SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.33 número1A sobredotação na Região Autónoma da Madeira: Desenvolvimento de políticas e práticas educativasMetodologias ativas numa escola técnica profissionalizante índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Portuguesa de Educação

versão impressa ISSN 0871-9187

Rev. Port. de Educação vol.33 no.1 Braga jun. 2020

https://doi.org/10.21814/rpe.18500 

ARTIGOS

 

Aprender na era digital: do currículo para todos ao currículo de cada um

Learning in the digital age: from the curriculum for all to the curriculum for each individual

Aprendizaje en la era digital: del plan de estudios para todos al plan de estudios para cada individuo

 

Joana Vianai
https://orcid.org/0000-0001-5939-4401

Helena Peraltaii

iUniversidade de Lisboa, Instituto de Educação, Unidade de Investigação e Desenvolvimento em Educação e Formação (UIDEF), Portugal.

iiUniversidade de Lisboa, Instituto de Educação, Portugal.

 

Endereço para Correspondência

 

RESUMO

As tecnologias digitais em educação têm vindo a desafiar-nos à reflexão sobre o currículo e sobre a aprendizagem. Será que tendo as tecnologias digitais, e mais concretamente o online, como contexto de aprendizagem (não formalizado), em que cada pessoa pode decidir o que aprender e como aprender, é viável considerar o currículo como referencial enquadrador dessa aprendizagem? Foi isso que nos propusemos investigar. Partindo de uma análise teórica e conceptual sobre o currículo, entendido enquanto conceção, organização e estruturação do processo de aprender, analisam-se as representações que diferentes adultos têm acerca de aprendizagens que realizam em contexto online e as suas conceções gerais sobre o currículo. Os dados empíricos provêm da aplicação de um questionário distribuído online e da realização de entrevistas semiestruturadas. Foram inquiridas 833 pessoas e entrevistadas sete, todas adultas com um perfil sociodemográfico diverso. Conclui-se que o espaço e o tempo, as estratégias e os intervenientes constituem os componentes do currículo que mais se alteram nestas circunstâncias. Consolida-se a conceção currículo pessoal de aprendizagem, um currículo autónomo, individualizado, cujo desenvolvimento o digital propicia e facilita.

Palavras-chave: Conceito de currículo; Tecnologias digitais; Aprendizagem; Currículo pessoal de aprendizagem

 

ABSTRACT

Digital technologies in education have been challenging us to reflect on curriculum and on learning. Within the scope of the so called educational digital technologies, specifically in non-formalized online contexts, is it still feasible and realistic to consider the curriculum as a framework of reference for learning? That is what we set out to research. Starting from a theoretical and conceptual analysis of the curriculum, understood as the conception, organization and structuring of the learning process, we analyzed the representations of different adults about online learning and their general conceptions about curriculum.Empirical data came from applying a questionnaire, distributed online, and conducting semi-structured interviews.833 people were surveyed and seven were interviewed, all adults with different socio-demographic profiles. As a result of the research, we found that space and time, strategies and actors are the most changing curriculum components in these circunstances.The concept of personal learning curriculum is consolidated as an autonomous, flexible, individualized curriculum, the development of which the digital provides and facilitates.

Keywords: The concept of curriculum; Digital technologies; Learning; Personal learning curriculum

 

RESUMEN

Las tecnologías digitales en educación nos han retado a reflexionar sobre el currículo y el aprendizaje. Si las tecnologías digitales, y más específicamente Internet, son el contexto de aprendizaje (no formalizado), en el que cada persona puede decidir qué aprender y cómo aprender, es factible considerar el plan de estudios como un marco para el aprendizaje? Eso es lo que investigamos. Partiendo de un análisis teórico y conceptual del plan de estudios, entendido como la concepción, organización y estructuración del proceso de aprendizaje, analizamos las representaciones que los diferentes adultos tienen sobre el aprendizaje en línea y sus concepciones generales sobre el plan de estudios. Los datos empíricos provienen de la aplicación de un cuestionario distribuido en línea y de la realización de entrevistas semiestructuradas. Se encuestó a un total de 833 personas y se entrevistó a siete, todos adultos con un perfil sociodemográfico diferente. Se concluye que el espacio y el tiempo, las estrategias y los participantes constituyen los componentes del plan de estudios que más cambian en estas circunstancias. El diseño del plan de estudios de aprendizaje personal es consolidado, un plan de estudios autónomo e individualizado que lo digital proporciona y facilita.

Palabras clave: El concepto de plan de estudios; Tecnologías digitales; Aprendizaje; Plan de estudios de aprendizaje personal

 

1. Introdução

As mudanças que se observam nas condições e circunstâncias nas quais se aprende hoje, na chamada era digital, levam-nos a interrogarmo-nos sobre quais as conceções de currículo presentes no século XXI e a refletir sobre as implicações que as características dos contextos de aprendizagem atuais podem ter na conceptualização e no entendimento acerca do currículo. Neste artigo apresentam-se os resultados de uma investigação que teve como propósito estudar as conceções acerca do currículo quando são usadas tecnologias digitais para aprender. Trata-se de olhar e problematizar o currículo na perspetiva de quem aprende, como cada um concebe e organiza as aprendizagens que realiza, como decide o que aprender, no âmbito do seu projeto ou percurso de aprendizagem ao longo da vida1, e se ainda faz sentido falar de currículo nestas circunstâncias e neste enquadramento.

Parte-se de uma análise teórica e conceptual em torno do conceito de currículo, centrada no seu entendimento enquanto modo como se desenvolve e se organiza a aprendizagem, e analisam-se as representações que diferentes sujeitos adultos têm acerca das aprendizagens que realizam em contexto online, e de modo não formal, e as suasconceções gerais sobre currículo na “era digital”. Para a recolha de dados optou-se pelo inquérito por questionário, distribuído online, e pela realização de entrevistas semiestruturadas, feitas a pessoas que usam a Internet e consideram que aprendem, como detalhadamente se apresenta no ponto relativo à metodologia.

A análise teórica e o estudo empírico permitem caracterizar o entendimento acerca do currículo no contexto digital e visam propor a sua corporização numa conceção de currículo que se lhe adeque, isto é, um currículo cujo desenvolvimento se revela quando se realizam aprendizagens a partir do uso de tecnologias digitais, como a seguir se contextualiza.

2. Aprender na era digital

No final do século XX não havia certeza sobre como é que as tecnologias viriam a ser usadas em educação no início do século XXI; contudo, a existência de mudanças no currículo decorrentes das implicações do seu uso generalizado era praticamente certa (Marsh & Willis, 1995). Já nos anos 80 do século passado, Albert Kelly (1981) afirmava que a rápida mudança tecnológica estava a ser acompanhada por mudanças igualmente drásticas na sociedade e que “essas mudanças sociais e morais [teriam inevitavelmente]... o seu impacto sobre o desenvolvimento do currículo” (p. 11).

Hoje predomina o uso regular, natural e espontâneo da Internet, sobretudo a partir de dispositivos móveis, em ambientes caracterizados pela mobilidade, flexibilidade, conectividade2, ubiquidade3 e serendipity4, que contribuem para a caracterização do contexto contemporâneo geral e dos contextos de aprendizagem que se geram em diversas dimensões. Numa sociedade que “se move no sentido de uma época pós-industrial e pós-moderna” (Hargreaves, 1998, p. x), a educação (formal) parece continuar a ser analógica, apesar do reconhecimento das oportunidades que as tecnologias digitais criam à aprendizagem e, por inerência, ao currículo.

