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Revista Portuguesa de Imunoalergologia

versão impressa ISSN 0871-9721

Rev Port Imunoalergologia vol.24 no.4 Lisboa dez. 2016

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Dermatite de contacto: revisão da literatura

Contact dermatitis: Literature review

 

Isabel Rosmaninho, Ana Moreira, José Pedro Moreira da Silva

Serviço de Imunoalergologia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia e Espinho, EPE

 

Contacto

 

RESUMO

A dermatite de contacto é uma doença muito frequente observada por imunoalergologistas, dermatologistas e médicos de medicina geral e familiar. É uma entidade que deve sempre ser considerada na presença de um eczema de difícil controlo.

O objetivo deste artigo consiste numa revisão da literatura sobre a dermatite de contacto em que os autores discutem os principais tipos de dermatite de contacto, o diagnóstico, alguns grupos específicos e tecem algumas considerações terapêuticas.

Palavras‑chave: Alergia, dermatite de contacto, eczema.

 

ABSTRACT

Contact dermatitis is a common disease seen by allergists, dermatologists and primary care physicians. It is an entity that should always be considered in the presence of eczema not responding to treatment.

The purpose of this article is to review the literature on contact dermatitis in which the authors discuss the main types of contact dermatitis, diagnosis, some specific groups and some therapeutic considerations.

Keywords: Allergy, contact dermatitis, eczema.

 

INTRODUÇÃO

A dermatite de contacto (DC) é uma patologia de prevalência crescente nos países industrializados.

É a causa mais frequente de doença cutânea ocupacional, representando 90 a 95 % do total destas, levando, frequentemente, a incapacidade laboral13.

Um estudo recente acerca da prevalência de alergia de contacto na população geral realizado em várias regiões da Europa, do qual Portugal fez parte, revelou que a sua ocorrência é de 27 %, sendo que o alergénio mais prevalente foi o níquel, descrevendo‑se uma prevalência de 18 %, em Portugal. O estudo salienta também que as medidas de prevenção primária têm de ser reforçadas4.

As fragrâncias são substâncias complexas que contêm muitos produtos químicos diferentes e são a principal causa de dermatite de contacto aos cosméticos. Novos produtos químicos estão constantemente a ser introduzidos nas fragrâncias, levando ao aumento crescente da alergia3,5.

Os autores fazem uma revisão da patologia e abordam os principais tipos de dermatite de contacto e seu diagnóstico, alguns grupos específicos e tecem algumas considerações terapêuticas.

DEFINIÇÃO E TIPOS DE DERMATITE DE CONTACTO

A DC é uma reação inflamatória da pele causada pelo contacto de uma substância exógena. A DC aguda caracteriza‑se por pápulas eritematosas, vesículas e lesões crostosas. Na DC crónica existe a presença de liquenificação, fissuras, descamação e secura da pele. As lesões podem ocorrer em simultâneo e o prurido é o sintoma que normalmente as acompanha3,5,6.

A dermatite de contacto compreende as formas eczematosas, nomeadamente as dermatites de contacto irritativa e a alérgica, assim como, as formas não eczematosas, designadamente a urticária de contacto imunológica e não imunológica, erupção liquenoide de contacto, erupção acneiforme de contacto, erupção multiforme like entre outras.

As dermatites de contacto eczematosas são as mais frequentes, sendo estas as abordadas no presente artigo6.

A dermatite de contacto irritativa (DCI) não necessita de sensibilização prévia e corresponde à maioria dos casos. É a dermatite ocupacional mais comum e a mais encontrada em indivíduos atópicos. Normalmente a sua etiologia é multifatorial, onde estão implicados factores endógenos e exógenos (químicos e/ou físicos), sendo as mãos o local mais afetado.

A substância irritativa é aquela que causa uma reacção inflamatória na maioria dos indivíduos, quando aplicada em concentração suficiente e por adequado intervalo de tempo. Qualquer indivíduo pode desenvolver uma DCI e a sua forma aguda consiste numa reação que aparece logo após a exposição. A DCI cumulativa é a forma mais comum, podendo levar semanas, meses ou até anos a aparecer. Esta forma resulta de múltiplas exposições a irritantes leves como sabões, champôs, detergentes, bem como a lavagem frequente das mãos. Normalmente, são indivíduos que têm profissões e/ou ocupações em que o trabalho húmido está implicado3,5,6,7.

