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Revista de Ciências Agrárias

Print version ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.35 no.2 Lisboa July 2012

 

Indicadores do uso sustentável de pesticidas; Onde está a dificuldade?

Pesticide risk indicators; What is the issue?

Cristina Amaro da Costa[1] e Maria do Céu Godinho[2]

 

[1] ESAV. Quinta da Alagoa. Estrada de Nelas. 3500-606 Viseu

[2] ESAS. Quinta do Galinheiro, S. Pedro, Apartado 310, 2001-904 Santarém

 

RESUMO

As políticas agrícolas adoptadas na União Europeia e em Portugal têm integrado preocupações ambientais e de saúde pública. A necessidade de avaliar os seus efeitos incorporou a intenção de estabelecer indicadores ambientais nos instrumentos legislativos em vigor para os monitorizar. Em Portugal, diversas entidades têm procurado monitorizar estes efeitos, nomeadamente o uso dos pesticidas, como a Agência Portuguesa do Ambiente (Sistema de Indicadores de Desenvolvimento Sustentável) ou o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas (Sistema Integrado de Gestão e Controlo). Nos indicadores disponibilizados nada se refere relativamente ao consumo de pesticidas nem a qualquer outro indicador ambiental, como qualidade do solo ou biodiversidade. Todavia, a partir dos registos ao nível do agricultor (cadernos de campo, etc.), recenseamentos e inquéritos, e actividades de investigação e experimentação, poder-se-ia criar um mecanismo simples e expedito que permitisse monitorizar o uso de pesticidas e seus efeitos no ambiente. Será assim tão difícil?

Palavras-chave: Indicadores de pesticidas, monitorização ambiental.

 

ABSTRACT

Agroenvironmental policies adopted in the European Union and in Portugal consider environment and human health a major issue. The evaluation of policy effects based on a framework of environmental indicators is referred on multiple legislative documents. In Portugal, several public and private organisms, tried to monitor the agricultural impacts, namely, those related to pesticide use. There isn’t available information related to pesticide consume (the available indicators are based on sales), or to any other environment effect due to pesticide use, as soil quality or biodiversity loss, that would allow an effective assess of impacts caused by agricultural activities. However, farmers, technical and certification organizations, research teams, public services collect systematically information that will be of major help for the establishment of a national indicators framework, that might assess the impacts of pesticide use and risks. Is it so difficult?

Keywords: Environmental assessment, pesticides indicators.

 

INTRODUÇÃO

Ao longo das últimas décadas, a economia e a sociedade têm tentado conhecer o impacto da atividade humana, nomeadamente da atividade agrícola e dos diversos sistemas de produção, no ambiente, de modo a garantir a gestão sustentável dos ecossistemas.

Desde a década de 80 que os indicadores ambientais são preconizados como uma ferramenta para avaliação do estado do ambiente e dos efeitos das políticas ambientais, nomeadamente das relacionadas com a agricultura. Assim, em quase todos os países da Europa e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), tem sido adotado um conjunto de indicadores ambientais para monitorizar e avaliar as pressões e a evolução das condições ambientais resultantes da actividade agrícola e da aplicação das diversas medidas de política que abrangem aspetos como as mudanças climáticas, biodiversidade, degradação do solo, da água, da paisagem, utilização de fertilizantes e de pesticidas, entre outros (OCDE, 2003; Peterson, 2004).

Os indicadores ambientais devem: traduzir o estado do ambiente perante as pressões exercidas e as respostas dos agentes envolvidos; ser simples, fáceis de interpretar e capazes de mostrar tendências ao longo do tempo; responder às alterações ambientais; ser comparáveis a nível local, nacional e internacional; apresentar limites máximos e mínimos. Além destas características, devem ser técnica e cientificamente testados e validados, permitir a sua obtenção rápida a custos reduzidos, de forma periódica e poder ser utilizados em modelos económicos e sistemas de informação (OCDE, 2002).

