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Nascer e Crescer

versão impressa ISSN 0872-0754

Nascer e Crescer vol.22 no.3 Porto set. 2013

 

QUAL O SEU DIAGNÓSTICO? / WHAT IS YOUR DIAGNOSIS?

 

Caso dermatológico

 

 

Catarina DiasI; Ana MaiaII; Manuela SeloresIII

IS. Pediatria, CH Vila Nova de Gaia-Espinho, 4434-502 Vila Nova de Gaia, Portugal. diascatarina9@gmail.com

IIUSF do Mar, ACES Póvoa de Varzim-Vila do Conde, 4490-602 Póvoa de Varzim, Portugal. sofiacardosomaia@gmail.com

IIIS. Dermatologia, CH Porto, 4099-001 Porto, Portugal. dermat@sapo.pt

Endereço para correspondência

 

 

ABSTRACT

Glomuvenous malformations, also known as glomangiomas, are tumor-like malformations or hamartomas of the glomus body. They can be sporadic or inherited as an autosomal dominant disease. Glomuvenous malformations tend to resemble hemangiomas. Clinical distinction between these entities is important due to their different therapeutic approaches. Surgical excision is the treatment of choice for isolated, painful glomuvenous malformations. We describe a case of a 7-year-old girl with multiple glomuvenous malformations.

Keywords: Glomuvenous malformations, glomangioma, glomus tumor.

 

Criança do sexo feminino, sete anos, referenciada à Consulta de Dermatologia por múltiplas lesões cutâneas azuladas/violáceas, dispersas por todo o corpo, com cerca de um ano de evolução. Desde o aparecimento da primeira lesão, no joelho direito, surgiram outras na região mandibular, perna esquerda, tórax e abdómen, perfazendo um total de 15.

Trata-se da segunda filha de um casal saudável, não consanguíneo, sem antecedentes patológicos referidos. O tio materno apresenta lesões semelhantes desde a adolescência, localizadas apenas na região lombar, sem aumento das dimensões ou do número.

Ao exame objectivo são visíveis máculas e pápulas violáceas, que não desaparecem à digitopressão, com bordos irregulares mas bem definidos e diâmetros variando entre 2 mm e 1 cm (Figuras 1 e 2). A criança encontra-se assintomática e o restante exame físico é normal. Realizou estudo analítico, ecografia abdominal e ressonância magnética cerebral, que não evidenciaram alterações.

 

 

 

Qual é o seu diagnóstico?

 

DIAGNÓSTICO

Malformações glomuvenosas múltiplas

 

COMENTÁRIOS

As malformações glomuvenosas (GVM, OMIM 138000), também conhecidas por glomangiomas, são hamartomas – malformações semelhantes a neoplasias – com células idênticas às células musculares lisas modificadas dos corpos glómicos. Os corpos glómicos são estruturas especializadas na termorregulação, localizadas na derme profunda, constituídas por anastomoses arteriovenosas revestidas por células musculares lisas epitelióides (células glómicas) e um estroma de tecido conjuntivo(1).

A primeira descrição clínica e histológica detalhada foi realizada por Masson, em 1924, que denominou esta lesão de “tumor glómico”. Identificaram-se mais tarde três subtipos histológicos, segundo a proporção de células glómicas e componentes vascular e muscular – o tumor glómico sólido, o glomangioma e o glomangiomioma(2). Esta classificação foi entretanto substituída pela designação geral de malformações glomuvenosas(3,5), embora alguns autores continuem a diferenciar o tumor glómico per se e a malformação glomuvenosa, ou glomangioma(4). O primeiro corresponde à lesão isolada, esporádica, enquanto o segundo corresponde à forma genética/hereditária.

As malformações glomuvenosas ocorrem habitualmente em áreas ricas em corpos glómicos, como as extremidades distais dos dedos (sobretudo a região subungueal), palmas, punhos, antebraços e pés(2-5). Localizações menos frequentes incluem os tecidos moles profundos, nervos, ossos, pénis, pulmão, estômago e intestino delgado. A apresentação subungueal é mais frequente no sexo feminino(4), não existindo preferência por género nas restantes localizações.

