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Revista Portuguesa de Imunoalergologia

Print version ISSN 0871-9721

Rev Port Imunoalergologia vol.25 no.4 Lisboa Dec. 2017

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Impacto do diagnóstico de alergia a fármacos

Impact of drug allergy diagnosis

 

Bernardo Sousa‑Pinto1,2,3, Ana Margarida Pereira3,4, João Almeida Fonseca1,3,4

1 MEDCIDS – Departamento de Medicina Comunitária, Informação e Decisão em Saúde, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

2 Serviço e Laboratório de Imunologia, Unidade de Imunologia Básica e Clínica, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

3 CINTESIS – Centro de Investigação e Tecnologias e Serviços de Saúde, Porto

4 Allergy Unit, Instituto CUF, Porto

 

Contacto

 

RESUMO

O sobrediagnóstico de alergia a fármacos é um fenómeno que se observa para várias classes de medicamentos. Tal poder‑se‑a dever, pelo menos parcialmente, às dificuldades de proceder a um diagnóstico diferencial com outras condições com apresentações clínicas semelhantes (como exantemas infeciosos), bem como à parca execução de testes confirmatórios. Não obstante, a atribuição de um diagnóstico de alergia a fármacos não é inócua – estudos recentes têm evidenciado que esta se associa a piores outcomesclínicos e a um impacto negativo sob o ponto de vista económico e dos sistemas de saúde. Nesse sentido, este estudo tem por objetivo discutir os achados mais relevantes relativos ao impacto clínico e económico da atribuição do diagnóstico de alergia a fármacos, tendo em consideração algumas das mais importantes classes medicamentosas.

Palavras-chave: Alergia a fármacos, avaliação do impacto em saúde, custo‑efectividade, diagnóstico, hipersensibilidade a fármacos.

 

ABSTRACT

Drug allergy overdiagnosis is a frequently reported phenomenon for multiple drug classes. It might be, at least partially, due to difficulties in performing a diffferential diagnosis with other conditions with similar clinical presentations (such as infectious exanthemas), and also due to a insufficiency in performing confirmatory tests. Nevertheless, labelling a patient as having a “drug allergy” is not innocuous – recent studies have shown that this label associates with worse clinical outcomes and with a negative economic impact on health systems. Therefore, this study aims to discuss the most relevant findings regarding the clinical and economic impacts of “drug allergy” label, taking into account some of the most important drug classes.

Keywords: Cost‑effectiveness, diagnosis, drug allergy, drug hypersensitivity, health impact assessment.

 

INTRODUÇÃO

As reações alérgicas a fármacos caracterizam‑se por uma elevada diversidade clínica e de gravidade.

De facto, estas reações podem ser de tal modo graves que os fármacos constituem uma das causas mais comuns de mortes relacionadas com anafilaxia1.

Nesse sentido, revela‑se fundamental identificar os indivíduos alérgicos a medicamentos. Não obstante, proceder a um correto diagnóstico de alergia a fármacos nem sempre é fácil – para além da história clínica (que, isoladamente, pode resultar em fenómenos de sobre ou subdiagnóstico), deverão ser tidos em conta os resultados de testes cutâneos, de testes de IgE específicas, e/ou de provocação (nos casos em que se encontram disponíveis)2. Estes testes, contudo, não são isentos de limitações – os testes cutâneos evidenciam baixa sensibilidade para reações alérgicas não imediatas, enquanto os testes de provocação são demorados, necessitam de experiência e encontram‑se contraindicados em algumas situações (e.g.: perante história prévia de síndrome de Stevens‑Johnson/necrose epidérmica tóxica)2. Por outro lado, embora existam muitos testes in vitro, a maioria carece de evidência científica suficiente para validar o seu uso generalizado na prática clínica2.

