoluções presentes nos acordos coletivos de sua categoria (Idem: 432). A indústria de têxtil, de confeções e de calçados, por exemplo, dentre tantas outras, tem acentuado esta tendência (Antunes, 2006: 21-23). Isto porque a racionalidade instrumental do capital impulsiona as empresas à flexibilização do trabalho, da jornada, da remuneração, aumentando a responsabilização e as competências, criando e recriando novas relações e formas de trabalho que, frequentemente, assumem feição informal. Nos exemplos de Alves e Tavares encontram-se “(…) os casos de trabalho em domicílio que se especializam por áreas de ocupação, prestando serviços às grandes empresas, que também se utilizam da subcontratação para a montagem de bens, produção de serviços, distribuição de bens através do comércio de rua ou ambulante” (Alves e Tavares, 2006: 432). Muitas vezes este modo de trabalho se realiza também em galpões – como na indústria de calçados – onde a informalidade é a norma.
Uma terceira modalidade, encontramos nos trabalhadores informais por conta-própria, que podem ser definidos como uma variante de produtores simples de mercadorias, contando com sua própria força de trabalho ou de familiares e que podem inclusive subcontratar força de trabalho assalariada ( Idem: 433).
Segundo Alves e Tavares, as “formas de inserção do trabalhador por conta-própria na economia informal não são práticas novas, mas foram recriadas pelas empresas capitalistas, como forma de possibilitar a extração da mais-valia relativa com a mais-valia absoluta. Lembramos que há diferentes formas de inserção do trabalho informal no modo de produção capitalista e, para sua análise, devemos considerar essa grande heterogeneidade, buscando desvendar quais os vínculos existentes entre esses trabalhadores e o acúmulo de capital” (Idem: 433).
E acrescentam: “Deste modo, proliferam-se os pequenos negócios vinculados às grandes corporações, envolvendo as áreas de produção, comércio e prestação de serviços. Os pequenos proprietários informais atuam em áreas que não atraiam investimentos capitalistas de maior vulto, de modo a atender à demanda por determinados bens e serviços. Esses trabalhadores adotam essas estratégias porque seus pequenos negócios informais não têm condições de concorrer com as empresas capitalistas, são elas que definem sua forma de inserção no mercado” (Idem: 433).
Estamos vivenciando, portanto, a erosão do trabalho contratado e regulamentado, dominante no século XX e vendo sua substituição pelas diversas formas de “empreendedorismo”, “cooperativismo”, “trabalho voluntário”, etc. O exemplo das cooperativas talvez seja ainda mais esclarecedor. Em sua origem, elas nasceram como instrumentos de luta operária contra o desemprego, o fechamento das fábricas, o despotismo do trabalho.
Hoje, entretanto, contrariamente a essa autêntica motivação original, os capitais criam falsas cooperativas como instrumental importante para depauperar ainda mais as condições de remuneração da força de trabalho e aumentar os níveis de exploração da força de trabalho, fazendo erodir ainda mais os direitos do trabalho.
As cooperativas “patronais” no Brasil vêm se tornando verdadeiros empreendimentos visando aumentar ainda mais a exploração da força de trabalho e a consequente precarização da classe trabalhadora. Similar é o caso do “empreendedorismo”, que cada vez mais se configura como forma oculta de trabalho assalariado e que permite o proliferar das distintas formas de flexibilização salarial, de horário, funcional ou organizativa.
É neste quadro, caracterizado por um processo tendencial de precarização estrutural do trabalho, em amplitude ainda maior, que os capitais estão exigindo também o desmonte da legislação social protetora do trabalho.
Ou seja, no movimento pendular do trabalho, preservados os imperativos destrutivos do capital, oscilamos crescentemente entre a perenidade de um trabalho cada vez mais reduzido, intensificado e mais explorado, dotado de direitos, e, de outro, uma superfluidade crescente, cada vez geradora de trabalho precarizado e informalizado, como via de acesso ao desemprego estrutural.
Por fim, é preciso enfatizar que a informalidade, em seus distintos modos de ser – que aqui tão somente indicamos alguns exemplos dominantes no Brasil – supõe sempre a rutura com os laços de contratação e de regulação da força de trabalho, tal como se estruturou a relação capital e trabalho, especialmente ao longo do século XX, sob a vigência tayloriano-fordista, quando o trabalho regulamentado tinha prevalência sobre o desregulamentado.
Se a informalidade não é sinônimo direto de precariedade, sua vigência expressa formas de trabalho desprovido de direitos e, por isso, encontra clara similitude com a precarização. Apontar suas conexões, suas inter-relações e suas vinculações torna-se imprescindível. E oferecer um esboço destas formas diferenciadas da informalidade do trabalho, do que é novo e o que é velho nas distintas modalidades assumidas pela precarização do labor em seus múltiplos exemplos, foi o objetivo deste texto.

 

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Artigo recebido a 2 de setembro de 2013. Publicação aprovada a 26 de setembro de 2013.

 

Notas

1Este texto apresenta algumas idéias que são resultado da nossa pesquisa Para onde vai o mundo do trabalho?, que realizamos junto ao CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa Científica) no Brasil.

2Professor Titular de Sociologia no Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) (Campinas, Brasil). Foi Visiting Research Fellow na Universidade de Sussex (Brighton, Inglaterra). Atualmente coordena as Coleções Mundo do Trabalho, pela Boitempo Editorial e Trabalho e Emancipação, pela Editora Expressão Popular. Endereço de correspondência: Cidade Universitária Zeferino Vaz, Cidade Universitária, Campinas, 13083-970, Brasil. E-mail: rantunes@unicamp.br

3 Em nosso livro Riqueza e Miséria do Trabalho no Brasil, há um desenho das características principais da informalidade, que utilizaremos a seguir, feita por Aparecida Alves e Maria Augusta Tavares (Antunes, 2006).

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