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Sociologia

versão impressa ISSN 0872-3419

Sociologia vol.23  Porto jun. 2012

 

Mulheres nas margens: a violência doméstica e as mulheres imigrantes1

Women at the margins: domestic violence and immigrant women

Les femmes dans les marges: la violence domestique et les femmes immigrantes

Mujeres en las márgenes: la violencia doméstica y las mujeres inmigrantes

Madalena Duarte2 e Ana Oliveira3

Universidade de Coimbra


 

RESUMO
A violência nas relações de intimidade mantém-se, nos dias de hoje, como uma gravíssima forma de discriminação assente na desigualdade de género. Em todo o mundo, as mulheres são vítimas de violência apenas porque são mulheres. É assim que a violência nas relações de intimidade ocorre em todas as sociedades, culturas, raças, classes sociais, etnias, orientações sexuais e religiões. No entanto, o facto de esta violência ser transversal a todos estes aspetos não deve obscurecer o facto de estes, não só poderem aumentar o risco das mulheres a situações de violência, como também o de exponenciarem as dificuldades que encontram na procura de ajuda. Neste artigo procuramos refletir sobre os obstáculos que as mulheres imigrantes encontram em Portugal quando se encontram numa situação de violência doméstica.

Palavras-chave: Mulheres imigrantes; Violência doméstica; Discriminação; Cultura; Género.


ABSTRACT
The violence within intimate relationships remains today as a very serious form of discrimination based on gender inequality. Around the world women are victims of violence simply because they are women. Thus, violence in intimate relationships occurs in all societies, cultures, races, social classes, ethnicities, sexual orientations and religions. However, the fact that this violence is transversal to all these aspects should not obscure the fact that they not only may increase the risk of these women to violence, but also to magnify the difficulties they encounter in seeking help. In this article we reflect on the obstacles that immigrant women in Portugal face when they are in a situation of domestic violence.

Keywords: Immigrant women; Domestic violence; Discrimination; Culture; Gender.


RÉSUMÉ
La violence dans les relations d’intimité se maintient aujourd’hui comme une forme très grave de discrimination basée sur l´inégalité du genre. Dans le monde entier, les femmes sont victimes de violence seulement parce que se sont des femmes. C’est ainsi que la violence dans les relations d’intimité s’engendre dans toutes les sociétés, cultures, races, classes sociales, ethnies, orientations sexuelles et religions. Cependant, le fait de cette violence être transversale à tous ces aspects ne doit pas cacher le fait de ceux-ci pouvoir non seulement accroître le risque de ces femmes à des situations de violence, comme aussi augmenter de forme exponentielle les difficultés qu’elles rencontrent dans la recherche d’aide. Dans cet article, nous cherchons réfléchir sur les obstacles que les femmes immigrantes rencontrent au Portugal quand elles se trouvent dans une situation de violence domestique.

Mots-clés: Femmes immigrantes; Violence domestique; Discrimination; Culture; Genre.


RESUMEN
La violencia en las relaciones de intimidad todavía se mantiene hoy como una gravísima forma de discriminación basada en la desigualdad de género. Por todo el mundo las mujeres son víctimas de violencia solo porque son mujeres. Así ocurre la violencia en las relaciones de intimidad en todas las sociedades, culturas, razas, clases sociales, etnias, orientaciones sexuales y religiones. Sin embargo, el hecho de que esta violencia es transversal a todas estas dimensiones no debe ocultar el hecho de que no sólo pueden aumentar el riesgo de exposición de las mujeres a la violencia, sino también para ampliar las dificultades que encuentran en la búsqueda de ayuda. En este artículo buscamos reflexionar sobre los obstáculos que las mujeres inmigrantes encuentran en Portugal cuando viven una situación de violencia doméstica.

Palabras-clave: Mujeres inmigrantes; Violencia doméstica; Discriminación; Cultura; Género


 