A importância de um correto diagnóstico de alergia a fármacos tem sido discutida em vários estudos recentes, os quais descrevem importantes implicações clínicas e económicas resultantes de um diagnóstico incorreto e, sobretudo, do fenómeno de sobrediagnóstico. Um dos primeiros destes estudos observou que a confirmação do diagnóstico só ocorria em 37 % dos doentes que tinham sido considerados alérgicos a medicamentos, sendo essa proporção inferior a 25 % quando considerados apenas os doentes com registo de hipersensibilidade aos anti‑inflamatorios não esteroides (AINE)3. Este estudo mostrou ainda que a necessidade de uso de medicamentos alternativos associava‑se a um aumento de quatro vezes nos custos dos tratamentos3. Em Portugal, não existem ainda muitos estudos que avaliem a frequência ou o impacto do sobrediagnóstico de alergia a fármacos; no entanto, o sobrediagnóstico foi já bem documentado num estudo realizado em crianças, no qual em apenas 5 % das crianças em que era referida alergia a fármacos o diagnóstico se confirmou após estudo completo4.

Neste texto, procuramos abordar alguns dos achados mais relevantes sobre o impacto de um diagnóstico correto de alergia a fármacos, os quais sumariamos no Quadro I

PENICILINAS

Sobrediagnóstico

A “alergia às penicilinas” encontra‑se sobrediagnosticada. O impacto deste fenómeno de sobrediagnóstico resulta não só do facto de os β‑lactamicos constituírem dos antibióticos mais frequentemente prescritos, mas também da elevada prevalência de indivíduos que reportam ter sido “diagnosticados” com alergia a esta classe de fármacos – estima‑se que cerca de 8 % da população norte‑americana reporte alergia às penicilinas5; entre os doentes hospitalizados, essa percentagem é aproximadamente o dobro6. Não obstante, num estudo recente executado numa Unidade de Alergia a Fármacos, verificou‑se confirmação (por testes cutâneos ou de provocação) da suspeita de alergia às penicilinas em apenas 29 % dos doentes referenciados7. Em contextos menos específicos, essa percentagem parece ser ainda inferior – de acordo com uma revisão sistemática e meta‑analise recente (baseada maioritariamente em estudos norte‑americanos e europeus), apenas cerca de 3% dos doentes com registo de reações adversas às penicilinas evidenciam reações imediatas confirmadas por testes cutâneos ou de provocação, sendo esse valor inferior a 2 % quando se considera apenas a população pediátrica8. O sobrediagnóstico de alergia às penicilinas é particularmente evidente nas crianças devido ao facto de (1) na população pediátrica o diagnóstico de alergia às penicilinas se basear frequentemente apenas na história clínica, e de (2) fenómenos aparentemente alérgicos traduzirem muitas vezes apenas manifestações de exantema vírico8,9.

Um outro fator que contribui para este fenómeno de sobrediagnóstico prende‑se com a possibilidade de “perda” de sensibilização às penicilinas com o passar do tempo.

De facto, um estudo prospetivo executado por Blanca et al verificou que menos de metade dos doentes com reações imediatas às penicilinas (confirmadas por testes cutâneos) mantinha testes cutâneos positivos ao fim de cinco anos10. Os autores verificaram ainda que a “negativação” dos testes cutâneos ocorreu mais rapidamente para os doentes que apenas apresentavam sensibilização à amoxicilina10. Este fenómeno de “perda” de sensibilização verifica‑se também quando a alergia às penicilinas é diagnosticada por testes in vitro, com mais de metade dos doentes a registar “negativações” do teste de determinação de IgE específicas e do teste de ativação basofílica11.

Assim, em doentes que reportem alergia às penicilinas é fundamental obter uma história clínica estruturada (de acordo com um estudo realizado por Li et al, este procedimento isoladamente possibilitou uma redução de 40 % do número de suspeitas de alergia às penicilinas em doentes internados12), que, exceto nas raras situações de choque anafilático ou de outras reações potencialmente fatais, deverá ser complementada por testes de confirmação, nomeadamente testes cutâneos baseados nos níveis de IgE específicas, ou de provocação oral – tal permite evitar ou retirar a atribuição desse “diagnóstico” em cerca de 90 % dos casos13.

De referir ainda que o registo de alergia às penicilinas é frequentemente incompleto, pouco detalhado e inconsistente; ou seja, para um mesmo doente, diferentes médicos tendem a registar a alergia às penicilinas de modo bastante heterogéneo, podendo inclusive não proceder a esse registo14.

Impacto nos doentes internados

O impacto da atribuição do diagnóstico de “alergia às penicilinas” tem sido alvo de vários estudos recentes, na sua maioria norte‑americanos.

