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Revista de Ciências Agrárias

Print version ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.40 no.1 Lisboa Mar. 2017

https://doi.org/10.19084/RCA16005 

ARTIGO

Estimativa de perdas pós-colheita da batata-reno (Solanum tuberosum). Estudo de caso: Distrito de Moamba, Bloco I (Moamba-Sede)

Estimate of post-harvest losses in potato (Solanum tuberosum). A case-study at Distrito de Moamba, Bloco I (Moamba-Sede)

Lourenço Ferro1, Brasilino Salvador2,* e Rafael Nguenha1

 

1 Departamento de Engenharia Rural, Faculdade de Agronomia e Engenharia Florestal, Universidade Eduardo Mondlane, Maputo, Moçambique; *E-mail: brasilino1979@gmail.com

2 Departamento de Agro-Pecuária, Fundo de Desenvolvimento Agrário, Ministério de Agricultura e Segurança Alimentar, Maputo, Moçambique.

 

RESUMO

O objectivo do presente estudo foi avaliar as perdas pós-colheita da batata-reno no distrito de Moamba, bloco I. A recolha de dados ocorreu em três etapas: na primeira foi feita a caracterização qualitativa à colheita, baseada nas propriedades mecânicas, fisiológicas e bióticas, e a quantificação do tipo de perdas durante a colheita, de acordo com o tipo de perda identificado, na segunda fase, correspondente ao transporte, e na terceira, ao armazenamento, em que se quantificaram as perdas, por um período de 30 dias, em condições normais de temperatura média de 28oC e humidade relativa média de 73,5%. As perdas, expressas em %, foram determinadas com base na relação entre a produção total da amostra, obtida através da pesagem da batata logo após a colheita, e a quantidade de batata que apresentava cada tipo de dano. As perdas totais da batata, desde a colheita até ao armazenamento, foram de cerca de 44,7% relativamente à produção total, dos quais 21,9% são perdas mecânicas, 56,8% são fitopatológicas e 21,3% fisiológicas. Do total de perdas, 47,2% verificaram-se na fase de colheita, 6% na fase de transporte e 46,8% na fase de armazenamento. Foi feita também a análise da variação dos parâmetros de qualidade da batata durante as três etapas, sendo que os principais parâmetros que se alteraram durante a colheita, transporte e armazenamento foram: a aparência, o peso, o aroma e a textura dos tubérculos.

Palavras-chave: armazenamento, batata-reno, pós-colheita, perdas, transporte

 

ABSTRACT

The objective of this study was to evaluate the postharvest losses of potatoes in Moamba district, block I. Data were collected in three stages: the first occurred soon after harvesting and aimed to quantify the different types of losses (physical, biotic and abiotic) at the time of harvest; in the second stage, the losses that occurred during transport were quantified; the third stage the losses were quantified after storage, for a period of 30 days at an average temperature of 28°C and relative humidity of 73.5%. The losses were determined by the ratio of the total production of the potatoes, obtained by weighing the potatoes crop after harvest, and the amount of potatoes that had each type of damage, in percentage. The total losses of potatoes, from harvesting to storage, were approximately 44.7% of the total production, of which 21.9% are mechanical losses, 56.8% are biotic and 21.3% are abiotic. Of these total losses, 47.2% were noted in the harvesting phase, 6% in the transport phase and 46.8% in the storage phase. It was also made the analysis of changes in quality parameters during these three stages, whereby main quality parameters changes occurred during harvest, transport and storage of potatoes were: appearance, weight, flavour and texture of tubers.

Keywords: harvest, losses, potatoes, storage, transport.

 

INTRODUÇÃO

A batata-reno (Solanum tuberosum L.) é uma cultura herbácea bem adaptada a climas temperados. No entanto, pode desenvolver-se sob variada gama de condições climáticas. Em Moçambique, esta cultura é produzida em quase todo o país, mas os distritos de Tsangano e Angónia, na província de Tete, contam com cerca de 90% da produção nacional. Niassa é a segunda província com maior produção, seguida da Zambézia. Na província de Maputo a batata é produzida nos distritos de Moamba, Boane e Namaacha (Demo et al., 2006).

