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Revista Portuguesa de Educação

versão impressa ISSN 0871-9187

Rev. Port. de Educação vol.26 no.1 Braga  2013

 

Editorial

Maria de Lourdes Dionísio e Fátima Antunes

 

A Revista Portuguesa de Educação inicia mais um ano da sua existência com um volume constituído por doze textos, os quais, como é sua característica, têm origem nos múltiplos campos do pensar e fazer Educação. É também um número inaugural, desta vez porque inicia a sua divulgação em edição online, no sistema OJS, propiciado pelo Serviço de Alojamento de Revistas Científicas (SARC), do Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP). Com esta medida, reforça-se o estatuto de máxima excelência que a revista quase artesanalmente foi construindo para si, ao mesmo tempo que, de forma mais cabal, se concretizam os seus objetivos de sempre, nomeadamente o de difundir conhecimento original e atual e fomentar o desenvolvimento de redes científicas nacionais e internacionais.

Abre o número com um texto de Susana Gonçalves no âmbito dos efeitos do sexo, do estilo educativo parental e da experiência no ensino superior sobre as variações nas escolhas dos estudantes quanto aos valores sociomorais, inferidos a partir dos seus modelos sociais de excelência. Se os atributos de natureza sociomoral parecem contribuir mais para essa avaliação de excelência moral, outros são também considerados relevantes. Por outro lado, confirma-se a decisiva influência dos processos de socialização durante a infância e adolescência nas preferências dos estudantes, mesmo se os professores e outros profissionais assumem um papel importante na sua organização e formação sociomoral. Se os valores e os modelos de excelência variam de acordo com os papéis sociais e os contextos em que são avaliados, também o género e os estilos educativos parentais afectam as escolhas de valores, que apenas de maneira difusa aparecem influenciados pela experiência no ensino superior.

Tiago Ribeiro Santos e Rita de Cássia Marchi, posicionados na interface da sociologia da educação com a história da educação, instituem um romance brasileiro, publicado originalmente em 1888, como objeto de análise dos ritos de instituição de um colégio de “elite da época”: o Ateneu. Tendo como objetivo destacar as condições simbólicas que permitem a reprodução da ordem interna, e assumindo, na esteira de Bourdieu, que a literatura constrói realidades, os Autores concluem que as práticas constitutivas dos ritos nessa instituição, para além de se apresentarem como o expoente máximo da educação do seu tempo, consagram a escola, na medida em que ratificam e reproduzem a “crença” que lhe é  atribuída.

A criação da Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos (ANEFA) em Portugal, em 1999, é analisada por Rosanna Barros, no quadro da emergência da europeização das políticas e da governação pluriescalar para o sector. Argumenta-se que um “entendimento paliativo para a missão” da educação e formação dirigidas a adultos foi expressão da força do mandato europeu de articulação entre educação, formação e emprego, que inscreveu o setor na agenda política do governo e promoveu a reconcetualização das suas temáticas tradicionais no âmbito das “novas políticas” de EFA. De acordo com a autora, a ANEFA desempenhou um papel chave no arranque das novas estratégias políticas de emprego e formação de ativos, contribuindo para “legitimar uma mais vasta reformulação do papel do Estado de bem-estar (cada vez mais mitigado)” na produção de políticas sociais.

O quarto texto, da autoria de Patrícia Sá e Fátima Paixão, problematiza o conceito de competência, integrando e sistematizando elementos diversos, entendidos pelas Autoras como capazes de contribuir para a compreensão de um conceito tão complexo como este é. Da análise de divergências e consensos, concluem que o termo é impreciso, o que acaba por ter um impacto negativo em vários lugares de decisão e práticas, nomeadamente nos discursos internacionais sobre as reorganizações curriculares com enfoque nas competências. Neste sentido, defendem a necessidade da continuação da investigação sobre a temática de modo a garantir a eficácia num ensino assim orientado e de “acordo com os princípios de Bolonha”. 

Situados explicitamente no quadro do processo de Bolonha, os Autores do texto Implementação de novas práticas pedagógicas no Ensino Superior apresentam a fundamentação e o desenvolvimento do projeto “Construção da Aprendizagem”, tomando como referências “o ensino centrado no estudante” e “baseado na aquisição de competências”, numa instituição de ensino superior portuguesa, desde 2010/2011. Tendo sido já desenvolvido ao longo de várias fases, foi possível recolher informação de natureza diversa e reformular quer os processos quer os instrumentos de registo e avaliação, bem como sistematizar e comunicar algumas das suas realizações.