Introdução

A violência nas relações de intimidade permanece, na atualidade, como uma relevante fonte de exclusão social. Com uma crescente visibilidade na esfera pública, traduzida num claro aumento das denúncias, a violência nas relações íntimas tem sido objeto de diversas políticas dirigidas à prevenção dessa violência, à sua criminalização e ao apoio às vítimas (Gelles, 1993).
Os diversos estudos sobre a violência nas relações de intimidade evidenciam, claramente, que esta é perpetrada, na sua grande maioria, por homens sobre mulheres (Lisboa 2009; Dias, 2004; Silva, 1985). As causas desta violência são atribuídas a uma construção social de género desigual e a uma estrutura social assente em conceções patriarcais (Dias, 2007). Esta ótica de análise rompe com uma série de visões tradicionais e modelos psicológicos que catalogam a violência doméstica como uma questão exclusivamente familiar ou como um problema do foro psicológico entre duas pessoas. A violência doméstica sobre mulheres não deve, contudo, para um cada vez maior número de autores/as, ser analisada tendo em conta somente a categoria género, nem a luta contra o patriarcado. Não está em questão a menor relevância destes aspetos – em última análise, a mulher é vítima de violência por ser mulher –, mas apenas se contesta a sua exclusividade. Partindo da teoria de “interseccionalidade” (Crenshaw, 1991), o argumento base desta corrente, na qual se inserem várias autoras feministas pós-coloniais, é o de que as mulheres vítimas de violência experienciam, simultaneamente, diferentes formas de opressão e de controlo social, uma vez que estão imersas em contextos sociais onde se cruzam diferentes sistemas de poder (como a raça, a etnia, a classe social, o género e a orientação sexual). Esta perspetiva veio romper com uma conceção feminista mainstream da violência contra as mulheres e, em especial, da violência doméstica. É assim que, por exemplo, diversos estudos têm vindo a demonstrar que as mulheres negras sofrem violência por parte dos seus companheiros por serem mulheres e por parte do sistema por serem negras (e.g. Allard, 1991).
Na verdade, as situações de violência nas relações de intimidade podem ser agravadas por fatores como o estatuto legal, a classe social, a cultura ou a etnicidade, entre outros. Para além disso, a pouca familiaridade com a língua, o difícil acesso a empregos adequados, o conhecimento insuficiente dos seus direitos, o isolamento da comunidade imigrante e o distanciamento das redes sociais e familiares de apoio também contribuem para reduzir a capacidade das mulheres imigrantes se protegerem contra situações de violência e abuso (Steibelt, 2009). Estes fatores contribuem para que estas mulheres se encontrem num lado ainda mais obscuro da vida familiar.
Neste artigo procuramos refletir sobre o facto de algumas mulheres se encontrarem nas margens da ajuda dada às mulheres em situação de violência nas suas relações de intimidade. Em particular, abordamos a invisibilidade e os obstáculos que as mulheres imigrantes em Portugal enfrentam quando se encontram numa situação de violência doméstica4 .

1. Mulheres imigrantes: da invisibilidade à demonização

Uma das mais interessantes alterações nas migrações transnacionais consiste na sua feminização. Com a expressão feminização das migrações não se pretende, apenas, dizer que o número de mulheres nos fluxos migratórios tem vindo a aumentar exponencialmente, mas também, e sobretudo, que é necessário uma análise qualitativa dessas estratégias migratórias. Contudo, e apesar de hoje, nos fluxos Sul-Norte, encontrarmos números equiparáveis de mulheres e de homens, o viés de género nas migrações não está presente nas políticas de migração, nem tão pouco nos programas de apoio aos/às imigrantes. Para tal contribui a ausência das mulheres na história das migrações, quer porque as suas estratégias migratórias passavam, principalmente, por reunificações familiares ou estavam dependentes da migração masculina, quer porque elas eram tidas apenas como acompanhantes do seu pai, marido, familiar e, frequentemente, não lhes era pedido sequer o passaporte, pelo que a história das migrações é history e não herstory (Engle, 2004:8). Deste modo, e como refere Françoise Gaspard (1998), embora as mulheres venham, desde há muito tempo, se assumindo, progressivamente, como sujeitos ativos de estratégias migratórias e não apenas como os suportes que as viabilizam, no Norte, sobretudo na Europa Ocidental, o rosto do migrante persiste em ser o rosto de um operário e, portanto, de um homem.