De uma forma geral, o consumo nacional da batata-reno tem estado a aumentar progressivamente nas zonas urbanas e peri-urbanas, e o défice de produção tem sido coberto pelas importações dos países vizinhos (MINAG, 2008), com destaque para a África-do-Sul. Na campanha 2009/10 a produção nacional foi de 138.356 toneladas e o consumo situou-se nas 264.600 toneladas o que significa, portanto, que o défice registado, acima de 92%, foi suprido pelas importações (MINAG, 2011).

A Estratégia do Governo de Moçambique para fazer face à crise alimentar está plasmada no Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Sector Agrário (PEDSA 2010-2019) que, de acordo com o MINAG (2011), é um quadro orientador, instrumento harmonizador e mobilizador de sinergias para impulsionar o desenvolvimento agrário do país. O PEDSA articula intervenções e facilita o acesso aos recursos e meios necessários para a produção agrária. Para estimular o aumento da produção agrária, o Fundo de Desenvolvimento Agrário (FDA) tem financiado os agricultores nacionais para aquisição da semente certificada de batata-reno assim como para outros meios essenciais para o aumento da produção e produtividade.

Neste caso específico, o Distrito de Moamba tem sido um dos beneficiários deste programa. Para assegurar o aumento sustentável da produção agrária e a auto-suficiência alimentar afigura-se necessário intervir em todos os segmentos da cadeia de valor, nomeadamente pesquisa, produção, escoamento, armazenagem, processamento e distribuição (MINAG, 2008). Nesta perspetiva, uma vez condicionados os requisitos para o aumento da produção e da produtividade agrícola, é necessário garantir que o produto chegue até ao consumidor através da otimização do maneio pós-colheita que tem sido um dos principais contribuintes para a insegurança alimentar. Uma das formas de garantir que a produção chegue ao consumidor em quantidade e qualidade satisfatórias, é minimizando as perdas pós-colheita.

O conhecimento quantitativo e qualitativo das perdas pós-colheita da batata-reno pode ajudar a desenhar políticas e a desenvolver técnicas agrárias conducentes a redução destas perdas em Moçambique. Estima-se que em Moçambique as perdas pós-colheita de produtos agrícolas, incluindo hortícolas, situam-se na ordem de 40% (Falcão e Mucavele, sd), largamente superiores quando comparadas com outros países, como Estados Unidos, onde as perdas não ultrapassam os 10% (Vilela et al., 2003). Contudo, há poucos estudos científicos que ilustram as perdas pós-colheita, descriminadas por cultura e por região específica no país, de modo a se poderem desenhar políticas e estratégias que permitam minimizar o efeito das perdas pós-colheita.

Tendo em conta o acima exposto, pretendeu-se, com o presente trabalho, estimar as perdas pós-colheita (quantitativas e qualitativas) que ocorrem durante o manuseamento pós-colheita da batata-reno, nas fases de colheita, transporte até ao armazenamento.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Este estudo foi realizado no distrito de Moamba, abrangido pelo programa de distribuição de sementes de batata e outros factores de produção do Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar (MASA) através do FDA, no âmbito do cumprimento do PEDSA.

Do ponto de vista climático, o distrito de Moamba, segundo a classificação de Koppen, é dominado pelo clima do tipo BS clima seco de estepe, com uma temperatura média anual que oscila entre 23o a 24o C e pluviosidade anual entre 580 a 590 mm. O distrito tem duas estações, uma quente de temperaturas mais elevadas e de pluviosidade acentuada que vai de Outubro a Março, e outra, fresca que se estende de Abril a Setembro (MAE, 2015).

De acordo com MAE (2005), em termos de solos, em geral, no distrito de Moamba predominam os solos planos de textura média e profundidades que variam desde a marginal até a boa. Ainda o mesmo autor referencia que os tipos de solos mais comuns neste distrito são os vermelhos, os pedocálicos, os pardos, os hidromórficos e os aluvionares.

O levantamento dos dados ocorreu em três etapas: Na primeira etapa, uma amostra de 50 Kg de batata foi colhida mecanicamente em 3 campos diferentes do bloco I, com uma área de 2 hectares cada campo, segundo uma amostragem não aleatória. Após a colheita foi feita a classificação da batata em descartada, quando apresentava algum tipo de dano, e não descartada. A porção descartada foi classificada e separada em grupos, de acordo com tipo de dano (danos mecânicos, fisiológicos e bióticos) e foi pesada individualmente por tipo.

