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Nascer e Crescer

versão impressa ISSN 0872-0754

Nascer e Crescer vol.21 no.3 Porto set. 2012

 

Resumo dos Posters

Talassemia β heterozigótica com fenótipo incomum

 

José Fraga1, Clara Machado1, Isabel Guerra1, Emília Costa1, José Barbot1

1 U. Hematologia Pediátrica, CH Porto

 

Resumo: Os síndromes β-talassémicos resultam de mu­tações dos genes β globínicos que comprometem a síntese de cadeias β. A gravidade clínica resulta da natureza das mutações em causa e, sobretudo, da sua presença em heterozigotia, ho­mozigotia ou heterozigotia composta. Em situações raras esta gravidade pode ser modificada pela ocorrência simultânea de mutações em genes não β.

Uma mutação no gene β em heterozigotia, mesmo que seja β0 (síntese nula de cadeias β), condiciona o fenótipo clínico de β-Talassemia minor. A presença de um fenótipo mais grave obriga a ponderar uma explicação adicional. Em primeiro lugar é importante investigar situações genéticas que determinem um excesso de produção de cadeias α. Estas situações, ao agrava­rem o desequilíbrio entre a produção de cadeias globínicas αe β, vão determinar a formação de tetrâmeros α que são tóxicos para as células precursoras eritróides.

De seguida descreve-se um caso de β-Talassemia intermé­dia como resultado da interacção de uma mutação β0 do gene globínico β em heterozigotia com a quadriplicação de um gene α também em heterozigotia (αα/αααα).

Adolescente, sexo masculino, 16 anos de idade, caucasia­no, filho de pai portador de β-Talassemia minor, seguido em con­sulta de Hematologia Pediátrica por anemia, microcitose acentu­ada, reticulocitose e hiperbilirrubinemia ligeiras. A investigação inicial revelou uma mutação β0 em heterozigotia. O fenótipo intermédio conduziu à investigação de patologia da membrana e do sistema enzimático do eritrócito que se revelou negativa. Entretanto, foram enviadas amostras para o Laboratório de He­matologia Molecular do Centro Hospitalar de Coimbra que do­cumentou a co-herança de uma mutação β0 (CD39 C-T) com a quadriplicação de um gene α (αα/αααα).

O presente caso ilustra a complexidade genética subjacen­te a um fenótipo de talassemia intermédia e reforça a neces­sidade de investigar causas adicionais em crianças portadoras de β-Talassemia heterozigótica com apresentação clínica mais grave do que o expectável.

 

Do sono ao diagnóstico – um caso Prader-Willi­-Like

 

Joana Magalhães¹, Natália Oliva Teles², Sílvia Pires², Bárbara Marques², João Lopes³, M Guilhermina Reis¹

¹ S. Pediatria, DCA, CH Porto

² U. Citogenética, Dep. Genética, CGMJM – INSA, Porto

³ S. Neurofisiologia, CH Porto

 

Introdução: O síndrome de Prader-Willi (SPW) é uma doença rara, associada a alterações na região cromossómica 15q11-q13, com fenótipo típico mas heterogéneo. Existem ca­sos descritos de doentes com fenótipo semelhante e mutações noutras regiões do cromossoma 15. As alterações do sono são critério minor de SPW.

A perturbação respiratória do sono, associada a obesidade e hipersónia diurna constitui o tipo adulto do SAOS, com reper­cussões importantes no comportamento, aprendizagem e risco cardiovascular. As alterações do sono no SPW são frequentes e multifatoriais, incluindo disfunção hipotalâmica, vias aéreas es­treitadas, obesidade e hipertrofia linfoadenoideia, sendo a polis­sonografia (PSG) essencial na sua caracterização.

Caso Clínico: Menina de 9 anos, filha de mãe obesa. An­tecedentes perinatais irrelevantes. Refluxo gastroesofágico nos primeiros meses de vida, com exame objetivo e evolução pon­deral normais.

Aos 5 anos avaliada por atraso global do desenvolvimento (QGD 65, Escala de Ruth Griffiths), com dificuldades linguagem. Adenoamigdalectomia aos 6 anos por infeções recorrentes e roncopatia. Enviada a consulta de Pneumologia Pediátrica aos 8 anos por sonolência diurna excessiva. Com roncopatia e ri­nossinusite ligeira. Objetivadas altura no P58, obesidade (IMC P99,7), cabelos de cor clara, olhos amendoados, mãos com de­dos curtos.

O cariótipo com bandas de alta resolução sugeriu deleção no cromossoma 15, confirmada por FISH [ish del(15)(q21.3q21.3) (bA74K1-)].

Do estudo do sono, a referir poligrafia não sugestiva de SAOS significativo e PSG, incluindo sono REM e não REM, sem alterações a justificar intervenção, nomeadamente ventilação não invasiva (VNI). A roncopatia melhorou com as medidas ge­rais (higiene nasal e perda peso), sem resolução da sonolência diurna.

Mantém seguimento multidisciplinar em consulta e apoio do Ensino Especial.

Comentários: Os autores apresentam uma doente com hi­personolência e fenótipo Prader-Willi-like, com monossomia par­cial do cromossoma 15. Perante alterações do sono em crianças com fenótipo sugestivo, este diagnóstico deve ser considerado e o estudo do cariótipo deve ser complementado por estudo cito-genético molecular (FISH). Dados os poucos casos publicados, a evolução e o prog­nóstico destes doentes não estão estabelecidos.

As alterações do sono de causa multifactorial implicam abordagem e seguimento multidisciplinar, com reforço das me­didas de estilo de vida e orientação terapêutica, nomeadamente pela eventual necessidade de VNI.

 

Existe relação entre a ingestão de pequeno almoço e o IMC?

 

Susana Rios1, Maria Inês Monteiro2, Ana Filipa Amorim2, Fátima Nunes2, Lúcia Gomes2, Miguel Costa2

1 USF Sem Fronteiras

2 CH Entre Douro e Vouga

 

Introdução: A importância do pequeno-almoço (PA) é há muito reconhecida, podendo ter um papel protetor contra a obe­sidade. A incidência desta patologia tem vindo a aumentar nos últimos anos, segundo a OMS. Recentemente, foi estabelecida uma relação entre a omissão de pequeno-almoço e o excesso de peso/obesidade em crianças e adolescentes europeus.

Objetivos: Caraterizar os hábitos de pequeno-almoço e estudar a associação entre a omissão de pequeno-almoço e o excesso de peso/obesidade numa população pediátrica.

Metodologia: Aplicação de questionário a crianças e adoles­centes (entre os 6 e os 18 anos), presentes na sala de espera da consulta de Pediatria, entre março e maio de 2012. Foram avalia­dos as características do pequeno-almoço e variáveis sociodemo­gráficas (sexo, idade, IMC, caracterização do agregado familiar).

Resultados: Foram recolhidos 400 inquéritos. A média de idades foi de 11,3 anos, sendo 56,2% dos inquiridos do sexo masculino, inserindo-se 69,5% em famílias nucleares. No dia da entrevista, 94,8% dos participantes ingeriram o PA, sendo na maioria dos casos constituído por leite com cereais (41,4%). Dos 5,3% que não tomaram PA, o principal motivo referido foi a falta de tempo (38,1%). Constatou-se obesidade em 24,7% dos inquiridos e excesso de peso em 22,1%, sendo 55,7% do sexo masculino. Dos que não tomaram pequeno-almoço, 55% tinha excesso de peso e/ou obesidade, com ligeiro predomínio do sexo feminino. Não foram encontrados relações estatisticamente significativas entre o IMC e ingestão e constituição de PA, tipo de família, sexo ou idade.

Discussão: Ficamos agradavelmente surpreendidos por 94,8% das crianças terem tomado o PA no dia da entrevista. No entanto, 46,8% dos inquiridos apresentavam obesidade/excesso de peso, refletindo a realidade mundial (e também a portuguesa), o que demonstra a ineficácia das medidas preventivas adotadas. Assim, é necessário continuar investir em todas as vertentes da prevenção da obesidade.

 

Prematuridade e síndrome genético: até ao diagnóstico de Síndrome de Williams

 

Joana Magalhães¹, Carla Zilhão¹, Ermelinda Silva¹, Marcia Martins², M Guilhermina Reis¹

¹ S. Pediatria, DCA, CH Porto

² C. Genética, S. Neonatologia, DCA, CH Porto

 

Introdução: O Síndrome de Williams (SW) é uma doença rara, frequentemente causada por mutações de novo. O fenótipo é heterogéneo, evolutivo, e sem uma característica específica para o diagnóstico. O cariótipo com técnica de FISH confirma a deleção 7q11.23.

A colestase neonatal associada a dismorfia facial e alte­rações cardiovasculares impõe a investigação de síndromes genéticos associados. As comorbilidades relacionadas com a prematuridade podem dificultar o reconhecimento de quadros sindromáticos.

Caso Clínico: Sexo masculino, 3 anos. Antecedentes de prematuridade 30 semanas, com somatometria adequada à idade gestacional. Internamento até aos 3 meses de vida registando-se estenose pulmonar periférica, convulsões, pneumonia e pneu­motórax, displasia broncopulmonar, dificuldades alimentares e colestase. Fenotipicamente fronte alta, nariz pequeno, boca lar­ga. Teve alta orientado para consultas de subespecialidade.

Evolução favorável da colestase, interpretada como mul­tifactorial e transitória (sem embriotoxon). Estável do ponto de vista cardiovascular e respiratório.

