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Nascer e Crescer

versão impressa ISSN 0872-0754

Nascer e Crescer vol.21 no.3 Porto set. 2012

 

Período neonatal

 

Ana Margarida Alexandrino1

1 Maternidade Júlio Dinis, CH Porto

 

RCIU define-se como a taxa de velocidade de crescimen­to inferior ao normal para o potencial de crescimento do feto, para uma determinada idade gestacional. Como consequência resulta daí o nascimento de um recém-nascido leve para a idade gestacional (LIG) isto é um recém-nascido com peso inferior ao percentil 10 para aquela idade gestacional. A definição de LIG não diferencia entre os LIG constitucionais, que alguns autores referem rondar os 70%, os LIG com RCIU e os AIG com RCIU. Daqui a importância do índice ponderal e da relação perímetro braquial/ perímetro craniano para diferenciar, caracterizar qua­litativa e quantitativamente estas situações. Os marcadores de RCIU são então: o diagnóstico prénatal de RCIU, peso ao nas­cer <percentil 10 (LIG) e índice ponderal <percentil 10. Algumas séries chamam a atenção para o facto de “… approximately one third of antenatally diagnosed IUGR is not correct…” e de “… only when the antenatal diagnosis of IUGR was confirmed by a neonatal birth weight less than the 10th percentile was there a correlation with adverse outcome.”

A insuficiência placentar compromete a transferência de nu­trientes, tais como aminoácidos essenciais (ex. leucina), cálcio e fósforo, podendo acompanhar-se de catabolismo proteico na unidade feto-placentar e coexistir com alterações dos estados de oxigenação e ácido-base. Dá-se a redistribuição do fluxo para o SNC com diminuição do fluxo para o pâncreas, fígado, tubo digestivo, rins, tecido hematopoiético. A composição corporal é alterada com diminuição da massa gorda total, da massa mus­cular e do conteúdo mineral ósseo; diminuição do glicogénio no fígado e no músculo esquelético. A malnutrição fetal condiciona uma nova programação estrutural e funcional que é causa de elevada mortalidade e morbilidade a curto, médio e longo prazo.

Os RN com RCIU não são todos iguais pois os factores determinantes são múltiplos e condicionam graus de RCIU va­riados e com diferentes prognósticos. A hipertensão materna pré-gestacional e as formas mais graves de HTA induzida pela gravidez associam-se a RCIU mais grave com consequente pre­maturidade. O tabagismo > 10 cigarros/dia, a baixa estatura, o IMC baixo e o baixo ganho ponderal estão mais vezes ligados a RCIU de termo.

A prematuridade é uma das consequências da RCIU e a incidência dos LIG aumenta com a idade gestacional mais baixa; está descrito que constitui 10% dos RN de termo nos países desenvolvidos e cerca de 20% dos RN MBP (muito baixo peso). Num estudo da Maternidade Júlio Dinis com análise dos RN LIG entre 2000 e 2004 (n=406), 106 casos eram MBP cons­tituindo 20% do total MBP desse período, confirmando-se pois os dados da literatura. Nesse mesmo estudo foram procuradas correlações entre os diferentes factores de risco de RCIU iden­tificados e o prognóstico: muito baixo peso e imaturidade foram factores determinantes para a mortalidade; muito baixo peso, a idade gestacional <32 semanas, a hipertensão materna crónica, multiparidade e doença genética tiveram forte correlação com a morbilidade.

As análises que estabelecem a associação de RCIU com menor mortalidade e menor morbilidade (justificadas com base na maturação acelerada pelo stress) fazem-no num determinado grupo de peso. É fundamental a análise por semana de idade gestacional e com amostras suficientemente grandes em cada semana. Estudo com 2 milhões de nascimentos, mostrou morta­lidade fetal, neonatal e perinatal dos LIG termo, com pesos entre 1500 a 2500g, 20-30 vezes superior à dos AIG. E quando o peso era inferior a 1500g a mortalidade era 70-100 vezes superior. Outro estudo mostrou que a mortalidade dos LIG aumenta com a descida da idade gestacional (factor imaturidade) e com a des­cida dos percentis de peso (gravidade da RCIU). Abaixo do per­centil 6 a mortalidade sobe a pique. Finalmente um estudo com amostra de 29916 RN prétermo com RCIU, (Thomas J. Garite, MD Reese C, James A. Intrauterine growth restriction increases morbidity and mortality among premature neonates. American Journal of Obstetrics and Gynecology, 2004), conclui que a RCIU está associada a morbilidade e mortalidade aumentadas nos RN prétermo.

As características clínicas dos recém-nascidos com RCIU são bastante impressivas: pele fina, laxa e seca; diminuição marcada do tecido e da gordura subcutâneos e atrofia das massas musculares; crânio anormalmente desproporcionado; face chupada, afilada de “de bruxinha”; cordão umbilical é frequentemen­te fino e a impregnação meconial não é rara. Os critérios físicos de cálculo da idade gestacional estão alterados e tornam-se pou­co fidedignos: a diminuição de vérnix leva a maior exposição ao líquido amniótico pelo que a pele é mais pregueada (exemplo - as plantas dos pés com pregas bem visíveis); botão mamário menos visível, genitais femininos menos maduros e cartilagem dos pavilhões auriculares reduzida. Os critérios neurológicos pelo contrário são fidedignos desde que não haja lesões neurológicas.

As complicações e morbilidade são variadas a começar pela própria prematuridade em si. Num estudo com 20000 RN MBP, de idade gestacional <30 semanas, os LIG tiveram taxas mais elevadas de mortalidade, enterocolite necrotizante, SDR e retinopatia da prematuridade. Outro estudo multicentrico euro­peu com RN 24-31 semanas mostrou que a displasia bronco-pulmonar aumentou com a descida do percentil de peso; mas que não houve associação da descida do percentil do peso com a leucomalacia periventricular e a hemorragia intraventricular mais grave. Além daquelas complicações são mais frequentes a termorregulação diminuída, a hipoglicemia, a hipocalcemia, os defeitos cardíacos congénitos, a policetemia, a trombocitopenia, a neutropenia e a função imunológica alterada. Nos RCIU de termo são de esperar mais situações de síndrome de aspiração meconial, asfixia perinatal e hipertensão pulmonar persistente.

A programação do nascimento destas crianças num centro perinatal é fundamental. A etiologia se ainda não está esclarecida, deve continuar a ser investigada tendo especial atenção para as cromossomopatias, malformações e infecções congénitas. A antecipação dos problemas que são mais frequentes é impor­tante para uma intervenção mais atempada e eficaz. O suporte nutricional é crucial e deve incluir não só alimentação parenteral desde as primeiras horas de vida como também alimentação en­teral trófica a iniciar nos primeiros dias de vida.

A avaliação da equipa de perinatologia é crucial para es­timar a probabilidade de sobrevida e a antecipação de morbili­dades graves futuras que podem ajudar os neonatologistas na tomada de decisões terapêuticas e na agressividade do suporte a instituir, sendo estas decisões mais prementes e críticas nas idades gestacionais mais próximas do limite da viabilidade.

 

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