A dermatite de contacto alérgica (DCA) envolve a sensibilização do sistema imunológico a um alergénio específico.

Na reexposição ao alergénio ocorre uma reacção eczematosa entre 48 a 72 horas, mediada por linfócitos T de memória. Nesta dermatite, concentrações relativamente pequenas do alergénio podem ser suficientes para desencadear uma reação inflamatória, ao contrário das reações por irritantes6. Não é possível, clínica e histologicamente, diferenciar a DCI da DCA3,5,6,7.

Existe evidência contraditória sobre a possibilidade de os doentes com eczema atópico (EA) terem risco aumentado de sensibilização de contacto quando comparados com os não atópicos5.

Em crianças com EA grave e DCA concomitante, a não aplicação dos alergénios causadores resulta em melhoria acentuada do EA8.

Como o EA está associado a alterações da barreira cutânea, é provável que a absorção de substâncias químicas aplicadas topicamente na pele aumente o risco de sensibilização, resultando em DCA e agravamento da dermatite subjacente9.

ABORDAGEM DIAGNÓSTICA

A abordagem diagnóstica engloba a anamnese, o exame físico (localização das lesões) e a realização de testes epicutâneos.

Anamnese

A anamnese é o primeiro passo na abordagemdiagnóstica (Quadro 1). A história da doença atual, a história ocupacional, as atividades de tempos livres, as tarefas domésticas, os produtos pessoais e a história pregressa são elementos fundamentais na recolha da história clínica10.

Embora esta última possa sugerir a causa da DCA, tem uma sensibilidade e especificidade moderada (76 %) em estabelecer o diagnóstico5.

Exame físico

A distribuição das lesões, na maioria das vezes, aponta‑nos para o agente causal. O grupo norte‑americano de dermatites de contacto enumera as três regiões mais frequentemente afetadas: cabeça, mãos e a forma generalizada5,11.

De seguida, serão abordadas as regiões do tegumento cutâneo mais vezes acometidas e o tipo de dermatite de contacto implicada5,6.

Cabeça

Pálpebras

A DCA é responsável por 80 % dos casos.Os produtos pessoais como cosméticos, champôs, sabões e gel de banho, que contêm perfumes, conservantes, excipientes e níquel, são os mais implicados12.

A dermatite de contacto alérgica ectópica, que consiste em lesões distantes do local original de contacto, está muitas vezes implicada nesta região corporal.

No verniz das unhas, a resina formol toluenosulfonamida e nas unhas de gel e artificiais a resina para terciária butilfenol formaldeído e os acrilatos são os alergénios implicados.

A dermatite de contacto aerotransportada, com localização nas pálpebras, pode ocorrer em contexto industrial, nomeadamente com a exposição à resina epóxi, devido à sua capacidade volátil e em ambiente rural, pela exposição ao alergénio de algumas plantas, nomeadamente da família das compostas.

Face

A DCA é a implicada na maioria dos casos. A nível periférico, são os produtos aplicados no couro cabeludo os mais incriminados. Por outro lado, na região central, são os cremes e a maquilhagem os mais envolvidos nas lesões.

Por fim, a dermatite de contacto alérgica ectópica e a dermatite de contacto aerotransportada podem também ser as responsáveis.

Lábios

A dermatite nesta região designa‑se queilite. A DCI corresponde à maioria dos casos ocorridos. Os agentes físicos (frio, vento e tempo seco) bem como os agentes químicos (saliva) são os responsáveis. A DCA pode ser provocada pelos alergénios veiculados na pasta dos dentes, colutórios, batons, protetores labiais, pastilhas elásticas e também por transferência ectópica.

A atopia também é considerada um fator de risco para a queilite.

Mucosa oral

As lesões na mucosa oral são raras. Normalmente resultam de trauma físico ou químico durante o procedimento dentário. Raramente os componentes do implante, amálgama ou prótese, estão implicados. Uma das possíveis manifestações de reação alérgica a esses componentes é uma reação liquenoide eczematosa13.

Couro cabeludo

O couro cabeludo raramente é afetado. Os alergénios, como o tioglicatoglicerol nas tintas permanentes, e a parafenilenodiamina nas tintas capilares, provocam reacção cutânea na região periférica da face, região periorbitária e pescoço.