Os danos mecânicos foram classificados de acordo com a ocorrência de frutos amassados, com marcas da caixa, com cortes, ferimentos, esfoladuras. Os danos bióticos foram caracterizados através de análises microbiológicas e identificação do agente causal. Os danos fisiológicos foram caracterizados através da observação de um ou mais dos seguintes defeitos: podridão apical, fruto torto (dobrado) e fruto esverdeado, frutos com casca enrugada e sintoma de perda de água.

A segunda fase do trabalho consistiu na quantificação das perdas que ocorreram durante o transporte da batata. Da batata classificada na primeira fase como própria para o consumo, foi separada uma quantidade de 120 kg que foi usada para estimar as perdas. Esta amostra foi dimensionada em lotes de 10 kg obtendo-se 12 embalagens. As embalagens foram transportadas juntamente com as dos produtores para o Mercado Grossista de Zimpeto (MGZ) e foram arrumadas em vários pontos no carro para que ficassem submetidas ao efeito da sobreposição e vibração, tal como é normalmente transportado pelos comerciantes. Após o transporte foi observada a batata contida em todos os lotes para calcular as perdas e separar a quantidade a ser usada na terceira fase.

Na terceira fase foram usados 100 Kg de batata para determinar as perdas durante o armazenamento. Esta quantidade foi novamente embalada em lotes de 10 kg obtendo-se 10 embalagens que foram armazenadas à temperatura ambiente durante um período de 30 dias, desde 30 de Outubro até 30 de Novembro de 2014. O armazenamento foi feito no Laboratório de Alimentos da Faculdade de Agronomia e Engenharia Florestal da Universidade Eduardo Mondlane. Após 30 dias foram estimadas as perdas que ocorreram durante o armazenamento.

As perdas foram avaliadas com base no volume total da amostra, obtida diretamente através da pesagem da batata logo após a colheita, e o volume de batata descartada obtida através da pesagem da batata considerada não comercializável.

A média de cada tipo de perdas foi calculada pela fórmula:

Onde: M é a média de cada tipo de perda de batata- reno em termos de peso (kg); Tp é o total de cada tipo de perdas em cada campo em termos de peso (kg); e r é o número de repetições (número de campos).

Para o cálculo da percentagem de perda de cada tipo de dano e da percentagem de perdas totais foram usadas as seguintes fórmulas:

Onde: %P é Percentagem de cada tipo de perdas; M é a média de cada tipo de perda de batata- reno; Tc quantidade total de batata tirada de cada campo para as análises.

Onde: %Pt é a percentagem de perdas totais; e %P é a percentagem de cada tipo de perda.

A percentagem de perda de humidade foi determinada pela seguinte fórmula:

onde Ph é a percentagem da perda de humidade; Pi é o peso inicial dos tubérculos; e Pf é o peso final, após 30 dias de armazenamento.

Os dados relativos às perdas pós-colheita, foram avaliados por meio da estatística descritiva e teste de correlação entre variáveis usando o Software Microsoft Excel 2007.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Análise das perdas durante a colheita

De acordo com os dados obtidos durante a fase da colheita constatou-se que 21.1% da batata colhida apresentou danos que a tornaram inadequada à comercialização, destes 7,1% corresponderam a danos mecânicos, 12,2% a danos bióticos e 1,8% a danos fisiológicos, conforme consta do Quadro 1.

Nos campos em estudo, a colheita da batata foi feita mecanicamente. De acordo com Silva (1994) citado por Sousa et al. (2003), as perdas ocasionadas por danos na batata dependem do método de colheita, e variam de 2,3% com uso da máquina de colheita até 9,6% com uso da enxada. No entanto, a ABBA(2001) refere que a topografia é um ponto importante para viabilizar a mecanização total na colheita da batata, pois em terrenos muito acidentados há dificuldade de operar com a máquina. O mesmo autor refere que a preparação do solo é um dos fatores fundamentais não só para a produtividade como também para a viabilização da colheita mecanizada. Portanto, vários fatores podem ter contribuído para as elevadas perdas durante a colheita, embora esta tenha sido feita mecanicamente.