Pelos 6 meses tornou-se nítido um atraso de desenvol­vimento psicomotor, com hipotonia axial e espasticidade dos membros, orientado para intervenção. Com o crescimento constatado défice cognitivo grave (QGD 49) com atraso na linguagem e alterações do comportamento: comportamento opositivo, hipe­ractivo, dificuldades persistentes na alimentação. Os exames de imagem cerebral não apresentam alterações relevantes. Sem alterações da calcémia ou do estudo metabólico. Ecografia re­novesical normal.

Aos 16 meses, na avaliação cardiológica, identificada este­nose aórtica supra-valvular, com gradiente máximo de 30mmHg; manteve-se assintomático.

Aos 20 meses, por manter fenótipo morfológico e compor­tamental sugestivos foi solicitado estudo genético para Síndro­me de Williams, que confirmou o diagnóstico. Cariótipo dos pais normal. Mantém boa evolução estatural, com peso no percentil 5-10.

Comentários: O Síndrome de Williams é uma doença rara, com apresentação heterogénea, mas cujo diagnóstico permite programar a vigilância e intervenção multidisciplinar para preve­nir e tratar precocemente as suas comorbilidades.

A colestase neonatal não é habitualmente uma caracte­rística do SW, podendo neste caso dever-se às intercorrências neonatais.

As alterações do desenvolvimento nos prematuros, quando não devidamente justificadas pelo seu contexto clínico, obrigam a prosseguir a investigação diagnostica.

 

Síndrome de Turner – experiência de uma unidade de endocrinologia pediátrica

 

Sofia Ferreira1, Mariana Costa2, Joana Magalhães3, Luís Ribeiro3, Maria João Oliveira3, Maria Helena Cardoso3, Teresa Borges3

1 CH Entre Douro e Vouga

2 ULS Alto Minho

3 CH Porto

 

Introdução: A Síndrome de Turner (ST) caracteriza-se por monossomia total ou parcial do cromossoma X. A heterogeneida­de fenotípica é considerável, sendo a baixa estatura e a disgene­sia gonadal as características mais consistentes.

Objectivos: Descrição das características clínicas de crianças e adolescentes com ST e avaliação da resposta ao tra­tamento com HC.

Material e métodos: Estudo retrospectivo, através da revi­são dos processos clínicos dos doentes com ST em seguimento na Unidade de Endocrinologia Pediátrica de um hospital de cui­dados terciários. Análise estatística realizada pelo SPSS 17.0.

Resultados: Identificados 28 casos de ST: idade actual média 11,2 ± 5 anos. O diagnóstico foi pré-natal em 17,9%. Nos restantes, a idade média do diagnóstico foi de 6,8 ± 4,7 anos e os motivos que conduziram ao diagnóstico foram: baixa estatura (69,6%), baixa estatura com atraso pubertário (13%), linfedema (7,1%) e cardiopatia congénita (8,7%). Em 32,1% verificou-se monossomia total do X, em 32,1% monossomia parcial e em 35,7% mosaicismo. As características fenotípicas mais frequen­tes foram: baixa estatura (89,3%), cubitus valgus (60,7%) e pa­lato arqueado (60,7%).

As alterações neurocomportamentais (39,3%), as altera­ções renais (35,7%) e excesso de peso/obesidade (21,3%) fo­ram as co-morbilidades mais observadas.

Cinco adolescentes iniciaram terapêutica hormonal de substituição (THS) com estrogénios com idade média de 13,8 ± 2,1 anos, 4 por via transdérmica, 1 por via oral. Em 3 a menarca foi espontânea.

O tratamento com HC foi instituído em 19 doentes (67,9%). Relativamente às 17 doentes sob HC há mais de 12 meses, a idade média de início foi de 7,4 ± 3,5 anos, com uma duração média de tratamento de 3,6 ± 2,3 anos. A média do SDS da es­tatura antes da HC (-2,66 ± 0,89) foi significativamente inferior à média do SDS da estatura actual (-2,23 ±0,96) (p=0,022). O SDS da estatura actual correlacionou-se significativamente com o SDS da estatura antes da HC (p=0,00), mas não com a idade de início da HC, a dose de início, a duração do tratamento e a estatura alvo.

Discussão: O diagnóstico precoce do ST é essencial não só para a instituição da terapêutica com HC e da THS em tempo útil, mas também para a avaliação/orientação das co-morbilidades. Na nossa amostra, apesar da duração média da terapêutica ser ainda curta, a maioria beneficiou da HC, com um ganho significa­tivo na estatura actual, de acordo com os dados da literatura.

 

Hemorragia cerebral não traumática em Pediatria – quando suspeitar

 

Liliana Branco1, Marta Santalha1, Marta Tavares2, Ana Luísa Lobo1

1 S. Pediatria, U. Guimarães, CH Alto Ave

2 S. Pediatria, UAG Mulher e da Criança, CH São João

 

Introdução: A hemorragia cerebral não traumática, apesar de ser uma entidade rara na população pediátrica, está associa­da a uma morbilidade e mortalidade significativa. A sua etiologia é variada, sendo a malformação vascular (MAV) a causa mais frequente neste grupo etário.

Caso clínico: Adolescente, sexo feminino, doze anos de idade, sem antecedentes pessoais de relevo. Cerca de 12 ho­ras antes da admissão, iniciou episódio súbito e intenso de cefaleia parietal seguido de vómitos, incontinência dos esfínc­teres e deterioração do estado de consciência. Sem história prévia de traumatismo, infecção, ingestão medicamentosa ou tóxica. Ao exame objetivo apresentava-se pouco reativa (ECG 9), com pupilas isocóricas e fotorreactivas, apirética e hemodinamicamente estável. Procedeu-se de imediato a sua intubação, ventilação mecânica e administração de bólus de NaCl a 3%, que manteve em perfusão. Analiticamente sem alterações de relevo. Efetuou TAC-CE que revelou uma “ex­tensa lesão hemorrágica cerebelosa bilateral com inundação do sistema tetraventricular”. A adolescente foi transferida para um centro hospitalar com cuidados neurocirúrgicos onde rea­lizou angioTAC-CE que evidenciou a presença de ruptura de malformação arteriovenosa na fossa posterior. Foi submetida a remoção cirúrgica do hematoma intracerebral e dissecção completa da MAV. No período pós-operatório, por apresentar hipertensão intracraniana refratária ao tratamento médico, foi submetida à craniectomia descompressiva. Posteriormente, constatada uma evolução clínica favorável, com recuperação rápida do estado de consciência. De salientar, à data de alta, a presença de ataxia cerebelosa na marcha. No seguimen­to, verificou-se uma resolução gradual do déficit neurológico, encontrando-se atualmente sem sequelas.

Conclusão: A MAV é uma condição patológica pouco fre­quente em pediatria. A maioria tem uma localização supraten­torial sendo que, apenas 10% se situam na fossa posterior. A apresentação clínica mais comum é a hemorragia cerebral. Os autores salientam a importância de um elevado índice de suspei­ção e da avaliação estruturada do doente crítico como principais determinantes para um diagnóstico e intervenção precoce, per­mitindo assim melhorar o seu prognóstico.

 

Síndrome da Cimitarra – a propósito de um caso clínico

 

Joana Magalhães1, Luciana Sousa2, Isabel Sá3, Sílvia Álvares4, M Guilhermina Reis1

1 S. Pediatria, DCA, CH Porto

2 S. Imagiologia, CH Porto

3 S. Cardiologia, CH Porto

4 S. Cardiologia Pediátrica, DCA, CH Porto

 

Introdução: A Síndrome da Cimitarra é uma patologia rara que se caracteriza pela drenagem anómala das veias pulmona­res direitas na veia cava ou aurícula, podendo incluir múltiplas malformações cardiopulmonares, sendo as mais frequentes dex­troposição cardíaca, hipoplasia pulmonar direita e alterações na irrigação arterial do pulmão direito. As manifestações clínicas incluem desde hipertensão pulmonar grave na primeira infância, até infeções recorrentes ou quadros com sintomas escassos e diagnóstico na idade adulta.

Caso clínico: Adolescente de 13 anos, sem antecedentes familiares relevantes. Internamento aos 6 meses por PNA a E coli, com estudo normal. Nessa altura foi identificada radiologi­camente assimetria pulmonar, investigada por tomografia, cinti­grafia e broncoscopia, com diagnóstico de anomalia da segmen­tação brônquica, ecocardiograma normal.

Recorreu ao serviço de urgência por dor torácica suges­tiva de nevrite intercostal, apresentando diminuição dos sons respiratórios base direita. Foi realizada telerradiografia torácica que evidenciou hipotransparencia na base direita, com desvio ipsilateral do mediastino, com hiperinsuflação à esquerda. Sem queixas respiratórias, com boa evolução estaturoponderal e bom estado geral.

Na consulta externa, efectuada TAC torácica que revelou hipoplasia do pulmão direito com desvio mediastínico homola­teral e subida da hemicúpula diafragmática, associada a duas veias de drenagem anómala para a veia cava inferior e para a veia pulmonar inferior esquerda, sendo estas imagens suges­tivas de Síndrome da Cimitarra. Provas de função respiratória normais.

Na avaliação por cardiologia, de referir ECG normal e ecocardiograma sem sinais de hipertensão pulmonar, sem al­terações além da dextrocardia, que tornou a avaliação difícil. A angio-RMN cardíaca confirmou as alterações descritas na TAC e ausência de malformações intracardíacas.