Mãos

As mãos são a localização mais frequente de dermatite de contacto. Geralmente, a etiologia é multifatorial, estando implicados o trabalho húmido, a atopia e os alergénios.

A DCI é mais frequente em casos onde existe o trabalho húmido. A imersão frequente das mãos em água, o contacto repetido com sabões e detergentes, a utilização das luvas por períodos continuados de duas horas, os ciclos repetidos de humidade e secura são fatores que vão levar a uma quebra da barreira cutânea14.

Quando estamos na presença de uma DCA, os alergénios mais implicados são níquel, cloreto de cobalto, as fragrâncias e os aditivos das borrachas, nomeadamente os tiurans.

Os doentes com DA associada a dermatite das mãos apresentam maior risco de sensibilização de contacto15.

Por outro lado, os doentes com história pregressa de DA na infância têm um risco aumentado de eczema das mãos irritativo ou alérgico16.

Axilas

Na região central, estão implicados as fragrâncias dos desodorizantes e na periferia os corantes dispersos dos têxteis.

 

Região anogenital

Os corticoides, as fragrâncias, a neomicina e os anestésicos locais são os alergénios mais frequentemente encontrados nos produtos aplicados nessa localização. A metilisotiazolinona, um conservante encontrado nas toalhitas de higiene, é um alergénio relevante17.

Pés

Na planta do pé, a resina de formol butilfenol‑para‑terciaria é um alergénio a considerar. No dorso do pé, o crómio e os aditivos das borrachas, nomeadamente o mercaptobenzotiazol e a mistura de mercapto, são os principais alergénios de contacto.

Dermatite de estase/úlceras de perna

Os doentes com dermatite de estase apresentam sensibilização frequente aos produtos aplicados no tratamento das lesões. A polissensibilização encontrada está associada à maior duração da doença ulcerosa18.

Eczema de craquelé

Trata‑se de uma DCI que resulta da secura extrema da pele devido à falta de hidratação, excesso de lavagem e ambienteseco.

 

Dermatite de contacto sistémica

Trata‑se de uma erupção difusa que envolve as áreas de flexão e intertriginosas e que surge após a ingestão e a exposição sistémica a um alergénio num indivíduo previamente sensibilizado por via percutânea. Assim, indivíduos sensibilizados a corticoides tópicos podem desenvolver uma dermatite de contacto sistémica ao tomar corticoides orais ou inalados19. As pessoas sensibilizadas ao bálsamo-do-peru, presente nos perfumes, podem apresentar uma dermatite de contacto sistémica ao ingerir especiarias ou aditivos alimentares aromatizados20.

As pessoas sensibilizadas ao níquel, quando ingerem alimentos ricos em níquel (espargos, feijão, cebolas, milho, espinafres, tomates, alface, cenouras, ervilhas, oleaginosas, farinha integral, cogumelos, arenque, ostras, peras, chá, cacau, chocolate, cerveja, vinho, fermentos) ou água da torneira podem também desenvolver uma dermatite de contacto sistémica21.

Fotodermatoses de contacto

Estas dermatoses incluem a dermatite de contacto fotoalérgica e a dermatite de contacto fototóxica, sendo esta a mais frequente22.

São dermatoses que ao contrário das dermatites de contacto aerotransportadas, não atingem áreas de sombra, nomeadamente as pregas faciais, a região submentoniana, retroauricular e as pálpebras superiores. As dermatoses agravadas pelo sol, como o lúpus eritematoso sistémico, a erupção polimorfa à luz, a dermatomiosite e a rosácea são também importantes diagnósticos diferenciais dessas dermatoses.

Os protetores solares químicos podem desencadear, nalguns doentes, uma dermatite de contacto fotoalérgica, pelo que, nesses casos, o uso de protetores solares físicos com dióxido de titânio ou óxido de zinco constituem uma boa alternativa por não serem fotossensibilizantes23.

Descreve‑se no Quadro 2 uma lista de medicamentos tópicos e orais que têm poder fotossensibilizante.

Por último, o diagnóstico definitivo de fotoalergia de contacto é efetuado pelo photopatch teste24.

Fitodermatoses

As dermatoses provocadas por plantas são designadas fitodermatoses. Estas surgem em contexto ocupacional e não ocupacional.