Durante a realização da colheita observou-se que o terreno apresentava algumas irregularidades, o que contribuiu para que se registassem danos mecânicos na batata e, outro aspeto de realce é que a máquina de colheita foi calibrada para efetuar a colheita a uma profundidade de 35 centímetros, enquanto a variedade da batata produzida (variedade Mondial) pode desenvolver tubérculos a uma profundidade de cerca de 40 centímetros o que significa maior probabilidade de haver corte de tubérculos pela máquina. A Figura 1 mostra as lesões provocadas pelo equipamento de colheita no tubérculo. A mudança da aparência dos tubérculos foi o principal parâmetro que se alterou na fase da colheita.

 

 

Os danos bióticos na fase da colheita foram de cerca de 12,2% da produção total o que corresponde a 27,3% do total de perdas (Quadro 1). Sauphanor e Ratnadass (1985) citados pela FAO (sd), apontam que os insetos podem ser a causa de sérios prejuízos em raízes e tubérculos como inhame (Dioscorea spp.) e batata-doce (Ipomoea batatas), em particular. Os mesmos autores apontaram que das perdas que ocorrem em tubérculos, 25% são atribuídas aos insetos.

As perdas bióticas ocorreram devido ao atraso da colheita, que devia ter sido realizada entre os dias 15 e 30 de Setembro, mas alguns produtores chegaram a colher cerca de 30 dias depois da maturação dos tubérculos devido à escassez de equipamentos de colheita no Distrito. Como foi descrito por Tavares et al. (2002), os tubérculos maduros podem permanecer alguns dias no campo sem alterarem as suas qualidades. Porém, a ocorrência de chuvas durante esse período pode conduzir a perdas por brotação precoce, para além do ataque de pragas e ocorrência de doenças do solo (Figura 2). O atraso na colheita tornou os tubérculos mais suscetíveis a pragas e doenças do solo. Neste caso, as pragas encontradas foram a Conoderus scalaris (Coleoptera: Elateridae) e o Praomys natalensis (Rodentia: Muridae). A C. scalaris é uma praga que além de se alimentar das folhas, pode também alimentar-se do tubérculo diminuindo o seu peso e deixando uma lesão que serve de entrada para fungos e bactérias, diminuindo, assim, o seu valor comercial (Leite e Nascimento, 2011).

 

 

As perdas fisiológicas foram de 1,8% da produção total o que correspondeu a 4% do total das perdas. As perdas por defeito fisiológico foram menores no distrito de Moamba quando comparadas com resultados encontrados em outros estudos, como foi o levantamento realizado por Schroeder et al. (1979) citados por Henz (2004), em São Paulo, onde se verificou que 57,5% das perdas totais foram devidos a problemas fisiológicos, incluindo o esverdeamento. Neste trabalho, verificou-se um ligeiro problema de esverdeamento (Figura 3) devido à não disponibilidade de equipamento para realização da amontoa, o que expôs os tubérculos a radiação solar. Para Conover e Proke (1987), o esverdeamento é um dos principais problemas de pós-colheita da batata, que deprecia ou mesmo inviabiliza a comercialização do produto. É resultado de uma reação que transforma amiloplastos em cloroplastos, geralmente acompanhada pela formação de glicoalcalóides. Tubérculos com teores de glicoalcalóides superiores a 20 mg.100g-1 de tecido fresco são considerados potencialmente perigosos à saúde (Van Es & Hartmans, 1987).

 

 

De acordo com Dimenstein et al. (1997) citados por Muthoni e Kabira (2015), o esverdeamento é associado a ocorrência de elevadas temperaturas durante o cultivo da batata, sendo que esta cultura desenvolve-se melhor a temperaturas entre 15 e 18 oC, e acima de 21 oC pode provocar problemas no crescimento da cultura. A plantação de variedades tolerantes ao calor pode ser uma estratégia adequada para reduzir as perdas devido ao stress por elevadas temperaturas (Muthoni e Kabira, 2015). Adicionalmente, recomenda-se a adoção de práticas culturais mais ajustadas, tais como cobertura morta e mudança da data de plantação como formas de evitar períodos de elevadas temperaturas. Midmore (1983) aponta que a cobertura morta atenua a variação diurna da temperatura do solo particularmente durante a estação seca onde a radiação solar é muito elevada.

Transporte

Os resultados das perdas verificadas no transporte da batata do Distrito de Moamba para a cidade de Maputo estão representados no Quadro 2. Nesta fase, verificaram-se apenas 2.7% de danos mecânicos, o que correspondeu a uma proporção de 6% das perdas totais de produção, que são relativamente menores, quando comparadas com perdas registadas em estudos prévios, como foi o de Ndunguru et al. (2005), onde se registaram 19% de perdas de batata-reno durante o transporte em Tanzânia.

Os ligeiros danos mecânicos verificados resultaram das vibrações do veículo durante o transporte devido às más condições da estrada, principalmente no troço que parte do Bloco I até à vila de Moamba (5 Km e duração de 4 minutos). Almeida (2005) sustenta que os danos por vibração são frequentes no transporte no campo, ou entre o campo e a central, pois os caminhos rurais são normalmente mais irregulares e os reboques podem não possuir suspensão adequada para amortecer as vibrações.

Para o caso concreto do Distrito de Moamba, as perdas no transporte não chegam a ser muito acentuadas porque a partir da vila de Moamba os problemas de estrada são ligeiros e possivelmente não causam danos por vibração aos tubérculos, uma vez que os transportadores usam a via da Estrada Nacional 4, que é regular e sem muitos problemas de distúrbios por covas. Outra causa que leva a perdas de tubérculos por danos mecânicos é a mistura com outros produtos e outras cargas colocadas por cima das embalagens de batata-reno, porque os produtores geralmente transportam produtos em carros alugados fazendo mistura outros produtos.

Armazenamento

Os resultados dos cálculos das perdas, que ocorreram no armazenamento da batata-reno num armazém convencional (à temperatura ambiente, com uma humidade relativa de 73.5%) estão apresentados no Quadro 3. Nesta fase, verificaram-se perdas bióticas e fisiológicas na ordem de 13.2% e 7.7%, respetivamente.

As perdas bióticas ocorreram devido ao ataque de Fusarium spp.. De acordo com Secor e Gudmestad (1999) citados por Gachango et al. (2012), estes fungos são responsáveis pela podridão seca da batata, uma doença devastadora desta cultura após a colheita em todo o mundo. Perdas associadas com a podridão seca foram estimadas entre 6 e 25%, e, em alguns casos, verificaram-se perdas acima de 60%, durante o armazenamento de longo prazo (Desjardins, 1995, citado por Gachango et al., 2012).

A maior severidade do ataque por fungos deveu-se aos danos causados durante a colheita, pois, de acordo com Brisolla et al. (2002), os prejuízos causados por este patógeno são potencializados por danos mecânicos nos tubérculos. Durante as operações de colheita, o fungo invade os tubérculos utilizando pontos de entrada criados pelos danos físicos ou por outras vias, provocando o apodrecimento contínuo dos tecidos, mesmo após o armazenamento dos tubérculos. Conforme previamente apontado, durante a colheita a batata-reno sofreu várias lesões devido a má regulação da máquina de colheita, facilitando a proliferação do fungo. A Figura 4 evidencia sintomas de ataque por Fusarium spp.

 

 

As perdas abióticas foram condicionadas pela temperatura (28oC) e humidade relativa (73.5%) no local de armazenamento, que, devido à elevada taxa de transpiração, proporcionaram uma acentuada perda de água nos tubérculos (Quadro 4). Estes dados estão de acordo com os 16% de perda de água registados durante o armazenamento, conforme indica a correlação entre a perda de água no armazenamento e as perdas pós-colheita (Y=1,26+ 0,52X). O teste de correlação mostra que 76% das perdas verificadas no armazenamento são explicadas pela perda de água nos tubérculos (R2=0,76) e que o incremento de uma unidade de perda de água implicou um aumento de perdas na ordem de 52% (b=0,52). O Quadro 5 apresenta os dados da perda de água e das perdas pós colheita usados para obtenção da equação de correlação.