Sempre assintomática.

Comentários: No caso apresentado o diagnóstico foi ba­seado num achado, com imagem torácica sugestiva, sendo con­firmado por TAC. Uma vez que até 40% têm malformações car­díacas associadas e a insuficiência cardíaca é uma complicação grave e frequente, é essencial a avaliação por Cardiologia e a caracterização completa de cada doente, para exclusão da ne­cessidade de Cirurgia. Nesta adolescente, assintomática, dever­-se-á manter vigilância clínica.

 

Propranolol como tratamento de primeira linha dos hemangiomas da infância

 

Joana Pereira1, Catarina Sousa1, Angélica Osório1, João Moreira-Pinto1, José Banquart-Leitão1

1 S. Cirurgia Pediátrica, CH Porto

 

Objetivo: Os hemangiomas são os tumores vasculares mais frequentes na infância. Apresentam um padrão de cres­cimento típico e auto-limitado, a que se segue um período de involução espontânea. Em aproximadamente 10% dos casos ocorrem complicações que obrigam a intervenção. O proprano­lol foi recentemente adicionado ao arsenal de fármacos para o tratamento destes doentes, e tem vindo a revolucionar a atitude terapêutica perante os hemangiomas infantis. O objectivo deste estudo é avaliar a eficácia do propranolol no tratamento dos he­mangiomas da infância.

Material e Métodos: Efectuamos um estudo descritivo dos doentes tratados com propranolol no Serviço de Cirurgia Pediá­trica – Centro Hospitalar do Porto, entre Março de 2010 e Mar­ço de 2012. Foram considerados candidatos ao tratamento os doentes com hemangiomas em fase proliferativa que apresen­tassem crescimento rápido, com risco de compromisso funcio­nal e/ou estético. O tratamento foi realizado em ambulatório e a dose de propranolol administrada foi de 2 mg/kg/dia, dividida em três doses. Todos os doentes foram avaliados previamente por Cardiologia, que manteve o seguimento durante o período de tratamento. A resposta ao tratamento foi categorizada em com­pleta, parcial ou ausente, foram também registados os efeitos adversos ocorridos.

Resultados: Foram incluídos 14 doentes, com um total de 18 hemangiomas. A localização mais frequente dos mesmos era a cabeça e pescoço. Em 11 doentes os hemangiomas eram focais e em 3 doentes multifocais (incluindo 1 segmentar). A in­dicação para o tratamento foi o risco de compromisso funcional em 8 casos, deformidade estética em 5 casos e crescimento rápido em 1 caso. A terapêutica com propranolol foi iniciada a uma idade média de 4,7 meses (variando entre 2 e 9 meses) e a duração média da mesma foi de 4,4 meses (variando entre 2 e 12 meses). Observou-se uma estabilização do crescimento dos hemangiomas em 100% dos casos. Relativamente à regressão esta foi completa em 11 hemangiomas e parcial em 3, o que corresponde a um sucesso terapêutico de 78,6%. Os restantes 4 hemangiomas ainda se encontram em fase de tratamento. Em apenas 1 caso foi necessário a interrupção do tratamento por bradicardia.

Conclusão: Na grande maioria dos casos o propranolol provocou uma regressão rápida e sustentada dos hemangiomas, diminuindo assim a duração natural das lesões, com poucos efeitos secundários. Consideramos o propranolol o fármaco de primeira linha no tratamento dos hemangiomas da infância. Es­tudos ulteriores são necessários para delinear o melhor esque­ma terapêutico e de vigilância, bem como o perfil de segurança deste fármaco.

 

Kerion Celsi – implicações clínicas e terapêuticas

 

Maria Inês Monteiro1, Ana Luísa Leite2, Teresa Oliveira1, Manuel Magalhães1, Joana Rodrigues1, Miguel Costa1, Cristina Rocha1

1 CH Entre Douro e Vouga

2 CH Vila Nova de Gaia-Espinho

 

Introdução: O Kerion Celsi é uma forma inflamatória de tinea capitis causado por uma reação de hipersensibilidade mediada por células T do dermatófito nos folículos capilares. O reconhecimento clínico precoce evita procedimentos invasivos. A hiperleucocitose que pode resultar é um reflexo do processo inflamatório. Estas reações tipo leucemóide são uma alteração hematológica reacional, que desaparece quando é corrigida a condição subjacente. Os agentes mais frequentemente envol­vidos são o Trichophyton verrucosum, o Trichophyton menta­grophytes, o Microsporum canis e o Microsporum gypseum. O espectro clínico é muito variável.

Caso Clínico: Criança de 3 anos, previamente saudável, observada no serviço de urgência por apresentar desde há 4 semanas lesões em crosta no couro cabeludo, acompanhadas de febre intermitente. Ao 7º dia de doença tinha sido medicada com corticóide oral e tópico, sem melhoria. História de contac­to esporádico com cão de rua. Ao exame objetivo apresentava massa inflamatória dolorosa no couro cabeludo com exsudado, associada a zonas de lesões descamativas com consequente alopécia. No tronco apresentava também lesões crostosas e pru­riginosas. Sem outras alterações, nomeadamente adenopatias. Analiticamente apresentava hiperleucocitose de 47.5 x 10^9/L, 80% neutrófilos (com granulações tóxicas), plaquetas e restan­te hemograma normal, proteína C reactiva 77.4 mg/L. Iniciou terapêutica com itraconazol oral, flucloxacilina endovenosa e cetoconazol tópico. Avaliada por Cirurgica Pediátrica, tendo-se procedido a tricotomia alargada do couro cabeludo, drenagem das lesões que apresentavam flutuação e limpeza local. Iniciou lavagem local com cloro-hexidina e colocação de ácido fusídico tópico. Evolução clínica favorável com normalização dos parâ­metros analíticos. O exame cultural revelou-se positivo para Tri­chophyton mentagrophytes. Manteve fluconazol no domicílio até perfazer quatro semanas. Atualmente apresenta boa evolução clínica com seguimento em consulta externa.

Discussão/Conclusão: O Kerion Celsi é uma forma exu­berante de tinha do couro cabeludo que pode atingir a criança com lesão tipo “colmeia de abelha”, muito dolorosa, com lesões supurativas profundas. O diagnóstico e terapêutica adequada e precoce podem prevenir complicações a longo prazo. O carácter inflamatório intenso é traduzido pela hiperleucocitose encontra­da. Como se verificou é uma proliferação benigna e transitória ra­pidamente resolvida com as medidas terapêuticas adequadas.

 

Restrição do crescimento intra-uterino: análise casuística do 1º semestre de 2012

 

Vieira B1, Lima T1, Braga A1, Soares S1, Dias C1, Rodrigues M1, Braga J1, Oliveira T1

1 Serviço Obstetrícia do Centro Hospitalar do Porto

 

Introdução: A definição mais comum de Restrição de Cres­cimento Intra-Uterino (RCIU) é um peso fetal estimado (PFE) abaixo do percentil 10 para a idade gestacional. A RCIU é um problema complexo para a Obstetrícia e para a Pediatria por se associar a um aumento da morbilidade e mortalidade fetal e ne­onatal.

Métodos Estudo: retrospectiva dos casos diagnosticados com RCIU e parto na Maternidade Júlio Dinis (MJD) Centro Hos­pitalar do Porto, no primeiro semestre de 2012. Resultados No período de tempo selecionado registaram-se um total de 55 ca­sos de RCIU em 52 gravidezes - 4 casos em gravidez gemelar, 3 das quais com ambos os fetos afetados. A pré-eclémpsia foi a causa materna mais frequentemente observada (n=10). A RCIU foi diagnosticada em média C s 33+4 semanas de idade gesta­cional (mediana 34+1 sem; [24+3: 39+2 sem]). Em 45,5% dos casos o diagnóstico ocorreu antes das 34 semanas de gestação (n=25). Observou-se ainda um PFE abaixo do percentil 5,0 em 50,9% (n=28), oligoémnios em 41,8% (n=23) e alterações no do­ppler da artéria umbilical em 21,8% (n=12). O parto ocorreu após as 37 semanas em 42,8% dos casos (n=23). A idade gestacional média no parto foi de 35+2 sem (intervalo 24+5: 39+3 sem). Relativamente à via de parto verificou-se cesariana em 61,8% dos casos (n=34). A cesariana eletiva foi o método de eleição em 12 casos, nos quais a finalização da gravidez foi decidida por agravamento do estado materno, fetal ou de ambos. Em 18,2% (n=10) a cesariana ocorreu na sequência de tentativa de indu­ção do trabalho de parto. Verificou-se parto eutócico em 32,7% (n=18) dos casos. O peso médio dos recém-nascidos (RN) foi de 1982 g (mediana 2145g [370 : 2975g]) e 58,2% (n=32) eram do sexo feminino. Oito RN apresentaram índice de Apgar (IA) < 7 no 1º: minuto (14,8%), e em 3 casos (5,6%) um IA < 7 no 5B: minuto.

Conclusão: Distinguir os fetos constitucionalmente peque­nos e os que têm realmente restrição de crescimento é extre­mamente importante, dado que condiciona a atitude do obstetra e o prognóstico fetal. A função do Obstetra passa assim por iden­tificar o crescimento abaixo do ideal, determinar a causa e seve­ridade do mesmo, consultar a Neonatologia, providenciar uma monitorização materno-fetal apertada, determinar e optimizar o momento para finalizar a gravidez e ainda selecionar via de parto mais apropriada. A incidência e gravidade dos casos de RCIU observados são naturalmente condicionadas pelo facto da MJD ser um centro de atendimento terciário.

