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Sociologia

versão impressa ISSN 0872-3419

Sociologia vol.26  Porto dez. 2013

 

ARTIGOS

Condomínios habitacionais fechados: (im)precisões conceptuais. Apontamentos para um debate sobre urbanidade e autonomia, segregação e qualidade de vida

Conceptual remarks on closed residential condominiums. Notes for a debate over urbanity and autonomy, segregation and quality of life

Remarques conceptuelles sur les condominiums résidentiels fermés. Notes pour un débat sur urbanité et autonomie, ségrégation et qualité de vie

Condominios residenciales cerrados: aclaraciones conceptuales . Notas para un debate sobre urbanidad y autonomía, segregación y calidad de vida

Marta Martins1

Universidade do Porto e Instituto Universitário de Lisboa


 

RESUMO
Algumas das analogias recorrentemente estabelecidas entre condomínios habitacionais fechados e outras formas e paisagens revestem-se de imprecisões histórico-conceptuais que dificultam a análise das realidades que, mais ou menos retoricamente, se tende a aproximar. A articulação entre tais precisões conceptuais e a reflexão sobre o resultado de pesquisas realizadas, na Área Metropolitana de Lisboa (2001-2007), sobre o surgimento e expansão dos condomínios habitacionais fechados apoia, neste artigo, a seleção de alguns pontos considerados importantes para debater a explicação e compreensão das dinâmicas e impactes subjacentes a tal fenómeno.

Palavras-chave : Condomínio habitacional fechado; Segregação; Qualidade de vida.


 

ABSTRACT
This article tackles the conceptual and historical inaccuracies that characterize some of the analogies and comparisons often established between closed residential condominiums and other forms and landscapes. It is argued that they undermine the analysis of the realities that, more or less metaphorically, are recurrently discussed both as perfect similar or perfect opposites. These remarks, along with results from fieldwork-experiences performed in Lisbon Metropolitan Area (2001-2007), allow us to mark some useful notes, important to debate both the explanation and the comprehension of the dynamics and impacts underlying the rising and development of closed residential condominiums, regarded as real estate products.

Keywords : Closed residential condominium; Segregation; Quality of life.


 

RESUMÉ
Certaines analogies souvent établi entre les condominiums résidentiels fermés et d'autres formes et paysages sont historique et conceptuellement inexact, ce qui font obstacle à l'analyse de les réalités plus ou moins rhétoriquement comparé. La clarification de ces inexactitudes s’articule, dans ce texte, avec la réflexion sur résultats de la recherche développé dans la Région Métropolitaine de Lisbonne (2001-2007) à propos de l’emergence et l'expansion des condominiums résidentiels fermés. Ces remarques permettent, enfin, la sélection de quelques notes intéressants pour débat l’explication et la compréhension de la dynamique et les impacts qui sous-tendre le phénomène du développement de ces produits immobiliers.

Mots-clés : Condominium résidentiel fermé; Ségrégation; Qualité de vie.


 

RESUMEN
Algunas de las analogías recurrentemente establecidas entre los condominios residenciales cerrados y otras formas y paisajes son históricamente e conceptualmente equívocas, dificultando la análisis de las realidades que, más o menos retóricamente, se intenta comparar. La precisión conceptual articulada con los resultados de investigación desarrollada en la Área Metropolitana de Lisboa (2001-2007) acerca de la aparición y expansión de condominios residenciales cerrados apoya, en este articulo, la selección de notas interesantes para debatir la explicación y la comprensión de las dinámicas y los impactos de este fenómeno.

Palabras clave : Condominio residencial cerrado; Segregación; Cualidad de vida.


 

Introdução

A noção de condomínio habitacional fechado (CHF) carece de contornos consensuais. Tal como a própria origem destes empreendimentos, esses contornos constituem motivo de debate entre os investigadores que se dedicam ao estudo do surgimento e expansão dos CHF. Este último fenómeno assume, de resto, uma visibilidade marcadamente conflitual. Tanto na esfera pública mais alargada, como no debate académico, a sua visibilidade é alimentada por conceções que sobre o mesmo projetam, sobretudo no que respeita aos seus impactes, um conjunto vasto de perigos e de potencialidades (Martins, 2009: 117).
Sendo certo que CHF corresponde, sobretudo, a uma situação de facto e não de jure (Raposo, 2002: 57; Low, 2003: 12), o debate é pontuado por invocações e analogias frequentemente estabelecidas entre CHF e outras formas e paisagens, não necessariamente associadas a objetos arquitetónicos vocacionados para uma função habitacional. Uma dessas analogias transporta-nos a uma forma vinda do imaginário medieval, idade, não raras vezes, apontada como berço do fenómeno: o gueto. Mas os CHF são também nomeados como extremos socialmente opostos de áreas de génese ilegal, castigadas pela pobreza e exclusão social. Favelas, bairros-de-barracas ou shanty towns são, não raras vezes, designadas como condomínios de pobres ou guetos involuntários de cidades duais e em acentuada polarização social.
Este artigo persegue, como primeiro objetivo, notar as imprecisões históricas e conceptuais de que se revestem algumas das analogias e comparações referidas. Embora metaforicamente poderosas, defende-se, elas podem dificultar a análise sobre o que está em jogo em cada uma das realidades que mais ou menos retoricamente se tende a aproximar. O esclarecimento da ancoragem histórica e conceptual a que nos atemos quando falamos de CHF impõe-se, nesse âmbito, como ponto inicial no texto. As clarificações históricas e conceptuais articulam-se, depois, com a apresentação de resultados de investigação realizada na Área Metropolitana de Lisboa (AML) (2001-2007) sobre o surgimento e expansão dos CHF. Um procedimento que apoia a concretização de um segundo objetivo, final: a seleção de alguns pontos significativos e desafiantes para o debate sobre a explicação e a compreensão das dinâmicas e impactes subjacentes ao fenómeno2.