Nos últimos anos, tem sido maior a visibilidade das mulheres imigrantes, desde logo pelo aumento da migração feminina autónoma. Mas, também, a mutilação genital feminina, o uso do véu nas escolas francesas e a poligamia invadiram o discurso político de muitos países Ocidentais, revelando, de uma forma polémica, a presença das mulheres migrantes, em especial as de cultura muçulmana5 . Estas questões, longe de servirem de base a uma reflexão profunda sobre a integração das mulheres migrantes ou sobre o multiculturalismo, foram utilizadas como pretexto para se visualizar, uma vez mais, os elementos culturais e religiosos dos imigrantes como perturbadores. De invisíveis, as mulheres migrantes passaram, pois, a diabolizadas (Gaspard, 1998). Neste processo, emerge uma rhetoric of othering (Riggins, 1997), isto é, um discurso sobre o “outro”, neste caso sobre a “outra mulher”, marcado pela “orientalização” dos outros, pela “suspeita” ou pelo desenvolvimento de um “medo” face a ele/a. A construção deste discurso e a fixação do “outro”, numa imagem à qual fica preso, tem consequências no que se refere à análise das situações de violência a que estas mulheres são sujeitas, em especial nos países de destino do Ocidente. Facilmente, são criados e disseminados estereótipos acerca das mulheres imigrantes, que se reproduzem em determinados meios fundamentais, como, por exemplo, nos tribunais, nas polícias ou nos serviços de atendimento. Os estereótipos sobre estas mulheres assentam, maioritariamente, em três pressupostos: elas são seres passivos, submissos e incapazes de tomar conta de si mesmas; podem ser assimiladas pela cultura ocidental; vêm de culturas marcadamente patriarcais e violentas (e.g. Kapur, 2005; Okin, 1999). Tais pressupostos comportam vários perigos. Um primeiro perigo é o de camuflar os problemas que afetam essas mulheres e que não têm origem numa comunidade individual onde aquela mulher está inserida, ou porventura nem no seu país, mas que são mais globais e que são, também, fruto da globalização económica neoliberal, de legados coloniais, de racismo, etc. Um segundo perigo consiste em negligenciar-se outros problemas que afetam a vida destas mulheres e que não são culturais, mas sociais e económicos, como o emprego, a habitação e a saúde. O enfoque em questões culturais facilmente pode conduzir a uma desresponsabilização do Estado do país recetor, em termos de necessidade de ampliação e efetivação das suas políticas sociais. Um terceiro risco é o de se perpetuar uma visão das mulheres do Sul como vítimas, colando-as a uma passividade que teima em não compreender que também estas mulheres são capazes de lógicas emancipatórias e de agir contra o patriarcado (Spivak, 1994). Finalmente, um último aspeto é que esta sobreatenção com as práticas culturais destas mulheres potencia uma hierarquização e um essencialismo cultural que tende a imputar a violência contra as mulheres às culturas não ocidentais, ao mesmo tempo que menoriza a violência que ocorre nas sociedades ocidentais, perpetrada por cidadãos nacionais.
As comunidades imigrantes ficam, obviamente, fragilizadas com estas assunções, porque “a outra mulher” é fixada numa imagem de culturas violentas. Isto tem consequências práticas graves no que se refere à violência doméstica. Veja-se, como exemplo, o acórdão de uma juíza alemã, de 2007, em Frankfurt, que teve de tomar uma decisão num caso de uma jovem marroquina muçulmana que queria o divórcio antes do prazo mínimo previsto pela legislação alemã, argumentando que o marido a agredia e ameaçava. A juíza decidiu não aceitar o pedido da mulher, baseando-se, para tal, no Corão6 , argumentando que ela devia saber que o marido tinha sido criado num país islâmico, o que lhe dava o direito, “garantido pela sua religião”, de a castigar. Esta é uma compreensão que perde de vista o primado da proteção dos direitos humanos da mulher e que a coloca numa situação mais vulnerável, por ter uma outra religião e por ser de outra nacionalidade. Ou seja, quer a invisibilidade, quer a demonização das mulheres imigrantes têm como consequência uma maior desproteção destas em situação de violência. Se a violência nas relações de intimidade é, por si só, uma obscuridade da vida familiar, é nossa hipótese que tal obscurantismo é ainda mais marcante quando falamos nas “outras” mulheres, as não brancas, as imigrantes, as irregulares.