 

Seguimento de um recém-nascido com hiperexcitabilidade

 

Maria João Vieira1, Andreia Costa1, Manuela Santos2, Luísa Malheiro1

1 U. Neonatologia, U. Guimarães, CH Alto Ave

2 U. Neuropediatria, S. Pediatria, CH Porto

 

Introdução: A síndrome de Angelman é um distúrbio gené­tico raro, que se carateriza pelo atraso do desenvolvimento psi­comotor, alterações neurológicas e comportamentos peculiares como o sorriso frequente. O diagnóstico clínico precoce é raro, uma vez que o quadro clínico vai-se formando ao longo do tem­po, podendo ser sobreponível a outras síndromes nos primeiros anos de vida.

Caso-clínico: Criança do sexo masculino, sem anteceden­tes familiares de relevo. Gestação sem intercorrências, parto por cesariana (incompatibilidade fetopélvica) às 41 semanas, índice Apgar 9/10. Sem malformações aparentes ao nascimento e com teste do diagnóstico precoce normal.

Nos primeiros dias de vida era evidente uma hiperexcita­bilidade, associada a trémulo dos membros e dificuldades na amamentação, tendo realizado ecografia transfontanelar que se revelou normal.

Foi orientado para consulta hospitalar de neonatologia, tendo-se constatado durante o seu seguimento um atraso do de­senvolvimento psicomotor, sem perda de habilidades, sendo as áreas mais afetadas a marcha e a linguagem. A nível comporta-mental destacava-se a hiperexcitabilidade, sorriso constante, hi­percinésia e perda rápida de interesse pelos objetos, mantendo bom contacto social. Verificou-se uma microcefalia progressiva, apresentando a partir dos 12 meses um fácies peculiar com face longa e discreto prognatismo.

Realizou pesquisa de CMV no cartão de Guthrie e estu­do metabólico que não revelaram alterações. A RMN cerebral mostrou áreas de desmielinização bilateral, apresentando um eletroencefalograma com surtos de atividade delta generaliza­da, embora sem convulsões até ao momento. Aos 15 meses foi requisitado o estudo molecular para Síndrome de Angelman que mostrou a presença de apenas um alelo paterno para a região 15q11-q13, confirmando assim o diagnóstico.

Mantém-se sob tratamento de fisioterapia e estimulação precoce desde os primeiros meses de vida e, posteriormente, de terapia da fala.

Conclusões: A clínica da Síndrome de Angelman nos pri­meiros meses de vida é inespecífica, incluindo caraterísticas que são sobreponíveis a outras síndromes. No entanto, a presença de trémulo dos membros e instabilidade de movimentos previamente à aquisição da marcha, numa criança com uma disposição alegre, são achados sugestivos desta síndrome. Os autores apresentam este caso clínico como uma chamada de atenção para a identifi­cação destas caraterísticas que poderão permitir um diagnóstico e uma orientação adequada mais precocemente.

 

Prevalência e factores de risco de retinopatia da prematuridade: estudo retrospetivo de 12 anos

 

Marta Nascimento1, Bruna Cardoso Vieira2, Isabel Ribeiro2, Rui Carvalho2, João Neves Martins2, Isabel Martins3

1S. Pediatria, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos

2S. Oftalmologia, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos

3U. Cuidados Intensivos Neonatais, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos

 

Introdução: A retinopatia da prematuridade (ROP) é uma doença vasoproliferativa, de etiologia multifatorial, secundária à inadequada vascularização da retina em desenvolvimento. Nas formas graves pode conduzir a importantes sequelas visuais, incluindo a cegueira. Os autores avaliaram a prevalência e fac­tores de risco de ROP nos RN prematuros nascidos no Hospital Pedro Hispano num período de 12 anos.

Materiais e Métodos: Estudo retrospetivo dos RN prema­turos submetidos a rastreio da ROP (por oftalmoscopia indireta e a partir de 2012 com o auxílio da RetCam®) de Janeiro de 1999 a Junho de 2012. Idade gestacional (IG) ≤ 32 semanas, peso ao nascimento (PN) ≤ 1500g e/ou curso clínico complicado foram os critérios de inclusão no rastreio. Avaliaram-se a prevalência e os potenciais fatores de risco relacionados com o desenvolvimento de ROP. Para a análise estatística foi usado o SPSS® 20.0.

Resultados: Rastrearam-se 267 RN, 50.6% do sexo femi­nino, com IG média de 29 ± 2 semanas e PN médio de 1193 ± 307g. A prevalência de ROP foi 22.1% (50.9% no estádio 1, 22.3% no estádio 2, 25% no estádio 3 e 1.8% no estádio 4B). Não foram encontrados casos no estádio 5. Doença plus ocorreu em 17.8% dos RN. Verificou-se associação estatisticamente sig­nificativa entre ROP e PN (p<0,001), IG (p<0,001), compromisso hemodinâmico na primeira semana (p<0,001), hemorragia intra­ventricular (p<0,001), doença de membranas hialinas (p<0,001), ventilação mecânica (p<0,001), oxigenoterapia (p<0,001), trans­fusões sanguíneas (p<0,001), uso de surfactante (p<0,001) e eritropoietina (p= 0,001). O PN e as transfusões sanguíneas fo­ram os fatores preditivos mais importantes. Foram tratados 13 RN: 6 com crioterapia, 6 com fotocoagulação a laser e 1 com as duas técnicas. Todos os olhos apresentaram regressão com o tratamento, excepto o RN com estádio 4 que desenvolveu des­colamento de retina subtotal em ambos olhos. Nos casos sem tratamento ocorreu regressão espontânea.

Conclusões: Observou-se uma prevalência da doença e fatores de risco semelhantes a outros estudos internacionais em países desenvolvidos. Diversos fatores de risco têm sido asso­ciados ao desenvolvimento de ROP, atribuindo-se à IG, PN e oxi­genoterapia um papel de destaque. No nosso estudo, o PN e as transfusões sanguíneas assumiram maior importância preditiva. A prevenção do parto prematuro, o uso criterioso de oxigenotera­pia e de transfusões sanguíneas são passos fundamentais para a profilaxia da ROP. 

 

Síndrome serotoninérgica após intoxicação com sertralina

 

Marta Rios1, Joana Grenha2, Ana Garrido2, Hernâni Brito1, Sara Gonçalves1, Paula Ferreira1

1 S. Cuidados Intensivos Pediátricos, CH Porto

2 S. Pediatria, CH Vila Nova de Gaia - Espinho

 

Introdução: O diagnóstico de síndrome serotoninérgica é clínico e caracteriza-se por sinais e sintomas de instabilidade au­tonómica, alteração do estado de consciência e hiperatividade neuromuscular. A gravidade é variável, desde trémulo ligeiro a hipertermia ou choque fatais. Em idade pediátrica, a maior parte dos casos ocorre por intoxicação acidental ou intencional, mas pode surgir após a primeira toma do fármaco, após aumento da dose ou associação de outro medicamento com ação serotoni­nérgica.

Caso clínico: Criança do sexo feminino, 8 anos, medicada com risperidona desde há 2 anos por perturbação de hiperati­vidade e défice de atenção e sertralina desde há 1 semana por sintomatologia depressiva. Sem outros antecedentes de relevo. Observada no Serviço de Urgência do hospital da área de re­sidência por quadro de agitação e alucinações, 5h após inges­tão intencional de 30 comprimidos de 50 mg de sertralina (60 vezes a dose prescrita). Na admissão, apresentava hipertermia, hipertensão arterial, taquicardia, taquipneia, diaforese, sialorreia, rubor facial, agitação psicomotora, mioclonias, trémulo e rigidez muscular. Pesquisa de drogas de abuso na urina negativa. Insti­tuída terapêutica com benzodiazepinas, clemastina e biperideno sem resposta e perfusão de propofol com controlo temporário dos sintomas, sendo necessário indução de coma barbitúrico e curarização. Transferida para o Serviço de Cuidados Intensivos Pediátricos do nosso hospital com o diagnóstico de síndrome serotoninérgica, onde manteve terapêutica de suporte e iniciou terapêutica antiserotoninérgica com ciproheptadina. Necessitou de curarização durante 10 dias. Durante o internamento, apre­sentou hipertensão arterial controlada com propranolol, rabdomi­ólise e citólise hepática. Transferida para o hospital de origem ao 13º dia, clinicamente bem.

Conclusão: Apesar dos inibidores seletivos da recaptação de serotonina (SSRIs) serem mais seguros do que os antide­pressivos tricíclicos e os inibidores da MAO, não são isentos de complicações, como demonstrado com este caso de síndrome serotoninérgica. Dado o aumento progressivo do número de crianças e adolescentes tratados com SSRIs, é importante que os profissionais de saúde conheçam esta entidade, uma vez que o diagnóstico e instituição terapêutica precoces são decisivos na evolução favorável da doença.

