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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.37 no.1 Lisboa mar. 2014

 

ARTIGO

Compostagem de biomassa de acácia com casca de pinheiro

Composting acacia biomass with pine bark

Luis Miguel Brito1, Isabel Mourão1 e João Coutinho2

 

1 Centro de Investigação de Montanha (CIMO), Escola Superior Agrária de Ponte de Lima, Instituto Politécnico de Viana do Castelo, Refóios, 4990-706 Ponte de Lima. E-mail: miguelbrito@esa.ipvc.pt, author for correspondence

2 C Química, DeBA, EC Vida e Ambiente, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, ap 1013, 5001-911 Vila Real. E-mail: j_coutin@utad.pt

 

RESUMO

As acácias são espécies invasoras da família Fabaceae que poderão ser valorizadas através da compostagem para produção de corretivos orgânicos e substratos hortícolas. Com esse objetivo construíram-se pilhas de grandes dimensões com detritos de acácia misturados com casca de pinheiro e diferente número de revolvimentos, para analisar as características físico-químicas durante a compostagem e modelar a decomposição da matéria orgânica (MO). As temperaturas foram superiores a 60oC durante um período de tempo suficientemente longo para a inativação de microrganismos patogénicos e a destruição de sementes de infestantes, devido à elevada quantidade de MO biodegradável deste material (600-620 g kg-1 de MO inicial) e à grande dimensão das pilhas. A elevada temperatura terá contribuído para as fortes perdas de N (450-470 g kg-1 de N inicial) por volatilização. No entanto, estas foram inferiores às perdas de C, e assim a razão C/N diminuiu de 56 no início, para 40-41 no final de compostagem. Este estudo indicou que a acácia pode ser compostada para produzir corretivos orgânicos, com um teor elevado de MO e baixa condutividade elétrica (<0,7 dS m-1). No entanto, é necessário um longo período de compostagem para atingir um elevado grau de maturação do composto.

Palavras-chave: Azoto, matéria orgânica, mineralização, razão C/N, temperatura

 

ABSTRACT

Acacias are invasive Fabaceae species that can be composted to produce organic amendments and horticultural substrates. With this aim, big piles were set up with ground and screened acacia residues and pine bark, and managed with different turning frequency, to analyze the physicochemical characteristics during composting and to model the breakdown of acacia organic matter (OM). Temperatures were >60oC for several months, indicating pathogen inactivation, seed destruction and high amount of biodegradable OM (600-620 g kg-1 of initial OM). High temperature and high pH conditions promoted significant N losses (450-470 g kg-1 of initial N). Nevertheless, these were smaller compared to C losses and so the C/N ratio decreased from 56 at the beginning to 40-41 at the end of composting. This study indicates that composting acacia can produce organic amendments with high OM content, and low electrical conductivity (<0.7 dS m-1). However, a long period of composting is required to achieve advanced compost maturation.

Key-words: C/N ratio, mineralization, nitrogen, organic matter, temperature

 

Introdução

As crescentes limitações na exploração da turfa, por razões ambientais, fundamentam a procura de materiais orgânicos alternativos para a produção de substratos, incluindo os produtos resultantes

da compostagem de biomassa vegetal. Apesar dos compostados de casca de pinheiro serem considerados uma boa alternativa, o seu custo tem aumentado, o que justifica a procura de novos materiais para este fim. A Acacia longifolia (Andrews) Willd. é uma espécie da família Fabaceae, que foi introduzida em Portugal para evitar a erosão de solos arenosos das zonas costeiras devido à capacidade que possui para assimilar azoto (N) atmosférico (Morais et al., 2012). No entanto, as acácias são espécies altamente competitivas, capazes de invadir o território das espécies nativas e de ameaçar a conservação dos habitats naturais. Atualmente são necessárias novas formas de valorização para estes táxones, tendo em conta a sua abundância em Portugal. A compostagem, para utilização do compostado como substrato hortícola e como corretivo orgânico do solo, poderá ser uma das soluções.