2. Violência e mulheres imigrantes: problemas que persistem

As entrevistas que temos vindo a realizar7 sugerem um conjunto de problemas que as mulheres imigrantes enfrentam quando se encontram numa situação de violência doméstica. Longe de esgotarmos a enumeração e a complexidade de tais problemas, pretendemos aqui, somente, enunciar aqueles que, no cômputo geral das entrevistas realizadas a mulheres, a ativistas, a técnicos/as, a órgãos de polícia criminal, a magistrados/ as, entre outros/as, foram mais referidos.
O trajeto percorrido pelas mulheres vítimas de violência é, muitas vezes, um trajeto longo e solitário. O receio de represálias, o sentimento de vergonha, a dependência económica, o medo de perder os filhos, entre outros aspetos igualmente relevantes, contribuem para que a violência permaneça no espaço familiar e não seja denunciada. No caso das mulheres imigrantes, o caminho percorrido até à denúncia pode ser ainda mais longo.
Em primeiro lugar, há comunidades imigrantes que se encontram isoladas cultural e socialmente, o que constrange a mulher na procura de intervenção oficial para resolver a situação de violência na qual se encontra. Nestes casos, a linguagem pode ser uma barreira muito significativa na tentativa destas mulheres procurarem ajuda. A entrevista de “Maria”, uma mulher russa de 29 anos de idade é clarificadora a este respeito. “Maria” veio há cerca de 25 meses para Portugal, onde casou com um cidadão russo. Não falar português tornou-se um obstáculo sério para procurar ajuda: “Só comecei a falar português quando cheguei à casa abrigo. Eu vivi 9 meses com o meu marido e a minha sogra, eu aprendi português nos livros, mas não tive companheiros com quem falar. (…) Uma vez, a vizinha chamou a ambulância, mas eu não sabia como comunicar, também não queria dizer, porque não sabia o que dizer e o que faria depois. O meu marido sempre me disse: ‘tu aqui não podes fazer nada. Tu aqui não falas, não tens dinheiro, não tens documentos, não tens nada. Por isso, eu posso fazer o que quiser contigo’. (…) A única amiga que tinha também era russa, mas o meu marido e a minha sogra proibiam-me de estar e falar com ela. Ela foi comigo à polícia, porque eu não falava português. Foi ela que me ajudou, para falar, para fazer as queixas.” (E1, “Maria”)
Sublinhe-se que estas situações podem assumir contornos ainda mais gravosos quando as mulheres não trabalham fora de casa, sendo-lhes difícil estabelecer laços de sociabilidade para lá da esfera familiar.
O isolamento contribui, ainda, para um desconhecimento dos seus direitos e do quadro normativo regulador da violência enquanto crime no país de destino: “Na Rússia, quando um homem bate na mulher, a polícia não ajuda e diz ‘não quero saber, se um homem bate é porque tem razão’. Eu não sabia que aqui havia estas leis da violência doméstica, que havia ajudas.” (E1, “Maria”)
Um outro problema apontado prende-se com o receio das polícias e das entidades legais. As imigrantes ilegais estão particularmente vulneráveis, porque evitam relatar a sua vitimização à polícia com medo de serem deportadas. Assim, sentem-se coagidas a permanecer em silêncio sobre os crimes cometidos na rua ou em casa, o que as faz sentir mais amedrontadas e mais cautelosas, limitando as suas vidas ainda mais severamente (Madriz, 1997). Como consequência, a ajuda é procurada por estas mulheres em situações já de extrema gravidade: “As agressões sofridas pelas mulheres imigrantes ilegais são gravíssimas. Quando nos chegam é porque já não lhes foi possível suportar mais, porque enquanto conseguem, vão suportando. Têm medo da polícia, de serem presas, de serem obrigadas a voltar para o seu país de origem… São situações muito complicadas.” (E2, Instituto Nacional de Medicina Legal)
Note-se, ainda, que, quando o estatuto legal da mulher imigrante está dependente do seu marido, empregador ou pai, a probabilidade de ela sofrer, em silêncio, uma situação de violência, por parte de qualquer um deles, é maior.