 

Anemia ferripriva refractária à terapêutica com ferro oral e infecção por helicobacter pylori - experiência de 5 anos de uma unidade de gastroenterologia pediátrica

 

Inês Vaz Matos1, Sara Oliveira1, Rosa Lima1, Fernando Pereira1

1 U. Gastroenterologia Pediátrica, CH Porto

 

Introdução: A patologia gastrointestinal (GI) associada a défice de absorção do ferro (Fe) é causa frequente de anemia ferripriva (AF) refractária à terapêutica com Fe oral (FeO). En­tre as etiologias possíveis estão a gastrite atrófica auto-imune (GAAI) e a infecção por Helicobacter Pylori (HP). O papel do HP na AF e o benefício da sua erradicação têm sido extensamente estudados mas a sua relação ainda é controversa.

Objectivos: 1) Determinar a prevalência de infecção por HP em crianças com AF refractária à terapêutica com FeO sem outra etiologia determinada. 2) Avaliar o efeito da erradicação do HP nos valores de hemoglobina (Hb), volume globular médio (VGM), Fe sérico e ferritina das crianças com diagnóstico histo­lógico de gastrite por HP.

Material e métodos: Estudo retrospectivo através da con­sulta dos processos clínicos dos doentes referenciados à con­sulta de Gastroenterologia Pediátrica por AF refractária ao FeO que efectuaram endoscopia digestiva alta com biópsias gástricas para esclarecimento etiológico no período de Julho de 2007 a Junho de 2012. Exclusão dos doentes com diagnóstico prévio de patologia GI (ex: doença celíaca ou doença inflamatória in­testinal).

Resultados: A amostra incluiu 40 crianças com idade me­diana de 12 anos (2-18 anos). Cinco (12,5%) não apresentaram evidência de patologia GI, 8 (20%) tinham critérios serológicos e anatomo-patológicos de GAAI e 30 (75%) apresentavam infec­ção por HP, sendo que apenas 2 referiam sintomas GI.No grupo com diagnóstico exclusivo de gastrite por HP (n=24), foi efectu­ado tratamento em 21 doentes (87,5%). O esquema triplo com amoxicilina, claritromicina e omeprazol foi o mais utilizado (62%). A bactéria foi eficazmente erradicada em 18 crianças (85,7%), na maioria (66,7%) à primeira tentativa. Verificou-se uma subida nos níveis médios de Hb (10,5±2,2 vs 12,8±1 g/dl; p=0,0048), VGM (75,7±6,6 vs 79,8±7,3 fl; p=0,15), Fe (33,1±18,2 vs 57,5±25μg/ dl; p=0,0026) e ferritina (30,9±47,6 vs 38,7±32,8 ng/ml; p=0,482) com a erradicação do HP.

Conclusões: Os nossos resultados sugerem uma relação entre infecção por HP e AF em idade pe­diátrica. Salientamos a elevada prevalência de infecção por HP em doentes cuja única manifestação clínica foi a AF refractária ao FeO. A erradicação da bactéria traduziu-se na melhoria dos parâmetros analíticos, sendo a variação estatisticamente signifi­cativa para os valores de Hb e Fe. Os dados referidos alertam para a importância da inclusão da pesquisa de HP na avaliação dos doentes com AF refractária.

 

Tocilizumab na AIJ sistémica – caso clínico

Carla Zilhão1, Helena Sousa2, Lurdes Palhau3, Margarida Guedes1

1 U. Reumatologia Pediátrica, CH Porto

2 S. Pediatria, H Vila Franca de Xira

3 S. Fisiatria, CH Porto

 

Introdução: A grande actividade inflamatória associada à Artrite Idiopática Juvenil sistémica, que pode cursar com um síndrome de activação macrofágica, tem vindo a colocar várias questões acerca da sua etiopatogenia. Na última década tem sido implicada uma desregulação das citocinas IL-1, IL-6 e IL-18, o que conduziu a uma nova abordagem terapêutica.

Caso clínico: Menino de 5 anos, 2º filho de pais jovens, saudáveis, não consanguíneos. Antecedentes familiares irrele­vantes. Aos 19 meses apresenta quadro de febre prolongada associado a sintomas constitucionais (perda ponderal, astenia e irritabilidade), exantema evanescente, serosite, hepatoesple­nomegalia, adenomegalias e artrite das metacarpofalângicas, interfalângicas proximais e do joelho esquerdo. Sem uveíte. Ana­liticamente, anemia e elevação importante dos marcadores de infl amação (leucocitose, trombocitose, velocidade de sedimen­tação, ferritina e amilóide A sérico); ANA’s e Factor Reumatóide negativos.

Tratamento inicial com prednisolona e metotrexato, com melhoria apenas transitória dos sintomas constitucionais. Por doença refractária, 1 mês depois inicia tratamento com anti-IL1 (Anakinra). Resposta parcial, com remissão da febre, mantendo marcadores de inflamação positivos e actividade articular. Dois anos após tratamento com Anakinra (+ PRD + MTX) e doença poliarticular activa mantida, foi proposto para tratamento com anti-IL6 (Tocilizumab).

Eficácia clínica, com noção subjectiva de melhoria em menos de 48h. Com 1 mês de tratamento, sem manifestações sistémicas, sem articulações activas, aumento ponderal de 1Kg e normaliza­ção dos valores da Hb e da VS, atingindo o PedACR70.

Sem efeitos laterais e boa tolerância ao tratamento. No en­tanto, aos 6 meses, mantém-se sem manifestações sistémicas, com normalização dos parâmetros inflamatórios, mas com três articulações activas.

Discussão: Esta criança apresenta vários factores de mau prognóstico (poliartrite difusa com atingimento das pequenas ar­ticulações, manifestações sistémicas persistentes, idade de iní­cio precoce e corticodependência).

Com o AnaKinra obteve-se uma resposta moderada, com o ónus de necessitar de injecções diárias, mal toleradas.

A resposta obtida vem reiterar estudos realizados que apon­tam o Tocilizumab como o tratamento de 1ªlinha na AIJ sistémica resistente aos corticóides.

 

Quando a má evolução ponderal é de causa infecciosa

 

Margarida Reis Morais1, Filipa Raposo1, Luísa Pimenta de Castro2, Ana Catarina Carneiro2, Ana Rita Araújo2

1 S. Pediatria ULS Alto Minho

2 Centro de Diagnóstico Pneumológico de Viana do Castelo

 

Resumo: Estima-se que a prevalência da má evolução pon­deral nos países desenvolvidos ronde os 10-15% e que apenas 5% dos casos têm uma patologia orgânica como única causa. Os autores apresentam o caso clínico de uma criança, actualmente com 24 meses, com antecedentes de má evolução ponderal a partir dos 10 meses, altura em que ingressa no infantário e inicia episódios recorrentes de rinorreia, tosse e febre com dois inter­namentos e múltiplas vindas ao Serviço de Urgência. Ao exame físico destacava-se bom estado geral, discreta palidez cutânea, auscultação cardiopulmonar sem alterações e sinais sugestivos de infecção das vias aéreas superiores. O estudo efectuado revelava uma velocidade de sedimentação de 103 mm, pelo que se realizou a pesquisa de BK no suco gástrico permitindo o diag­nóstico de tuberculose. Iniciou terapêutica bactericida tripla com rifampicina, isoniazida e pirazinamida, notando-se uma recupe­ração significativa da evolução ponderal. Apesar das múltiplas causas de má evolução ponderal, a tuberculose, ainda que rara, deve ser uma hipótese a considerar.

 

Uveíte crónica – um desafio na idade pediátrica

 

Ana Freitas1, Carla Zilhão2, Manuela Selores3, Vasco Miranda4, Mesquita Marques5, Margarida Guedes2

1 S. Pediatria, CH Porto

2 U. Reumatologia Pediátrica, S. Pediatria, CH Porto

3 S. Dermatologia, CH Porto

4 S. Oftalmologia, CH Porto

5 S. Oftalmologia, H Braga

 

Introdução: As uveítes crónicas são situações raras na ida­de pediátrica, mas potencialmente graves, podendo condicionar défice visual em cerca de 45% das crianças. Englobam um grupo muito heterogéneo de situações clínicas, podendo ser classifica­das, do ponto de vista etiológico, como infecciosas ou não infec­ciosas. Neste último grupo a artrite idiopática juvenil é a causa mais vezes identificada, apesar da uveíte idiopática ser mais fre­quente. O diagnóstico é um desafio, principalmente em idade pe­diátrica, visto ter um curso clínico frequentemente assintomático e a precocidade da terapêutica condicionar o prognóstico.

Caso clínico: Criança do sexo feminino, 7 anos de idade, com antecedentes de pieira recorrente e obstipação. Aos 4 anos diagnosticada uveíte anterior bilateral não granulomatosa, com evolução para uveíte crónica com sinéquias posteriores, apesar da corticoterapia instituída (tópica, intra-ocular e sistémica). O processo inflamatório veio a estabilizar apenas após a instituição da associação de metotrexato e terapêutica biológica (infliximab). Durante o seguimento foram detectados episódios de exantema urticariforme associados a dor abdominal, aparecimento de máculas tipo café-com-leite evanescentes e episódios esporádicos e auto-limitados de artralgias e rigidez matinal. A investigação laboratorial revelou uma diminuição dos níveis de complemento C1q, C3 e C4, com anticorpos anti-C1q positivos e ANA negati­vos, que associada à clinica descrita foi compatível com o diag­nóstico de vasculite hipocomplementémica urticariforme.

Comentários: O caso clínico apresentado traduz algumas das complicações associadas à uveíte crónica, assim como as dificuldades inerentes ao seu diagnóstico etiológico. Pela gravi­dade clínica e risco de sequelas graves, é cada vez mais con­sensual que a abordagem terapêutica seja agressiva, com uso frequente de dois imunossupressores, e recurso à terapêutica biológica sempre que indicado.