A inovação tecnológica produz mudanças nos valores e nas normas de uma sociedade e, logo, constitui uma fonte de pressão sobre o currículo (Kelly, 1981) e sobre a aprendizagem. O facto de a Internet se apresentar como um meio possível para apoiar e inovar múltiplos modos de aprendizagem (Brown, 2007), entre a população em geral e em particular entre alunos e professores, é considerado um dos fatores que mais influencia o currículo (Means, 2008).Estas tendências determinam o papel das tecnologias enquanto suporte do currículo, e, quer este seja visto como corpo de conteúdos ou como processo de aprendizagem, as tecnologias podem suportá-lo admitindo ou introduzindo práticas e ideias que o mudarão ou que, em última instância, provoquem a mudança.Na “era digital”, os contextos em que se aprende têm características distintas daqueles no seio dos quais se construiu e configurou o conceito de currículo e a teoria curricular que lhe está subjacente. Destacam-se, por um lado, a grande abertura e as possibilidades de acesso à informação e ao conhecimento disponíveis hoje, em qualquer momento e a partir de qualquer lugar, e, por outro lado, a maior flexibilidade e as opções que caracterizam os momentos e processos de aprendizagem, em termos de meios e recursos usados, temas e assuntos aprendidos, atividades e estratégias mobilizadas para aprender, tempos e espaços de aprendizagem. Mais do que a ampla oferta formativa disponível atualmente, em diferentes formatos, modalidades e configurações, a maioria das pessoas5 pode também aceder a múltiplos conteúdos e recursos digitais; pode participar em grupos ou comunidades de partilha e aprendizagem online; realizar cursos abertos quando e onde quiser; explorar, simular e experimentar situações (virtuais) próximas do real, entre outros exemplos. O recurso às tecnologias digitais possibilitou alargar consideravelmente os modos como se pode aprender e permite inovar processos e transformar práticas de aprendizagem e de ensino (Viana et al., 2017) (através, por exemplo, da programação e robótica, da realidade virtual e aumentada, da inteligência artificial).

Em particular na idade adulta, o aprendente autónomo, não sujeito aos condicionalismos de um tempo e de um espaço (de)limitados nem de um currículo formal, pode autorregular ou autodirigir as aprendizagens que realiza em contexto online não formal e definir uma estratégia que lhe permita conduzir e gerir o seu percurso de aprendizagem. Cada um pode ser o agente central que decide sobre as aprendizagens que quer realizar e que realiza; sobre os conhecimentos que considera essenciais para a sua vida e percurso pessoal, profissional e/ou académico; sobre os modos de gerir e organizar os processos e procedimentos que leva a cabo para aprender; e sobre os períodos de tempo e os locais (físicos ou virtuais) em que o faz. O aprendente constitui-se assim como construtor e decisor curricular das aprendizagens que realiza em contextos não formalizados.

Estas características adequam-se mais a conceções de currículo assentes em abordagens construtivistas, uma vez que privilegiam a aprendizagem e/ou o aprendente no processo de (co)construção do currículo. As tecnologias digitais constituem meios privilegiados, mas é o próprio aprendente quem pensa e decide como as usar e quem organiza a forma como tira partido das suas potencialidades para aprender. Isso leva-nos ao questionamento sobre as possibilidades e os modos de reconfigurar o currículo, a concebê-lo de outro modo, a reconsiderar a sua organização e desenvolvimento, quer em contextos formais, quer em contextos não formais de aprendizagem, presenciais ou virtuais. Importa, assim, analisar o conceito de currículo e o seu entendimento na época atual, na qual se usam regularmente tecnologias digitais para aceder ao conhecimento e aprender.

3. Currículo, modo como se aprende e se organiza a aprendizagem

A necessidade de repensar, e mesmo de reconceptualizar, o currículo tem há muito sido objeto do discurso e da investigação sobre este conceito e sobre a prática que o concretiza. Na investigação sobre educação vários têm sido os autores (Brown, 2007; Marsh & Willis, 1995; Means, 2008; Ornstein & Hunkins, 2009), especialmente nos finais do século XX e início do século XXI, a discutirem e a sublinharem a importância e a necessidade de se repensar o conceito de currículo e a sua configuração, sobretudo, na emergência da sociedade digital, apresentando algumas propostas para a sua reconceptualização. Entre as propostas e contributos apresentados, ainda que se ancorem em diferentes perspetivas, modelos ou entendimentos conceptuais, sobressaem globalmente duas tendências divergentes6:uma de cariz social, que valoriza, fundamentalmente, o currículo enquanto construção assente em mudanças de natureza marcadamente social (e.g., Pinar, Young, Goodson, entre outros); e a outra de cariz individual, que se centra no aprendente, ou seja, perceciona o indivíduo como centro da construção do currículo, valorizando a aprendizagem experiencial, o currículo enquanto conjunto de experiências de aprendizagem, seguindo, sobretudo, na linha de John Dewey no início do século XX (Grundy, Doll, Kliebard, Marsh, & Willis, entre outros). A sociedade e o indivíduo constituem verdadeiramente os dois alicerces ou variáveis que alimentam o conceito de currículo, e que estão constantemente em interação.

É numa época de oposições entre as visões de John Dewey (1902) e de Franklin Bobbit (1918) que é cunhado o termo currículo relacionado com aquilo que se aprende. Apesar das contradições existentes nos fundamentos das suas perspetivas, ambos usam o termo currículo referindo-se àquilo que se aprende, como se aprende, quando, onde e porquê. É nesta linha que utilizamos no nosso estudo o conceito de currículo, entendido, em simultâneo, como o saber, o conteúdo, de que o aprendente se apropria e o processo que o leva a tal apropriação.

Apesar da diversidade e, por vezes, da divergência de entendimentos conceptuais relativamente ao currículo, na sua esmagadora maioria, e de modo semelhante, perspetivas, conceções, práticos e investigadores situam-no e associam-no ao contexto escolar, à organização das aprendizagens que se promovem e realizam na escola (ou em outra instituição educativa), com um caráter formal(izado) e predefinido. Ainda que se possa reconhecer que praticamente todas as instituições da sociedade têm um currículo (mesmo que subentendido) (Tanner & Tanner, 1995), a maioria dessas instituições normalmente não utiliza o conceito de currículo para denotar a natureza das suas funções e respetivas ações, mesmo as que têm um caráter educativo.

Em grandes linhas, o currículo é entendido, por um lado, enquanto proposta referente à seleção, organização e promoção de experiências de aprendizagem por parte da instituição de ensino (Vasconcellos, 2009), cobrindo, assim, não apenas os objetos do conhecimento, os conteúdos, mas também as experiências, ou aprendizagens previsíveis, e, ainda, a proposta de um caminho a ser percorrido, de uma prescrição sequencial (Goodson, 2001), um guia (Gimeno Sacristán, 1999) ou sequência ordenada de estudos, numa perspetiva de desenvolvimento curricular. Implica a estruturação de tempos, espaços, saberes, recursos, relacionamentos, agrupamentos de alunos, formas de trabalho dos docentes, objetivos, metodologias, formas de avaliação (o que se prevê ensinar e como é que a escola se vai organizar para isso).Por outro lado, o currículo é percebido como o percurso efetivamente feito pelo sujeito na escola (vivido, em ação) e que não coincide necessariamente com a proposta curricular7. É nesta última linha que nos situamos, ainda que admitindo que, por vezes, se possa subentender também uma proposta prévia, mas, nesse caso, da responsabilidade do mesmo sujeito que, assim, assume o duplo papel de destinatário e destinador do currículo.