A casca de pinheiro (Pinus pinaster Ait.) é constituída principalmente por lenhina (33% do peso seco), polifenóis (11%), celulose (24%) e hemicelulose (15%) (Fradinho et al., 2002), sendo principalmente incinerada para produção de energia ou utilizada em arranjos paisagistas. A casca de pinheiro é uma alternativa à turfa porque possui boas propriedades para misturas na formulação de substratos. A casca de árvores é um material barato mas que tem de ser triturado/ moído, e crivado (<2 - 3 cm) e compostado porque a casca fresca possui taninos, resinas, fenóis, terpenos e outros compostos que podem ser fitotóxicos.

A biomassa de materiais como a casca de pinheiro e os detritos de acácias poderão ter taxas de decomposição baixas devido aos seus teores relativamente elevados de lenhina, polifenóis e celulose (Baggie et al., 2004). O material recalcitrante poderá não contribuir para aumentar rapidamente a atividade microbiana e consequentemente as temperaturas necessárias para higienizar o composto. No entanto, as acácias são fabáceas e possuem um apreciável teor de N que contribui para o rápido ataque microbiano e consequente aumento da temperatura.

A produção de calor gerado pelo metabolismo microbiano durante a compostagem depende da taxa de crescimento e atividade dos microrganismos, e esta depende de propriedades físicas e químicas da biomassa em compostagem que podem ser críticas, como o teor de humidade, o arejamento, a razão C/N da mistura, entre outras (Bernal et al., 2009; Brito et al., 2012). Por outro lado, a dissipação do calor do interior da pilha depende da superfície específica das pilhas, e portanto, da sua dimensão (Brito et al., 2008). Contudo, quanto maior a dimensão de uma pilha, maior é o número de locais no seu interior com anaerobiose e, por isso, a dimensão da pilha influencia o tipo de microrganismos presentes, a temperatura e o tipo de emissões que se produzem (Fukumoto et al., 2003).

Em termos de emissões e perdas de N, a frequência de revolvimento das pilhas, assim como a sua altura e outras dimensões, influenciam fortemente as taxas das trocas gasosas com o exterior da pilha (Fukumoto et al., 2003).

No caso do azoto, a intensidade das emissões gasosas durante o processo de compostagem é determinada pela capacidade de troca de gases com a atmosfera e por outros fatores como a razão C/N do material em compostagem ou o pH e a temperatura que ocorrem na fase termófila (Brito et al. 2012). O revolvimento da pilha é uma prática de gestão do processo de compostagem que permite aumentar o teor de oxigénio no seu interior. No entanto, também pode aumentar a emissão de amónia (NH3) e assim reduzir o valor agronómico do composto.

Neste estudo examinou-se o processo de compostagem de detritos triturados e crivados de Acacia sp. misturada com detritos de casca de pinheiro (Pinus pinaster) com os objetivos específicos de quantificar as transformações físico-químicas desta biomassa em compostagem, modelar a decomposição da MO, avaliar os efeitos do revolvimento no processo, e determinar a possibilidade de se atingirem temperaturas elevadas o tempo suficiente para destruir a viabilidade das sementes e produzir um compostado com características benéficas para utilização como corretivo orgânico do solo e componente de substratos hortícolas.

 

Materiais e Métodos

Utilizaram-se resíduos triturados (<80 mm) da limpeza de acácia (mais de 80% de A. longifolia e o restante de A. dealbata e urze) misturados com uma pré-mistura com base em resíduos de casca de pinheiro (P. pinaster). Esta pré-mistura foi preparada com casca de pinheiro, pó e entrecasca de pinheiro, restos das crivagens de pilhas de compostagem de resíduos de pinheiro anteriores, e com 2 kg de ureia (46% de N) e 4 kg de mármore branco moído (com valor neutralizante equivalente a 90% de carbonato de cálcio), por metro cúbico de mistura. A pré-mistura possuía partículas <15 mm. Os detritos foram triturados com uma trituradora de alta rotação com moinho tipo martelos (Doppstadt; AK 403 Profi), e posteriormente crivados com um crivo de estrelas amovível (Neuenhauser Super Screener Portable Star Screen).