 

A realidade dos jovens a respeito da ocupação dos tempos livres

 

Joana Rodrigues1, Ana Azevedo1, Fátima Nunes1, Maria Inês Monteiro1, Arménia Oliveira1

1 S. Pediatria, CH Entre Douro e Vouga

 

Introdução: A ocupação de tempos livres (OTL) é essencial na educação das crianças, pois fomenta a promoção do seu de­senvolvimento integral.

Objetivo: Descrever o modo como crianças/ adolescentes ocupam os seus tempos livre e a sua relação com o aproveita­mento escolar.

Material/Métodos: Análise restrospetiva de inquéritos re­alizados aos pais de crianças e adolescentes que frequentam a consulta externa do CHEDV. Foram analisados parâmetros como sexo, idade, IMC, OTL: televisão, leitura e atividades extracurriculares (desportiva e outras).

Resultados: Foram avaliados 100 inquéritos de crianças e adolescentes, com idades compreendidas entre os 10 e 17A, (mediana 14A) com um predomínio do sexo feminino (60%) e com peso acima do P85 verificado em 44%.

Relativamente ao hábito da leitura, verificou-se que não lêem qualquer livro (não escolar) 17%, sendo que cerca de 56% o fazem apenas durante meia hora/dia. Constatou-se parecer haver uma relação positiva entre o número de horas de leitura / dia e um melhor aproveitamento escolar (p<0.001).

No que concerne ao uso da televisão, 65% refere que o faz durante 2 ou mais horas/dia. Foi ainda referido em 63% a existência de televisão no quarto. Em 65% dos casos, os pais referem esclarecer as notícias do telejornal aos filhos, havendo aparente repercussão positiva nas notas (p0.001).

Não foi constatada correlação com significado estatístico entre o aproveitamento escolar e o nº horas dispendido com a televisão.

Quanto à prática de exercício físico extra-escolar, 21% mencionou que não pratica qualquer desporto e a maioria fá-lo durante 1h/dia, sendo que o desporto mais praticado é o futebol, seguido da natação e voleibol.

Cerca de metade (48%) negou possuir qualquer tipo de actividade extracurricular, sendo que quando comparado com a média escolar, aparentemente as crianças com pior média fre­quentam menos atividades extracurriculares (p<0,05).

Conclusão: A prática de atividades extracurriculares pa­rece tornar os adolescentes mais disciplinados, condicionando um maior interesse pela escola, influenciando positivamente o seu rendimento escolar, tal como é descrito nalguns estudos da literatura. O modo como as crianças ocupam os tempos livres é bastante importante nas suas vidas e, consequentemente, isso reflecte-se na sua saúde, sendo nosso dever promovê-las, bem como incentivar os pais a fazê-lo.

 

Infeções urinárias em idade pediátrica no Centro Hospitalar Baixo Vouga – resistências aos antibióticos

 

Marta Machado¹, Rita Lacerda Vidal¹, Ângela Almeida¹, Elmano Ramalheira², Sofia Figueiredo¹, Jorge Vaz Duarte¹, Paula Rocha¹

1 S. Pediatria, CH Baixo Vouga

2 S. Patologia Clínica, CH Baixo Vouga

 

Introdução: As Infeções do Trato Urinário (ITU) em crian­ças exigem um tratamento atempado pelo risco de lesão renal com sequelas a longo prazo. Deve ser direcionado para os agen­tes etiológicos mais frequentes, tendo em conta as resistências antibióticas conhecidas na área geográfica em questão.

Objetivos: Estudar a prevalência das bactérias responsá­veis por ITU diagnosticadas no nosso Serviço, analisar o respe­tivo padrão de suscetibilidade aos diversos antibióticos e, dessa forma, contribuir para o conhecimento das resistências na área de influência do Hospital de modo a propor um tratamento empí­rico inicial com maior probabilidade de eficácia. Comparação dos resultados obtidos com os dados do estudo anterior (relativos ao período 2005-2006).

Materiais e Métodos: Estudo retrospetivo das bactérias identificadas nas ITU diagnosticadas no Serviço de Pediatria do CHBV e respetivos Testes de Suscetibilidade Antibiótica (TSA), durante 2010-2011. Na avaliação do TSA foram excluídas as ITU de crianças sob profilaxia por ter sido verificada a existência de uma diferença estatisticamente significativa relativamente às ITU de crianças sem profilaxia.

Resultados: No período em estudo, foram diagnosticadas 515 ITU. O microrganismo mais frequentemente isolado foi a Es­cherichia coli (79,2%), seguido do Proteus mirabilis (14,7%). No grupo de crianças sem profilaxia, as taxas de sensibilidade dos microrganismos isolados (n=479) foram de: 98,7% para Cefota­xima, 96,6% para Cefuroxime-axetil, 96,2% para Gentamicina, 87,5% para a associação Amoxicilina e Ácido clavulânico, 84% para Nitrofurantoína, 80,5% para Cotrimoxazol e 58,3% para Ampicilina.

Discussão: Comparando com os dados do período 2005­-2006, as resistências à Ampicilina (41,7%) permaneceram ele­vadas, justificando a não utilização da Ampicilina e da Amoxici­lina no tratamento empírico das ITU. As percentagens de resis­tência e sensibilidade intermédia para a associação Amoxicilina e Ácido Clavulânico diminuíram (de 21,1 para 12,5%), pelo que este esquema poderá, eventualmente, ser considerado como opção terapêutica. Face às sensibilidades encontradas neste estudo, e tal como anteriormente, conclui-se que o Cefuroxime e a Gentamicina são boas opções para o tratamento empírico das ITU. A diminuição das resistências verificada para a maioria dos antibióticos em relação ao estudo anterior, reforça a importân­cia da sensibilização que tem sido efetuada na racionalização e prescrição de antibióticos segundo protocolos.

 

Disúria: verdade ou consequência?

 

Maria Inês Monteiro1, Miguel Costa1, Lúcia Gomes1

1 CH Entre Douro e Vouga

 

Introdução: O aumento do limite de idade de atendimento em serviços de urgência (SU) pediátricos confrontou os profis­sionais com situações peculiares da adolescência. As infeções sexualmente transmissíveis (IST) são um destes novos desafios. A idade de início da vida sexual está em mudança assim como as taxas de IST. A pouca procura pelos cuidados médicos e falta de tratamento favorece a disseminação de IST.

Caso Clínico: Sexo masculino, 17 anos, recorreu ao SU por disúria. Referia estar medicado com aciclovir tópico e bri­vudina, por lesão herpética genital, mantendo dor. Sem outras queixas. Restantes antecedentes irrelevantes. O exame objeti­vo revelou várias lesões ulcerosas penianas. Sem exsudados/ corrimento uretral. Sem outras lesões visíveis, nomeadamente na região anal e oral. Na anamnese referiu múltiplos parceiros sexuais, de ambos os sexos, incluindo relações sexuais em grupo. Negava consumos de álcool ou drogas. Coitarca aos 13 anos. Frequentador habitual de bares/discotecas, onde conhecia os parceiros. No SU colheu serologias. Foi medicado com Pe­nicilina G benzatínica, azitromicina, ceftriaxone, aciclovir oral e metronidazol. Efetuado reforço para a necessidade de aderir e concluir o tratamento e explicadas medidas de educação sexual. Resultados analíticos: AgHBs, HCV, HIV, VDRL, Chlamydia trachomatis e Neisseria gonorrhoeae negativos, Herpes 1 IgM +, VDRL positivo. Foi encorajado a comunicar aos parceiros se­xuais do último mês.

Em seguimento em Consulta de Adolescentes e Psicologia. Atualmente sem complicações de IST.

Discussão/Conclusão: Os adolescentes são um grupo de alto risco para as IST e é imperativo fazer o seu diagnóstico precoce de modo a prevenir potenciais complicações e interrom­per a cadeia de transmissão. Há que saber ouvir e encaminhar os apelos que se escondem atrás do motivo evidente que trás o adolescente a um SU. Neste caso a disúria, tão frequente na idade pediátrica, levou a abordagem completamente distinta no adolescente. Chamamos a atenção para a necessidade de exa­me físico completo, incluindo região genital, que se torna ainda mais complexo nesta faixa etária. O atendimento de jovens exige princípios fundamentais, como o sigilo profissional, uma atitude não crítica com avaliação psicossocial importante e reconheci­mento e orientação das necessidades com máxima intervenção a cada oportunidade. Casos como o apresentado representam apenas a ponta do iceberg das IST em Portugal, sendo que a verdadeira taxa de incidência é desconhecida.

 

Criança com vómitos – o que fazem os pais?

 

Catarina Rêgo1, Ana Luísa Leite2

1 USF Nova Via

2 S. Pediatria, CH Vila Nova de Gaia-Espinho

 

Introdução: Os vómitos são um sintoma frequente na crian­ça e, como tal, são um motivo comum de consulta médica. O seu espectro clínico pode ser muito variado, contudo, na maioria das vezes é benigno e enquadrado num quadro de intolerância digestiva leve. Frequentemente o seu tratamento é apenas sin­tomático. A prática clínica demonstra que existem muitas dúvidas sobre a gravidade do quadro e a sua orientação, sendo um sin­toma causador de muita preocupação nos pais.

Objectivos: O objectivo deste estudo foi avaliar os conheci­mentos e atitudes dos pais e/ou cuidadores perante uma criança ou adolescente com vómitos.