Independentemente da variedade e divergência de aceções e entendimentos sobre o conceito de currículo, nota-se que é comum sublinhar-se a coexistência de dois planos de conceptualização do currículo: no plano das intenções, encontra-se o currículo promulgado, intencional e oficial, e o currículo interpretado e planeado; no plano do real, regista-se o currículo implementado, o currículo aprendido (e o que é ensinado). Não está escrito necessariamente, mas é aprendido pelos alunos. É a partir das interseções que podem ocorrer entre esses dois planos que surgem e se fundamentam as conceções de currículo oculto, currículo nulo, currículo paralelo, currículo implícito, currículo informal, entre outras formas de entendimento acerca das aprendizagens que decorrem do (e podem ser determinadas pelo) currículo formal prescrito, mas que não se encontram explicitamente planeadas ou previstas antecipadamente (Cuban, 1993; Doll, 1997; Eisner, 1996).

Os trabalhos de diferentes investigadores nas últimas décadas (Beyer, 2004; Cuban, 1993; Doll, 1997; Grundy, 1987; Kliebard, 2011; Marsh & Willis, 1995; Pacheco, 2013; Roldão, 2011; Selwyn, 2011; Wenger, 1998) têm demonstrado que a generalidade das aprendizagens é maioritariamente determinada pelas experiências vividas (currículo real, em ação) pelo próprio sujeito da aprendizagem (o aprendente) e menos pelo que se encontra promulgado no currículo oficial, definido pelos decisores curriculares, nos diferentes níveis de decisão. Referem, ainda, que o conceito de currículo pode ser entendido de diferentes (e novos) modos, apontando em alguns desses casos para a sua desformalização. É neste entendimento que o currículo ganha sentido na sua relação dinâmica com o digital e o não formal.

A partir de um estudo realizado recentemente, Elizabeth Almeida e José Armando Valente (2014) defendem, igualmente, a existência de um “profícuo diálogo entre o currículo do contexto formal da disciplina e o currículo dos contextos de aprendizagem visitados pelos nossos alunos” (p. 1184), o que, segundo os autores, “forneceu referências para levantarmos novas possibilidades de diálogo entre o currículo praticado nos contextos de aprendizagem não-formais e o currículo do contexto formal da escola, o que sugere uma nova abordagem da inter-relação entre currículo e cultura” (Almeida & Valente, 2014, p. 1184). A partir das práticas e experiências de aprendizagem que se geram e são proporcionadas pela Internet e pelos ambientes virtuais de aprendizagem que a integram têm surgido outras aceções de currículo. Entre essas referem-se, por exemplo, o termo Currículo 2.0 (Edson, 2007), ao considerar que a educação é conduzida pelo utilizador, que tem um papel ativo naquilo que aprende, como e quando aprende; o currículo modelado por uma matriz, “não-linear e não-sequencial” (Doll, 1997); os estudos sobre as comunidades virtuais de aprendizagem que descrevem o currículo como uma estrutura curricular flexível e aberta, segundo uma abordagem socioconstrutivista, entendido como sendo construído, no interior e pela própria comunidade de prática, em ambientes virtuais (Costa, 2007; Wenger, 1998); e o currículo enquanto comunidade, assente no conceito de aprendizagem rizomática (Bruno, 2011; Cormier, 2008) – a ação da comunidade constitui o currículo – com base no pressuposto de que a negociação distribuída do conhecimento permite à comunidade legitimar o conhecimento adquirido e demonstrado.

A partir das diversas conceções e entendimentos acerca de currículo e perspetivando-o pelo lado de quem aprende, o ‘currículo em ação’ pode ser associado às aprendizagens que cada um realiza, nos diferentes contextos formativos que experiencia ao longo da vida. Com esse olhar, quando o próprio sujeito concebe e decide acerca das suas aprendizagens e das suas experiências formativas, falamos de um entendimento acerca do currículo que designamos por currículo pessoal de aprendizagem (Viana, 2017).

Currículo pessoal de aprendizagem

No percurso pessoal de aprendizagem, quando cada um assume o papel de desenhar, de gerir e regular o desenvolvimento dos processos e experiências de aprendizagem, em vários momentos da sua vida, num determinado momento histórico, social e cultural, é o próprio que é autor e decisor curricular sobre as aprendizagens realizadas e a realizar.Referimo-nos a decisões tomadas sobre: i) o que aprender (conhecimentos de vários níveis e tipos, valores, técnicas, outros); ii) os objetivos, intenções, necessidades (que questões há para as quais se precisa ou quer uma resposta) ou interesses que mobilizam ou determinam as experiências de aprendizagem; iii) o que fazer (tarefas, atividades); iv) com que fontes (que podem ser outras pessoas) e recursos; v) como organizar a situação de aprendizagem (estratégias e técnicas mobilizadas, tempo(s) e espaço(s) onde têm lugar); vi) como agir para realizar a aprendizagem pretendida; e vii) como verificar se se aprendeu.

Recobre-se, assim, o desenvolvimento curricular na sua completude, configurando um plano e uma ação em desenvolvimento que se reformula e se reconfigura continuamente. Considera-se subjacente a esta noção de currículo a definição de um plano ou projeto (pessoal) de aprendizagem, por parte de cada um, ainda que possa ser, em alguns casos, bastante aberto, genérico, abrangente e pouco explícito, fora de um quadro ou contexto institucional(izado). Isto é, em contextos não formalizados para a aprendizagem, quando não existe qualquer entidade ou uma figura pedagógica a determinar, a guiar e a decidir sobre as aprendizagens a realizar, é o sujeito aprendente que delineia (de modo mais ou menos consciente) uma estrutura (curricular) de organização da aprendizagem. Essa estrutura é uma estrutura autoconcebida e autoconstruída, na sua maioria tomando como referência a experiência pessoal tida em contextos formais de aprendizagem e as conceções que cada um tem sobre o que é o currículo ou a ideia geral acerca da organização curricular das aprendizagens (Idem).

Nesse sentido, o processo curricular, de acordo com esta aceção, caracteriza-se (de modo simplificado), como se ilustra na Figura 1, por partir de uma conceção estratégica sobre a aprendizagem (que poderá ocorrer em situação, durante a ação) – currículo planeado.

 

 

Numa fase posterior, através de um qualquer mecanismo de avaliação ou balanço reflexivo (meta-análise, metacognição) desencadeado, o currículo aprendido é, de algum modo, formalizado, a partir do próprio sujeito que aprende, quando há uma (auto)apropriação do que foi aprendido e transformado em conhecimento construído. O currículo é (auto)formalizado.

Os próprios aprendentes fazem, mesmo que de uma forma menos explícita, sistemática ou profunda, um balanço ou apreciação reflexiva, sob a forma de avaliação das aprendizagens que realizaram e/ou do caminho percorrido e das decisões tomadas, nomeadamente sobre o modo como equacionaram cada um dos pressupostos ou componentes do currículo (objetivos, atividades, estratégias, tempo, espaço, recursos, intervenientes) (Viana, 2017).

Posteriormente, outros intervenientes podem adotar um papel crucial no processo curricular, contribuindo, de algum modo, para a legitimação social (Roldão, 1999), ou seja, o reconhecimento social dos conhecimentos adquiridos pelo aprendente, como necessários para a sua vivência económica e social, e a sua valorização, por exemplo entre os pares, em qualquer uma das dimensões: profissional, pessoal, social.