As pilhas de compostagem foram construídas em 30 de Novembro de 2011, em Mira (40o25’N 8o44’W), sobre uma camada de casca de pinheiro com aproximadamente 30 cm de altura, e foram monitorizadas durante todo o ano de 2012, até Março de 2013, sendo uma pilha revolvida seis vezes (A) e outra apenas três vezes (B). As pilhas foram constituídas por 60% em volume com detritos das acácias e 40% de resíduos da casca de pinheiro. No entanto, esta proporção, em peso fresco, foi 34% de acácia e 66% de pinheiro, enquanto em peso seco foi 44% e 56% respetivamente. A densidade dos resíduos de acácia triturada fresca (185 kg m3), calculada pela Norma EN 12580 (CEN, 2012), foi inferior à da pré-mistura (549 kg m3), e o teor de humidade dos resíduos acácia foi também inferior ao da pré-mistura (Quadro 1). As pilhas construídas possuíam grandes dimensões (˜100 m3, 8 m de diâmetro da base e >3 m de altura). A dimensão das partículas foi inferior a 2 cm para os resíduos de pinheiro, mas com partículas mais compridas (até 8-10 cm) de resíduos de acácia. As principais características dos resíduos de acácia e de casca de pinheiro encontram-se descritas no Quadro 1.

 

 

Durante os revolvimentos, realizados com uma grua florestal e uma pá frontal de trator, impediu-se a entrada de qualquer matéria mineral do exterior para o material em compostagem, para não afetar o cálculo da mineralização da matéria orgânica (MO) da biomassa em compostagem. A pilha A foi revolvida aos 35, 98, 147, 203, 266, 336 dias após o início da compostagem, enquanto a pilha B foi revolvida apenas aos 98, 203 e 336 dias de compostagem.

A temperatura do ambiente exterior e as temperaturas das pilhas de compostagem (próximo da base, do centro e do topo das pilhas, aproximadamente à altura de 0,5 1,5 e 2,5 m de altura respetivamente) foram determinadas com termístores (tipo ST1, Delta-T Devices), sendo os valores horários registados com base em leituras a cada minuto, através de um registador de dados (Delta-T Devices).

Realizaram-se 22 colheitas de quatro amostras por cada pilha, ao longo do período de compostagem, recolhidas em quatro pontos distintos do centro das pilhas desde 30 de Novembro de 2011 até Março de 2013. Parte das amostras foram congeladas imediatamente após a colheita, para a determinação do azoto mineral (após extração com KCl 2M, 1:5 m:v) por espectrofotometria de absorção molecular e recorreram-se às normas europeias para a determinação das seguintes características: humidade, pH, condutividade elétrica (CE), MO e N Kjeldahl, conforme descrito anteriormente por Brito et al. (2012). A mineralização da MO foi calculada com base nas perdas de MO (g kg-1 da MO inicial) que foram calculadas pela seguinte fórmula (Paredes et al., 2000):

Perdas de MO (g kg-1) = 1000 – 1000 [X1 (1000 – X2)] / [X2 (1000 – X1)] [1]

As perdas de massa foram calculadas pela fórmula (Tang et al., 2007):

Perdas de massa (g kg-1) = 1000 [1- (X1 / X2)] [2]

em que que X1 e X2 representam o teor de cinzas (g kg-1), respetivamente no início e no fim de cada período de compostagem. As perdas de N foram calculadas pela seguinte fórmula (Paredes et al., 2000):

Perdas de N (g kg-1) = 1000 – 1000 [X1 N2)] / [X2 N1)][3]

em que X1 e X2 representam o teor de cinzas (g kg-1), e N1 e N2 o teor de N, respetivamente no início e no fim de cada período de compostagem.

A mineralização da MO foi estimada pelas perdas de MO utilizando uma função cinética de 1ª ordem, expressa pela seguinte equação:

MOm = MO0 (1 - e-kt) [4]

em que MOm representa o teor de matéria orgânica (g kg-1) mineralizada no tempo t (dias), MO0 representa o teor de MO potencialmente mineralizável (g kg-1) e k representa a taxa de mineralização (dia-1).