A título de exemplo, um estudo de coorte retrospetivo norte‑americano mostrou que, em doentes internados, a atribuição do diagnóstico de alergia às penicilinas associa‑se a um maior uso de antibióticos de segunda linha e, por conseguinte, a um aumento significativo do risco de infeções por agentes multirresistentes (incluindo Staphylococcus aureus resistentes à meticilina e Enterococcus resistentes à vancomicina) e Clostridium difficile15. Um estudo de coorte prospectivo holandês corroborou estes resultados no que diz respeito ao uso de antibióticos alternativos, tendo ainda encontrado uma maior taxa de reinternamentos nos doentes com registo de alergia às penicilinas16. Não obstante, este último estudo não encontrou diferenças significativas de tempo de internamento entre os indivíduos com e sem registo de alergia às penicilinas.

Um estudo de coorte retrospetivo comparou dois grupos de doentes com bacteriemia por bacilos Gram negativos e história médica passada de alergia aos β‑lactamicos – (1) doentes que, não obstante este registo, tinham recebido estes antibióticos (os quais, nos Estados Unidos, constituem a opção de primeira linha para tratamento empírico deste tipo de infeções), e (2) doentes nos quais apenas se tinha procedido ao uso de antibióticos alternativos6. Os autores observaram que a falência da terapêutica instituída foi mais frequente neste último grupo6. Note‑se ainda que apenas 3 % dos doentes experienciaram uma reação de hipersensibilidade no decurso da antibioterapia, mas tal não se associou a um aumento significativo do tempo de internamento ou da mortalidade6.

Esta informação complementa a de um outro estudo, no qual doentes com registo de alergia às penicilinas requerendo antibioterapia foram submetidos a testes de confirmação diagnóstica (testes cutâneos e de provocação oral) durante o internamento – tal procedimento possibilitou que 76 % (n=37) dos doentes em estudo passassem a receber β‑lactamicos, o que resultou numa poupança global de 11005 dólares americanos (297 dólares por doente)17.

De facto, o sobrediagnóstico de alergia às penicilinas associa‑se a um aumento dos custos económicos hospitalares15 – um estudo britânico constatou que, em doentes identificados como alérgicos às penicilinas, os custos dos antibióticos prescritos eram entre 1,8 e 2,6 vezes superiores aos que seriam registados caso fossem usados os antibióticos de primeira linha12. Adicionalmente, o estudo norte‑americano referido estimou que os custos acrescidos dos internamentos em doentes com registo de alergia às penicilinas são 9,5 vezes superiores ao que seria registado caso esses doentes tivessem sido submetidos a confirmação do diagnóstico de alergia15.

Os dados citados dizem respeito a estudos realizados na população geral ou em adultos. Contudo, esta realidade parece ser similar nas crianças. De acordo com dados preliminares de um estudo de hospitalizações pediátricas portuguesas, o registo de alergia às penicilinas associa‑se a internamentos mais longos e com custos económicos tendencialmente superiores18.

As mensagens principais relativas ao impacto do diagnóstico de alergia às penicilinas encontram‑se sumariadas no Quadro 2A.

AGENTES INTRAE PERIOPERATÓRIOS

As reações anafiláticas intra e perioperatórias são relativamente raras, com uma incidência que varia entre 1:6000 e 1:200 0019. Os antibióticos constituem uma das principais causas de anafilaxia perioperatória – um estudo norte‑americano levado a cabo num hospital terciário constatou que os antibióticos representam os agentes mais frequentemente responsáveis por reações anafilácticas no período perioperatório, enquanto os bloqueadores neuromusculares representaram apenas cerca de 11 % das reações19. Por sua vez, de acordo com estudos multicêntricos franceses, os bloqueadores neuromusculares são a principal causa (60 %) de reações anafiláticas ocorridas em contexto de anestesia geral20. Em Portugal, num estudo retrospetivo de doentes referenciados por suspeita de reações adversas no peri‑operatorio, os bloqueadores neuromusculares também foram identificados como principais agentes causais (63 %) de reações anafiláticas, seguidos do látex (19 %)21. Assim, as reações anafilácticas perioperatórias devem ser estudadas através de testes cutâneos e/ou, quando possível, prova de provocação ou determinação de IgE específicas (disponíveis para os bloqueadores neuromusculares2). Perante identificação de um agente perioperatório como agente causal, devem ser também estudados (para além dos agentes administrados) outros bloqueadores neuromusculares e anestésicos intravenosos de uso comum22. Tal permite uma melhor decisão na opção por anestésicos alternativos, de modo a evitar a recorrência de reações20.