As perdas abióticas verificadas durante o armazenamento são essencialmente atribuídas à germinação dos tubérculos (Figura 5). Woodell et al. (2009) indicaram que as temperaturas amenas poderão estimular a germinação e o aparecimento de doenças nos tubérculos e que estes, quando armazenados em ambientes secos, adquirem aparência flácida e seca. Neste estudo, os tubérculos foram armazenados em condições normais de temperatura (28oC) e humidade relativa (73,5%), o que não se adequa às condições ideais para o armazenamento dos tubérculos da batata-reno, pois de acordo com Woodell et al. (2009), a temperatura ótima para a conservação da batata-reno varia de 5.6 a 10oC e a humidade relativa ótima de 90 a 95%.

 

 

Perdas pós-colheita totais

De uma forma geral, o total de perdas estimadas foi de 44.7% sobre a produção total, das quais 47,2% foram registadas na colheita, 6% no transporte e 46,8% no armazenamento. Estas perdas são muito elevadas em comparação com estimativas feitas em outros estudos. Bleinroth (1979) citado por Henz (2004), no Brasil, encontrou cerca de 30% de perdas de batata-reno devido à falta de armazéns apropriados, esverdeamento da batata, e transporte inadequado.

No Distrito de Moamba, as perdas registadas são particularmente elevadas durante as fases de colheita e de armazenamento, que contribuem com 47,2% e 46,8%, respetivamente. A curta distância de Moamba ao MGZ (80 Km), com a consequente diminuição do tempo de transporte (50 minutos) e o estado da estrada EN4 que se encontra em condições de transitabilidade aceitáveis, podem ter contribuído sobremaneira para as reduzidas perdas pós-colheita na fase do transporte. As perdas na colheita foram elevadas devido ao atraso da mesma, porque de acordo com o calendário dos produtores a batata devia ter sido colhida entre os dias 15 a 30 de Setembro de 2014, mas a mesma teve a colheita cerca de 30 dias depois. Por outro lado, essas perdas foram provocadas pelos cortes devido a má regulação do equipamento de colheita. As perdas no armazenamento também foram elevadas devido ao efeito da temperatura de armazenamento (28oC) e da humidade relativa 73% que favoreceram a perda de água por transpiração e o desenvolvimento de doenças (podridão seca). O Quadro 6 sumariza as perdas pós-colheita em todas as etapas, nomeadamente: colheita, transporte e armazenamento.

As perdas na colheita são mais fáceis de evitar, alocando mais máquinas colhedoras da batata-reno para o Distrito e proporcionando programas de treinamento sobre a calibração das mesmas, o que iria poupar cerca de 21,1% da produção total da batata-reno que se perde nesta fase. Para minimizar as perdas que se verificaram durante o armazenamento seria necessário implantar estruturas de armazenamento (frigoríficos) nos mercados grossistas, principalmente no MGZ.

 

CONCLUSÕES

O presente trabalho julga-se de extrema importância para Moçambique, uma vez constituir uma ferramenta importante para o processo de tomada de decisões e formulação de políticas que possam concorrer para a redução das perdas pós-colheita, tendo em conta a escassez de dados desta natureza. Registaram-se perdas na ordem de 44.7% da produção total da batata, nas diferentes fases de manuseamento pós-colheita, sendo que as fases da colheita e armazenamento contribuíram com o maior nível de perdas (acima de 90%) em relação às verificadas durante o transporte.

A escassez de equipamentos de colheita no Distrito de Moamba faz com que haja atrasos na colheita dos tubérculos, o que permite que fiquem expostos a pragas e doenças do solo, acentuando assim o nível de danos. As perdas durante o armazenamento foram causadas pelo emurchecimento e podridão seca, devido a altas taxas de transpiração provocadas pela exposição dos tubérculos a elevadas temperaturas (28oC) e baixa humidade relativa (73%).

No que tange a natureza dos danos, os danos bióticos foram as principais causas de perdas observadas, seguidos pelos danos físicos e abióticos, que apresentaram a mesma magnitude de importância. Estes danos levaram a alteração do peso, aparência na textura e aroma. A aparência foi o parâmetro que se alterou em todas fases, como resultado de danos físicos, flacidez, germinação e deterioração dos tubérculos da batata.

 

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Recebido/received: 2016.01.13

Recebido em versão revista/received in revised form: 2016.05.05

Aceite/accpeted: 2016.05.05

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