4. Metodologia

A componente empírica do estudo aqui apresentado consiste na análise de representações acerca do currículo, nomeadamente quando se realizam aprendizagens a partir do uso de tecnologias digitais, em contextos ou situações que não estão formalmente estruturadas (para o ensino ou para a formação). Visa-se, desta forma, conhecer o pensamento dos respondentes sobre currículo e, em simultâneo, verificar se o conceito de currículo por nós proposto se conforma com as representações dos participantes no estudo, confirmando, deste modo, a razoabilidade e a pertinência deste conceito.

De caráter descritivo e interpretativo, a investigação realizada situa-se no paradigma humanista-interpretativo (Amado, 2013; Cohen et al., 2000; Denzin & Lincoln, 2000; Patton, 1990), com uma abordagem investigativa de vertente qualitativa, complementada e fundamentada por dados quantitativos, com base num design parcialmente misto (Creswell, 2009; Leech & Onwuegbuzie, 2009; Tashakkori & Teddlie, 2003).

Para o seu desenvolvimento operacional, a investigação foi estruturada em dois estudos. No estudo I foram inquiridos utilizadores regulares da Internet (com mais de 18 anos de idade), através de inquérito por questionário, com questões para respostas fechadas e algumas de resposta aberta (Hill & Hill, 2009; Moreira, 2004; Rea & Parker, 1992), distribuído online (Andrews et al., 2003), sobre as aprendizagens que consideram realizar quando acedem à Internet e usam os diversos ambientes aí disponíveis. Foi feitaa revisão do questionário por parte de especialistas e realizado o pré-teste, determinantes e fundamentais na validação do questionário.O questionário foi divulgado através do envio de mensagens por correio eletrónico, individualizadas ou dirigidas a grupos específicos, em redes sociais, em comunidades virtuais e em outros grupos online. No estudo II foram realizadas entrevistas semidiretivas (Amado, 2013; Cohen et al., 2000) a adultos que consideram aprender online. Neste caso, para a seleção dos participantes procurou-se combinar sujeitos que reunissem características diversificadas entre si e idênticas às da amostra do estudo I. Isto e´, pessoas adultas de diferentes faixas etárias, com diferentes graus de formação académica completa e de diferentes áreas. Convidaram-se, assim, para participarem no estudo pessoas da rede de contactos pessoal, que reunissem os critérios definidos.

Os inquiridos foram questionados sobre a forma e as circunstâncias nas quais aprendem quando utilizam a Internet, pedindo-se-lhes para assinalarem a sua concordância, ou discordância, com um conjunto de afirmações apresentadas relativas a características elementares que podem configurar as aprendizagens online. Essas afirmações emergiram da revisão da literatura sobre o conceito de currículo, nomeadamente sobre as principais características e atributos associados às conceções de currículo, e resultaram da sua sistematização, considerando a variância que pode existir nos seus elementos constituintes (Gaspar & Roldão, 2007; Kelly, 1981; Peralta, 2005; Taba, 1974; Tanner & Tanner, 1995; Tyler, 1949), desde o currículo com uma estrutura mais aberta e flexível até ao currículo predefinido e delimitado previamente.

A análise dos dados obtidos centrou-se nas características curriculares das aprendizagens documentadas (Quadro 1): os objetivos que motivam ou desencadeiam as aprendizagens em contexto online (porquê? para quê?), os assuntos, conteúdos ou objeto de aprendizagem (o quê? sobre o quê?), as estratégias, os meios e os métodos usados, bem como as atividades realizadas (como?) e a avaliação que é feita sobre essas aprendizagens (que resultados?) (Dilon, 2009).

 

 

A opção para analisar e tratar as informações recolhidas recaiu no uso combinado de tratamento estatístico dos dados (Hill & Hill, 2009), com recurso ao software SPSS, realizando análise descritiva univariada, e bivariada para os casos em que se considerou pertinente verificar a relação estabelecida entre variáveis, através da aplicação de medidas de associação (nomeadamente ETA e coeficiente de correlação de Spearman). Foi também realizada análise de conteúdo (Bardin, 2009), utilizando o software NVivo. Com vista à obtenção de um índice de fiabilidade da categorização recorreu-se ao acordo inter-juízes (Chen & Krauss, 2004; Fonseca et al., 2007; Lima, 2013); em concreto, calculou-se o coeficiente de Kappa (k) do modo como é explicitado por Cohen (1960), enquanto estratégia de avaliação da objetividade da classificação realizada (Fonseca et al., 2007). Durante o desenvolvimento da investigação, a dimensão ética e deontológica foi considerada. Procurou assegurar-se a confidencialidade, a privacidade, o consentimento informado dos participantes e a preservação dos seus dados pessoais (Amado, 2013; Cohen & Manion, 1994; Denzin & Lincoln, 2000).

Os inquiridos nos dois estudos apresentam um perfil sociodemográfico diverso, o que permite verificar se há diferenças para algum dos aspetos considerados nas conceções tidas acerca do currículo.

No estudo I participaram 833 sujeitos, a maioria do sexo feminino (76.5%), de diferentes faixas etárias, distribuídos entre os 18 e os 64 anos. A maioria encontra-se a trabalhar (74.8%) e cerca de 21.9% estuda. Entre estes, 14.8% são trabalhadores-estudantes.

A maioria dos respondentes indica ter formação pós-graduada, ou seja, 51.7% possui uma pós-graduação, um mestrado ou um doutoramento. Entre os respondentes registam-se utilizadores que se integram numa diversidade abrangente de áreas profissionais, entre as quais se destaca consideravelmente a área de Educação (48.1%), seguida das áreas de Ciências Físicas, Matemáticas e Engenharias (11%), Artes (8.8%), Design (7.9%), Tecnologias (5.5%), entre outras (18.7%).

Relativamente ao estudo II, foram entrevistadas sete pessoas com diferentes perfis, com idades compreendidas entre os 17 e os 76 anos, entre as quais cinco são mulheres. Os participantes têm diferentes graus de formação académica (ensino secundário, licenciatura, mestrado e doutoramento), uns são estudantes (3), do ensino secundário (1) e do ensino superior (2), outros trabalhadores (5) (das áreas de design, saúde e educação) (em dois casos trabalhadores-estudantes), e uma é reformada.

5. Apresentação de resultados

Os resultados que advêm da análise das representações dos inquiridos acerca do currículo quando realizam aprendizagens a partir do uso de tecnologias digitais, em contextos não formais, permitem-nos salientar a seguinte constatação geral: das respostas dos inquiridos subentende-se uma conceção de currículo enquanto processo, em que as aprendizagens são organizadas pelo próprio aprendente, que decide sobre os conteúdos (o que aprende), as atividades e as estratégias (como aprende), o(s) tempo(s) e espaço(s) em que o faz.

A maioria dos inquiridos, quer no estudo I quer no estudo II, concorda que “na Internet cada um organiza e gere o seu próprio percurso de aprendizagem, decidindo o que aprende, como e quando aprende”, mesmo que não o defina a priori, como explica um dos entrevistados: “eu posso aprender em função dos estímulos que vou tendo e não tanto de coisas que decidi previamente. Eu acho que até prevalecem as coisas que eu não defini previamente porque sou muito suscetível àquilo que a descoberta me vai surgindo”. Outro dos entrevistados sublinhou que não define um plano, embora concretize imensas aprendizagens durante a utilização que faz da Internet: “há uma componente organizada e há uma componente desorganizada, (...) muitas vezes eu vejo um site, vou ler um artigo que alguém partilhou no Twitter, e dei por mim a ler imensas coisas. E eu não planeei fazer aquilo, no entanto aprendi imenso no processo”.