1. Condomínios habitacionais fechados. Ancoragens históricas incertas, reedições modernas

A clausura formal não é uma originalidade ou traço exclusivo dos CHF. Por aí parece passar, todavia, a propósito das suas origens longínquas, o paralelo estabelecido entre estes empreendimentos e a cidade medieval. Esta última parece distante das remotas procedências históricas dos CHF, inclusivamente estando ausente no marketing dedicado à sua promoção; a heterogeneidade social inscrita na configuração interna do espaço e quotidiano nesses aglomerados seria, ainda, um traço que social e simbolicamente, essencialmente, os afasta dos empreendimentos presentemente em exame (Raposo, 2002). Também o usufruto de amenidades não constitui uma originalidade ou especificidade dos CHF.
O princípio que permite situar os antecedentes dos mesmos residirá, sim, conforme proposto por Maria Rita Raposo, na especificidade da conjugação, nestes empreendimentos, das dimensões de clausura (impermeabilidade física dos perímetros e dispositivos/práticas de controlo da acessibilidade/circulação) e usufruto de amenidades (equipamentos e/ou serviços de uso coletivo) com “a propriedade privada colectiva ou comum (e/ou usufruto) de espaços exteriores associados à função residencial (…) indissociável da propriedade privada e individualizada de fracções ou unidades de habitação autónomas” (2002: 55, 59-60).
Observando tal princípio, o surgimento dos CHF parece corresponder à reedição de um fenómeno cujos antecedentes reportam às praças residenciais britânicas e, pouco mais tarde, ao subúrbio romântico planeado anglo-americano (idem: 159-219). Paisagens indissociáveis do quadro de profundas transformações que, entre meados do século XVIII e finais do XIX, ditariam o derrube jurídico-institucional do Antigo Regime – um tempo de transição, em que a renovação de barreiras à acessibilidade e comunicabilidade surge, no que aos modos de habitar concerne, como via de reequilíbrio de posições e estatutos entre novos e velhos grupos sociais, relacionados segundo uma nova lógica económica e cultural, capitalista. Nesta perspetiva, o advento de um habitat burguês antecede historicamente os atuais CHF, aglutinador dos anseios de segregação fisicamente consagrada, isolamento doméstico do núcleo familiar, onde a privatização de espaços abertos recria “pequenas parcelas de natureza” que contrastam com o cheiro do enxofre das “fábricas e tugúrios urbanos (…) (assim como de todas as instalações contaminadas pelas classes perigosas da modernidade)” (idem: 160-161).
Surgido na Califórnia (EUA) em finais da década de 60 do século XX, o atual advento dos CHF regista, relativamente ao momento primevo, importantes inovações, manifestando-se em diversos contextos e concretizando-se em maior número de casos (Raposo, 2002: 225; Nunes, 2001: 31; Low, 2003: 15-16). A produção deste produto imobiliário reveste-se, além disso, da complexidade decorrente do próprio desenvolvimento do sistema institucional de conceção, construção, comercialização e consumo de espaço residencial.