Apesar dos resultados experimentais da mineralização da MO se terem ajustado bem ao modelo expresso na equação anterior em diversos estudos para diferentes materiais orgânicos (Paredes et al., 2000; Bustamante et al., 2008; Brito et al., 2008; Brito et al., 2010), no presente estudo, devido ao facto dos resíduos de acácia possuírem um elevado teor de lenhina, polifenóis e celulose, e por isso, ser esperada a existência de um reservatório de MO dificilmente biodegradável considerou-se, também, outro modelo que contemplasse dois reservatórios distintos de MO mineralizável com diferente resistência à mineralização:

MOm = MO1 (1 - e-k1t) + MO2 (1 - e-k2t) [5]

em que, MOm representa a MO mineralizada no tempo t (dias), MO1 e MO2, são reservatórios de MO mineralizável e k1 e k2 são as constantes de mineralização da MO desses reservatórios. Este modelo foi adaptado do modelo utilizado por Molina et al. (1980) para ajustar os resultados da mineralização do N de compostados aplicados ao solo.

Os resultados das perdas de MO durante a compostagem foram ajustados às funções cinéticas pelo método do algoritmo de Levenberg-Marquardt, para minimizar as diferenças entre as somas dos quadrados dos valores observados e dos valores previstos da variável dependente. O mesmo procedimento de regressão não linear foi utilizado para ajustar as perdas de N em cada período de compostagem a equações semelhantes às anteriores, nas quais a MO foi substituída por N mineralizado e perdido durante a compostagem. Utilizou-se o teste da menor diferença significativa (p<0,05) para a comparação entre as médias dos parâmetros químicos analisados, e recorreu-se ao programa SPSS v. 15.0. (SPSS Inc.) para a análise de variância para comparação entre médias de tratamentos e para a análise de regressão não-linear.

 

Resultados e Discussão

Inicialmente, as temperaturas das pilhas de compostagem aumentaram até uma temperatura máxima de 73 oC, alcançada no topo das pilhas A e B, respetivamente 16 e nove dias após o início da compostagem (Figura 1), indicando a rápida degradação de compostos imediatamente disponíveis, tais como açúcares, aminoácidos e proteínas. Nesta fase, os microrganismos termófilos degradam, também, gorduras, celulose, hemicelulose e alguma lenhina (Bernal et al., 2009). Trinta e cinco dias após o início de compostagem, a pilha A foi revolvida. Após a queda inicial, a temperatura subiu novamente de forma constante até valores termófilos (>55 oC) no prazo de quatro dias, atingindo o pico (74 oC) no topo da pilha, duas semanas depois do revolvimento. Após o segundo revolvimento da pilha A e primeiro da pilha B, que ocorreu aos 98 dias de compostagem o tempo necessário para atingir temperaturas máximas foi superior na pilha A do que na pilha B, revelando um teor de MO facilmente biodegradável na pilha A (que fora revolvida anteriormente) inferior ao da pilha B. Após o dia 203, depois de revolver ambas as pilhas, as temperaturas foram superiores na pilha B onde se alcançaram temperaturas superiores a 64 oC na parte superior da pilha, porque haveria mais MO facilmente biodegradável nas camadas exteriores da pilha B que foi menos revolvida. O mesmo se verificou após o último revolvimento efetuado aos 336 dias de compostagem. Posteriormente as temperaturas diminuíram em ambas as pilhas.

 

 

As temperaturas no centro e no topo das pilhas foram geralmente superiores em comparação com a base das mesmas (Figura 1), o que pode ser explicado pelo movimento do ar frio que entra pela base e ascende até ao topo das pilhas (Gao, 2010). Contudo, o revolvimento das pilhas terá contribuído para que todo o material fosse sujeito às temperaturas termófilas por muito tempo. Deste modo, as condições de temperatura nas pilhas satisfizeram o requisito sanitário para os compostados (Wu e Smith, 1999), equivalente a 55 °C durante =15 dias, já que as temperaturas foram mantidas entre 65 oC e 75 oC durante vários meses. O tamanho das pilhas também contribuiu para a produção e retenção de calor, porque as perdas de calor diminuem com a diminuição da superfície específica das pilhas e consequentemente com o aumento do seu volume (Füleky, 2010).