De acordo com as representações dos inquiridos, as aprendizagens realizadas online são determinadas ou condicionadas “pelo que interessa ou faz sentido para cada um”. Somente será dada a atenção necessária para aprender àquilo que faz sentido, àquilo que desperta algum interesse ou cria qualquer forma de motivação: “há sempre motivações ou algum interesse quando tu partes para um momento de pesquisa online que te leva a uma aprendizagem”. As aprendizagens realizadas online são determinadas ou condicionadas “por metas, objetivos ou necessidades da vida pessoal” e também “da vida profissional ou académica”, na perspetiva da maior parte dos inquiridos. As necessidades da vida profissional ou académica podem ser associadas aos conhecimentos valorizados socialmente, que maioritariamente nos são impostos, e às competências que a sociedade espera que cada um desenvolva, ao assumir determinado perfil profissional ou académico. Contudo, essa não foi a leitura feita pelos inquiridos, que, na sua maioria, discordam de que as aprendizagens online sejam condicionadas ou determinadas “pelo que a sociedade valoriza ou espera de cada um” ou, quando muito, mostram-se indecisos quanto a isso. Duas entrevistadas concordam, porém, considerando que o fazem numa perspetiva de acompanhar o que é valorizado socialmente: “dou por mim tantas vezes a fazer pesquisa: ‘não, mas por que é que eles dizem que isto é ótimo se eu não conheço?’. Vou querer perceber. Portanto, é uma necessidade que acaba por ser muitas vezes social, cultural”. Em determinadas situações que ocorram ou que não se percebam, “mas que a sociedade esteja a dar importância”, faz-se uma pesquisa sobre o tema.

O modo como se organizam as aprendizagens que se realizam na Internet varia: “às vezes o que começa como estruturado, passa para algo não estruturado, começa como sequencial quase a chegar a um conhecimento, tu desvias-te para o lado e já estás a explorar outro. Varia muito”. Os inquiridos consideram que na maioria das experiências de aprendizagem que realizam online existe intencionalidade (há sempre um motivo, um propósito, objetivos, um interesse). Mesmo não tendo uma intencionalidade antecipada, pode passar a tê-la em determinado momento, ou até mesmo “ser uma intenção só de procurar e não de saber o que vou encontrar”. Os inquiridos no estudo I também concordam que a maioria das experiências de aprendizagem na Internet se realiza de modo “informal” (84%). Sobre isto, os entrevistados no estudo II concordam que “é de uma forma livre.(...) não há aqui um plano de estudo”, associando o atributo informal ao contexto em que se situam, que consideram ser desprovido de qualquer estado ou caráter de formalização das aprendizagens.

Essa forma livre é associada a outro modo de aprender online que todos consideram experienciar em determinado(s) momento(s), afirmando que “muitas das aprendizagens online são realizadas de modo aleatório e ocasional”, porque existem sempre aqueles momentos “em que te apetece ir à Internet pesquisar por qualquer coisa mais aleatória”, “consoante o que vai surgindo”. Nem sempre estamos à espera de encontrar o que acabamos por encontrar, “e por vezes são informações importantes” e, a partir daí, pode-se “definir uma meta”. A percentagem de inquiridos que, no estudo I, concorda diminui consoante é maior a sua idade e o seu grau de formação, o que parece indicar que quanto mais velho se é, e com maior formação académica, menos se considera realizar aprendizagens de modo aleatório e ocasional. Algumas aprendizagens online também ocorrem “de modo organizado e estruturado”, especialmente quando têm objetivos concretos: “defino determinadas etapas, determinadas estratégias”. No estudo I é maior a percentagem de mulheres do que de homens a concordar, enquanto é maior a percentagem de homens que concorda que a maioria das experiências de aprendizagem online são de modo “fragmentado, não-linear e não sequencial”, “aleatório e ocasional”.

Em geral, os inquiridos não concordam ou mostram-se indecisos sobre o facto de se refletir quando se aprende ao utilizar a Internet, nomeadamente “sobre as atividades e os processos realizados para aprender” ou mesmo “sobre os resultados alcançados”, considerando-se a dimensão relacionada com a avaliação das aprendizagens. Os entrevistados no estudo II consideram que a reflexão sobre as aprendizagens realizadas (o que foi feito e alcançado, o que podia ser feito de outra forma), quando ocorre, é realizada a posteriori: “não é propriamente durante o período que passo na Internet que reflito sobre as atividades”, explicitando o tipo de reflexão que faz: “o que às vezes penso é, (...) se calhar podia ter ido ali procurar. (...) Principalmente quando não encontro a resposta para aquilo que pretendo, não é?”.

No que se refere ao tempo e espaço, a esmagadora maioria dos inquiridos concorda que as aprendizagens na Internet ocorrem “numa variedade de ambientes online (websites, blogs, grupos ou comunidades virtuais, redes sociais, ...)” e “numa variedade de dias e horários”. Os tempos (dias ou horários) em que se acede à Internet e se aprende não estão definidos previamente, mesmo para quem é mais organizado e define planos de aprendizagem. Segundo os entrevistados, isso pode eventualmente acontecer, mas raramente e em situações muito específicas. No estudo I, os homens (73%) e o grupo de respondentes com idades compreendidas entre os 45 e os 64 anos (78%) são quem mais concorda que “as aprendizagens na Internet ocorrem em ambientes online específicos e selecionados por cada um”. A esse propósito, no estudo II, os entrevistados explicam que há ambientes que selecionam (regularmente) para aprender, de acordo com os seus objetivos e propósitos: “quando tenho um objetivo eu escolho os ambientes em que me movo, ou já os escolhi, mas posso vir a escolher outros e alterar”.

Sozinhos é a forma que a maioria dos inquiridos seleciona quando referem que se aprende online. Alguns dos entrevistados analisam esta pergunta, questionando o que é aprender sozinho online uma vez que se acede a informação criada e partilhada por outras pessoas: “Quer dizer, no fundo estás sozinho. Mas na Internet estão as pessoas. (...) e o que está na Internet foi feito por alguém. Aprendes com as outras pessoas, mas sozinha, não está ninguém contigo no computador”. Da mesma forma, todos consideram que online aprendem com os outros, entre os quais se identificam diferentes grupos, nomeadamente “todas as pessoas com quem estamos em contacto e podemos interagir” e “as pessoas com interesses comuns aos nossos”. Aprende-se qualquer coisa com cada pessoa com quem se interage – “mesmo que não tenha nada a ver com a minha área. Acho que estou sempre a aprender com pessoas diferentes” – e essencialmente a partir da interação estabelecida, e não tanto em termos de conteúdos. As pessoas com interesses comuns podem ser colegas (da mesma área profissional, de trabalho, amigos) ou pessoas numa situação ou fase de aprendizagem similar à nossa: “a pessoa pode não ser um especialista, pode ser uma pessoa que está numa fase de aprendizagem similar à tua, o que também é interessante, partilhar experiências (...). Para perceber as dificuldades que elas têm e como é que resolveram esses problemas”. Observa-se, no estudo I, que quanto mais velhos, menos concordam com a ideia de aprender com o grupo de pares. A maior percentagem de discordância entre a generalidade dos inquiridos é relativa ao facto de na Internet se aprender, essencialmente, “com especialistas de determinada(s) área(s)”. Alguns concordam que aprendem com especialistas – por exemplo, as “pessoas que escrevem artigos” a partir dos quais se adquirem conhecimentos válidos e fidedignos – e com a possibilidade de se lhes dirigirem: “tu se quiseres (...) dirigires-te a um especialista”. No estudo I, verifica-se que são mais os homens que concordam (63.7%) com essa ideia. Por sua vez, há mais mulheres a concordarem que aprendem essencialmente “em grupo ou comunidade, de modo colaborativo” (77.8%): “eu por exemplo aqui no Facebook colaboro com um grupo que é a comunidade da fotografia”.