A grande maioria dos casos surge de forma esporádica, em adultos entre a terceira e a quarta décadas de vida. A apresentação mais habitual consiste numa pápula ou nódulo pequeno e solitário, firme, de coloração vermelha, violácea ou azul, consoante a sua profundidade(3). As dimensões variam geralmente entre os 2 e os 10 mm de diâmetro(2,3). Histologicamente, são quase sempre capsulados. A estimulação local pelo frio ou pela pressão pode desencadear paroxismos dolorosos intensos, por vezes incapacitantes(3).

As malformações múltiplas são mais raras, constituindo menos de 10% dos casos descritos(5). São geralmente maiores que as lesões isoladas, não capsuladas e indolores. Subdividem-se nas formas localizada, disseminada e congénita ou em placa(3). A apresentação da doença nas formas múltiplas ocorre, em média, 10 a 15 anos mais cedo que nas formas isoladas. Cerca de 60% destes doentes referem pelo menos um familiar afectado(3). Reconhece-se, nestes casos, um padrão de hereditariedade autossómico dominante, de penetrância incompleta e expressão variável. Nas formas familiares foram identificadas mutações no gene da glomulina, localizado no cromossoma 1p21-22(2,3).

O diagnóstico definitivo é dado pelo exame anatomopatológico da lesão. Apesar da sua aparência epitelióide, as células glómicas são imunorreactivas à α-actina do músculo liso(5) e não expressam determinantes epiteliais. A ressonância magnética poderá ser útil para definir a extensão da doença e planear o tratamento, bem como para detectar alterações cerebrais sugestivas de neurofibromatose tipo 1, patologia que tem sido descrita em associação com as malformações glomuvenosas(6). Os exames laboratoriais são desnecessários, excepto se houver risco de sequestração plaquetária (lesões múltiplas ou extensas).

O diagnóstico diferencial faz-se com hemangioma, malformação venosa cutâneo-mucosa, tumor pericítico, granuloma piogénico, espiradenoma, angiolipoma, nevo intradérmico e melanoma maligno(4,5).

O tratamento de eleição para as malformações glomuvenosas isoladas e dolorosas é a excisão cirúrgica, quase sempre curativa(3,4). Nos casos de lesões de grandes dimensões, a escleroterapia ou a ablação com laser poderão oferecer algum benefício(3,4).

As lesões são habitualmente não involutivas mas o prognóstico é, na maioria dos casos, excelente. Embora extremamente rara, está descrita a transformação maligna de lesões recorrentes(7). Recomenda-se a vigilância anual dos doentes afectados.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Gombos Z, Zhang P. Glomus Tumor. Arch Pathol Lab Med 2008; 132:1448-52.         [ Links ]

2. Frumuseanu B, Balanescu R, Ulici A, Golumbeanu M, Barbu M, Orita V, et al. A new case of lower extremity glomus tumor. Up-to-date review and case report. J Med Life 2012; 5:211-4.         [ Links ]

3. Brauer JA, Anolik R, Tzu J, Meehan S, Lieber CD, Geronemus RG. Glomuvenous malformations (Familial generalized multiple glomangiomas). Dermatol Online J 2011; 17:9.         [ Links ]

4. Borovaya A, Kunte C, Flaig MJ, Albrecht K, Goldscheider I, Korting HC, et al. Disseminated Cutaneous Glomangiomas in an Adolescent Boy. Acta Derm Venereol 2012; 92:324-5.         [ Links ]

5. Solovan C, Chiticariu E, Beinsan D, Zurac S, Baderca F. Multiple disseminated glomuvenous malformations: do we know enough? Rom J Morphol Embryol 2012; 53:1077-80.         [ Links ]

6. De Smet L, Sciot R, Legius E. Multifocal glomus tumours of the fingers in two patients with neurofibromatosis type 1. J Med Genet 2002; 39:e45.         [ Links ]

7. Brathwaite CD, Poppiti RJ Jr. Malignant glomus tumor. A case of widespread metastasis in a patient with multiple glomus body hamartomas. Am J Surg Pathol 1996; 20:233-8.         [ Links ]

 

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA

Catarina Dias

Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia-Espinho

Serviço de Pediatria

Rua Conceição Fernandes

4434-502 Vila Nova de Gaia, Portugal

E-mail: diascatarina9@gmail.com

Recebido a 15.07.2013 | Aceite a 27.08.2013

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