O teor inicial de humidade nas pilhas foi de 562 g kg-1 (Quadro 1) e a compostagem decorreu com uma humidade adequada para a atividade microbiana (Figura 2), considerando que o nível de humidade mais favorável para a compostagem se situa entre 500 g kg-1 e 700 g kg-1 (Kader et al., 2007). A evaporação da água foi compensada pela precipitação ocorrida (as pilhas ficaram destapadas durante a compostagem) e pela água produzida durante o processo de decomposição da MO. O elevado teor de humidade também terá contribuído para a manutenção das temperaturas elevadas nas pilhas de compostagem, porque a humidade favorece a acumulação do calor e a sua retenção na pilha (Petric et al., 2009).

 

 

O pH do material em compostagem variou entre o mínimo de 6,1 registado na pilha B e o máximo de 7,4 na pilha A mas sem variações consistentes durante o processo de compostagem. Estes valores de pH não limitam a utilização deste compostado como corretivo do solo, mas poderão limitar a sua utilização como componente de substratos, que frequentemente apresentam valores de pH inferiores (Cáceres et al., 2006). A condutividade elétrica (CE) do material em compostagem foi sempre baixa com pequenas variações entre o máximo de 0,7 dS m-1 no início da compostagem e o mínimo de 0,4 dS m-1 registado no final da compostagem na pilha A (Figura 2). Esta ligeira diminuição de CE pode ser explicada pela volatilização de amónia e a precipitação de sais minerais, como sugerido por Gao (2010) e Bustamante et al. (2008). Elevadas concentrações de sais podem causar problemas de fitotoxicidade, sendo o valor da CE do compostado importante na avaliação da adequação e segurança do mesmo para fins agrícolas. Nesta investigação, os valores finais CE de compostados foram muito inferiores ao valor máximo de 3 dS m-1 recomendado para aplicação de compostados ao solo (Soumaré et al., 2002) e próximo do valor de CE referido para os substratos por Abad et al. (2001) de 0,5 dS m-1. A perda de matéria seca (resultados não apresentados) foi de 526 e 509 g kg-1, respetivamente, para pilha de A e B, após 455 dias de compostagem. Portanto, o número de revolvimentos não afetou significativamente a perda de biomassa em compostagem. Perdas de massa inferiores foram referidas por Pereira et al. (1998) para a Acacia longifolia durante a decomposição no solo (44%, após 16,5 meses). Pelo contrário Baggie et al. (2004) registaram perdas superiores para a Acacia mangium, nomeadamente, perdas de cerca de 500 g kg-1 de massa seca durante 8 semanas de incubação, enquanto no presente estudo, para o mesmo período de tempo, as perdas de massa foram 333 e 405 g kg-1, respetivamente, para as pilhas A e B. As perdas de MO (620 e 601 g kg-1 da MO inicial) revelaram duas fases diferentes de degradação da MO (Figura 3). A primeira fase (aproximadamente 4 semanas) foi indicativa da rápida decomposição do substrato facilmente biodegradável e de uma taxa muito elevada de atividade microbiana. A segunda fase mostrou um ritmo mais lento de degradação da MO, quando permaneciam apenas os substratos mais resistentes à biodegradação. O modelo [5] revelou um melhor ajustamento aos resultados das perdas de MO (valores de r2 de 0,95 e 0,96 respetivamente para a pilha A e B) do que o modelo [4] (valores de r2 de 0,81 e 0,63 respetivamente para a pilha A e B). Estas perdas (Figura 3) revelaram e existência de dois reservatórios de MO biodegradável, ambos com uma fração da MO mineralizável total semelhante, mas com taxas muito distintas de mineralização.

 

 

A diferença nas taxas de mineralização dos dois reservatórios de MO, provavelmente resultou da presença simultânea das folhas de acácia mais facilmente biodegradáveis (primeiro reservatório) e de material lenhoso dos ramos da acácia e da casca de pinheiro, com maior razão C/N e maior resistência à biodegradação (segundo reservatório). Isto poderá fundamentar que o modelo de degradação da MO (e consequentes perdas de CO2) destes materiais, melhor adaptado aos valores observados, fosse aquele que considerou dois reservatórios distintos. O que está de acordo com o que tem vindo a ser descrito na literatura desde a década de 1970. Parnas (1975), por exemplo, considerava as substâncias que continham azoto como constituinte molecular, como proteínas e ARN, os quais denominava de compostos C-N (com C1 representando a massa do carbono deste reservatório), e as substâncias que não continham azoto, como celulose e amido, denominando estas de compostos C (com C2 representando a massa do carbono deste reservatório). Hunt (1977) também dividiu a matéria orgânica em decomposição em dois componentes. Contudo, para este autor, o reservatório facilmente mineralizável compreendia açúcares, amido e proteínas, enquanto o outro reservatório, de matéria orgânica resistente à decomposição, compreendia moléculas como celulose, lenhina, gorduras, taninos e ceras. Nos materiais utilizados neste estudo, é provável que o primeiro reservatório se associasse principalmente aos açúcares e proteínas das folhas da acácia, e o segundo à celulose e hemicelulose dos ramos de acácia e da casca de pinheiro.