Em síntese, em contextos não formais online, para além de sozinhos, aprende-se essencialmente com pessoas com interesses comuns; sobre conteúdos específicos (sobre os quais há uma necessidade de aprender) ou sobre assuntos novos (que se encontram inesperadamente e despertam interesse para saber mais); e numa variedade de dias e horários, em diversos ambientes online (websites, grupos ou comunidades virtuais, redes sociais, entre outros).

A partir da análise das representações dos inquiridos verifica-se que a conceção geral acerca do currículo pouco varia em função do seu perfil sociodemográfico, o que demonstra uma consolidação da conceção tida acerca de currículo, no contexto e circunstâncias de aprendizagem considerados na investigação realizada. Identificam-se algumas variações nas suas representações em função do sexo, idade ou grau de formação académica, ainda que sem significância. Não se registam quaisquer variações considerando a sua área profissional ou se estão a estudar, a trabalhar, ambas ou em outra situação.

Conceção geral acerca do currículo na era digital

Após a análise das representações que os diferentes sujeitos adultos inquiridos têm acerca de aprendizagens que realizam em contexto online, discute-se a conceção geral acerca do currículo, em articulação com a análise teórica e conceptual realizada, entendendo o currículo enquanto conceção, organização e estruturação do processo de aprender, que se corporizou sob a aceção de currículo pessoal de aprendizagem (Viana, 2017).

A generalidade das experiências de aprendizagem que decorre da utilização da Internet, e é realizada em contextos não formais, parte de determinada intencionalidade (sem regulação ou avaliação explícitas), quer seja um determinado motivo, propósito, interesse, objetivo, ou uma necessidade, de foro pessoal, profissional ou académico. A intencionalidade não tem necessariamente de ser prévia ao momento de aprendizagem, nem o é em grande parte das situações, podendo tornar-se expressa durante a ação, em função de determinados estímulos que promovem a realização de (outras) aprendizagens, que, apesar de não terem sido previstas, são consideradas pertinentes.

A dimensão individual do currículo neste contexto situa-o num eixo conceptual entre o social, político alargado, e um conceito utilitário. Isto é, da mesma forma que no currículo formal se reflete “oconflito entre interesses dentro de uma sociedade e os valores dominantes que regem os processos educativos” (Gimeno Sacristán, 1989, p. 17), em contextos não formais o currículo reflete o conflito existente entre os interesses pessoais e os valores dominantes na sociedade que regem as necessidades deaprendizagem sentidas pelo próprio sujeito que aprende, sobretudo em termosprofissionais e académicos.

Na sua maioria, as experiências de aprendizagem tidas ou desencadeadas em contextos online não formais não são organizadas ou estruturadas previamente, nem definidas e delimitadas a priori. A sua organização e delimitação vão-se tornando expressas durante a ação ou a experiência propriamente dita. E é o próprio sujeito quem decide e define, livremente, o que quer aprender, o que aprende, como aprende e como se organiza para aprender, num ambiente que se caracteriza por ser desprovido, a priori, de qualquer estado ou caráter de formalização. Essa forma livre é associada ao modo aleatório e ocasional (que se pode designar por serendipity), como vimos no enquadramento, que se experiencia em determinado(s) momento(s) em ambientes online, em que não existe uma intencionalidade explícita ou a definição prévia de um plano de aprendizagem, mas, ao navegar-se na Internet e aceder-se a determinada informação, é-se reportado, inesperadamente, para a realização de aprendizagens. Ou seja, apesar de as aprendizagens online nestes contextos serem desprovidas, a priori, de qualquer estado ou caráter de formalização, a generalidade das experiências de aprendizagem é pautada por alguma estruturação e realiza-se de modo sequencial, isto é, respeitando um conjunto de etapas, definidas pelo próprio aprendente, que escolhe um determinado período de tempo para realizar certas atividades e alcançar os seus propósitos. As aprendizagens ocorrem de modo organizado, a partir de orientações ou de um plano que o próprio cria ou vai definindo, tomando decisões quanto a isso.

O conceito (de currículo) informal aplicado nestas circunstâncias é ambíguo e menos apropriado, na medida em que, apesar de tudo, há uma formalização ou curricularização dessas aprendizagens, uma formalização que é autoconstruída. Ou seja, se eu programo e/ou me organizo para aprender, deixa de ser informal e passa a ser a uma formalização que eu próprio crio. O currículo neste contexto e circunstâncias pode-se considerar informal no sentido em que o aprendente não segue um conjunto de orientações para a aprendizagem que estejam formalmente instituídas e predefinidas por outros, no seio de determinado quadro institucional. No entanto, o próprio sujeito, ao construir individualmente o seu currículo, ou seja, ao organizar o processo ou percurso de aprendizagem, formaliza o modo como desenvolve o currículo de aprendizagem – o seu currículo pessoal de aprendizagem.

6. Conclusões

Neste texto procurou-se contribuir para a reflexão sobre a reconstrução do conceito de currículo no século XXI alicerçado quer na sua evolução teórica e conceptual, considerando as conceções presentes na era digital (e.g., Beyer, 2004; Cuban, 1993; Doll, 1997; Goodson, 2001; Grundy, 1987; Kliebard, 2011; Marsh & Willis, 1995; Pacheco, 2013; Pinar, 2008; Roldão, 2011; Selwyn, 2011; Wenger, 1998), quer nos resultados do estudo empírico, a partir das representações dos inquiridos sobre currículo quando usam tecnologias digitais e realizam aprendizagens online. Corporiza-se o conceito de currículo na conceção cunhada por currículo pessoal de aprendizagem. Um currículo autónomo, individualizado, cujo desenvolvimento o digital propicia e facilita.

Nesta aceção, o currículo está associado às experiências de aprendizagem vividas e às atividades realizadas pelo próprio aprendente, atividades movidas pela sua intencionalidade, e não por parte de professores, formadores ou outros decisores curriculares, e que se desenrolam ao longo do seu processo pessoal de aprendizagem, num percurso que é construído e desenvolvido, especialmente, ao longo da vida adulta.

Constata-se, contudo, que os aprendentes, de alguma forma e naturalmente, tendem a reproduzir o(s) modelo(s) de currículo que prevaleceu(eram) ao longo do seu percurso escolar, especialmente quando previamente se organizam para aprender, concebem e estruturam as condições nas quais levam a cabo essas aprendizagens e, conscientemente, fazem escolhas e tomam decisões de natureza curricular. São os próprios aprendentes que assumem o desenho e a organização curricular das aprendizagens que realizam (ou tencionam realizar), ao invés de essas decisões serem tomadas por outros, especialmente quando usam tecnologias digitais e acedem à Internet para aprender.