A alergia aos anestésicos locais encontra‑se também sobrediagnosticada, o que potencia riscos de (1) exposição dos doentes a intervenções dolorosas, e (2) recurso desnecessário a anestesia geral (o que acarreta maior consumo de recursos hospitalares)23. Um estudo norueguês encontrou que, dos doentes avaliados com registo de alergia aos anestésicos locais, apenas 2% evidenciavam um correto diagnóstico, enquanto 7 manifestavam alergia a outras substâncias, tais como o látex ou a clorhexidina23. No Quadro 2B encontram‑se sumariadas as principais conclusões relativas ao sobrediagnóstico de alergia aos anestésicos.

ANTI‑INFLAMATORIOS NÃO ESTEROIDES

Os AINE são a segunda classe de fármacos com maior frequência de reações de hipersensibilidade24. A prevalência de indivíduos da população geral que reporta hipersensibilidade aos AINE pode atingir cerca de 6 %24, embora a proporção de indivíduos com diagnóstico confirmado por testes de provocação seja bastante inferior – um estudo português verificou confirmação da hipersensibilidade aos AINE em apenas 8 % das crianças referenciadas a uma consulta de alergologia por essa suspeita25, enquanto um estudo turco similar encontrou taxas de confirmação rondando os 20 %26.

É de prever que, em doentes que reportem hipersensibilidade aos AINE “clássicos”, se verifique um maior uso de inibidores seletivos da ciclo‑oxigenase2 que, embora tendencialmente bem tolerados, têm um custo superior27,28.

Não obstante, o impacto nos serviços de saúde do sobrediagnóstico de hipersensibilidade aos AINE permanece pouco estudado. As suspeitas de que esse impacto possa ser elevado prendem‑se, em parte, com os resultados de estudos relativos à doença respiratória exacerbada pela aspirina (AERD), a qual representa cerca de 20 % da asma nos adultos29. Esta condição cursa com rinossinusite crónica com polipose nasal, responsável por uma perda média de 4,8 dias de trabalho por ano e por custos económicos anuais que rondam os 1539 dólares americanos por doente – estes custos são resultado de um uso aumentado dos serviços de saúde, do impacto da medicação e de custos superiores no período perioperatório30.

Em doentes requerendo profilaxia antiplaquetária para prevenção secundária de eventos cardiovasculares, a presença de hipersensibilidade aos AINE pode motivar a utilização de antiplaquetários alternativos ou, especialmente quando há indicação para dupla antiagregação plaquetária, o recurso a protocolos de dessensibilização.

Quando é possível optar, um estudo de custo‑efetividade norte‑americano concluiu que a dessensibilização é mais custo‑efectiva que o uso de clopidogrel em doentes com AERD29.

No Quadro 2C encontram‑se as principais mensagens relativas ao sobrediagnóstico de hipersensibilidade aos AINE e respetivo impacto.

QUIMIOTERÁPICOS

As reações de hipersensibilidade aos quimioterápicos são relativamente comuns e clinicamente heterogéneas, podendo resultar da exposição a quase qualquer agente31.

Estas reações ainda se encontram mal compreendidas, de tal modo que, de acordo com alguns autores, muitas das reações idiossincráticas aos quimioterápicos traduzem, na verdade, quadros de hipersensibilidade32. A atribuição do diagnóstico de alergia aos quimioterápicos resulta frequentemente na descontinuação da terapia, o que poderá ter um impacto negativo no outcomedo doente31.

Adicionalmente, sabe‑se que os custos de tratamento são superiores nos doentes com reações de hipersensibilidade aos quimioterápicos – a título de exemplo, no caso do cetuximab, esses custos são três vezes superiores33.

Alternativamente à descontinuação, e dependendo do fármaco, poder‑se‑a optar por proceder a um protocolo de dessensibilização ou à reintrodução do fármaco acompanhada por medidas de precaução (nomeadamente prolongamento do tempo de administração e pre‑medicacao com corticosteroides e anti‑histaminicos)34.