A construção e selecção de indicadores é relativamente complexa devido aos diversos âmbitos dos indicadores (pressão – estado - resposta), aos múltiplos efeitos que decorrem dos modelos de agricultura e das políticas do sector, à diversidade de níveis de análise dos ecossistemas agrários e dos próprios ecossistemas agrários pela multiplicidade de interacções ambientais, sociais e económicas. Por isso, cada vez é mais importante estruturar medidas, acções e instrumentos coerentes e sustentáveis, adequados aos diferentes níveis (Peixeiro e Batista, 2001; Passos et al., 2007).

Assim, procede-se à análise dos diversos indicadores do uso de pesticidas monitorizados na última década, em Portugal, referidos em estudos e documentos publicados.

Sistematiza-se a legislação e os programas que apoiam ou preconizam a construção e divulgação de indicadores do uso de pesticidas.

 

INDICADORES DE USO DE PESTICIDAS

Um indicador ambiental deve ser um valor, parâmetro ou estatística, capaz de fornecer informação e descrever o estado de um fenómeno, situação, acontecimento, bem como a sua evolução. Entre os diversos indicadores referidos pela bibliografia são exemplo: área de agricultura biológica por países, que pode indicar maior ou menor perturbação ambiental, já que previsivelmente se tratam de sistemas de produção com menor perturbação ambiental (Peterson, 2004); presença de larvas mineiras em estufas, como pragas-chave, que poderão indicar o excesso de tratamentos com pesticidas em culturas protegidas (Godinho, 2005); e o uso de pesticidas, cujos efeitos secundários no agricultor, consumidor, águas subterrâneas, peixes, pássaros, abelhas e artrópodes auxiliares podem ser estimados (Bues et al., 2004; CE, 2007; De Smet et al., 2005; Ioriatti et al., 2011; Réus et al., 2002; Stenrød et al., 2008).

Os indicadores ambientais podem ser de diferentes tipos. Quando descrevem alterações ambientais, económicas e sociais, decorrentes de uma determinada prática, como por exemplo a área sujeita a tratamentos com pesticidas numa determinada região, dizem-se indicadores de pressão. Se medem a qualidade do ambiente, os recursos disponíveis e produtos obtidos e a segurança alimentar, por exemplo através da medição da riqueza em matéria orgânica nos solos, são indicadores de estado. Quando medem os efeitos das medidas implementadas e da resposta dos agricultores às diversas pressões e alterações, por exemplo a adesão a determinado financiamento agro-ambiental, são indicadores de resposta. Os indicadores de uso de pesticidas são englobados nos indicadores de estado.

 

INDICADORES DE USO DE PESTICIDAS E INSTRUMENTOS LEGISLATIVOS

A nível internacional

A necessidade de avaliar os efeitos das políticas agrícolas adotadas na UE tem levado a que os diversos instrumentos legislativos em vigor sejam acompanhados da intenção de estabelecer quadros de indicadores ambientais.

A generalidade dos regulamentos e documentos relacionados com uso sustentável dos pesticidas, limites máximos de resíduos de pesticidas, no interior e à superfície dos géneros alimentícios e dos alimentos para animais, de origem vegetal ou animal, colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado, controlos oficiais realizados para assegurar a verificação do cumprimento da legislação relativa aos alimentos para animais e aos géneros alimentícios e execução da condicionalidade, modulação e sistema integrado de gestão e de controlo, no âmbito dos regimes de apoio direto aos agricultores, prevêem a definição de indicadores de monitorização do uso de pesticidas, seus efeitos e resíduos (Quadro 1).

 

 

Ainda a nível europeu, as directivas e regulamentos relacionados com qualidade e proteção da água do solo, também consideram essencial a monitorização de indicadores de poluição ou de contaminação com substâncias perigosas, entre os quais se encontram os pesticidas.

A nível europeu, o EUROSTAT disponibiliza diversos indicadores, nem sempre referentes a todos os países europeus e nem sempre obtidos com as mesmas metodologias. Referem-se, como exemplo, o “consumo de pesticidas”, recolhido por inquérito junto da indústria, a “qualidade da água – poluição por nitratos e pesticidas” obtidos pela Agência Europeia do Ambiente, “práticas agrícolas” fornecidas por alguns países, “área em modo de produção biológico” fornecido pelas entidades nacionais gestoras nas medidas agroambientais, “evolução das populações de aves”, com base em dados da rede BirdLife (Wilson et al., 2011).