Quando se comparam as perdas de N de ambos os reservatórios (Figura 3), verificou-se uma tendência semelhante à da MO, sendo as perdas muito mais relevantes nas primeiras semanas de compostagem, em paralelo com a degradação mais rápida da MO. O que significa que as perdas de N foram muito elevadas na primeira fase da compostagem e mais reduzidas na segunda fase da compostagem, devido ao ataque microbiano mais lento à MO remanescente. As perdas de N não variaram significativamente entre as pilhas A e B (respetivamente 469 e 453 g kg-1 do N inicial), provavelmente porque a diferença de tratamentos foi apenas de três revolvimentos.

Aproximadamente 600-620 g kg-1 da MO dos resíduos de acácia e casca de pinheiro foram mineralizados durante um período de 455 dias de compostagem. Estes valores são comparáveis com outros materiais orgânicos durante a compostagem realizada num período de tempo sempre muito inferior ao considerado neste estudo: (i) 620–660 g kg-1 de MO de estrume com palha (Vuorinen e Saharinen, 1997); (ii) 460–760 g kg-1 com estrume de bovinos leiteiros com serrim (Michel et al., 2004); (iii) 630– 670 g kg-1 com a fração sólida do chorume (Brito et al., 2008); e 645–672 g kg-1 com estrume de suínos (Zhu et al., 2004).

O aumento no teor de N total durante a compostagem (Figura 2) foi devido ao facto das perdas de N serem inferiores às perdas de MO. Este aumento no teor de N encontra-se bem documentado para diferentes materiais durante a compostagem (de Bertoldi e Civilini, 2006; Brito et al, 2008; Brito et al., 2010). Neste estudo, o teor de N total aumentou de valores iniciais de 8,5 ± 0,2 g kg-1 de MS para valores finais de 9,5 ± 0,3 g kg-1 na pilha A e 9,4 ± 0,8 g kg-1 na pilha B, após 455 dias de compostagem (Figura 2). A razão C/N diminuiu de valores iniciais de 56 ± 1,1 no início do processo para valores finais de 40 ± 1,0 e 41 ± 3,3, respetivamente, para as pilhas A e B (Figura 2). As variações na razão C/N durante a compostagem ocorrem tanto como resultado da mineralização de MO (perda de CO2) como das perdas de N por volatilização de amónia (de Bertoldi e Civilini, 2006). Assim, a redução na razão C/N resultou do facto das perdas de C terem sido superiores às perdas de N. A diminuição na razão C/N dos compostados finais em comparação com a razão C/N do material original foi indicativa de que compostados estavam num estado avançado de compostagem ainda que sendo superiores aos referidos por outros autores como compostos maturados (Larney e Hao, 2007; Zucconi e de Bertoldi, 1987), porque a razão C/N inicial destes materiais foi muito elevada, e em grande parte o C orgânico encontra-se em moléculas de muito difícil degradação, como a lenhina.

O teor de N mineral (N-NH4 + + N-NO3-) foi muito reduzido durante o processo de compostagem (resultados não apresentados), com exceção do N-NH4 + na primeira semana de compostagem em que foi superior a 100 mg kg-1 MS. Posteriormente o teor de N-NH4 + foi sempre inferior a 70 mg kg-1 MS na pilha -A e 100 mg kg-1 MS na pilha B. O teor de N-NO3 foi sempre inferior a 10 mg kg-1 MS até aos 231 dias de compostagem, aumentando ocasionalmente desde então até ao final da compostagem.

