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Revista Portuguesa de Educação

versão impressa ISSN 0871-9187

Rev. Port. de Educação v.23 n.1 Braga  2010

 

Editorial

 

Recentemente, afirmou-se na imprensa diária que Portugal publicava, por ano, 7.000 artigos científicos com “significado internacional”. Embora não fosse dito qual o critério para a atribuição deste significado, sabemos que dirá respeito à indexação das Revistas, onde os textos foram publicados, em bases de dados (numa base de dados?) que medem o “factor de impacto”. Na sua grande maioria, não serão, pois, revistas científicas nacionais nem em língua portuguesa, mesmo que internacionais. Sem pretender reproduzir aqui a polémica à volta das “revistas de impacto” que, nos últimos tempos, tem circulado entre a comunidade académica, com denúncias de como a medição enfermará de deficiências e enviesamentos técnicos ou de como os processos de inclusão nessas bases pecam, muitas vezes, por falta de transparência; não pretendendo também discorrer sobre o verdadeiro significado do “impacto”, não podemos deixar de nos unir aos argumentos de um colega editor de uma revista portuguesa que há bem pouco tempo, também no seu editorial, apelava para “que o número de revistas em língua portuguesa que integram essas bases de dados cresça”. Sabendo que a aceitação das revistas portuguesas, particularmente as da área das Ciências Sociais, não resultará nunca de movimentos solitários, caberá, portanto, aos governos e às suas agências de promoção e financiamento da ciência um papel activo nesse alargamento. Mas cabe-lhes antes de tudo assumir o valor internacional das bases de que são patrocinadores, por exemplo, as bases hispano-americanas Latindex, Redalyc, Scielo, cujos critérios de qualidade editorial e científica estão a par, ou mesmo acima, dos das bases comerciais. No que diz respeito à Revista Portuguesa de Educação, o “significado internacional” dos textos que publica é bem patente não só nos artigos que lhe são submetidos, como nas citações que estes incluem. O número agora disponível é disto exemplo. Entre os seus oito textos, um é do México, cinco do Brasil e dois de Portugal. Alguns citam já textos anteriormente publicados na RPE, sinal inequívoco da pertença dos nossos autores a uma já muito alargada comunidade científica não exclusivamente de língua portuguesa.

Abre este número com um texto de Mariana Gaio Alves que interpela os actuais discursos sobre a Aprendizagem ao Longo da Vida. Da análise dos sentidos que lhe são atribuídos e das alterações que promove nas políticas educativas e processos de educação e formação, a Autora conclui que “existem poucos elementos portadores de “novidade” em toda esta centralidade crescente da ideia de aprendizagem ao longo de vida”. No segundo texto, Aloísio Ruscheinsky discute práticas e políticas no âmbito da educação e sociedades sustentáveis, particularmente o modo como as ciências sociais podem contribuir para este debate. O texto assume-se como uma “provocação sobre a denominação, os condicionamentos e os nexos entre educação e sociedades sustentáveis” de modo a suscitar, “tanto interrogações urgentes quanto a busca por práticas sociais e responsabilidades públicas”. Segundo o Autor, “o resultado almejado é apontar controvérsias envolvidas no nexo entre atores sócio-ambientais e a constituição de sociedade sustentável”. O texto de Neusa Dal Ri e Cândido Vieitez, sobre a pedagogia do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, desvela categorias relativas ao funcionamento e organização de uma escola pública de que aquele Movimento detém a posse. O estudo permite concluir que, por exemplo, o “conceito teórico-prático de democratização da escola pública transcende a categoria formal-oficial de gestão democrática”. Liliana Ferreira reflecte sobre o trabalho dos professores e sua relação com a gestão escolar, na perspectiva da emancipação destes trabalhadores. A Autora defende a “necessidade de os professores pensarem a educação, escola, o seu trabalho, inicialmente, a partir de seu projeto pedagógico individual” bem como os modos para “pensar mais sobre gestão democrática e democratizante nos espaços escolares com os sujeitos que lá trabalham, e não fora desses contextos”. Luís Ávila Meléndez é o Autor do quinto texto, cujo objectivo é mostrar o valor da “participação dos actores regionais na construção de cidadanias nacionais com matizes regionais, por meio da criação de instituições de ensino superior privado”, no sentido, também, de inverter estratégias recorrentes de ocultação da natureza histórica de projectos de sociedade. O texto da autoria de Sílvia Ferreira e Ana Maria Morais, sobre a natureza da ciência nos currículos de Ciências, “centra-se na mensagem do Discurso Pedagógico Oficial no que se refere ao processo de construção da ciência, às relações intradisciplinares entre conhecimentos científicos e metacientíficos e à forma como o Ministério da Educação explicita aos professores as características anteriores”. Os resultados são discutidos e comparados com investigações internacionais, realçando-se as implicações pedagógicas dos factos constatados. No penúltimo texto, uma equipa liderada por Telma Ferraz Leal apresenta os resultados de um estudo sobre manuais escolares, especificamente quanto às orientações didácticas para a escrita de textos argumentativos. Das conclusões destaca-se o facto de os manuais para as classes iniciais do Ensino Fundamental, no Brasil, promoverem “o ensino de textos argumentativos desde o início da escolarização”, apesar das actividades analisadas serem ainda escassas. Enquadradas pela assunção dos textos como géneros, as propostas identificadas elegem a actividade de escrita tanto com finalidades escolares como não-escolares. No último texto, Rita Marchi discute a existência do “oficio de aluno” e do “oficio de criança” no quadro complexo das relações entre paradigmas: o da Sociologia da Educação e o da Sociologia da Infância que, rompendo com o anterior, institui como seus elementos nucleares “o princípio da construção social da infância, o da criança-ator e a reivindicação da autonomia conceitual da infância”.

Neste número contamos ainda com uma nota de leitura da autoria de José António Afonso sobre duas obras de Ester Fraga Nascimento.

Na notícia de que se deu conta na abertura deste Editorial, podia ainda ler-se que aqueles 7000 textos de “significado internacional” correspondem a 20 textos por dia: “20 histórias que encerraram ali”. Esperamos que as “histórias” que agora damos à estampa não encerrem aqui, pelo contrário: que a história do seu significado comece agora nas suas mãos, leitor!

 

Maria de Lourdes Dionísio