As repercussões que temem não se restringem à deportação. As mulheres imigrantes podem não estar dispostas a colaborar em nenhuma estratégia baseada na criminalização, uma vez que desconfiam do sistema criminal, do qual querem proteger os respetivos companheiros, não obstante serem agressores. Isto é particularmente verdade para as mulheres não brancas. De acordo com Levit e Verchick (2006), estas mulheres enfrentam problemas adicionais porque têm consciência que, ao procurarem proteção policial, estão a sujeitar o agressor a um sistema de justiça criminal racialmente preconceituoso. Assim, as mulheres não brancas enfrentam, simultaneamente, o dilema da falta de policiamento (underpolicing) e ultra agressividade (overaggressive policing) da polícia.
Outras dificuldades surgem já após a procura de ajuda por parte destas mulheres. Para além da língua, o estatuto legal é, para muitas mulheres, um obstáculo quase intransponível. Vários serviços de emergência social encontram-se disponíveis apenas para cidadãos/ãs nacionais ou cidadãos/ãs estrangeiros/as com a sua situação regularizada:
“Quando se liga para o 1448, a primeira coisa que perguntam é se a pessoa tem documentos ou não, se está ou não regularizada. Se a pessoa não está regularizada, normalmente a resposta é que não podem fazer nada. Nas casas abrigo, se as coisas não mudaram, a Segurança Social não subsidia as vagas das mulheres que não estão regularizadas. Portanto, a maior parte das instituições não acolhe mulheres não regularizadas nas casas abrigo. As que acolhem é por conta e risco delas e financiado por elas. A verdade é que nisto vemos a diferença entre a sociedade civil e o Estado.” (E7, ONG)
De facto, a ausência de autorização de residência é um problema com o qual se confrontam várias ONG que têm a seu cargo a gestão de casas abrigo, uma vez que as mulheres têm de estar numa situação regularizada para poderem ser acolhidas. No entanto, as entrevistas realizadas com algumas ONG permitiram-nos perceber que, ainda que sem apoio financeiro estatal, as mulheres imigrantes numa situação de ilegalidade são acolhidas.

Transparece nas entrevistas realizadas uma sensibilização crescente por parte dos serviços de proteção e das polícias – do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e das chamadas polícias de proximidade, Polícia de Segurança Pública (PSP) e Guarda Nacional Republicana (GNR) – para o fenómeno da violência doméstica, quer exercida sobre mulheres em geral, quer sobre mulheres imigrantes:
“A relação dos imigrantes e a polícia é sempre complicada, mas em termos de violência, aos poucos e poucos, a polícia está a fazer um grande esforço, está mais próxima dos cidadãos e dos imigrantes, o próprio SEF, que há uns anos era, de facto, uma polícia de fronteiras pura e simples, agora tem uma abordagem completamente diferente, tem um call center com medidas interculturais, com diversas línguas. Por exemplo, um imigrante em situação irregular já não tem o mínimo receio de entrar num CNAI [Centro Nacional de Apoio ao Imigrante] e nós temos uma delegação do SEF aqui. O ser regular ou irregular já não é um obstáculo para recorrer aos serviços; foi feito um grande caminho nesse sentido.” (E3, ACIDI)
Apesar das melhorias, muitas respostas são, ainda, marcadas por uma significativa discriminação, com base no género, mas também na origem e na etnia. Vários/as autores/ as têm vindo a demonstrar que, nas respostas do sistema de justiça, facilmente são identificadas componentes de discriminação baseadas no género, mas também na etnia, na classe social, na orientação sexual, entre outras. Como referem Sokoloff e Dupont (2005: 5), a disseminação de caracterizações negativas das mulheres negras como sendo agressivas, violentas, resilientes, tem impedido estas mulheres de receber um tratamento igualitário e atencioso por parte do sistema judicial, em particular magistrados/as, agentes policiais e funcionários/as dos tribunais. Segundo a dirigente de uma ONG:
“Houve uma mulher negra, que vivia numa zona, num bairro, onde há muitos africanos e que telefonou várias vezes para a polícia porque estava a ser agredida pelo marido e a polícia não respondeu ao primeiro nem ao segundo telefonema. Essa mulher teve de telefonar para nós e fomos nós que telefonámos à polícia a perguntar o que se passava, porque não tinham ainda ido a casa daquela mulher, e um dos polícias disse-me que naqueles sítios existiam situações dessas todos os dias: ‘essa gente é assim’. Acham que no caso delas a violência é uma coisa cultural. Mas quando foi uma mulher francesa a telefonar foram logo porque pela pronúncia perceberam que era branca. Portanto, apesar de esta ser uma situação tendencialmente excecional, ainda acontece.” (E4, ONG)