A ocorrência de lixiviados não foi observada nas pilhas durante a compostagem, provavelmente devido à grande dimensão das pilhas e consequente reduzida superfície específica. Portanto, além de manter as temperaturas elevadas, as pilhas com grande volume podem ser vantajosas por não necessitarem de cobertura, já que a água da chuva é necessária para manter a humidade da pilha e não é demasiada para lixiviar os nutrientes, dentro das condições em que decorreu o presente estudo. Por outro lado, na fase termófila da compostagem, o teor de N-NO3 foi praticamente vestigial porque as bactérias responsáveis pela nitrificação são fortemente inibidas por temperaturas superiores a 40 °C (Hellmann et al., 1997). Assim, será de esperar que durante a compostagem, as perdas de N por lixiviação de nitratos, fossem praticamente nulas. No entanto, a elevada temperatura e as condições de pH durante a fase termófila, provavelmente, promoveram uma intensa volatilização de amónia, o que explicaria perdas elevadas de N (453-469 g kg-1 de N inicial) que ocorreram durante a compostagem (Figura 3), principalmente na fase inicial do processo, quando a degradação da MO e a produção de amónia foi mais intensa.

A reduzida concentração de amónia que se verificou durante a compostagem da acácia em comparação com outros estudos, designadamente com resíduos da pecuária intensiva (Brito et al., 2008), poderá ser explicada pela elevada razão C/N dos resíduos de acácia relativamente aos dejetos animais, bem como, às perdas de N na forma de amónia no estado gasoso. No final da compostagem, a concentração de N-NO3-ultrapassou a concentração de N-NH4 + em ambas as pilhas, sendo a razão N-NH4 + / N-NO3 de 0,28 na pilha A e 0,96 na pilha B no último dia do período de compostagem avaliado.

A razão N-NH4 + / N-NO3- tem sido frequentemente utilizada para avaliar a maturação dos compostados, sendo sugeridos valores <1 (Larney e Hao, 2007) e <0,5 (CCQC, 2001) como indicativos de compostados bem estabilizados. O compostado A avaliado neste trabalho alcançou, portanto, uma razão N- N-NH4 + / N-NO3 inferior aos valores indicativos para uma boa maturação. Enquanto o compostado B, que foi menos revolvido, poderia carecer de um período ainda mais longo de maturação. O teor de N-NH4 + no final da compostagem foi inferior ao teor limite de N-NH4 + de 400 mg kg-1 MS sugerido por Zucconi e de Bertoldi (1987) como indicador de estabilização dos compostados.

 

Conclusões

Os detritos de acácia moídos e crivados misturados com detritos de casca de pinheiro possuem uma biodegradabilidade e uma estrutura que permite a sua compostagem efetiva, com bom arejamento, como revelaram as temperaturas termófilas que foram atingidas logo após a construção das pilhas e que permaneceram acima de 60 oC por um período suficientemente longo para satisfazer os critérios mais rigorosos para inativação completa de agentes patogénicos.

As perdas de matéria orgânica (600-620 g kg-1 de MO inicial) foram superiores às perdas de N (453469 g kg-1 de N inicial) e assim a razão C/N diminuiu de um valor inicial de 56 para valores finais de 40 e 41, respetivamente para a pilha com maior e menor frequência de revolvimento.

Este estudo revelou que o compostado maturado pode ser obtido com material de acácia com um número reduzido de revolvimentos das pilhas, após 455 dias de compostagem, como se verifica pela descida das temperaturas de compostagem, a estabilização na degradação da MO, a diminuição da razão C/N e o aumento do teor N-NO3 nos compostados finais em comparação com o teor de N-NH4 +. Além de estabilização da MO e da higienização do compostado de resíduos de acácia, os resultados indicaram que a compostagem de acácia com casca de pinheiro pode produzir corretivos do solo ricos em MO e com uma baixa CE sendo, no entanto, necessário um longo período de compostagem e maturação dos compostados finais.

 

Agradecimentos

Este estudo realizou-se com o apoio dos fundos estruturais da União Europeia, através do projeto IDT Empresas em Co-Promoção: “Compostagem de espécies invasoras”. QREN/COMPETE/ CEI_13584/2010.

 

Referências Bibliográficas

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Recebido/Received: 2013.10.28

Aceitação/Accepted: 2013.12.14

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