Metodologia: Estudo observacional e transversal, com aplicação de um questionário anónimo e voluntário. A amostra de conveniência incluiu pais ou mães de crianças até aos 18 anos que recorreram à consulta de Pediatria no Centro Hospita­lar de Vila Nova de Gaia/Espinho, EPE de 11 de Setembro a 6 de Outubro de 2012. Trataram-se os dados com o software SPSS 18.0®, procedendo-se à análise descritiva dos dados e usando­-se o teste estatístico qui-quadrado para um nível de confiança de 95% e um erro máximo de 5%.

Resultados: Analisaram-se 210 questionários, idade média dos pais foi de 35,7 anos (desvio padrão=6,76), 41,4% desem­pregados, média de 1,72 filhos, a faixa etária do filho mais novo mais representativa é a pré-escolar (2 a 5 anos). Apena 28% distingue corretamente vómitos de náuseas e regurgitação, 80% fazem uma pausa alimentar após o vómito, mas só 41% aguar­da corretamente 30 minutos após o episódio, 5% dá medição e apenas metade considera que vómitos nos recém-nascidos são potencialmente mais graves. A solução de hidratação oral não é dada por rotina, 20% considera que os vómitos não se resolvem de forma natural, 18,1% referem que são o início de uma doença grave e 67,3% recorre nas primeiras horas a um profissional mé­dico. Verificou-se que pais mais novos são o que mais recorrem a um profissional médico, enquanto pais com mais habilitações aguardam mais tempo e não confundem tanto vómitos com náu­seas e regurgitação (p<0,05).

Conclusão: Os pais em geral ficam preocupados com epi­sódios de vómitos nas crianças, confundem os conceitos náuse­as, regurgitação e vómitos e têm atitudes que não são adequa­das. Enquanto profissionais de saúde é importante desmistificar falsas crenças dos pais, esclarecer dúvidas e receios existentes, bem como informar sobre as abordagens e tratamentos mais adequados.

 

Como brincam as nossas crianças?

 

Sofia Ferreira1, Helena Silva2, Andreia Lopes3, Sofia Águeda3, Ana Filipe Almeida3, Fátima Pinto4

1 CH Entre Douro e Vouga

2 CH Porto

3 CH São João

4 Pediatria, US Aníbal Cunha, ACES Porto Ocidental

 

Introdução: Brincar é fundamental para o desenvolvimento cognitivo, físico, social e emocional da criança. No entanto, o tempo para brincar tem vindo a sofrer uma redução, resultante do estilo de vida actual, estrutura familiar, pressão com resulta­dos académicos e oferta de actividades passivas.

Objectivos: Avaliar as actividades de ocupação dos tem­pos livres de crianças em idade pré-escolar, e relação com o desenvolvimento psicomotor (DPM) e o quociente de inteligên­cia (QI).

Métodos: Estudo transversal realizado num Centro de Saú­de Urbano. Foram convocadas 118 crianças, sendo aplicado um questionário aos pais e avaliado o DPM com a escala Schedule of Growing Skills II (SGSII) e o QI com o teste do Desenho da Figura Humana de Goodenough.

Resultados: Incluídas 67/118 crianças: 61,2% do sexo feminino, idade média 53,7 ± 2,9 meses. Todos os pais consi­deraram a brincadeira livre importante. Brincavam com os filhos 1,7±1,1 h durante a semana, 4,5±2,9 h ao fim de semana. Liam aos filhos diariamente 54,7% [início mais precoce associado a maior escolaridade materna (p<0,05)]. Viam televisão diariamen­te 67,7% das crianças, ocupando 1,8±1 h/dia, e 58% jogavam consola/computador 2-4 vezes/semana. Praticavam actividades ao ar livre semanalmente 85,1%. Metade frequentava activida­des extracurriculares.

Apresentaram ≥ 1 desvio padrão na SGSII 19,4%. O QI foi normal em 67,1% e superior em 31,3%. Verificou-se uma as­sociação significativa (p<0,05) entre algumas actividades e um melhor score em áreas específicas da SGSII: a leitura na área da audição/linguagem, as actividades ao ar livre na área da lo­comoção, as actividades extracurriculares nas áreas da audição/ linguagem e manipulação, a expressão plástica/motricidade fina nas áreas da manipulação, fala/linguagem e cognição.

Conclusão: Apesar do possível condicionamento das res­postas resultante do facto de o questionário não ser anónimo, os pais parecem ter noção da importância do brincar, brincam frequentemente com os filhos e as actividades praticadas são adequadas. No entanto, as actividades de ecrã assumem já uma dimensão preocupante nesta faixa etária. Observa-se uma re­lação entre algumas actividades e um melhor desempenho na SGSII e no QI, embora a maioria dos resultados não seja esta­tisticamente significativa, o que pode estar relacionado com o tamanho reduzido da amostra e/ou com os resultados uniforme­mente bons do DPM e QI.

 

Quando não se encontra a causa…

 

Joana Correia1, Conceição Silva2, Sandra Ramos2, Joaquim Silva Pereira2, Maria José Dinis2

1 CH Porto

2 CH Póvoa de Varzim-Vila do Conde

 

Introdução: A febre de origem indeterminada (FOI) define-se como febre que persiste após 3 semanas de evolu­ção ou após uma semana de internamento. Em idade pediátri­ca as principais etiologias são infeciosas, reumatológicas ou neoplásicas. Em alguns casos, o diagnóstico etiológico não é estabelecido.

Caso clínico: Criança de 3 anos, sexo feminino, previa­mente saudável. Plano de vacinação atualizado, sem vacinas extra-calendário. Residente em ambiente rural, sem saneamento básico; uso de água de poço para cozinhar e higiene. Contacto com cães e aves. Antecedentes de internamento por gastroen­terite um mês antes, mantendo desde então queixas de dor ab­dominal ligeira. Internada por febre elevada com 4 dias de evolu­ção. Estudo analítico com anemia microcítica, sem leucocitose e PCR elevada (8,44mg/dl). Radiografia do tórax normal. Em D2, com hemocultura e urocultura negativas, repete estudo analíti­co, que mostra elevação da PCR (25,97mg/dl); inicia tratamen­to empírico com ceftriaxone, sem resolução do quadro. Na pri­meira semana de internamento, referência a dor abdominal por vezes intensa, associada a elevação das transaminases (3x). A ecografia abdominal revelou nódulo esplénico, compatível com malformação artério-venosa na RMN. Durante o internamento manteve febre elevada, razoável estado geral e recusa alimentar parcial, sem perda ponderal. Manteve elevação dos parâmetros de inflamação, inclusive da VS (máximo 112mm/1ªh). Em D14 de internamento apresentava trombocitose, com resolução da citólise hepática. Da investigação realizada para esclarecimento etiológico: exames culturais (sangue, urina, fezes e LCR) negati­vos. Prova tuberculínica anérgica e PCR M. tuberculosis no suco gástrico negativa. Marcadores víricos, serologias, imunoglobuli­nas séricas, complemento, fator reumatoide, ANA, ANCA, ECA, anti-dsDNA sem alterações. Ecocardiograma e ECG normais. Observação por Oftalmologia sem sinais de inflamação ocular. Medulograma sem alterações, com exames culturais da medula óssea negativos. Ficou apirética em D25 de internamento, com melhoria do estado geral e sem queixas.

Discussão: Frequentemente, a FOI resulta de uma apre­sentação atípica de patologias comuns. Em muitos casos, a febre remite sem deixar sequelas, e sem que o diagnóstico definitivo seja estabelecido. Este tipo de situação traz grande an­siedade aos familiares e ao clínico, que na angústia de procurar uma etiologia, vai progredindo na investigação, por vezes de forma invasiva.

 

Transmissão mãe-filho da infecção VIH: quando as serologias na gravidez são negativas...

 

Nádia Guimarães1, Carla Teixeira1, Isabel Cunha1, Eurico Gaspar1, Laura Marques1

1 U Infecciologia Pediátrica e Imunodeficiências, S. Pediatria, CH Porto

 

Introdução: A transmissão mãe-filho da infeção pelo Ví­rus da Imunodeficiência Humana (VIH) tem vindo a ser reduzida devido ao rastreio universal das grávidas, à instituição de tera­pêutica antiretrovírica na gestação e de medidas profiláticas peri­-parto à grávida e ao recém-nascido associadas à evicção do aleitamento materno. Com as novas medidas instituídas a taxa de transmissão mãe-filho desta infecção tem apresentado valo­res inferiores a 2% em Portugal. No entanto, pode ocorrer trans­missão desta infecção não detectada no rastreio pré e peri-natal. Os autores apresentam dois casos ilustrativos desta situação.