Este essencialismo cultural é visível, também, em algumas decisões judiciais, nas quais são ainda notórios preconceitos relativamente ao papel social da mulher. Em 1989, o Supremo Tribunal de Justiça – pronunciando-se sobre uma decisão de primeira instância que condenava dois jovens pela violação de duas estrangeiras, que lhes tinham pedido boleia, – lavrou um acórdão que ficou célebre, porque, embora confirmando a condenação, tendeu a desculpabilizar os dois rapazes:
“(…) se é certo que se trata de crimes repugnantes que não têm qualquer justificação, a verdade é que, no caso concreto, as duas ofendidas muito contribuíram para a sua realização. Na verdade, não podemos esquecer que as duas ofendidas, raparigas novas, mas mulheres feitas, não hesitaram em vir para a estrada pedir boleia a quem passava, em plena coutada do chamado ‘macho ibérico’. É impossível que não tenham previsto o risco que corriam; pois aqui, tal como no seu país natal, a atração pelo sexo oposto é um dado indesmentível e, por vezes, não é fácil dominá-la. Assim, ao meterem-se as duas num automóvel justamente com dois rapazes, fizeram-no, a nosso ver, conscientes do perigo que corriam, até mesmo por estarem numa zona de turismo de fama internacional, onde abundam as turistas estrangeiras habitualmente com comportamento sexual muito mais liberal e descontraído do que a maioria das nativas (…).”
Como é possível constatar pelo trecho do acórdão citado, neste são tecidas considerações várias sobre o comportamento das duas mulheres estrangeiras, nomeadamente sexual. Independentemente do texto da lei, a subjetividade presente numa decisão judicial, sobretudo por parte de um tribunal de instância superior, pode ter consequências sérias na definição legal de vítima. Como mulheres, elas têm de ultrapassar a presunção de que o direito lhes fornece suficiente proteção. Como mulheres imigrantes, elas têm, ainda, de provar que merecem tal proteção.
Nos EUA, vários estudos interessantes têm vindo a ser realizados sobre as decisões judiciais proferidas no âmbito de processos em que a mulher vítima de violência doméstica acaba por matar o seu agressor para sobreviver. Sharon Angella Allard (1991) argumenta, não só que mulheres brancas e negras têm um tratamento diferenciado por parte dos tribunais nestes casos de legítima defesa, como também que a raça estabelece, estereotipadamente, uma diferenciação entre as boas e as más vítimas. Segundo a autora, os media e a disseminação de estereótipos racistas contribuem para uma ideia da mulher negraque não vai ao encontro da conceção da mulher vítima de violência: passiva, fraca, submissa, muito emotiva, muito gentil, dependente, receosa, atemorizada, branca e de classe média.
Grande parte das pessoas entrevistadas alertou, em especial, para a discriminação que as mulheres brasileiras sofrem na sociedade portuguesa, o que pode suscitar situações de dupla vitimização – por parte do agressor e por parte das instituições – quando estas se encontram numa situação de violência: “Há um grande preconceito contra as mulheres brasileiras. Houve um caso de uma mulher brasileira que vivia com um português. Essa mulher era agredida. Em casa, mas também na rua. Aconteceu essa mulher começar a ser agredida e insultada pelo marido na rua mesmo antes de chegar a casa, com toda a vizinhança a assistir e ninguém a socorria ou denunciava porque era brasileira.” (E5, ONG)
Ao estarem veiculadas a uma das nacionalidades predominantes no “mercado do sexo” em Portugal (Manuela Ribeiro et al., 2005, 2007), muitas mulheres brasileiras ficam ligadas a processos de exclusão social e mundos de precariedade que, naturalmente, poderão, em determinado momento, configurar situações de violência. Daqui resultam dois riscos. Desde logo, o facto de a prostituição das mulheres brasileiras ser, esmagadoramente, percebida como uma opção “laboral migratória” pode levar a que passem despercebidas situações de exploração (Santos et al., 2008). Por outro lado, o número de brasileiras na prostituição também conduz a um processo de “passagem” do estigma da prostituição para imigrantes com a mesma nacionalidade. Para tal, não terá sido indiferente o movimento das “Mães de Bragança”, e o aproveitamento mediático do mesmo, que contribuiu para que a sociedade portuguesa despertasse para um moralismo que se prestou a demonizar as mulheres brasileiras em Portugal9 .
“Joana”, uma brasileira com 31 anos e que se encontra em Portugal há seis, contou-nos a sua própria experiência. “Joana” denunciou o seu companheiro português à polícia, após vários casos de agressão. Na sequência dessa denúncia, foi aplicada ao agressor uma medida de coação de afastamento, medida que, de acordo com “Joana”, não tem sido cumprida. A trajetória percorrida por esta mulher tem sido marcada, não apenas pela violência do seu agressor, mas também pela discriminação por parte de algumas entidades: “Levei com agressões verbais do pai e da mãe dele. Ele a tentar tirar-me as chaves e o telemóvel, porque percebeu que eu estava a gravar, os pais a arrastarem-me pelos cabelos pelo chão, ele começou a calcar-me a cabeça com os joelhos. A polícia chega, eu mostro uma carta onde diz que o (companheiro) não se pode aproximar de mim, a polícia fala com o pai, com a mãe, com o [companheiro] e ninguém faz nada. E eu: ‘então, eu tenho essa carta, eu sou leiga no assunto, não sou nenhuma advogada nem estudei para tanto, mas entendo perfeitamente que está escrito aqui que ele não se pode aproximar de mim. Se ele fizesse isso, ele era sujeito a ser preso. E vocês não fazem nada?’ E eles disseram: ‘mas, a gente não sabe se o advogado dele entrou com alguma ação para derrubar esse processo’, e eu: ‘mas vocês vão dar a oportunidade de ele continuar a quebrar a minha casa inteira?’ E o polícia virou-se para mim e como já tinha estado lá diversas vezes por causa das agressões, por causa da casa, diz: ‘isso já virou uma pouca-vergonha. Eu se fosse a você, arrumava as suas coisas e ia embora. Em vez de estar a toda a hora a chamar a polícia. Escusa de estar a chamar a polícia, porque eu aqui não venho mais. Se for a minha vez de vir, eu não venho’ (…). Eles dizem sempre que o homem brasileiro é ladrão e a mulher é prostituta. Mas é mesmo assim que eles nos tratam. Até para encontrar emprego, para nós brasileiros, é mais complicado. O preconceito é muito grande.” (E6, “Joana”)
“Joana” é igualmente assertiva no que diz respeito à assistente social que tem lidado com o seu processo, mesmo quando ainda estava com o seu companheiro: “Queria trocar de assistente social. Para mim ela não é boa assistente social. Ela trata-me com discriminação. Tudo o que eu lhe peço, ela recusa logo, nem é ‘vou tentar’, é ‘acho que não vou conseguir’. Tudo! Foi o tratamento da minha filha, quis ir ao dentista, ela ‘acho que não vou conseguir’. Na altura fui com o (companheiro) e a conversa mudou de figura. Era um português que estava sentado ao meu lado, e ela disse ‘acho que não vai conseguir’ (o tratamento dos dentes) e ele virou-se para ela e disse: ‘porque é que ela não vai conseguir? Eu sou português e consigo. Ela não está ilegal. A senhora só tem de ver como é que ela faz’. Bastou ele falar assim com ela, e ela disse logo como tudo funcionava: tinha de passar em dois dentistas, tinha de passar no IEFP, para declarar que estava desempregada, só isso mais nada. E levar isso do dentista até ela. Depois pensavam qual era o melhor orçamento e pronto. Com ele, foi outra coisa. Sempre que ia sozinha, era o ‘acho que não vou conseguir’.” (E6, “Joana”)
“Joana” tem, no entanto, opiniões favoráveis relativamente a outras instituições, onde sente que foi tratada sem discriminação e com respeito: “Tenho muito boa opinião do SEF. O CNAI é, para mim, como se pedisse ajuda ao meu próprio país, porque eles é que nos compreendem e fazem tudo para ajudar. Eu já sou conhecida lá.” (E6, “Joana”)
Nos seus discursos, as mulheres imigrantes entrevistadas têm opiniões e experiências diferenciadas relativamente às várias pessoas, instituições e organizações que têm marcado os seus percursos de sobrevivência de uma situação de violência numa relação de intimidade. Não podemos, pois, fazer generalizações no que se refere a uma instituição específica. Não obstante essa cautela, devemos realçar que todas as mulheres relataram, pelo menos, uma situação em que foram discriminadas ao procurar ajuda.