No que se refere à avaliação do risco, diversos estudos apontam os resíduos de pesticidas na fruta, vegetais e cereais, como uma das principais preocupações dos consumidores europeus. A entidade responsável por monitorizar este tipo de riscos é a Agência Europeia de Segurança Alimentar, que analisa os riscos dos alimentos e controla a sua qualidade, de modo a cumprir o Regulamento (CE) 396/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de Fevereiro (EFSA, 2010).

São diversos os países europeus que estabeleceram já a monitorização de indicadores de uso de pesticidas, em diversos tipos de planos de acção de índole nacional, nomeadamente França (Aubertot et al., 2005); Reino Unido (DEFRA, 2006); e Alemanha (FMFACP, 2008).

A FAO define com regularidade o indicador “uso de pesticidas agrícolas”, que refere a quantidade de substância activa (s.a.), em kg, por hectare de terra agrícola, construído com base nas vendas de pesticidas de cada país. Nos documentos metodológicos, surgem, como limitações para este indicador, o facto de não considerar informação referente à toxicidade, mobilidade e persistência das s.a., não ter qualquer tipo de relação com a sua utilização espacial e a ocorrência de falhas na transferência de dados (FAO, 2007).

Existem, ainda, organizações internacionais que procuram criar modelos de monitorização de indicadores de uso de pesticidas, com vista à redução do seu uso e dos riscos associados. Podem referir-se a Pesticide Action Network (PAN), uma organização mundial que inclui 600 organizações não-governamentais e instituições de 60 países, representada na Europa pela PAN Europe, sediada no Reino Unido (Parente, 2005; PAN Europe, 2010), ou o EUROSTAT, que preparou e disponibilizou a metodologia comum para a construção de estatísticas referentes ao uso de pesticidas na agricultura (Nadin, 2009).

A nível nacional

São diversos os instrumentos legislativos nacionais (Quadro 2) que prevêem um conjunto de procedimentos de controlo físico, a realizar in loco, aos produtores que aderirem aos diversos programas de apoio ao sector agrícola e a locais de risco, como as águas subterrâneas.

 

 

O Instituto Nacional de Estatística disponibiliza, em Portugal, informação diversa sobre os principais indicadores agro-ambientais com o objectivo de identificar, qualificar, quantificar e avaliar tendências das interacções mais significativas entre a agricultura e o ambiente. Os indicadores são construídos com base em fontes muito diversificadas e apresentam alguma heterogeneidade, mas permitem analisar tendências bem como o posicionamento relativo de Portugal face aos restantes Estados Membros da UE. Relativamente ao uso dos pesticidas, a informação apresentada refere-se aos níveis e à intensidade do uso de pesticidas pela agricultura, expressa em s.a. das quantidades vendidas (INE, 2009).

No âmbito do Sistema Integrado de Gestão e Controlo (SIGC), da responsabilidade do Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas (IFAP), prevê-se o registo permanente do conjunto de informação relativa às explorações que apresentam pedidos de ajuda às diversas de medidas de apoio ao sector – “condicionalidade” - que inclui o sistema de informação geográfica de identificação de parcelas que visa a caracterização das explorações agrícolas, sistema de identificação e registo dos direitos ao pagamento que garante o cruzamento dos controlos previstos, sistema integrado de controlo de modo a assegurar a verificação eficaz dos requisitos da concessão das ajudas, entre os quais os referidos no Quadro 3.

 

 

As ajudas no âmbito da condicionalidade obrigam ao registo de informação que pode servir de base à construção de diversos indicadores de uso sustentável de pesticidas, nomeadamente registos do uso de pesticidas, recolha e concentração dos resíduos de embalagens e excedentes e destruição de sebes, muros e galerias ripícolas.

O plano nacional de controlo plurianual integrado (PNCPI), da responsabilidade dos Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAMAOT) e do Ministério da Economia e do Emprego (MEE), inclui o conjunto de planos específicos de controlo, tendo como objectivo assegurar que o controlo oficial cobre toda a legislação alimentar e todos os géneros alimentícios ao longo de toda a cadeia alimentar, nomeadamente o controlo de produtos provenientes de sistemas de produção como o Modo de Produção Biológico (MPB), de resíduos de pesticidas em produtos de origem vegetal e rastreabilidade, da segurança biológica, química, rotulagem, apresentação e publicidade de géneros alimentícios (MADRP, 2008). Entre 2007 a 2009, verificou-se o aumento do número de amostras recolhidas e analisadas, em cerca de 30%, com a percentagem de amostras que excedeu os valores dos Limite Máximo de Resíduos (LMR) muito baixa e que decresceu de 6% para 2,5% no período referido (Araújo, 2011). Neste mesmo período, o dimetoato, carbendazime, benomil e ditiocarbamatos foram os pesticidas que mais vezes ultrapassaram os valores dos LMR (74% em 2007, 65% em 2008 e 56% em 2009).

No âmbito da Directiva Quadro da Água (Directiva 2000/60/CE, de 23.10) é preconizada a adopção de indicadores que permitam avaliar o impacto da actividade humana sobre o estado das águas de superfície e sobre as águas subterrâneas, nomeadamente o seu estado ecológico e químico e o potencial ecológico. A monitorização destes indicadores está contemplada nas actividades do Instituto da Água (INAG) e a informação sobre resíduos de pesticidas encontrados em águas subterrâneas ou superficiais deveria ser disponibilizada no âmbito do Sistema de Informação Nacional dos Recursos Hídricos (SINRH).

Esta directiva obriga à elaboração de planos de gestão das regiões hidrográficas que devem incluir a síntese das pressões e impactes da actividade humana no estado da água subterrânea e a apresentação dos resultados da monitorização periódica (DGA, 2008). Estes resultados são disponibilizados nas diversas regiões e referem-se a valores de pesticidas que tenham ultrapassado os limites previstos nas Normas de Qualidade (Anexo I da Directiva das Águas Subterrâneas, Decreto-Lei n.º 208/2008, de 28 de Outubro), como se verifica, por exemplo, em Torres Vedras, Caldas da Rainha, Nazaré, onde as águas subterrâneas apresentam, actualmente, valores médios superiores ao limiar de qualidade para pesticidas (ARHTejo, 2011). Nalguns casos, os relatórios das regiões hidrográficas referem como lacuna não estarem a ser monitorizados metabolitos dos pesticidas e identificam, por exemplo, resíduos de DDT, dicofol, aldrina, dieldrina, endrina e isodrina, que apesar de estarem banidos dos países da eu, podem permanecer no solo durante vários anos (ARHCentro, 2011)

Em 2007, cerca de 52,4% das massas de água de superfície de Portugal continental encontrava-se em risco de não cumprir os objectivos ambientais preconizados pela Directiva-Quadro da Água e pela Lei da Água (Vilão et al., 2010).

Por outro lado, em Portugal, todas as entidades distribuidoras de água, bem como a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ESRAR), que analisa pesticidas nas águas para consumo humano, têm que estar em conformidade com o Decreto-Lei 306/2007 de 27 de Agosto, que define os critérios de qualidade da água consoante a sua origem e obriga a análise de pesticidas nas águas para consumo humano. A Empresa Portuguesa das Águas Livres (EPAL), além de efetuar análises relativamente às listagens anuais disponibilizadas pela Direcção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR), tem como política procurar outro conjunto de s.a. que revelem persistência ambiental ou quando existam evidências nacionais e/ou internacionais de novos compostos no meio aquático (Cardoso et al, 2011).

A nível nacional, duas entidades recolhem informação referente a intoxicações com pesticidas no decurso da sua actividade: o Centro de Informação Antivenenos (CIAV) e O Programa Antídoto – Portugal. O Centro de Informação Antivenenos (CIAV), criado, em 1982, no Instituto Nacional de Emergência Médica, é um centro médico de consulta telefónica na área da toxicologia, responsável pela prestação, em tempo útil, das informações necessárias e adequadas a profissionais de saúde ou ao público em geral, visando a abordagem correta e eficaz a vítimas de intoxicação (http://www.inem.pt/ciav). O Programa Antídoto – Portugal é uma plataforma contra o uso ilegal de venenos, constituída por várias entidades públicas e privadas portuguesas e que teve início oficial a 4 de Março de 2004. Este programa pretende combater as diversas formas de uso indevido de substâncias tóxicas e contribuir para o melhor conhecimento sobre as consequências que essas práticas representam para a fauna silvestre http://www.antidoto-portugal.org).

No âmbito da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), têm sido desenvolvidos vários trabalhos no domínio dos indicadores e índices ambientais, dos quais se pode salientar a Proposta para um Sistema de Desenvolvimento Sustentável (SIDS), elaborada, em 1998, na ex-Direcção Geral do Ambiente (DGA), publicado pela primeira vez em 2000 e revisto e reeditado em 2007, que visa contribuir para a melhoria da gestão do desempenho ambiental, económico, social e institucional, e para tornar os processos de sistematização e troca de informação sobre ambiente e desenvolvimento sustentável mais eficientes (APA, 2010; DGA, 2000). Em 2011, a APA disponibilizou o Sistema Nacional de Informação do Ambiente – SNIAmb – que garante a estruturação e divulgação de dados de referência para apoio ao desenvolvimento e avaliação de políticas e desempenho ambientais (Baltazar, 2011).

O SIDS inclui a monitorização de diversos indicadores relacionados com o uso de pesticidas - estado das águas de superfície, estado das águas subterrâneas, quantificação das vendas de produtos fitofarmacêuticos, qualidade da água para consumo humano, - e com os seus efeitos, nomeadamente ao nível da biodiversidade - índice de aves comuns (Quadro 4).

 

 

São, ainda, monitorizados outros indicadores que estão relacionados com o práticas agrícolas mais ou menos intensivas, e a partir dos quais se pode avaliar o impacto da actividade agrícola, como por exemplo o número de explorações ou a área de “produção agrícola certificada”.

Relativamente a indicadores de uso de pesticidas a nível nacional, em Portugal, tem sido monitorizada a venda de produtos fitofarmacêuticos, cujos valores são disponibilizados no SIDS e na DGADR (Fig. 1).

 

 

Da avaliação deste indicador, pode facilmente perceber-se uma ligeira tendência decrescente no total de pesticidas vendidos (diminuição de 1% na média do período 2001-2010), em particular dos fungicidas (Fig. 1). Apesar de se tratar de um indicador expedito e de fácil construção, não reflecte verdadeiramente o uso de pesticidas, já que as vendas não estão associadas nem a práticas agrícolas (uma s.a. de protecção integrada também pode ser utilizada em agricultura convencional), nem a culturas (diversas s.a. podem ser utilizadas em diferentes culturas), nem a regiões, nem a qualquer tipo de efeito ambiental, para além de se desconhecer a sua efectiva utilização.

Uma das formas de tornar este indicador mais rico é associar aos valores das vendas de cada s.a., um valor de externalidade ambiental decorrente da toxidade para auxiliares, abelhas, peixes, mobilidade, persistência, etc. São exemplos o indicador de risco para a saúde humana e indicador de risco para o ambiente, que associa parâmetros de risco para a saúde humana e de risco para o ambiente, a partir das classes de toxicidade de cada s.a. (Vieira, 2003); a soma de tratamentos equivalentes que constitui uma boa estimativa do potencial risco de contaminação ambiental decorrente do uso de pesticidas, com base nos valores de toxicidade dermal, máxima concentração permitida na água e o concentração mais elevada da s.a. que não causa afeitos adversos observáveis nos organismos testados (Costa et al., 2007; De Smet et al., 2005; Reus et al., 2002) ou o Environmental Impact Quotient (EIQ), referido em diversos trabalhos de avaliação do impacto da actividade agrícola, e que se calcula com base num grande número de variáveis associadas aos efeitos dos pesticidas no ambiente, na biodiversidade, no agricultor e no consumidor (meia vida no solo e na planta, potencial de lixiviação, perdas superficiais potenciais, toxicidade para peixes, aves, abelhas, artrópodes auxiliares, toxicidade dermal e crónica) (Kovach et al., 1992).

A nível regional e local

Ao nível local, são diversas as iniciativas que incluem a construção de indicadores ambientais, no âmbito de sistemas de gestão e intervenção territorial. A Associação de Municípios do Distrito de Évora (AMDE), no contexto do Projecto INTERREG II-C “Coordenação de Sistemas de Informação Geográfica e de Instrumentos de Observação Territorial para o Desenvolvimento de Espaços Rurais de Baixa Densidade”, propõe a construção de um conjunto de indicadores ambientais flexíveis e de fácil uso que possa realizar diagnósticos da situação ambiental e das dinâmicas de mudança na região do Alentejo (com exceção do Alentejo Litoral) (Peixeiro e Batista, 2001).

Ao nível dos agricultores e associações, são diversos os registos sistemáticos que decorrem da prática agrícola e dos compromissos definidos no âmbito das medidas de apoio e legislação nacional, nomeadamente no âmbito dos cadernos de campo e de registo exigidos pelos diversos modos de produção certificados e múltiplos referênciais de qualidade.

Por exemplo, a prática da proteção e produção integrada, e da agricultura biológica, prevê a existência de cadernos de campo, onde deverá ser registada informação sistemática relativa à aplicação de pesticidas, à estimativa do risco, à monitorização da fauna auxiliar, entre outra, desde 1997 (Portaria 65/97, de 28.01), prática que terá provavelmente continuidade no âmbito dos novos instrumentos legislativos e regulamentares.

No âmbito das universidades, institutos politécnicos e centros de investigação, têm sido desenvolvidos múltiplos projectos relacionados com o uso de pesticidas (ex. AGRO 24 - Uso de pesticidas em arrozais numa perspectiva de agricultura sustentada, HERBITOXBIOAS - Development of bioassays for herbicide toxicity based on gene expression profiling using yeast cells) e com indicadores ambientais, quer na área do uso dos pesticidas (ex. AGRO 545 - Os indicadores ambientais para avaliar a prática da protecção integrada, da produção integrada e da agricultura biológica e o uso sustentável de pesticidas em Portugal) quer dos seus efeitos no ambiente e biodiversidade (ex. PTDC/AGR-PRO/111123/2009 - The use of biological indicators as tools for assessing the impact of agricultural practices in sustainability of olive grove; BioDiVine - Demonstrating functional biodiversity in viticulture landscapes).

 

CONCLUSÕES

O panorama complexo de legislação, regulamentos, regras, programas, quer relacionados com o uso de pesticidas quer com a actividade agrícola e com o ambiente, que consideram essencial o estabelecimento de quadros de indicadores que permitam avaliar o impacto destas actividade tem, seguramente, dividido o esforço nacional e dificultado a implementação de um sistema comum, que possa enriquecer em informação de forma contínua.

Parece urgente operacionalizar um verdadeiro sistema de indicadores, com base em alguns que já existam e funcionam, e aos quais se possa acrescentar, de forma descentralizada, a informação que está dispersa. De forma simplificada, deveria ser integrada a informação que é recolhida pelas diversas entidades, incluindo associações, agricultores, municípios, entidades reguladoras, universidades e politécnicos, e todas as outras, que no âmbito das suas funções recolhem informação relacionada com o uso de pesticidas e seu impacto.

Construir um indicador de uso de pesticidas, e não só de venda dos mesmos, implica a definição ou escolha do(s) indicador(es) e, em sequência, a decisão de dar início ao processo onde podem e devem participar todos os agentes envolvidos.

 

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