A irritação é a causa mais frequente, mas as plantas também podem ser sensibilizantes. A mistura de lactonas sesquiterpénicas existe em várias plantas, nomeadamente na família das compostas. Os quadros clínicos variam entre pulpites, dermatite de contacto aerotransportada até formas mais extensas, que tipicamente surgem ou agravam no verão. Por outro lado, não nos podemos esquecer que os pesticidas usados são mais sensibilizantes do que as plantas25.

As fitofotodermatoses são dermatoses em que é necessário a exposição solar, por isso designam‑se reacções fototóxicas. As plantas ou o fruto da planta, que produz furocumarinas, em contacto com a pele e com a ação do sol, origina uma erupção cutânea linear muito característica.

O diagnóstico é essencialmente clínico. A protecção da pele com luvas e roupa protetora é um requisito num dia com sol para trabalhar com plantas que têm capacidade fototóxica.

Testes epicutâneos (TE)

Os TE são considerados o gold standard para fazer o diagnóstico de DCA. Estão indicados em qualquer doente com doença crónica eczematosa ou dermatite liquenificada em que há suspeita de DCA3,5,9,26,27.

Os corticoides orais e tópicos têm de ser descontinuados quatro semanas e sete dias, respetivamente, antes da aplicação dos TE. Os anti-histamínicos não interferem na realização destes. A exposição solar deve ser evitada duas semanas antes da sua realização e nas grávidas e nas lactentes devem ser adiados.

Utilizam‑secâmaras de alumínio (Finn chamber®) ou câmaras de plástico (Curatest®), porém não foi comprovado superioridade de um sistema em relação ao outro.

A série-padrão inclui os alergénios mais comuns e relevantes numa determinada região geográfica. Atualmente, a série-padrão do grupo português de dermatites de contacto é composta por trinta e dois alergénios.

Outras séries complementares são usadas de acordo com a anamnese e a localização da dermatose. A série padrão da sociedade europeia de dermatites de contacto é constituída por 30 alergénios (Quadro 3). Em algumas situações, os produtos próprios, quer os leave on (produtos não enxaguáveis), que são aplicados tal e qual, ou os rinseoff (produtos que devem ser enxaguados alguns minutos após aplicação), em que são feitas diluições, podem ser testados28.

Os alergénios em que o veículo é aquoso são preparados no momento da aplicação. Os alergénios em que o veículo é a vaselina podem ser preparados com 48 horas de antecedência.

De acordo com o grupo internacional de dermatites de contacto (ICDRG), a primeira leitura é efetuada 48 horas após a aplicação dos TE. A segunda leitura é efetuada 72 horas e/ou 96 horas após a aplicação dos TE.

Cerca de 30 % das leituras negativas às 48 horas tornam‑se positivas às 96 horas, por isso a maioria dos autores refere que esta é a altura ideal para a segunda leitura.

Revela‑se importante porque ajuda a determinar se a reação é irritativa, que é uma reação em decrescendo, diminuindo entre a primeira e a segunda leitura, ou alérgica, que é uma reação em crescendo29.

Por vezes, são efetuadas leituras tardias, até dez dias, no caso de suspeita de sensibilização a metais, antibióticos, parafenilenodiamina, acrilatos, anestésicos, mistura de lactonas e corticoides.

Segundo o ICDRG, a interpretação dos TE é efetuada por um sistema de pontuação estandardizado, amplamente utilizado apresentado no Quadro 430.

 

 

O angry back syndrome é uma reação “falso-positiva” que surge adjacente a uma verdadeira reação e que origina uma inflamação e irritabilidade contígua. A utilização de concentrações elevadas dos alergénios a testar, bem como a aplicação dos TE em locais com lesões cutâneas, podem igualmente originar reações falso‑positivas.

A ocorrência de reações “falso-negativas” está estimada em 30% dos casos. As causas incluem a baixa concentração do alergénio no extrato, o uso do veículo errado, a exposição prévia à radiação ultravioleta, a aplicação de corticoterapia tópica no local da aplicação dos TE e a toma de corticoterapia superior a 20/mg dia ou outro imunossupressor com capacidade de inibição da resposta dos TE.

Na presença de um TE positivo é preciso determinar a relevância clínica conforme descrito no Quadro 5.

 

 

Nos doentes em que o teste clássico é duvidoso, pode ser feito o teste aberto de aplicação repetida (TAAR).