O espaço e o tempo, as estratégias e os intervenientes constituem as componentes do currículo que mais se alteram e se distinguem nessas situações, comparativamente com o que acontece em contextos formais, nos quais prevalecem aprendizagens institucionalizadas. É tomando esses elementos, ou pressupostos, como referência que se tece um conjunto de considerações conclusivas sobre os principais atributos que caracterizam o currículo neste contexto de aprendizagem e os modos como se desenvolve nessas circunstâncias, de acordo com as conceções tidas pelos inquiridos nesta investigação: a) a especificação dos elementos organizadores da aprendizagem (objetivos, estratégias, avaliação) e o conferir-lhe um caráter mais ou menos estruturado, delineando previamente ou não as circunstâncias de aprendizagem, são decisões tomadas pelo sujeito que aprende; b) na generalidade das experiências de aprendizagem reconhece-se alguma intencionalidade que determina a respetiva conceção e organização curricular, num processo em que o aprendente é, na maioria das situações, o principal interveniente; c) o tempo e espaço são ubíquos e flexíveis, não estando pré-definidos nem delimitados previamente; d) a avaliação constitui a componente curricular que parece ser menos explícita e reconhecida pelos autores das aprendizagens em contextos não formais online.

Neste contexto, não existindo um processo concreto de ensino, é o próprio sujeito que se ensina a si próprio, fundindo-se o ensinar e o aprender. E, sendo o aprendente o agente central e o principal decisor curricular, o currículo, neste contexto e circunstâncias, depende, também, de fatores ou fontes de pressão externas, nomeadamente: o contexto social em que se integra e o quanto serão valorizadas socialmente as aprendizagens que realiza, por exemplo em termos profissionais ou académicos; os contextos político e económico; e a própria formação inicial e contínua do aprendente (Kelly, 1981). Isto é, o desenho do currículo varia também em função das crenças e dos valores tidos pelo aprendente sobre educação (Ornstein & Hunkins, 2009).

Os contextos formais nos quais se realiza a aprendizagem institucionalizada, como se enquadrou neste trabalho, e os currículos aí vigentes são determinantes para o desenvolvimento do currículo pessoal de aprendizagem, uma vez que funcionam como base estruturante para o caminho que se constrói posteriormente em contextos de aprendizagem não formalizados.

 

Referências

Almeida, M. E., & Valente, J. A. (2014). Currículo e contextos de aprendizagem: Integração entre o formal e o não-formal por meio de tecnologias digitais. Revista e Curriculum, 12 (2), 1162-1188.         [ Links ]

Amado, J. (Coord.). (2013). Investigação qualitativa em educação. Imprensa da Universidade de Coimbra.         [ Links ]

Andrews, D., Nonnecke, B., & Preece, J. (2003). Eletronic survey methodology: A case study in reaching hard-to-involve internet users. International Journal of Human-Computer Interaction, 16 (2), 185-210.         [ Links ]

Bardin, L. (2009). Análise de conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70.         [ Links ]

Beyer, L. (2004). Direcções do Currículo: As realidades e as possibilidades dos conflitos políticos, morais e sociais. Currículo sem Fronteiras, 4 (1), 72-100.         [ Links ]

Bobbitt, F. (1918). The curriculum. Cambridge, U.K.: Houghton Mifflin Company. Acedido em março de 2016 em https://archive.org/details/curriculum008619mbp .         [ Links ]

Brown, R. (2007). Curriculum consonance in technology education classrooms: The official, intended, implemented, and experienced curricula.ProQuest, Indiana University - School of Education.         [ Links ]

Bruno, A. R. (2011). A mediação partilhada em redes rizomáticas: (Des)territorialização de possibilidades para a discussão sobre o ser tutor e a tutoria em cursosonline. In H. Fontoura & M. Silva (Org.),Práticas pedagógicas, linguagem e mídias: Desafios à pós-graduação em educação em suas múltiplas dimensões(pp. 116-131). ANPEd Nacional.         [ Links ]

Canário, R. (2005). O que é a escola? Um “olhar” sociológico. Porto Editora.

Canário, R. (2006). Aprender sem ser ensinado. A importância estratégica da educação não formal. InL. Lima, J. A. Pacheco, M. Esteves, & R. Canário,A educação em Portugal (1986-2006): Alguns contributos de investigação(pp. 195-254).SPCE.

Chen, P., & Krauss, A. (2004). Interrater agreement. In M. Lewis-Beck, A. Bryman, & T. Liao (Eds.),The Sage encyclopedia of social science research methods(pp. 511-513). Sage Publications.         [ Links ]

Cohen, J. (1960). A coefficient of agreement for nominal scales.Educational and Psychological Measurement, 20(1), 37-46.         [ Links ]

Cohen, L., & Manion, L. (1994). Research Methods in Education. Routledge.         [ Links ]

Cohen, L., Manion, L., & Morrison, K. (2000). Research methods in education. Routledge.         [ Links ]

Cormier, D. (2008). Rhizomatic education: Community as curriculum. Innovate: Journal of Online Education, 5(4).         [ Links ]

Costa, A. F., Cardoso, G., Coelho, A. R. & Pereira, A. (2015). A sociedade em rede em Portugal – Uma década de transição. Almedina.

Costa, C. (2007). O currículo numa comunidade de prática.Sísifo, 3, 87-100.         [ Links ]

Creswell, J. W. (2009).Research design. Sage Publications.         [ Links ]

Cuban, L. (1993). The lure of curricular reform and its pitiful history.Phi Delta Kappan, 75(2), 182-185.         [ Links ]

Denzin, N. K., & Lincoln, Y. S. (Eds.). (2000). Handbook of qualitative research. Sage Publications.         [ Links ]

Dewey, J. (1902).The child and the curriculum. Chicago: The University of Chicago Press.Disponível em https://archive.org/stream/childandcurricul00deweuoft#page/23/mode/thumb .         [ Links ]

Dilon, J. T. (2009).The questions of curriculum. Journal of Curriculum Studies, 41 (3), 343-359.         [ Links ]

Doll, W. (1997).Currículo: Uma perspetiva pós-moderna.Artes Médicas.         [ Links ]

Downes, S. (2006). Learning Networks and Connective Knowledge. Instructional Technology Forum. Disponível em http://www.it.coe.uga.edu/itforum/paper92/paper92.html .         [ Links ]

Edson, J. (2007). Curriculum 2.0: User-driven education. The Huffington Post.Acedido em dezembro de 2017 em http://www.huffingtonpost.com/jonathan-edson/curriculum-20-userdriven_b_53690.html        [ Links ]

Eisner, E. W. (1996). Cognition and Curriculum Reconsidered.Paul Chapman Publishing.         [ Links ]

Fonseca, R., Silva, P., & Silva, R. (2007). Acordo inter-juízes: O caso do coeficiente kappa. Laborato´rio de Psicologia, 5 (1), 81-90.