Casos clínicos:

Caso 1: Criança com 9 anos de idade, nascido por parto eutócico às 36 semanas de gestação. As serologias para o VIH foram negativas durante a gestação e no parto. Foi amamentado até aos 3 anos de idade. Em 2006 foi efetuado diagnóstico de infeção VIH 1 à mãe e, posteriormente, ao pai que era usuário de drogas endovenosas. Em 2011 desenvolve uma escabiose com lesões extensas e múltiplas, refractária à terapêutica. Foi efectu­ado estudo analítico e diagnosticada trombocitopenia persistente (83 000 plaquetas/mm3). A serologia do VIH1 foi positiva, confir­mada por Western-blot em 2 amostras. A carga vírica era 170 000 cópias/ml e os linfócitos T CD4+ estavam muito diminuídos (56/ mm3). De acordo com a classificação do CDC encontrava-se no estádio B3. Iniciou terapêutica anti-retrovírica combinada (TARc) e profilaxia com Cotrimoxazol, com boa evolução clínica e ana­lítica posterior. Caso 2: Criança com 6 anos de idade, nascido por parto eutócico de gestação de termo. As serologias maternas para o VIH eram negativas no 1º e 3º trimestre da gestação. Amamentado até aos 2 anos de idade. Diagnóstico de infecção pelo VIH1 no companheiro da mãe em contexto de estudo pré­operatório de cirurgia ortopédica, em 2012. Efectuado estudo à mãe e à criança, confirmando-se infecção VIH1 em ambos. Apresentava hipertrofia parotídea bilateral, hepatoesplenomega­lia e pneumonia intersticial linfóide, uma carga vírica de 526 000 cópias/ml e 232 linfócitos T CD4+/mm3. Iniciou TARc com boa evolução clínica e analítica posterior.

Discussão: É importante não esquecer a infecção pelo VIH no diagnóstico diferencial de qualquer criança que apresente sin­tomas ou sinais de imunodeficiência, mesmo que as serologias maternas tenham sido negativas na gestação ou no parto. Pode ocorrer infeção materna durante a gestação e a grávida estar em período- janela, com serologias que ainda não positivaram. Por outro lado, pode ocorrer infeção materna no período pós-natal com transmissão do vírus ao filho através do leite materno.

 

Síndrome neurolética maligna - caso clínico

 

Marta Rios1, Diana Gonzaga2, Inês Carrilho3, Céu Mota1, Paula Rocha1, Paula Ferreira1

1 S. Cuidados Intensivos Pediátricos, CH Porto

2 S. Pediatria, CH Porto

3 S. Neuropediatria, CH Porto

 

Introdução: A síndrome neurolética maligna (SNM) pode surgir em 0,02-3% dos doentes tratados com neuroléticos e caracteriza-se por alterações do comportamento, hipertermia, rigidez muscular e disautomonia. Habitualmente, surge durante as primeiras 2 semanas de tratamento, mas pode ocorrer após uma única toma ou após tratamento prolongado.

Caso clínico: Adolescente, sexo feminino, 16 anos, com delírios persecutórios desde há 2 meses, internada no Departa­mento de Pedopsiquiatria por agitação psicomotora grave. Me­dicada com decanoato de haldol e diazepam e posteriormente com olanzapina e risperidona. Ao 4º dia de internamento, apa­recimento de febre e rigidez muscular, mantendo períodos de agitação. O estudo analítico revelou elevação da CK (3756 UI/L), da DHL (533 UI/L) e das transaminases (TGO 142 UI/L, TGP 93 UI/L); hemograma, PCR, ionograma e função tiroideia normais, marcadores víricos e VDRL negativos. Transferida para o nosso serviço em D8 por suspeita de SNM. Para exclusão de outros diagnósticos (encefalite infeciosa/parainfeciosa ou autoimune, encefalopatia metabólica, lesões do SNC), efetuou o seguinte estudo: TC e RM cerebrais sem alterações; exame citoquímico, bacteriológico e virológico do LCR normais; pesquisa de bandas oligoclonais no LCR negativa; PCR Mycoplasma pneumoniae no LCR e anticorpos anti-NMDA no soro e no LCR em curso; es­tudo imunológico, equilíbrio ácido-base, amónia e ceruplasmina séricas e cobre urinário normais. Para além da suspensão dos neuroléticos, foi instituída terapêutica de suporte (medidas de ar­refecimento, midazolam, hiperhidratação, alcalinização da urina e enoxparina profilática) e terapêutica específica com bromocriptina. Manteve alterações do comportamento, rigidez muscular e hipertermia durante 2 dias, e apresentou HTA e taquicardia. Constatou-se diminuição das transaminases e da CK, tendo sido transferida para o hospital de origem ao 4º dia.

Comentários: O diagnóstico de SNM deve ser equaciona­do sempre que surjam pelo menos 2 dos 4 sinais que a caracteri­zam. Neste caso, a febre foi o principal indicador do diagnóstico, entretanto suportado pela rigidez muscular, valores de CK supe­riores a 1000 UI/L e exclusão de outras causas. O diagnóstico precoce, com suspensão dos fármacos implicados, monitoriza­ção, prevenção e tratamento das complicações e, nos casos mais graves, terapêutica com agonistas dopaminérgicos como a bromocriptina, são fundamentais para a evolução favorável des­te quadro potencialmente fatal.

 

Meningite recorrente: simples coincidência ou algo mais?

 

Maria João Vieira1, Sérgio Caselhos2, Joana Magalhães1, Ana Luísa Lobo1

1Serviço de Pediatria – CHAA – Unidade de Guimarães

2Serviço de Otorrinolaringologia – CHAA – Unidade de Guimarães

 

Introdução: A meningite recorrente é uma situação rara e potencialmente grave, com uma incidência estimada entre 1,3% a 9,3%. A sua presença implica a investigação de possíveis fato­res predisponentes, como defeitos anatómicos ou imunológicos.

Caso clínico: Criança do sexo feminino internada aos sete anos por meningite pneumocócica, sem complicações. Sem an­tecedentes de traumatismos crânio-encefálicos, cirurgias, infe­ções recorrentes ou doenças heredofamiliares.

Aos dez anos recorre ao Serviço de Urgência com um qua­dro de febre, cefaleia frontal com fotofobia, diminuição da acui­dade visual e vómitos com doze horas de evolução. Ao exame físico apresentava-se com discurso incoerente, fotofobia intensa e sinais meníngeos positivos.

Foi requisitada uma TAC crânio-encefálica que excluiu al­terações do parênquima encefálico, mostrando no entanto sinais de sinusite fronto-etmoidal esquerda e maxilar direita.

Realizou punção lombar, com saída de líquor turvo, estudo citoquímico compatível com meningite bacteriana e antigénios capsulares do pneumococo positivos, tendo de imediato iniciado antibioterapia.

No decurso da investigação da meningite recorrente efe­tuou um estudo imunológico que não revelou alterações.

Foi pedida a colaboração de otorrinolaringologia, tendo sido identificada no exame físico uma neoformação polipóide na fossa nasal esquerda associada a rinorreia mucopurulenta ipsilateral.

Realizou uma TAC dos seios perinasais que confirmou a neoformação de tecidos moles na fossa nasal esquerda, cuja RMN mostrou tratar-se de um meningocelo.

Cinco meses após a segunda meningite foi submetida a mi­crocirurgia nasal com correção de meningocelo, mantendo-se assintomática até ao momento (cinco meses pós-cirurgia).

Conclusões: A meningite recorrente pode ter como base várias patologias. Neste caso, o compromisso das leptomenin­ges constituiu uma porta de entrada de microorganismos (S. pneumoniae) da cavidade nasal para o líquor, favorecendo a ocorrência de meningites de repetição. Os exames de imagem permitiram a identificação desta alteração anatómica e conse­quente correção cirúrgica.

 

Hiperplasia supra-renal congénita por deficiência de 21-hidroxilase: correlação genótipo-fenótipo

 

Inês Vaz Matos1, Luís Ribeiro1, Ana Novo1, Maria João Oliveira1, Helena Cardoso1, Teresa Borges1

1 U. Endocrinologia Pediátrica, CH Porto

 

Introdução: A hiperplasia supra-renal congénita (HSRC) por deficiência de 21-hidroxilase (21-OHD) é uma doença autos­sómica recessiva comum. É causada por diversas mutações no gene CYP21A2 e na maioria dos casos a gravidade da doença correlaciona-se com a sua variação alélica.

Objectivo: Descrever o espectro mutacional do gene CYP21A2 e avaliar a correlação genótipo-fenótipo nos pacientes com 21-OHD seguidos na Unidade de Endocrinologia Pediátrica do Centro Hospitalar do Porto.

População e métodos: O estudo molecular do gene CYP21A2 foi efectuado em 23 pacientes com critérios clínicos e laboratoriais de 21-OHD. Várias técnicas de genotipagem foram utilizadas.

Resultados: Foram estudados 23 pacientes não relacio­nados: 4 perdedores de sal, 8 virilizantes simples e 11 com a forma não clássica da doença. Todos apresentavam mutações do gene CYP21A2. Sete (30,4%) eram homozigotos, 12 hetero­zigotos compostos (52,2%) e 4 heterozigotos para uma mutação (17,4%). As mutações mais frequentes foram: V281L (37,8%), I172N (17,8%), I2 splicing (13,3%), Q318X (11,1%) e delecções/ conversões do CYP21A2 (6,7%). A taxa de concordância global entre genótipo e fenótipo foi de 73,9%, sendo total no fenótipo perdedor de sal.

Conclusão: A frequência relativa dos defeitos genéticos encontrados na nossa amostra difere de outros estudos portu­gueses, provavelmente devido ao menor tamanho da amostra e à utilização de técnicas de genotipagem diferentes. Na maioria dos casos verificou-se uma boa correlação genótipo-fenótipo, o que reforça a importância do estudo molecular do CYP21A2 na predição da gravidade da doença e no aconselhamento genético e pré-natal. As discrepâncias podem ser explicadas por novas mutações, genotipagem incompleta, heterozigotia composta para duas ou mais mutações e outras variações genéticas na biossíntese ou na sensibilidade aos androgénios.

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