Este é especialmente adequado para produtos de higiene pessoal, nomeadamente cosméticos. É aplicada a substância que se quer testar próximo da fossa antecubital, sendo feita uma leitura aos quinze minutos e uma hora depois da aplicação. Posteriormente, é aplicada a substância duas vezes por dia, com observação do desenvolvimento local de uma reação por um período de duas semanas.

DERMATITES DE CONTACTO – GRUPOS ESPECÍFICOS

Dermatite de contacto ocupacional (DCO)

A DCO é uma das doenças ocupacionais mais comuns, afetando até 10 % dos trabalhadores nos Estados Unidos da América, com custos anuais superiores a um bilião de dólares. Esta dermatose representa 90 a 95 % de todas as doenças cutâneas ocupacionais, classificando‑se em DCA e DCI. A DCI representa cerca de 80 % dos casos, sendo as mãos a localização mais envolvida na DCO13.

As profissões com maior risco de desenvolver DCO incluem a indústria alimentar, os profissionais de saúde, as cabeleireiras, as esteticistas, os funcionários de limpeza, os trabalhadores rurais e da indústria de construção civil5,31.

A relação do nexo causal é fundamental para estabelecer o diagnóstico. Maths propôs sete critérios para definir a causa ou o fator agravante da DCO descritos no quadro 632. Os critérios de Maths foram recentemente validados e são atualmente aceites para fazer o diagnóstico de DCO33.

Dermatite de contacto nas crianças

A DC nas crianças deve ser considerada sempre que exista um eczema rebelde à terapêutica. O EA apresenta defeitos da barreira cutânea e pela exposição cumulativa a produtos aplicados topicamente na pele é considerado um fator de risco para a sensibilização de contacto.

O perfil de sensibilização nas crianças é semelhante ao do adulto. As fontes comuns de alergénios são os produtos de higiene, cosméticos, acessórios de desporto, calçado e brinquedos. A DC nas crianças pode ocorrer tão frequentemente como nos adolescentes e nos adultos.

Os testes epicutâneos são considerados o goldstandard para fazer o diagnóstico de DCA nas crianças34,35,36.

A dermatite das fraldas na maioria das vezes corresponde a formas irritativas, mas a DCA pode ocorrer pelos alergénios veiculados pelos elásticos das fraldas (resina para‑terciaria butilfenol formaldeído e mercaptobenzotiazol).

As toalhitas, champôs e sabões líquidos têm a metilisotiazolinona, um alergénio cada vez mais preponderante.

Relativamente às tatuagens temporárias, a sua coloração escura resulta da adição da parafenilenodiamina à henna. O seu uso tem vindo a ser desencorajado pelo risco futuro de sensibilização à parafenilenodiamina.

A Academia Europeia de Alergologia e Imunologia Clínica (EAACI) elaborou uma bateria própria para crianças, apresentada no Quadro 736.

 

 

Reações de hipersensibilidade retardada a implantes metálicos

As reações de hipersensibilidade retardada aos implantes metálicos constituem um tema controverso. Os estudos mostram que a frequência de sensibilização aos metais na população geral é de 10 %, nas próteses estáveis é de 25 % e nas próteses disfuncionais é de 60 %37,38.

As manifestações clínicas de hipersensibilidade aos implantes descritas são cutâneas, como dermatite de contacto ou dermatite de contacto sistémica, e extracutâneas, como inflamação crónica, dor, calor e rubor.39,40.

Atualmente, não é possível estabelecer uma relação direta entre sensibilização aos constituintes da prótese e a sua falência. No entanto, estudos demonstram que a sensibilização aos metais desencadeia a falência da prótese.

Por outro lado, outros estudos mostram que é a falência da prótese que desencadeia a sensibilização aos metais40,41.

Os TE constituem o método de diagnóstico de eleição no estudo da hipersensibilidade retardada aos implantes metálicos. Embora os testesin vitro (o teste de transformação linfoblástico) para o estudo de hipersensibilidade retardada aos alergénios de contacto (metais e componentes do cimento) estejam disponíveis, a sua relevância clínica ainda não foi estabelecida e contínua em investigacão5,40.

De acordo com a maioria dos autores, os TE são realizados antes da aplicação da primeira prótese, quando há história prévia de alergia aos metais, metacrilatos e antibióticos. Por outro lado, quando há falência da prótese e suspeita de alergia aos seus componentes, após terem sido excluídas causas infeciosas e biomecânicas, realizam‑se os TE5,40,41.