2. Gueto e condomínio habitacional fechado. Uma analogia histórica e conceptualmente equívoca

No quadro de transformações conformadoras de uma terceira revolução urbana moderna, François Ascher destaca a emergência espacialmente inscrita de “novas formas de segregação social” (2010 (2001): 72). Estas plasmavam-se, por um lado, na constituição de guetos de pobres, lugares de reagrupamento “por diferentes mecanismos económicos, sociais e políticos (de) populações excluídas do desenvolvimento económico” (idem: 63). Por outro, na proliferação de guetos de ricos ou “bairros privados rodeados por muros”, onde a geração de “fragmentação social (e) enclausuramento espacial” se presume imanente, alimentada pela cedência à “tentação de ruptura do pacto social e dos laços de solidariedade locais e nacionais” ( idem).
É recorrente, o uso do termo gueto para aludir ao que se considera ser um CHF. Mas a mesma expressão é convocada para nomear o que alguns apontam como o reflexo invertido dos CHF. Consubstanciado nas favelas, shanty-towns ou bairros-de-barracas, esses são lugares a que Zygmunt Bauman chama guetos involuntários ou forçados, “para onde foram empurrados os desclassificados, os refractários e os imigrantes recentes” (2006 (2005): 36, 81).
Antes notado por Loïc Wacquant a propósito do debate sobre os “conjuntos habitacionais degradados das periferias urbanas francesas”, o uso mais ou menos metafórico da palavra gueto para referenciar algumas destas paisagens alia a “confusão conceptual com amnésia histórica” (2008 (2006): 10, 86). Tal equívoco participa, ainda, numa desracialização do conceito de gueto, ancestralmente associado a um “instrumento de dominação etnorracial” dotado de uma forma territorial específica, assente no confinamento espacial e enclausuramento organizacional compulsórios de um grupo subordinado face a outro, subordinante (idem: 61, 18, 12). Assim sucedera em Veneza, em 1516. Posteriormente difundido noutros pontos da paisagem medieval europeia, sob o impulso de crescentes sanções e limitações económicas, o dispositivo operatório de dominação material e simbólica oferecia ao grupo dominado, contudo, uma espécie de “escudo protector” (idem: 85). Nele, assistir-se-ia ao desenvolvimento e à densificação de redes organizacionais alternativas vocacionadas para a manutenção possível da sobrevivência física e cultural da categoria social e territorialmente segregada.
O gueto é “um instrumento institucional” que se cumpre por meio de uma operação prática de restrição coerciva, a qual dá corpo ao confinamento espacial e ao “encapsulamento organizacional” de um grupo tido como “pervertido e perversor” (Wacquant, 2008 (2006): 79). A escolha da palavra institucional reveste-se, nesta definição, de um sentido preciso. Enquanto fenómeno relacional, o gueto afigura-se como uma instituição no sentido durkheimiano do termo. Ele articula elementos radicalmente associados a tal noção, tal como preconizada por Durkheim, nomeadamente, o “elevado grau de permanência de um facto social” (Javeau, 1998:113) e os princípios de pré-existência, “exterioridade e de (constrangimento) dos factos sociais relativamente ao indivíduo” (Silva e Pinto, 1999 (1986): 15). De facto, é também (ou precisamente) pela sua natureza institucional, forjada na combinação entre a origem involuntária da segregação e o paralelismo organizacional existente no seu cosmos social que o gueto configura, para o grupo subordinado – como “poderosa máquina de identidade colectiva” – uma armadilha difícil de romper (Wacquant, 2008 (2006): 85-88).
Retoricamente poderosa, a imprecisão que fere a analogia estabelecida entre a noção de gueto e a ideia de CHF – e entre gueto e favelas, shanty towns ou bairros-de- barracas – pode dificultar a análise do que está em jogo em cada um desses fenómenos, em cada contexto específico. A este respeito, retenha-se três notas importantes, avançadas por Wacquant (2008 (2006): 83-85).

  • Primeiro, nem todos os guetos são pobres e nem todas as áreas pobres são guetos. Alguma heterogeneidade interna em termos de condições objetivas de vida seria uma realidade por vezes verificada em alguns guetos (sendo a penúria a marca mais forte verificada nos mesmos). Por outro lado, a pobreza marcante das áreas deserdadas, economicamente vulneráveis, não corresponde, necessariamente, a um processo social de deliberada contenção étnica.
  • Depois, se todos os guetos são segregados, nem todas as áreas segregadas são guetos. Os CHF assumem-se, na perspetiva do autor, como ex. paradigmático disso mesmo. Tais “ilhas de privilégio”3
    configuram paisagens a que subjaz uma segregação reputada como “inteiramente voluntária e electiva” e autonomamente manipulável pelo indivíduo que nelas escolhe residir (Wacquant, 2008 (2006): 85). A autonomia na gestão da porosidade e ambiguidade das fronteiras (Martins, 2009) é o aspeto sublinhado por outros autores, quando notam o que fundamentalmente diferencia tipos de guetos (Bauman, 2001: 36, 116; Raposo, 2002: 312). Bauman explicita, assim, o que separa os guetos involuntários dos guetos voluntários (de que os CHF são, a seu ver, perfeito ex.):

    “Para os que fazem parte do ghetto voluntário, os restantes ghettos são lugares onde nunca porão os pés. Para os habitantes dos ghettos involuntários, em contrapartida, o território a que estão confinados (ao verem-se excluídos de todos os outros lugares) é um espaço do qual se encontram proibidos de sair. (…) (Os) verdadeiros ghettos são locais de onde os seus insiders não podem sair; o propósito fundamental dos ghettos voluntários, pelo contrário, é impedir a entrada de outros – garantindo, no entanto, que os insiders são livres para sair para onde, quando e como quiserem” Bauman, 2001: 36, 116).

  • A terceira nota é, sobretudo, uma clarificação que, mais uma vez, visa diferenciar o gueto de outras realidades. Algumas das áreas celebrizadas pelos pioneiros da Escola de Chicago como bairros étnicos eram muito mais diversas do que o que as designações dos investigadores deixariam antever. Áreas como a Pequena Irlanda ou a Pequena Itália eram, na realidade, enclaves poliétnicos, que não reuniam apenas uma minoria da população total daquelas origens nacionais (Wacquant, 2008 (2006): 18; Hall, 1993 (1988): 372). O mosaico de mundos sociais descrito por Robert Park (2005 (1936): 69) assentava na constituição de agregações sobretudo alimentadas pela “afinidade cultural e concentração socioprofissional” – e não pela restrição coerciva, radical e etnorracial. São diferentes, os fundamentos que sustentam a homogeneidade social do gueto e dessas áreas. Num caso, etnia; noutro caso, classe. Em muitos desses bairros “a segregação era parcial e porosa” (Wacquant, 2008 (2006): 87). Em contraste com “a imutável exclusividade racial e com a alteridade institucional” do gueto negro, o sonho americano tornado possível para os habitantes dessas outras áreas, em muito ganhava corpo no/por meio de um conjunto de organizações voltadas para fora, que “facilitavam a adaptação ao novo ambiente da metrópole norte-americana” (idem: 87-88). Assim, as analogias que o gueto admite reportam, como tal, a outro tipo de “instituições de confinamento forçado de categorias despossuídas e estigmatizadas, como reservas indígenas, campos de refugiados e prisões” – e não a mitos contemporâneos como o das cité- gueto, em França ( idem: 13, 19, 86).

3. Gueto dos ricos, uma questão de metodologia?

Clarividente na desmontagem da analogia estabelecida entre gueto e outras paisagens, Wacquant manifesta, no que aos CHF concerne, a impressão sobre a sua homogeneidade social interna. Em linha com a sólida proposta de Teresa Caldeira (2000: 259), aceitando que os CHF são a versão residencial da noção mais ampla de enclaves fortificados4, o autor descreve-os como uniformes em termos de riqueza, renda, profissão e mesmo, nalguns casos, na pertença étnica dos residentes (Wacquant, 2008 (2006): 85).
É uma impressão partilhada por Bauman, para quem o contraste entre a homogeneidade interna no gueto voluntário e a heterogeneidade dos que permanecem fora dele é central na sua própria definição. Este autor ilustra a expansão dos CHF em cidades globais recorrendo à imagem de “ (vedações que separam) o ghetto voluntário dos ricos e dos poderosos dos inumeráveis ghettos forçados em que os deserdados vivem” (2001: 116, 36).
Semelhante crença pressente-se em fontes várias. Por ex., na preocupação da Organização das Nações Unidas, inscrita no relatório State of the World’s Cities 2006/07 (UN-Habitat), ante a emergência de uma “arquitectura do medo”, na qual “os ricos (se refugiam) em enclaves residenciais fortificados ou comunidades cerradas, atentatórias do crescimento urbano sustentável” (El País, 16.06.2006).
Quem vive, pois, nos CHF? Admite-se que o valor imobiliário dos fogos e a sua localização são indicações fulcrais na imaginação sobre tal população. Que condomínio fechado (ou privado) é uma marca destinada a favorecer o posicionamento de um produto imobiliário parece também indesmentível. Em experiências pessoais de pesquisa levadas a cabo na AML (Martins, Patrícia, Pereira e Santos, 2002; Martins, 2006), quem tem possibilidades, os ricos ou franjas minoritárias da população foram as expressões imediatamente mobilizadas na generalidade dos discursos de agentes e atores interpelados a este propósito5.
Contudo, e reportando-nos a tais experiências de pesquisa, a suposta homogeneidade social do universo dos que residem em CHF fragiliza-se por classificações que, insinuadas ou peremptoriamente asseveradas, aconselham a diferenciação entre fontes e recursos de prestígio social (dinheiro versus cultura), e percursos e modos de acesso a tais fontes e recursos (novos ricos versus ricos). A classificação dos residentes expõe-se, então, em toda a sua complexidade, nela ressoando uma complexa relação entre capitais, posicionamentos sociais e um jogo de distinção social (Bourdieu, 1979: 117-118)6.
Na realidade concreta dos estilos de vida e na “produção quotidiana das práticas” (Pereira, 2005: 43), o CHF afigura-se como o veículo que permite a aparência da homogeneidade de estatutos entre residentes que experimentam fortunas de primeira geração (novos ricos, gente com dinheiro mas sem cultura), ou que encontram na divisão de custos no acesso a equipamentos e espaços coletivos, apanágio dos CHF, a possibilidade de preservar práticas e estatutos tidos como socialmente prestigiantes. Desta forma, sugere-se, optar por um CHF pode sinalizar trajetórias de mobilidade social de sentidos opostos.
Consonante com a diversificação do produto imobiliário CHF, a distribuição da heterogeneidade social dos residentes participa também na classificação dos empreendimentos entre si. Porque o universo dos CHF é arquitetónica, social e também simbolicamente heterogéneo, há uma escala de apreciação segundo a qual o estatuto do CHF não se reduz, única e primordialmente, ao preço dos fogos, evidente critério de segmentação do produto imobiliário. Assim, quanto maior o número de habitantes, mais denso, tipologicamente mais diverso e mais próximo (fisicamente mais acessível, por meio de transportes públicos), menos exclusivo é tendencialmente considerado um CHF (Martins, 2006; Martins, 2009). Não deixa de ser curioso verificar que, sendo a dimensão, a densidade e a heterogeneidade social, elementos associados a alguns dos clássicos tipos-ideais de cidade – nomeadamente, àquele preconizado por Louis Wirth (2001 (1938)) – os CHF considerados mais prestigiados são os que mais dele parecem afastar-se (Martins, 2009: 122).
A verosimilhança da homogeneidade interna, entendida como característica própria dos CHF, podia, contudo, ser apenas um problema de metodologia de observação/análise. Uma questão de confronto entre uma lógica metodológica extensiva, vocacionada para a deteção de padrões, regularidades, categorização de grandes grupos – e uma abordagem de pendor intensivo, mais apta a problematizar o quotidiano e a descodificar a lógica dos atores. Embora absolutamente complementares, são perspetivas diferentes.
A questão parece extravasar, contudo, o âmbito metodológico. A crença na homogeneidade interna da população residente em CHF, manifesta em expressões como gueto dos ricos, tende a andar de par em par com um discurso onde são marcantes as ideias da cidade global e da polarização social.

4. Condomínios habitacionais fechados – um fenómeno global, da cidade dual?

Como notado por Peter Marcuse, “a ideia da cidade dividida não é certamente nova” (apud Hamnett, 2001: 167). A distribuição de “concentrações de ricos e pobres” (Hamnett, 2001: 10) e a convivência entre indivíduos experienciando desiguais condições objetivas de vida são, de resto, temas intensamente refletidos em múltiplas perspetivas teóricas e políticas de ação e pensamento. São centrais no próprio desenvolvimento das ciências sociais desde as “pesquisas precursoras de Engels e Le Play” (Freitas, 2001: 19), focadas nas condições de vida da classe operária em cidades que passavam, no século XIX, por intensos processos de industrialização.
Em sentido lato, a polarização é um processo em que “uma distribuição se está tornando crescentemente bimodal”, cconcentrando-se as observações nos seus pólos extremos (Hamnett, 2001: 165). E polarização social é, de facto, um tema que emerge por relação a “uma preocupação crescente com o chamado meio em desaparecimento” (the so-called disappearing middle) (idem: 165, 169). Sucede que, na opinião de Chris Hamnett, que optamos por transcrever no original, o termo polarização suscita alguma ambiguidade teórica:

“We need to specify whether we are speaking of employment, occupation or income, and whether (it) is relative or absolute. (…) (Because) polarization may be occurring in certain respects but not in others, and the causes may be quite different” (Hamnett, 2001: 169).

Para Saskia Sassen, a tese da crescente polarização social reporta sobretudo às transformações ocorrentes na estrutura do emprego, intrinsecamente relacionada com a ascensão do capitalismo financeiro em detrimento da produção industrial. Tal polarização, é descrita por Hamnett como geradora de “novos alinhamentos de classe” (“a new class alignment”) que, sendo particularmente marcantes nas designadas cidades globais, decorreriam do aumento do número (ou proporção) de “highly skilled and low- skilled (workers)”, em contraste com o decréscimo do número (ou proporção) dos “ middle groups” (2001: 165, 170).
Para Hamnett, contudo, importa recusar a sinonímia entre polarização e desigualdade (inequality), não apenas porque a desigualdade pode também manifestar- se sob várias formas e decorrer de várias fontes, mas porque parece igualmente possível conceber a existência de maior desigualdade sem necessariamente se registar uma maior polarização ocupacional (idem: 169). Considera ainda questionável que a polarização ocupacional seja “característica de todas as cidades globais” (idem: 170), sublinhando que, também pelas especificidades locais de cada contexto de análise (prevalência do Estado-Providência, por ex.), polarização ocupacional e polarização de rendimentos auferidos podem não coexistir. Em alguns contextos, assistir-se-á mesmo à combinação entre uma despolarização ocupacional, e uma polarização de rendimentos auferidos, situação que não parece totalmente estranha à realidade portuguesa.
Mito ou poderosa metáfora retórica – talvez “mais adequada à crítica social do que teoria social”, conforme sugerido por Mollenkopf e Castells ( apud Hamnett, 2001) – a tese da cidade dual, polarizada, confronta-se com uma realidade mais complexa:

“(Peter) Marcuse argues that although the patterns have a spatial dimension, and their spatial characteristics influence their substance, they are ‘ not rigid spatial patterns in the old sense in which Burgess and Park tried to describe city structure’. (…) Nor, in my view should polarization be used to refer to increasing residential segregation by class, race, gender, etc., though this may be certainly related to growing social polarization at the city level. (…) we already have a perfectly good term for this ‘segregation’, and we would then need to differentiate between social and spatial polarization which need not to take place simultaneously.” (Hamnett, 2001: 166-167, 169).

Embora a questão da polarização não constitua, em Portugal, o principal mote nas contendas geradas a propósito da implantação concreta de CHF, estes últimos são, não raras vezes, apresentados como pólos socialmente opostos aos designados bairros sociais. Este paralelo é contestável, olhando quer às géneses de uns e de outros espaços, quer à subjacente consideração de que se trata de pólos extremos da desigualdade social. Os mais ricos não vivem necessariamente em CHF, assim como os mais pobres, não vivem (sempre) nos designados bairros sociais (Martins, 2006; Martins, 2009).
A ideia de condomínios de pobres tende a confundir o que é um produto imobiliário (CHF) com processos frequentemente informais, feridos de ilegalidade, nos quais se geram favelas, bairros de barracas, shanty-towns. A natureza institucional de todos estes fenómenos é importante para perceber o que neles está em causa e para discutir em que termos podem (ou não) ser comparados. Mesmo que, no final, possa concluir-se, tomando à letra a analogia, que o que leva determinada pessoa a residir num CHF é o mesmo que leva outra a apoiar e a participar num movimento de defesa de levantamento de barreiras físicas numa determinada área de residência degradada. Algo que merece investigação mais aturada, em contextos diversos7.
A propalada natureza global do fenómeno CHF, seu surgimento e expansão, articula, em todo o caso, três elementos: (1) a semelhança entre formas arquitetónicas mapeáveis na totalidade dos continentes; (2) a crença na sobreposição entre homogeneidade social dos residentes e homogeneidade do próprio produto imobiliário; e (3) a semelhança das lógicas subjacentes à emergência do fenómeno em contextos díspares em termos de crescimento económico e desenvolvimento humano.
Porém, valerá a pena notar a opinião de Setha Low (2003: 16), para quem, em diferentes locais, os CHF parecem servir “diferentes propósitos e (expressar) distintos significados culturais”:

“ (Neles se) alojam trabalhadores expatriados na Arábia Saudita, replicam os complexos datcha socialistas em Moscovo, providenciam/proporcionam um estilo de vida seguro em face da extrema pobreza no Sudeste Asiático, protegem os residentes na África do Sul, criam enclaves exclusivos para as elites emergentes na Bulgária e na China, e oferecem opções de segundas casas exclusivas (...) na Europa Ocidental.” (Low, 2003: 16).

Na investigação que é produzida sobre o fenómeno há fatores que são, em regra, considerados eficientes para explicar a emergência dos CHF. Todavia, são distintas as ponderações conferidas aos mesmos, quando a propósito de vários casos se apuram aqueles considerados mais eficientes. O medo do crime domina o discurso produzido a propósito dos CHF na América do Sul ou em países como a África do Sul. Na Arábia Saudita ou no Líbano, a sensação de continuidade na experiência do habitar e a manutenção de determinados estilos de vida tidos como socialmente desviantes é destacada na relação entre quadros hipermóveis e a primeira emergência de CHF. Neste último país, em que os CHF surgem num contexto de guerra civil, a proteção da integridade física de pessoas e bens ou o acesso ao abastecimento de água e eletricidade são fatores importantes na estruturação dessa procura. Como adianta Maria Paula Nunes (2001: 56), mais tarde, no Líbano, ganha terreno, junto das “classes médias altas, entretanto desenvolvidas com a recuperação económica do país (…) alguma sedução por um estilo de vida ocidental, que se pretende importar por ser considerado moderno e (de) prestígio”. Nestes casos, à procura, e sobretudo às motivações para procurar CHF, é dada primazia explicativa.
Em contextos em recente transição de regime político, ganha terreno a associação analiticamente estabelecida entre tal mudança, a conturbação económica e a ascensão de novas elites sociais (e) dirigentes, que serão quem primeiro adere aos CHF (Bartetzky e Schalenberg, 2009). Reforça-se, assim, o nexo entre CHF e a reinvenção social das fronteiras entre grupos aproximados pela natureza extensiva das crises económicas e pelo aprofundamento dos processos democráticos (Caldeira, 2000).
No que respeita a Portugal, para a generalidade dos residentes entrevistados nas experiências pessoais de pesquisa atrás referenciadas, viver num CHF não foi uma opção deliberada (Duro, Martins, Patrício e Pereira, 2001; Martins, Patrício, Pereira e Santos, 2002; Martins, 2006; Raposo, Cotta e Martins, 2012). À decisão de saída da casa anterior e à subsequente procura de casa, não presidiu uma intenção prévia de residir num CHF. Resultados em linha com dados produzidos sobre o caso Argentino (Elguezabal, 2009) – resultados contrastantes com dados sobre a situação no Brasil (Caldeira, 2000).
Curiosamente, também, naquelas pesquisas, o medo do crime é desvalorizado como motivo mais eficiente para explicar, tanto a escolha de determinado empreendimento, como o próprio desenvolvimento do fenómeno em Portugal.
Estes contrastes permitem pensar em que medida a propalada dimensão global do fenómeno CHF advém sobretudo das dinâmicas de produção e oferta de produtos imobiliários de vocação predominantemente residencial – e menos das lógicas que estruturam a procura pelos mesmos. Algo que só a troca de mais experiências concretas, assentes em trabalho de terreno, pode ajudar a iluminar. Pensamos, sobretudo, na necessidade de questionar a noção de segurança – termo aglutinador de diferentes sentidos associados às ideias de medo, privacidade e controlo sobre a incerteza. Frequentemente, esses sentidos perdem visibilidade própria em prol do acentuar do medo do crime. Porque neste termo, segurança, tanto cabem receios fundados em múltiplos desconfortos, como interesses estratégicos e modos de exercício de um ascendente que se ganha sobre a vizinhança próxima, percebida como espaço que passa a poder influenciar-se mais diretamente.

Notas para debate e conclusão

A reflexão sobre o percurso empírico e analítico referenciado permite destacar quatro notas finais.
A propalada falta de qualidade da cidade atualmente existente. O surgimento e a expansão dos CHF suscitam um debate particularmente aceso. Contudo, por entre as discordâncias que separam confessos adeptos e assumidos oponentes aos CHF, deteta-se interessantes compreensões mútuas. Sublinhe-se, nomeadamente, o consenso sobre a razão considerada mais eficiente para compreender a decisão de residir, na AML, nestes empreendimentos: a fuga à falta de qualidade da cidade atualmente existente. A qual se deve sobretudo, segundo os entrevistados (Martins, 2006; Raposo, Cotta e Martins, 2012), ao mau desempenho dos poderes públicos na gestão e na manutenção da coisa e do espaço públicos.Ausência da centralidade do tema da casa-fogo. A pesquisa empírica revela, pela análise dos discursos dos agentes e atores entrevistados, este curioso facto. Tal (quase) ausência verifica-se na apreciação das qualidades que distinguem os CHF da habitação dita corrente (Martins, 2006). E manifesta-se também, no caso dos residentes em CHF entrevistados, tanto nas motivações subjacentes a tal decisão, como nos fatores que constroem positivamente a sua atual satisfação residencial. Globalmente, o que sobressai é a importância da vizinhança próxima na expressão das qualidades materiais e simbólicas que, segundo residentes e não residentes, distinguem positivamente os CHF da habitação convencional. O ascendente da vizinhança próxima. Contemporaneamente, a persistência de debilidades estruturais coexiste, em Portugal, com um quadro inquestionável de veloz mudança social. Num contexto em que a pobreza, a privação e a precariedade são incontornáveis, a melhoria das condições de habitabilidade é recorrentemente apontada, na esfera pública, como um dado consonante com a leitura do copo meio cheio – presumindo-se mitigados os défices quantitativos (referentes ao acesso à habitação) e qualitativos (relativos ao gozo de condições e equipamentos de conforto, no fogo habitacional). A casa foi, para muitos, uma conquista alcançada com enorme esforço. A monitorização de tendências de opinião demonstra que o sentido desta mudança é também tendencialmente percebido como positivo entre a população8. A propalada falta de qualidade da cidade atualmente existente – que no discurso dos entrevistados, residentes e não residentes em CHF torna compreensível a decisão, na AML, de morar num CHF (Martins, 2006; Martins, 2009) – assenta em frustrações e reivindicações, em grande medida, socialmente construídas sob uma memória mistificadora da cidade e do espaço público de antes. Contudo, a tais elencos subjaz uma exigência de qualidade de vida indissociável de desejos expressos quanto às qualidades do espaço próximo, fora de casa9. Estarão os anseios focados na vizinhança próxima a ganhar um ascendente sobre a casa no balanço que estrutura a perceção da qualidade habitacional (Martins, 2009: 125-126)? Atendendo ao percurso nacional, em que medida tal reflete o trânsito entre aspirações e necessidades, as quais passam a ser discutidas na esfera dos direitos, reivindicados com base em recursos de poder mais partilhados?
Adensa-se o sentido da interrogação quando se presumem desatualizados alguns dos pressupostos socioantropológicos subjacentes à unidade de vizinhança como categoria operatória no planeamento (Nunes, 2007: 118-119). De facto, os resultados da pesquisa (Martins, 2006; Martins, 2009: 125-126) inspiram um aparente paradoxo. A autonomização de práticas relativamente ao contexto residencial (a perda de centralidade da vizinhança próxima, neste sentido), convive com a adesão a elencos de carências percebidas e desejos ideais (necessidades e aspirações, neste sentido) que conferem às características da mesma vizinhança próxima – precisamente – um lugar central na valoração do contexto residencial, sobre ela projetando necessidades e imagens sobre o que faz um habitat ideal, a qualidade de vida e a boa vizinhança. A hipótese da secessão. Frequentemente, assiste-se à seguinte denúncia: os residentes em CHF são indivíduos em défice dos sentidos de cidadania e urbanidade. Para Bauman, o CHF é como “um eremitério, materialmente situado na cidade, mas social e espiritualmente fora dela” (Bauman, 2006 (2005): 35). E adianta:

“Por isolamento, entende-se a separação das pessoas consideradas inferiores do ponto de vista social. (…) Os residentes dos condomínios isolam-se, por meio da sua vedação, do caos e da dureza que tornam a vida urbana desconcertante, desagradável e vagamente ameaçadora, e ficam reclusos num oásis de calma e segurança (…) (abandonando) os outros às mesmas ruas sórdidas e miseráveis de que fugiram sem olhar a despesas” (idem: 36).

Sendo certo que a alteridade organizacional não constitui (por enquanto) uma marca da generalidade dos CHF, importa explorar esta imagem de cidade e testar a hipótese que supõe como essencialmente subjacente à decisão de residir num CHF, os referidos défices de cidadania e urbanidade. Em que aspetos outros se concretiza tal isolamento? Como observá-lo enquanto atitude e prática de distanciamento, sendo que tal averiguação convida ao estabelecimento de grupos de controlo, representativos da população que não reside (porque não quer ou não pode) em CHF?

Conclusão. A análise das razões subjacentes à emergência e expansão dos CHF não pode ignorar outras lógicas que, além daquelas sedeadas na procura, sustentam a dinâmica mais vasta do consumo de espaço residencial. Tais lógicas reportam à totalidade de um campo estruturado também pelos interesses e estratégias afetas à produção e à oferta de espaço residencial, bem como à mútua adaptação dos dois mercados. Este é um vetor em que a ação do Estado é particularmente chamada à colação. Importa refletir sobre os princípios de atuação que norteiam a intervenção dos poderes públicos. Que dinâmicas de recomposição dos tecidos social e edificado escolhem privilegiar? Qual o seu real poder de negociação com os privados na organização do espaço (Távora, 1999: 14), entre a incerteza da mudança e a aparente certeza a mais do Planeamento (Secchi, s.d.: 276)…?
Os resultados das investigações realizadas apelam, também, a uma análise mais fina dos padrões de segregação sócioespacial, que vá além de uma análise exclusivamente baseada numa interpretação mecanicista das dinâmicas de distinção social. Descrever e explicar a segregação é importante. Mas compreender as dinâmicas que a estruturam gera oportunidades de encontrar, tanto o que separa grupos sociais, como os elencos de anseios, desejos, exigências e recusas que podem, eventualmente, aproximá-los. Perante a “multiplicação das procuras legítimas” (Bourdin, 2011 (2010):110), o favorecimento da coesão social depende (também) da “arte da negociação de novos compromissos” (Ascher, 2010) que operem novas formas de regulação entre esses elencos, interesses coletivos e o julgamento político sobre o bem-comum.

 

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Notas

1 Socióloga. Bolseira de Investigação/ FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Doutoranda em Arquitetura – Dinâmicas e Formas Urbanas na FAUP – Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (Porto, Portugal). Investigadora do CEAU – Centro de Estudos em Arquitetura e Urbanismo da FAUP (Porto, Portugal) – e do DINÂMIA’CET-IUL – Centro de Estudos sobre a Mudança Socioeconómica e o Território do ISCTE-IUL (Lisboa, Portugal). Endereço de correspondência: Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo - Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, Rua do Gólgota, 215, 4150-755 Porto | Portugal. E-mail: martamartins78@gmail.com

2 Salvaguardando-se a total responsabilidade da autora pelo conteúdo final do mesmo, este artigo beneficiou da leitura atenta de João Pedro Silva Nunes, a quem muito agradeço os preciosos comentários, críticas e sugestões. Aos referees da Revista Sociologia, agradeço a cuidadosa leitura do texto, a qual permitiu nele introduzir aperfeiçoamentos úteis. A reflexão aqui inscrita nasce de um conjunto de trabalhos realizados, entre 2001 e 2007, sobre o surgimento e a expansão dos CHF em Portugal. Entre eles, uma investigação desenvolvida entre 2005 e 2006 deu corpo a uma dissertação de licenciatura em Sociologia pelo ISCTE, realizada sob a atenta e paciente orientação de Marluci Menezes (NESO-LNEC) e Maria Isabel Duarte (ISCTE). A sua concretização contou com o fundamental apoio do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, instituição que, através do seu Núcleo de Ecologia Social, proporcionou um estágio dedicado ao desenvolvimento do projeto. Parte do restante percurso foi partilhado com outros colegas, em momentos de aprendizagem e reflexão inesquecíveis. Tiago Pereira, Sandra Patrício, Inês Duro, Joana Santos, Maria Rita Raposo, Diogo Cotta, a todos agradeço.

3Sublinha, os CHF gozam de “uma aura positiva de distinção e não (de) um sentimento de infâmia ou temor”; eles “servem para aumentar e não diminuir as chances de vida e para proteger o modo de viver de seus residentes” (Wacquant, 2008 (2006): 85).

4 Para Caldeira (2000: 258-259), os enclaves fortificados concentram, em combinações variáveis, residência, lazer, trabalho e consumo; cultivam a “negação e rutura com o resto da cidade, celebrando, pelo recurso a técnicas (in)formais de controlo/monitorização personalizada e privada do espaço, o valor do que é restrito e partilhado entre pares, desvalorizando o que é público e aberto à heterogeneidade do meio urbano. (…) tendem a ser ambientes socialmente homogéneos. Aqueles que escolhem habitar esses espaços valorizam viver entre pessoas seletas (ou seja, do mesmo grupo social) e longe das interações indesejadas, movimento, heterogeneidade, perigo e imprevisibilidade das ruas”.

5 Ao longo do texto, serão feitas referências aos trabalhos realizados pela autora entre 2001 e 2007, ora individualmente ora integrando equipas de trabalho. Neles, desenvolvemos e colaborámos na prossecução de um conjunto de pesquisas dedicadas ao surgimento e à expansão dos CHF. A abordagem de distintos objetos permitiu explorar temas associados, tanto à produção, como à apropriação social destes modelos habitacionais – sendo de destacar, também, a exploração do seu papel enquanto participantes de novas coexistências, observadas em contextos específicos. Os trabalhos referenciados compreendem a aplicação de desenhos de pesquisa que articulam e combinam metodologias de pendor intensivo e extensivo. Globalmente, falamos de um acervo de cerca de 45 eentrevistas a residentes em CHF (Duro, Martins, Patrício e Pereira, 2001; Martins, Patrício, Pereira e Santos, 2002; Martins, 2006; Raposo, Cotta e Martins, 2012), 2 inquéritos por questionário a residentes em CHF (Duro, Martins, Patrício e Pereira, 2001; Martins, 2006) e entrevistas a agentes associados à oferta e à mediação de espaço residencial, investigadores e decisores políticos (Martins, Patrício, Pereira e Santos, 2002; Martins, 2006).

6 Tal complexidade encontra sentido no postulado segundo o qual, como defendido por Bourdieu (1979:117-118), a classe social não é redutível a uma propriedade, nem ao somatório de determinadas propriedades – nem se define, também, “por uma cadeia de propriedades, todas ordenadas a partir de uma propriedade fundamental (…) numa relação de causa efeito, de condicionante a condicionada, mas sim pela estrutura das relações entre todas as propriedades (contextualmente) pertinentes (sexo, idade, origem social ou étnica, por ex.), que confere a cada uma delas e aos efeitos que exerce sobre as práticas, o seu próprio valor”. A desigualdade social é também, neste sentido, a diversidade lida à luz de como o prestígio estrategicamente disputado e socialmente conferido a determinadas “propriedades incorporadas (disposições) ou objetivadas (bens económicos e culturais)” (idem: 127) se traduz, ao longo do tempo biográfico e coletivo, num ascendente exercitável como poder.

7 É útil, também, distinguir entre CHF e co-housing, modalidade de apropriação coletiva de espaços para fins residenciais emergente nos anos 60/70 do século XX na Dinamarca. Os CHF diferenciam-se, desde logo, pela natureza impessoal da reunião efetuada no acesso a estes últimos, produtos imobiliários.

8 Em 2004, “80% dos portugueses inquiridos pelo Eurobarómetro (declaravam) sentir-se satisfeitos com as suas condições de habitação, ainda que essa percentagem se distanciasse em 8 pontos percentuais da média dos 27 países europeus” (Pappámikail, Pereira e Marques, 2010: 116).

9A investigação produzida sobre a satisfação residencial vem demonstrando, também, que a perceção do cenário residencial extravasa a realidade da casa, tanto na sua configuração material, como simbólica (Freitas, 2001).

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