Reflexões finais: para uma política do reconhecimento

As mulheres imigrantes, tal como as nacionais, estão sujeitas, no país de acolhimento, a diferentes formas de violência – como a violência no seio familiar, o assédio sexual, a violação, entre outras variadas, e não exclusivas, formas de violência. Os discursos das mulheres imigrantes que estiveram numa situação de violência doméstica em Portugal por nós entrevistadas, são demonstrativos de que os trajetos que estas mulheres percorrem para se libertarem de uma situação de violência assumem especificidades que não devem ser negligenciadas. Entre essas especificidades, encontramos o facto de estas mulheres poderem estar numa situação de ilegalidade, pertencerem a um grupo cultural minoritário, não falarem a língua nacional e, como vimos, serem alvo de discriminação e de preconceitos, inclusive por parte de entidades oficiais. Podemos falar, nestes casos, de uma dupla vitimação: a perpetrada pelo agressor e a cometida pelas instâncias que deviam assegurar a proteção daquela mulher.
Na verdade, as formas de discriminação das mulheres imigrantes ocorrem a diferentes níveis. Não raras vezes, as políticas de imigração, de acesso ao mercado de trabalho ou aos serviços públicos, entre outras, promovem situações de discriminação das mulheres imigrantes, em particular as oriundas do Sul Gobal ou “as outras mulheres europeias”, para usar o termo de Regulska (1998). Estas mulheres acabam por ter um acesso menos facilitado aos sistemas de justiça, de saúde, de segurança social, de educação, às políticas de habitação e a outras oportunidades socioeconómicas. Como consequência, estas mulheres estão, igualmente, menos protegidas de situações de violência e, como foi possível verificar em algumas narrativas, mais dependentes do seu agressor.
As mulheres imigrantes são, assim, remetidas para lá de uma linha abissal que divide o mundo humano do sub-humano. Para lá dessa linha, os princípios de humanidade não são postos em causa por práticas desumanas. Falamos de um espaço que é um não-território em termos jurídicos e políticos, um espaço impensável para o primado da lei e dos direitos humanos (Santos, 2007). Encontramos, no fundo, pessoas que não existem, nem no plano social, nem no plano legal. São espaços construídos, por exemplo, na violência com impunidade. As políticas de apoio às mulheres vítimas de violência devem combater a obscuridade destes não-espaços.
Em Portugal, nos Planos Nacionais Contra a Violência Doméstica (PNCVD), encontramos menções às mulheres imigrantes. Por exemplo, no II PNCVD afirma-se que: “(…) da coexistência de várias comunidades, com valores e referências culturais tão diferentes resultam problemas novos, nomeadamente na área da violência doméstica. (…) Na aplicação de todas as outras medidas deste Plano as mulheres imigrantes serão consideradas em igualdade de circunstâncias com as de nacionalidade portuguesa.”10

A menção desta especificidade é crucial num documento definidor das linhas de orientação política nesta matéria. De facto, as mulheres mais pobres necessitam de habitação segura; as mulheres imigrantes precisam de não ser ameaçadas com a deportação; as mulheres estrangeiras necessitam de intérpretes; são necessários serviços adaptados e que compreendam as especificidades que comportam algumas culturas e religiões. Como vimos nos discursos das mulheres imigrantes entrevistadas, algo tão simples como a diferença linguística pode perpetuar situações de violência e opressão. Ou seja, as políticas, os serviços e as intervenções têm de ter em consideração as diferenças culturais, entre outras, das mulheres a que se destinam, bem como as condições estruturais e as necessidades particulares das diferentes comunidades (Sokoloff & Dupont, 2005). A prática, no entanto, parece ficar, como vimos, em alguns aspetos, aquém daquelas que são as linhas estratégicas de intervenção. Para tal, contribui a ideia pré-construída e disseminada nos media, e mesmo nas campanhas contra a violência doméstica, da mulher branca, europeia, vítima de violência. Imagens como estas, não só colaboram com a invisibilidade de que há outras mulheres vítimas de violência, como contribuem para estabelecer uma hierarquia entre aquelas mulheres que merecem mais ajuda: a mulher branca, mãe de família, que se sujeita a uma violência. O risco é, portanto, o de se obter uma definição de vítima que estabeleça hierarquias informadas por valores morais, que acabem por se traduzir em barreiras legais e/ou práticas, na ajuda oferecida a estas mulheres.
Qualquer política que se destine a capacitar as mulheres imigrantes em situação de violência pressupõe, na nossa opinião, um conjunto de pressupostos.
As desigualdades de género em diferentes campos e em várias escalas permanecem nas nossas sociedades, não obstante mudanças políticas e legislativas que almejam a igualdade (Silva, 2008). Assim, em primeiro lugar, na esteira de Nancy Fraser (1997), podemos afirmar que tais políticas devem pressupor redistribuição, empowerment das vítimas, mas também um reconhecimento cultural. Isto é, as políticas devem assentar no combate à discriminação e à violência com base no género, assumindo-se, igualmente, como uma componente de combate ao patriarcado.
Aquilo para o qual a teoria da interseccionalidade aplicada à violência sobre as mulheres nos alerta, é que essas políticas tendem a ser ineficazes, uma vez que não é possível intervir separadamente sobre pessoas que sofrem duplas e triplas experiências de discriminação, assentes numa experiência de opressão marcada pelo género, pela classe, pela raça ou pela nacionalidade. Estas mulheres são confrontadas, não apenas com discriminação com base na desigualdade de género, mas também com barreiras étnicas e racistas da sociedade de acolhimento. Como consequência, em segundo lugar, são necessárias políticas de imigração menos restritivas que não forcem as populações migrantes a refugiar-se na clandestinidade.
Em terceiro lugar, devemos ter em consideração a posição de alguns/mas autores/ as que estudam a questão da violência sobre as mulheres do Sul Global e que criticam o discurso universal dos direitos humanos. A sua crítica vai no sentido de que a universalidade imputada à declaração dos direitos humanos mais não é do que uma perspetiva ocidental sobre os mesmos, sendo que o Sul continua a não ter uma voz clara sobre os seus problemas próprios e as suas especificidades relativamente aos problemas comuns (e.g. Santos, 2004; Kapur, 2006). É necessária uma política de reconhecimento cultural. Desde logo, considera-se que, quando se fala em direitos humanos das mulheres, é fundamental perceber que essas mulheres são diferentes e provêm de regiões cultural e socialmente diversas, ou seja, temos de atender às diferenças culturais evitando leituras universalizantes.
Em síntese, se é fundamental que o género não seja esquecido na violência nas relações de intimidade, é imprescindível que não se caia num essencialismo que entenda as mulheres como categoria homogénea. Com isto, não se pretende condenar a centralidade do género e o esforço num combate das desigualdades de género que estão na base da violência exercida sobre as mulheres, mas mostrar como não se pode prescindir de uma intervenção que tome mais questões em linha de conta.
Parece-nos, por fim, crucial que qualquer política tenha o claro objetivo de uma ação transformativa dirigida ao fortalecimento da consciência cidadã e coletiva destas mulheres, contra as diversas formas de opressão que as procuram subalternizar, não as reduzindo, contudo, à categoria de vítimas passivas, nem as submetendo a processos de estigmatização e exclusão.

 

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Notas

1 Este artigo resulta do Projeto “Trajetórias de Esperança: itinerários institucionais de mulheres vítimas de violência doméstica”, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia /COMPETE e Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género e da Dissertação de Doutoramento “Para um Direito Sem Margens: A defesa dos direitos das mulheres contra a violência”, de Madalena Duarte, financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

2 Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES UC) (Coimbra, Portugal). E-mail: madalena@ces.uc.pt

3 Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES UC) (Coimbra, Portugal). E-mail: anaoliveira@ces.uc.pt

4 A violência doméstica é entendida, neste artigo, como a violência exercida sobre as mulheres nas relações de intimidade.

5 De referir a polémica que surgiu na Europa na sequência do filme Submissão (uma referência inequívoca ao Islão), realizado por Hirsi Ali e Theo van Gogh, em 2004, sobre a situação da mulher nas sociedades islâmicas, abordando temas como os casamentos arranjados, a violência doméstica ou o incesto.

6 Mais especificamente na Sura 4, vers. 34: “Os homens são os protetores das mulheres, porque Deus dotou uns com mais (força) do que as outras, e pelo seu sustento do seu pecúlio. As boas esposas são as devotas, que guardam, na ausência (do marido), o segredo que Deus ordenou que fosse guardado. Quanto àquelas, de quem suspeitais deslealdade, admoestai as (na primeira vez), abandonai os seus leitos (na segunda vez) e castigai as (na terceira vez); porém, se vos obedecerem, não procureis meios contra elas.”

7 As entrevistas (a mulheres vítimas de violência doméstica, órgãos de polícia criminal, ONG, IPSS, magistrados/ as judiciais e do Ministério Público, advogados/as, Instituto de Segurança Social, profissionais de saúde, entre outros/ as representantes de entidades estatais e da sociedade civil) têm vindo a ser realizadas no âmbito do Projeto Trajetórias de Esperança: itinerários institucionais de mulheres vítimas de violência doméstica e da Dissertação de Doutoramento Para um Direito Sem Margens: A defesa dos direitos das mulheres contra a violência. No que, especificamente, diz respeito às mulheres em situação de violência, foram entrevistadas 30 mulheres, de idades, origem geográfica e classe social diferenciadas. De entre estas, cinco eram imigrantes. A análise de conteúdo das entrevistas a estas mulheres, bem como das ONG que as apoiaram, permitiu apurar as semelhanças e diferenças entre os seus percursos e aqueles das mulheres de nacionalidade portuguesa.

8 A Linha Nacional de Emergência Social – Linha 144 – está em vigor desde o dia 30 de setembro de 2001, funcionando 24 horas por dia e de utilização gratuita. Este serviço tem como objetivo dar uma resposta imediata em situação de emergência social, tendo como grupos prioritários, vítimas de violência, sem abrigo, idosos e crianças abandonadas.

9 Não seria, pois, displicente, que as políticas contra a violência fossem articuladas com políticas de cidadania, como defendem Silva e Bessa (2010), orientadas para a não discriminação e a não estigmatização dos modos de vida e das práticas, incluindo as que se relacionam com a chamada indústria do sexo.

10 Diário da República, I Série B 3871, nº 154 7 de Julho de 2003, 3870-3871.

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