A abordagem diagnóstica e a estratégia adotada na sequência de uma reação de hipersensibilidade aos quimioterápicos é dependente do fármaco em questão. A título de exemplo, contrariamente à oxaliplatina, taxanos, L‑asparaginase e metotrexato, os testes cutâneos encontram‑se validados para a carboplatina, recomendando‑se proceder a esses testes entre o quinto e o oitavo ciclos de quimioterapia31.

Adicionalmente, já foi demonstrado sucesso na reintrodução da carboplatina, quer após protocolo de dessensibilização quer após adoção de medidas de precaução34.

Por outro lado, em doentes com carcinoma colorretal que experienciaram reações de hipersensibilidade ligeiras à oxaliplatina, a reintrodução deste fármaco resultou maioritariamente no reaparecimento de reações ligeiras, registando‑se apenas reações graves (potencialmente obrigando a dessensibilização) numa minoria de doentes (18 %)35.

Os procedimentos de dessensibilização rápida a quimioterápicos têm vindo a ser estudados quanto à segurança, eficácia e custo‑efetividade.

Num estudo que analisou mais de 2000 procedimentos de dessensibilização rápida, registaram‑se reações moderadas/graves em apenas 7 % dos casos, nenhuma das quais tendo resultado na interrupção terapêutica ou na morte dos doentes36. Adicionalmente, esse mesmo estudo não encontrou diferenças significativas entre os custos de administração de carboplatina após um protocolo de dessensibilização rápida e os custos de administração deste quimioterápico num grupo de controlos não alérgicos36 (não supreendentemente, os protocolos de dessensibilização rápida também parecem mais custo‑efetivos do que regimes que requeiram internamento37).

Do mesmo modo, em doentes que registaram reações de hipersensibilidade ao paclitaxel, a readministração deste fármaco com menor velocidade de administração revelou‑se segura e custo‑efectiva38.

De facto, a dessensibilização ao paclitaxel parece ser mais custo‑efectiva que a sua substituição pelo nab‑paclitaxel, embora sejam necessários mais estudos que o confirmem39.

Existe pouca informação relativamente ao impacto económico dos protocolos de dessensibilização rápida, por comparação com a substituição por quimioterápicos alternativos. Dados preliminares sugerem, contudo, que a dessensibilização se associa a menores custos económicos, pois possibilita que o tratamento seja feito com agentes de primeira linha, com subsequente diminuição das complicações e idas ao serviço de urgência40.

As mensagens principais relativas ao impacto do diagnóstico de alergia aos quimioterápicos podem ser consultadas no Quadro 2D.

OUTROS FÁRMACOS

Já foram descritas várias associações entre alelos específicos do HLA e reações de alergia a fármacos do tipo tardio (cujas consequências são, por vezes, fatais). Contudo, a execução de testes farmacogenéticos apenas está preconizada para um número reduzido de fármacos41. O teste para o alelo HLA‑B* 57:01 antes de iniciar terapia com abacavir é altamente custo‑efectivo, particularmente em caucasianos42,43. Por outro lado, a execução de testes farmacogenéticos para os alelos HLA‑B* 15:02 e HLA‑B* 58:01, respetivamente antes de iniciar terapia com carbamazepina e alopurinol, apenas se revela custo‑efectiva em doentes asiáticos41. A execução de testes farmacogenéticos na prevenção de reações de hipersensibilidade do tipo tardio encontra‑se descrita mais detalhadamente em outros artigos41,44.

CONCLUSÕES

A atribuição de um diagnóstico de alergia às penicilinas associa‑se a piores resultados clínicos e custos económicos mais avultados. Embora exista menor evidência relativa a outras classes de fármacos, os estudos existentes apoiam a hipótese de a atribuição de um diagnóstico de alergia se associar a um impacto negativo sob o ponto de vista clínico e/ou económico e dos sistemas de saúde. Assim, revela‑se fundamental proceder a um correto diagnóstico de alergia a fármacos, tendo por base não só a história clínica mas também, sempre que possível, testes confirmatórios.

 

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Contacto:

Bernardo Sousa‑Pinto

CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde

Rua Dr. Plácido da Costa, Porto

E‑mail: bernardo@med.up.pt

 

Financiamento: Nenhum.

 

Declaração de conflito de interesses: Nenhum.

 

Data de receção / Received in: 14/02/2017

Data de aceitação / Accepted for publication in: 25/05/2017

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