Álvarez Arregui, Rodriguez Martín e Gonçalves, adotando uma perspetiva biológica de ecosistema, apresentam dados no âmbito de uma investigação longitudinal sobre formação blended learning, opção educativa que aproveita as vantagens das tecnologias e do ensino presencial. Com o objetivo de conhecer como valorizam os estudantes o ecosistema de formação desenhado e quais os efeitos nos estilos de aprendizagem, o estudo exploratório realizado permitiu identificar pontos fortes e fracos do modelo, entre outros e respetivamente, o uso de metodologias ativas e a necessidade de aperfeiçoar os sistemas de apoio como, por exemplo, as tutorias entre pares.

O sétimo texto, de Preciosa Silva, Ana Maria Morais e Isabel Pestana Neves, toma como objeto de análise vários documentos reguladores do Ensino de Ciências no 1º ciclo do Ensino Básico. Sustentada na teoria do Discurso Pedagógico de Basil Bernstein, a análise sobre o que se ensina e sobre a forma como se ensina dá conta das diferenças nas mensagens desses documentos. Tais diferenças, segundo as Autoras, podem influir negativamente tanto nas práticas dos professores como na concepção dos manuais escolares.

Na continuidade da linha de investigação do texto anterior, aliás já longamente desenvolvida pela equipa em que se situam as Autoras, Vanda Alves e Ana Maria Morais discutem em que medida a prática pedagógica de professores de Ciências Naturais recontextualiza o Discurso Pedagógico Oficial veiculado no currículo da mesma disciplina. Construindo um percurso metodológico que combina as abordagens qualitativa e quantitativa, a investigação apreendeu processos de recontextualização quer ao nível do campo de recontextualização oficial quer entre este e o campo de reprodução pedagógica. Os sentidos desses processos suscitam, de acordo com as Autoras, fundadas questões, em particular no que toca a formação de professores e a promoção do desenvolvimento profissional em contextos de maior autonomia pedagógica, com vista ao favorecimento da literacia científica de todos os alunos.

Igualmente situadas na sala de aula, particularmente nos recursos para o ensino da Matemática, Dilaila Botas e Darlinda Moreira apresentam um estudo que teve por objetivo conhecer os materiais didáticos mais frequentes na prática pedagógica de um agrupamento de escolas do 1º ciclo e que concepções pedagógicas presidem a esse uso. Apresentando-os como materiais que ajudam os alunos na aprendizagem, os professores do estudo valorizam estes recursos sobretudo pelo seu lado motivador e, confirmando outras investigações, encaram-nos como imprescindíveis para a aprendizagem matemática e compreensão de situações abstratas

Com o título Projetos de Educação para a saúde em meio escolar: da avaliação às práticas de referência, o artigo seguinte explora um modelo avaliativo desenvolvido num estudo multicasos e analisa práticas de referência no campo. Foram considerados cinco projectos em curso em 2009/10 em outras tantas escolas/Agrupamentos de 2º e 3º CEB, um por cada Direção Regional de Educação. O estudo permitiu construir um referencial de avaliação externa, capaz de complementar o processo de avaliação interna, assim como de caraterizar práticas de referência como contributo relevante para contextualizar e analisar as dinâmicas das intervenções e sustentar a reflexão sobre as problemáticas evocadas.

Cláudia Colaço e Isabel Sanches, no âmbito de uma investigação-ação realizada numa escola de 1º ciclo do ensino básico, e que teve como objetivo promover a aprendizagem de um grupo de alunos que contava no seu seio com uma criança considerada com necessidades educativas especiais de carácter permanente, apresentam os dados de uma intervenção que pretendeu criar um ambiente inclusivo para cada aluno. Por recurso a estratégias de aprendizagem cooperativa, aumentaram a qualidade e quantidade das aprendizagens das crianças, ao mesmo tempo que promoveram “uma outra forma de ‘olhar’ a diferença”.

No último texto, Eduardo Alves discute como tem vindo a desenhar-se na Madeira, em paralelo com a evocação legitimatória do discurso da competitividade e da implementação da lógica do mercado, quer o sistema educativo regional quer o debate em torno da centralização/descentralização. O artigo aborda a problemática e o processo de autonomia no contexto português pós-25 de Abril, com destaque para a Região Autónoma, a fim de analisar visões e tempos políticos da educação na Madeira. O Autor argumenta a favor de perspetivas futuras na senda de uma regulação autónoma educativa e de um projeto e subsistema educativos regionais próprios, em sintonia com um horizonte de desenvolvimento endogenamente referenciado e articuladamente construído.

Encerra o número com duas recensões, uma da autoria de Dora Luís sobre uma obra de Rosanna Barros, Genealogia dos Conceitos em Educação de Adultos: Da Educação Permanente à Aprendizagem ao Longo da Vida – Um estudo sobre os fundamentos político-pedagógicos da prática educacional e outra de Silvania Colaço e Cândida Pinto sobre a obra coletiva Projetos de letramentos: debates e aplicações.