No entanto, ressalva‑se a necessidade de mais estudos para que estas recomendações sejam validadas.

 

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Existem várias condições dermatológicas que se podem assemelhar clínica e histologicamente à DC e que devem ser consideradas no seu diagnóstico diferencial (Quadro 8)26.

O EA é uma doença característica da infância que se traduz numa hiperreatividade cutânea com prurido intenso associado. É uma patologia crónica e recidivante com morfologia e distribuição típica das lesões. Na primeira infância as lesões agudas estão localizadas na face e superfícies extensoras, não existindo lesões na região da fralda. A partir dessa idade as lesões localizam‑se, essencialmente, nas superfícies flexoras (prega poplítea e prega antecubital) e tornam‑se cada vez mais liquenificadas.

As mãos e a região palpebral são frequentemente atingidas durante a adolescência e a idade adulta. Quando encontramos localizações mais extensas, torna‑se necessário fazer o diagnóstico diferencial com dermatite de contacto sistémica.

O eczema desidrótico caracteriza‑se por pequenas lesões microvesiculares localizadas na região palmar, plantar e superfície lateral dos dedos. Pelo contrário, o eczema numular distribui‑se irregularmente pelo tegumento cutâneo, não se associa a xerose e é invulgar antes dos cinco anos de idade.

Por outro lado, existem outras patologias em que o diagnóstico definitivo é histológico. A dermatite herpetiforme é uma doença autoimune bolhosa com predisposição genética para a intolerância ao glúten. A imunofluorescência direta mostra depósitos de IgA na camada dérmica. A micose fungoide é um linfoma cutâneo de células T e as lesões, numa fase inicial, podem apresentar um aspeto inespecífico, assemelhando‑se a dermatoses inflamatórias, como o eczema crónico42. Na análise histopatológica existe um envolvimento preferencial da epiderme, sendo a presença de microabcessos de Pautrier patognomónica, porém ocorrendo em apenas 25 % dos casos43.

 

TRATAMENTO

O tratamento ideal da DC requer a identificação e a eliminação do contacto do agente causador. Se o contacto com o alergénio ou o irritante responsável continua, a dermatite pode tornar‑se crónica e mais generalizada.

Contudo, mesmo com a remoção da exposição e a evicção do contacto, a dermatite pode persistir em alguns doentes5,26.

O tratamento sintomático de primeira linha é a corticoterapia.

Os corticoides tópicos são usados para pequenas áreas. Em lesões agudas são usados corticóides em formas de cremes e em lesões crónicas utilizam‑se corticoides pomadas. Nas áreas de pele fina aplicam‑se corticoides menos potentes, contrariamente às áreas de pele espessa. A corticoterapia sistémica é usada quando a superfície corporal atingida é superior a 20 %. Os inibidores tópicos da calcineurina têm sido usados com sucesso no tratamento do EA, porém a sua eficácia na DCA e DCI ainda não foi estabelecida3,5,6. Outros tratamentos, incluindo a ciclosporina, azatioprina e psoraleno + UVA, têm sido usados no tratamento da DCA resistente a corticoterapia, nomeadamente no eczema crónico das mãos.3 A alitretinoína, aprovada na Europa mas não comercializada em Portugal, é utilizada para tratar adultos com eczema crónico grave das mãos que não apresentaram melhoria após outros tratamentos tópicos, incluindo corticoides3.

A aplicação de emolientes é transversal a qualquer fase do eczema e o uso de cremes barreira é controverso44.

A prevenção é a melhor maneira de evitarmos o aumento da incidência e prevalência da DC. A prevenção primária da DCI e da DCA engloba a evicção da exposição a possíveis irritantes e alergénios e a proteção cutânea.

 

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Contacto:

Maria Isabel Rosmaninho Lopes da Silva

Centro Hospitalar Gaia/Espinho

R. Dr. Francisco Sá Carneiro,

4400‑129

Vila Nova de Gaia

Telef. 22 786 5100

 

Financiamento: Nenhum.

 

Declaração de conflitos de interesse: Nenhum.

 

Data de receção / Received in: 18/08/2016

Data de aceitação / Accepted for publication in: 15/11/2016

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