Gaspar, M. I., & Roldão, M. C. (2007). Elementos do desenvolvimento curricular. Universidade Aberta.         [ Links ]

Gimeno Sacristán, J. (1989). El curriculum: Una reflexión sobre la práctica. Ediciones Morata.         [ Links ]

Gimeno Sacristán, J. (1999). Comprender y transformar la enseñanza. Ediciones Morata.         [ Links ]

Goodson, I. (2001). O currículo em mudança. Estudos na construção social do currículo. Porto Editora.         [ Links ]

Grundy, S. (1987). Curriculum: Product or praxis?Falmer Press.         [ Links ]

Hargreaves, A. (1998). Os professores em tempos de mudança. O trabalho e a cultura dos professores na idade pós-moderna. Mc Graw Hill.         [ Links ]

Hill, M. M., & Hill, A. (2009). Investigação por questionário. Edições Sílabo.         [ Links ]

Kelly, A. V. (1981). O currículo. Teoria e prática. Harbra.         [ Links ]

Kliebard, H. (2011). Os princípios de Tyler. Currículo sem Fronteiras, 11(2), 23-35.         [ Links ]

Leech, N., & Onwuegbuzie, A. (2009). A typology of mixed methods research designs.Quality & Quantity, 43(2), 265-275.         [ Links ]

Lima, J. A. (2013). Por uma análise de conteúdo mais fiável. Revista Portuguesa de Pedagogia, 47(1), 7-29.         [ Links ]

Lima, L. (2005). A educação de adultos em Portugal (1974-2004). In R. Canário & B. Cabrito (Orgs.),Educação e formação de adultos. Mutações e convergências(pp. 31-60). Educa/IEFP.

Marsh, C. J., & Willis, G. (1995).Curriculum: Alternative approaches, ongoing issues.Merrill.         [ Links ]

Means, B. (2008). Technology’s role in curriculum and instruction. In M. Connelly (Ed.),The Sage Handbook of curriculum and instruction (pp. 123-144). Sage Publications.

Moreira, J. M. (2004). Questionários: Teoria e prática. Almedina.         [ Links ]

Ornstein, A. C., & Hunkins, F. (2009). Curriculum:Foundations, principles and issues. Pearson.         [ Links ]

Pacheco, J. A. (2013). Estudos curriculares. Génese e consolidação em Portugal.Educação, Sociedade & Culturas, 38, 151-168.         [ Links ]

Patton, M. (1990). Qualitative evaluation and research methods. Sage Publications.         [ Links ]

Peralta, M. H. (2005). Currículo: O plano como texto. Um estudo sobre a aprendizagem da planificação na formação inicial de professores de alemão. Fundação Calouste Gulbenkian; FCT.         [ Links ]

Pinar, W. (2008). Curriculum theory since 1950. Crisis, reconceptualization, internationalization. In M. Connelly (Ed.), The Sage Handbook of curriculum and instruction (pp. 491-513). Sage Publications.         [ Links ]

Rea, L. M., & Parker, R. A. (1992). Designing and conducting survey research. A comprehensive guide. Jossey-Bass Publishers.         [ Links ]

Roldão, M. C. (1999). Gestão curricular: Fundamentos e práticas. DEB.         [ Links ]

Roldão, M. C. (2011). Um currículo de currículos. Edições Cosmos.         [ Links ]

Santaella, L. (2014). Comunicação ubíqua. Repercussões na cultura e na educação. Paulus Editora (eBook).         [ Links ]

Schiro, M. (2013). Curriculum theory. Conflicting visions and enduring concerns. Sage Publications.         [ Links ]

Selwyn, N. (2011). Em defesa da diferença digital: Uma abordagem crítica sobre os desafios curriculares da Web 2.0. In P. Dias & A. Osório (Orgs.), Aprendizagem (in)formal na Web social. Centro de Competência da Universidade do Minho.         [ Links ]

Siemens, G. (2005). Connectivism: A learning theory for the digital age.International Journal of Instructional Technology & Distance Learning, 2 (1), 3-10.         [ Links ]

Taba, H. (1974). Elaboración del currículo.Teoría y práctica. Ediciones Troquel.         [ Links ]

Tanner, D., & Tanner, L. (1995). Curriculum development: Theory into practice. Prentice-Hall.         [ Links ]

Tashakkori, A., & Teddlie, C. (Eds). (2003). Handbook of mixed methods in social & behavioral research. Sage Publications.         [ Links ]

Tyler, R. (1949). Basic principles of curriculum and instruction.The University of Chicago Press.         [ Links ]

Vasconcellos, C. S. (2009). Currículo: A atividade humana como princípio educativo. Libertad.         [ Links ]

Viana, J. (2017). Currículo em contextos informais: contributos para a (re)conceptualização do conceito de currículo a partir de aprendizagens online (2016). [Tese de Doutoramento em Educação, Universidade de Lisboa].         [ Links ]

Viana, J., Peralta, H. & Costa, F. (2017). Digital Non-Formal Education as an Opportunity to Transform School. In G. Ílin; S. Ilin; B. Silva; A. Osório e J. A. Lencastre (Eds). Better e-learning for innovation in education.(pp. 197-214). ÖzKaracan Matbaacilik

Wenger, E. (1998). Communities of practice. Learning, meaning and identity. Cambridge University Press.         [ Links ]

 

Recebido em 27 de agosto de 2019

Aceite para publicação em 4 de maio de 2020

 

Endereço para Correspondência

Toda a correspondência relativa a este artigo deve ser enviada para:

Joana Viana

Rua Dom Luís de Noronha, 36, 6ºC

1050-073 Lisboa

jviana@ie.ulisboa.pt

 

Notas

1Perspetiva assumida considerando a aprendizagem sobre as dimensões da vida, num prisma de educação aberta, de acordo com as intenções iniciais dos autores da Educação Permanente, que surge como um princípio organizador de todo o processo educativo – continuidade, diversidade e globalidade – e não enquanto educação e formação ao longo da vida, na perspetiva que é marcada pelo princípio da empregabilidade (ver, por exemplo, a análise e discussão que são realizadas por autores como Canário, 2005, 2006; Lima, 2005).

2Associada, por vezes, aos princípios do conectivismo (Siemens, 2005) e às perspetivas sobre a aprendizagem em rede (Downes, 2006).

3A partir do uso de dispositivos móveis para aprender emerge a noção de aprendizagem ubíqua, caracterizada por ser espontânea, acidental, caótica e fragmentada, inadvertida e não deliberada. Prescinde da equação ensino-aprendizagem e faz emergir um processo de aprendizagem sem ensino (Santaella, 2014).

4Serendipity(ou serendipidade, no termo usualmente adotado em língua portuguesa) é uma palavra que resume uma ideia complexa, isto é, é sobre o acaso que não é acaso. Refere-se a um estado, uma sensação, um momento ou situação que se caracteriza por uma certa aleatoriedade ou incerteza, quando se encontra algo que é proveitoso para o próprio apesar de não existir essa intenção consciente a priori, ou seja, sem o ter procurado deliberadamente. Depois de acontecer (se encontrar, sentir ou experienciar), eventualmente percebe-se o que se alcançou e como se desenrolou. Esta é uma das formas que a aprendizagem informal pode adotar, assemelhando-se e, de alguma forma, sobrepondo-se à noção de ubiquidade, referida anteriormente.

5Genericamente, assiste-se à clivagem ou separação entre dois grupos: os que têm acesso à informação e ao conhecimento através de meios tecnológicos e digitais e os que não têm e que ficam excluídos devido à falta de conhecimentos e de domínio do meio digital (Costa et al., 2015).

6A esse propósito consultar, por exemplo, a análise das ideologias curriculares realizada por Michael Schiro (2013).

7Uma noção mais abrangente, visto como “curso da vida, trajetória do educando, para diferenciar de curriculumvitae, que na sua aceção comum é entendido como documento-resenha da vida profissional” (Vasconcellos, 2009, p. 27).

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons