SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.35 issue2Pesticides and honey beesPesticide risk indicators: What is the issue? author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Revista de Ciências Agrárias

Print version ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.35 no.2 Lisboa July 2012

 

Baydiversity– Planos de acção de conservação para a gestão integrada de áreas agrícolas

Baydiversity– Conservation action plan for the management for integrated management of agricultural áreas

Filipa Gouveia[1], Maria do Carmo Tavares[1], Ana Guerra[1], Luís Antunes[2]; João Vila Maior[2] e Avelino Balsinhas[2]

 

[1] AmBioDiv – Valor Natural. Ambiente, Natureza e Sustentabilidade, Lda. E-mail: ambiodiv@ambiodiv.com;

[2] Bayer CropScience, Lda. Rua Quinta do Pinheiro, 5; 2794-003 Carnaxide

 

RESUMO

O Projecto Baydiversity nasceu da necessidade da Bayer CropScience alinhar estratégias de Conservação da Natureza e Biodiversidade com políticas internacionais, reforçando a sua relação com um conjunto seleccionado de clientes e possibilitando que estes possam gerir sustentavelmente as suas parcelas agrícolas. O Plano de Acção de Conservação (PAC) é uma ferramenta de gestão que: a) avalia e monitoriza valores naturais com interesse regional/local e com estatuto de conservação; b) avalia espécies com importância na protecção de culturas e conservação do solo; c) define indicadores biológicos para avaliar e monitorizar o desempenho das práticas pró-conservação; e d) avalia áreas agrícolas e adjacentes a estas, para a correcta gestão do habitat. O principal objectivo do PAC é estabelecer uma linha base em relação à Biodiversidade, que permitirá a definição de orientações de gestão que favoreçam a Biodiversidade. Foram realizados em 2011, 14 PAC para clientes do grupo Bayer, no Norte, Centro e Sul do País.

Palavras-chave: Biodiversidade, espécie, gestão agrícola, plano de acção de conservação.

 

ABSTRACT

The Baydiversity project was born on the need of Bayer Cropscience to embrace strategies for Nature and Biodiversity Conservation with the international politics, reinforcing its relationship with selected clients, thereby making these clients able to integrate questions related with Biodiversity Conservation in the management of their agricultural properties. A Biodiversity Action Plan (BAP) is a management tool that a) evaluates and monitors natural values with regional or local interest and with conservation status, b) evaluates species important for culture protection and soil conservation, c) defines biological indicators to evaluate and monitor the performance of post-conservation practices and d) evaluates agricultural and its contiguous areas, in order to correctly manage the habitat. The main goal of BAP is to establish a baseline for biodiversity that will allow the definition of management guidelines. During 2011 there were accomplished 14 BAP for clients of Bayer group in the north, center and south of Portugal.

Keywords: Agricultural management, biodiversity, biodiversity action plan, specie.

 

INTRODUÇÃO

Como a Bayer não possui as capacidades técnicas para realizar estudos de Biodiversidade, procedeu à realização de um protocolo com a AmBioDiv, empresa já com um longo historial de trabalhos relacionados com gestão de Biodiversidade, ao nível agrícola e florestal. Numa primeira fase do projecto foi realizado um Plano de Acção de Conservação (PAC) para cada uma das 14 quintas. Os trabalhos continuarão em 2012, com a selecção das áreas mais interessantes para trabalhar, sobretudo ao nível das questões ambientais e ecológicas, através da gestão e recuperação de áreas mais degradadas, tendo em vista a melhoria dos set-aside agrícolas e florestais como forma de refúgio de pragas e auxiliares destas culturas, o que permitirá ao proprietário reduzir o uso de pesticidas no controlo de pragas e doenças das suas culturas.

Foi adoptada a metodologia denominada Abordagem ao Habitat – análise de comunidades vegetais através da fitossociologia (Braun-Blanquet, 1979) – tendo sido identificadas diversas espécies e habitats com estatuto de conservação em set-asides agrícolas e florestais, fornecendo importantes guidelines de gestão destas áreas aos proprietários. As 14 quintas visitadas são sobretudo dedicadas à produção agrícola de vinho, uva, pomóideas e à produção florestal de alfarrobeira, oliveira, pinho e eucalipto. As quintas foram agrupadas em 3 grupos, de acordo com a sua distribuição biogeográfica: Norte, Centro e Sul, e são referidas as espécies com estatuto de conservação identificadas (flora e fauna), bem como as comunidades vegetais identificadas.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Na avaliação dos valores naturais presentes utilizou-se a abordagem ao nível do Habitat (Figura 1), através da aplicação da metodologia fitossociológica da escola de Zurich_Montpellier, proposta inicialmente por Braun-Blanquet (1966), Rivas-Martínez (1976) e posteriormente modificada por Géhu e Rivas-Martínez (1981). A abordagem ao nível do Habitat é focada na avaliação da estrutura e desenvolvimento de um habitat, sobretudo através da análise das comunidades vegetais, utilizando a metodologia fitossociológica que integra as variáveis ambientais e sumariza praticamente toda a diversidade florística, bem como muitas das relações ecológicas entre os diferentes organismos (Loidi, 1994). Posteriormente, é necessário saber se a estrutura do habitat providencia áreas de abrigo, alimentação e reprodução para as diferentes espécies de fauna. A nomenclatura sintaxonómica apoia-se em Rivas-Martínez et al. (2001 e 2002).

 

 

O material vegetal foi identificado segundo os trabalhos de Castroviejo et al. (1986-1997), Coutinho (1939), Franco (1971, 1984), Franco e Afonso (1994, 1998, 2003), Muñoz Garmendia e Navarro(1998) e Zarco (1990). A identificação da fauna, espécies, dejectos e pegadas foi efectuada na base de guias de campo e bibliografia especializada (Askew, 2004; BirdLife International, 2004; Brown, 2002; Bruun, 2002; Costa, 2003; Ferrand de Almeida, 2001; Flegg, 1990; García-Barros, 2004; Maravalhas, 2004 e 2003; MacDonald, 2003; Mullarney, 1999; Pollard, 2003; Robineau, 2007; Tolman, 1997 e Van Swaay, 1999). A biogeografia das quintas avaliadas seguiu o trabalho de Costa et al. (1998).

 

RESULTADOS E DICUSSÃO

Foram avaliadas 14 quintas em Portugal Continental (Figura 2) que serão aqui agrupadas e descritas por grupos: Sul, Centro e Norte.

 

 

Sul

Foram avaliadas 5 quintas localizadas (Figura 2), respectivamente, no Superdistrito Sadense, Alto-Alentejano (2), Estremenho e Algárvico.

Quinta de Camarate

Foram identificadas 99 espécies de flora, 33 de aves, 4 de mamíferos e 1 de réptil. Das espécies identificadas, apenas a flora apresenta espécies com estatuto de conservação, nomeadamente um endemismo europeu e uma espécie constante na Directiva Habitats, Anexo V: Salvia sclareoides e Ruscus aculeatus, respectivamente.

A Quinta de Camarate localiza-se em Azeitão e estende-se por cerca de 110 hectares (ha). Tem 40 ha de vinha, sendo os restantes constituídos por matagais, montados de sobro, e pinhais. A quinta localiza-se no sopé da Serra da Arrábida, em solos argilo-calcários, sendo aqui produzidos os queijos de Azeitão. Existe ainda uma colecção ampelográfica com mais de 500 castas diferentes de vinha. Esta propriedade encontra-se encostada ao Parque Natural da Arrábida, área protegida da Rede Natura 2000 (RN2000).

Os habitats da RN2000 identificados são: bosques de zambujeiros (9320pt1 – Bosques olissiponenses-arrabidenses de zambujeiro e alfarrobeira) e montados de sobro (6310 – Montados de Quercus spp. de folha perene).

Herdade da Morgada

A Herdade da Morgada localiza-se em Borba e tem 110 ha, destes 27,5 ha são vinha, 28 ha de nogueiras, 20 ha de montado de sobro, 11 ha de pomares de ameixas rainha-cláudia, 13 ha de pomares de ameixas japonesas e 2,5 ha de damascos. A propriedade encontra-se em zona de caça associativa, apresenta terreno plano e com bastante diversidade de culturas frutícolas. A área de montado de sobro encontra-se em óptimo estado de conservação. De maneira geral, existem poucos núcleos de vegetação na bordadura das culturas, tratando-se de um local muito aberto e de características áridas, abrangido pelo anticlinal de Estremoz, com solos que variam entre xistos e vermelhos calcários. Os caminhos não apresentam sinais de erosão e as culturas têm relvados naturais nas entrelinhas. Na propriedade existe ainda uma charca com boas condições para a ocorrência de anfíbios.

Esta propriedade não está abrangida por qualquer Sítio de Interesse Comunitário (SIC) ou Zona de Protecção Especial (ZPE) da RN 2000, nem por nenhuma Área Classificada.

Foram identificadas 86 espécies de flora, 35 de aves, 4 de mamíferos e um réptil. Apenas no grupo da flora se observou a presença de espécies com estatuto de conservação, nomeadamente 2 endemismos europeus (S. sclareoides e Phlomis lychnitis). Em termos de habitats RN2000 identificados, chama-se a atenção para os montados de sobro (6310 – Montados de Quercus spp. de folha perene).

Herdade de João Portugal Ramos

A Herdade de João Portugal Ramos localiza-se em Estremoz, com cerca de 130 ha. Tem 63 ha de vinha e 70 ha de montado, uma ribeira e uma pequena barragem. Esta propriedade não está abrangida por qualquer SIC ou ZPE da RN2000, nem por nenhuma Área Classificada.

Nesta Herdade foram identificadas 105 espécies (73 de flora, 25 de aves, 5 de mamíferos e dois répteis) e 3 apresentam estatuto de conservação: o tartaranhão-caçador (Circus pygargus) uma espécie ameaçada com o estatuto de Em Perigo (EN), a Gladiolus illyricus subsp. reuteri (endemismo ibérico) e a Anarrhinum bellidifolium (endemismo europeu). Estas espécies ocorrem sobretudo nos montados de sobro (6310 – Montados de Quercus spp. de folha perene).

Quinta da Granja

Foram identificadas 91 espécies de flora, de destacar as 3 espécies presentes na Convenção CITES (Anacamptis pyramidalis, Ophrys apifera e Serapias sp.), todas orquídeas que se desenvolvem nestes solos calcários, bem como o endemismo europeu (S. sclareoides) e a espécie constante na Directiva Habitats, Anexo II (Salix salviifolia).

A quinta localiza-se entre o Carregado e Arruda dos Vinhos e estende-se por 120 ha. Tem várias parcelas de plantação de uva de mesa e outras de cereal (cevada). As áreas de cereal funcionam como pousio, sendo “cedidas” a agricultores que tratam da sua gestão. As culturas agrícolas de uva de mesa têm a particularidade de não serem regadas, o que pode ser um factor diferenciador que permita diferenciar este tipo de produção no mercado da fruticultura em favor da conservação da natureza. Apresenta solos profundos, com elevada capacidade de retenção de água e com pH na ordem dos 8 – solos calcários. Esta propriedade não está abrangida por qualquer área da RN2000. Os habitats com maior relevância, são os relvados de orquídeas (habitat prioritário para a conservação 6210 - Prados secos seminaturais e fácies arbustivas em substrato calcário), bem como os matagais arbustivos presentes nas imediações destes relvados e que são constituídos por carrascais (5330pt5 – Carrascais, espargueirais e matagais afins basófilos)

Quinta dos Vales

Localiza-se em Estombar e estende-se por 50 ha. Nesta quinta são desenvolvidas várias actividades, tais como culturas agrícolas (vinha, figueiras, laranjeiras, ameixeiras e alfarrobais) e florestais Esta propriedade não está abrangida por qualquer área da RN2000. Compreende área agro-florestal, implantada em terreno calcário com relevo ondulado. O solo (calcário) é um dos principais factores ecológicos responsáveis pelo desenvolvimento do coberto vegetal: núcleos de orquídeas, carrascais e tomilhais, entre outros.

De todas as quintas amostradas foi a que apresentou maior diversidade de espécies, nomeadamente espécies com estatuto de conservação. Em termos de flora foram identificadas 117 espécies, das quais 2 são endemismos (Cistus psilosepalus e G. illyricus subsp. reuteri) e 5 são orquídeas, espécies que figuram na Convenção CITES (Anacmptis pyramidalis, Ophrys bombyliflora, Ophrys lutea, Ophrys speculum e Serapias sp.). Foram também registadas 4 espécies de répteis, 28 espécies de aves e 3 espécies de mamíferos. Relativamente às espécies de aves, destaca-se a Gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus), detectada na amostragem e que apresenta estatuto de conservação Vulnerável. Contudo, tratando-se de uma ave marinha a utilização da área da Quinta dos Vales será apenas pontual. Todos os outros grupos de fauna não apresentam espécies com especial interesse para a conservação.

Centro

Foram avaliadas 4 quintas (Figura 2) localizadas, respectivamente, no Subsector Beirense Litoral (2), Altibeirense e Zezerense e Miniense Litoral.

Quinta do Valdoeiro

A Quinta do Valdoeiro, no concelho de Mealhada, tem cerca de 140 ha. Esta propriedade não se encontra abrangida por qualquer área classificada da RN2000.

Identificaram-se 60 espécies vegetais, 25 aves, 7 mamíferos e um anfíbio. Em relação às espécies identificadas com estatuto de conservação, apenas a flora apresenta espécies desta categoria, nomeadamente dois endemismos europeus (Hypericum elodes e Cytisus striatus) e uma espécie constante na Directiva Habitats, a gilbardeira (R. aculeatus). Foi amostrada uma charca e a sua envolvente constituída por povoamentos de eucalipto e um povoamento de pinhal-bravo, não tendo sido identificados quaisquer habitats classificados.

Apesar da Biodiversidade encontrada ser reduzida, as zonas amostradas possuem potencial para a ocorrência de muitas espécies com estatuto de conservação, dado o estado actual de conservação da área ser evolutivo e favorável. Esta reduzida detecção de Biodiversidade, pode dever-se ao facto de ter sido realizada uma única visita de amostragem.

Colinas de São Lourenço

Localiza-se no concelho de Anadia e tem cerca de 20 ha, não sendo abrangida por qualquer área classificada da RN2000. Foram identificadas 46 espécies vegetais, sendo apenas uma constante da Convenção CITES (A. pyramidalis), 4 espécies de aves, 3 espécies de mamíferos e uma espécie de réptil. Nenhum dos grupos de fauna apresenta espécies com especial interesse para a conservação.

Foi avaliada a área de pinhal que não apresentava sub-coberto arbustivo por ter sido recentemente cortado. Assim sendo, a diversidade florística encontrada foi relativamente baixa. Alguns sobreiros estão presentes no estrato arbóreo e no estrato arbustivo apenas se observaram as seguintes espécies (resquícios do corte de matos ou regeneração após corte): Smilax aspera, Cistus salvifolius, Ulex sp., Quercus lusitanica, Myrtus communis, Crataegus monogyna, Daphne gnidium e Phillyrea angustifolia.

Apenas foi identificado um habitat classificado, caracterizado por ser uma área aberta constituída por relvados de orquídeas em solos calcários. Esta área já não pertence à quinta, no entanto, foi realizada a sua avaliação que permite tirar elações sobre o tipo de vegetação que poderia existir na mesma caso houvesse mais áreas naturais.

Dada a altura do ano em que os levantamentos foram realizados (Verão), já não foi possível identificar as espécies de orquídeas aqui presentes. Apenas se conseguiu observar já o estado final do seu ciclo reprodutivo (ovários inchados). Provavelmente trata-se de A. pyramidalis e Serapias sp., contudo sem certezas. Do que se conseguiu observar, as populações eram grandes (pelo menos mais de 20 indivíduos de A. pyramidalis), o que torna a área habitat prioritário da RN2000.

Quinta de Valverdinho

Localiza-se na sub-região da Cova da Beira e tem cerca de 1200 ha, não se encontrando abrangida por qualquer área classificada da RN2000.

As áreas amostradas correspondem sobretudo a zonas húmidas que constituem os set-asides das áreas plantadas. As ribeiras são dominadas por salgueirais, freixiais e amiais (92A0pt4 – Salgueirais arbustivos de S. salviifolia; 91E0* - Florestas aluviais de Alnus glutinosa e Fraxinus excelsior e 91B0 – Freixiais termófilos de Fraxinus angustifolia). Foram identificadas 76 espécies de flora, duas endemismos Europeus (C. striatus e A. bellidifolium) e 1 espécie do Anexo II da Directiva Habitats (S. salviifolia). Em termos de fauna, foram registadas 41 espécies de aves, 6 espécies de mamíferos, 2 espécie de répteis, 2 de anfíbios, 1 de peixes, 6 de Odonatos e 3 de Lepidopteros. A maioria das espécies de fauna registadas corresponde a espécies não ameaçadas, comuns e de distribuição ampla. No entanto, é de realçar a importância da presença de dois endemismos ibéricos, a rã-ibérica (Rana iberica) que merece atenção especial já que, apesar de ser uma espécie classificada como Pouco Preocupante a nível nacional, apresenta populações isoladas na sua área meridional de distribuição e do lagarto-de-água (Lacerta shreiberi), também considerado Pouco Preocupante (LC) no Livro Vermelho de Vertebrados de Portugal, mas apresentando populações residuais a sul do Rio Tejo, com elevada probabilidade de extinção. A toupeira (Talpa occidentalis) é também um endemismo ibérico considerado como Pouco Preocupante (LC) que, dada a sua ampla distribuição em Portugal, não requer, para já, especial atenção. Na conservação de anfíbios, dada a sua dependência de zonas húmidas (p.e. charcas, linhas de água, pauis), tem especial relevância a conservação destas e diminuir a poluição e eutrofização das mesmas. Para os répteis terrestres, as acções de conservação devem também centrar-se na manutenção da vegetação autóctone.

Quinta de Lemos

A Quinta de Lemos localiza-se em Silgueiros e tem cerca de 50 ha com 23 ha de vinha, 8 ha de olival, sendo os restantes constituídos por floresta (bosquetes de carvalhais e pinhais). Esta propriedade não se encontra abrangida por nenhuma área protegida da RN2000.

Durante as saídas de campo foram identificadas 69 espécies de flora, 32 de aves, 3 mamíferos e dois répteis. Apenas o grupo da flora apresenta espécies com especial interesse para a conservação: 4 endemismos Europeus (Linaria spartea, A. bellidifolium, Teucrium scorodonia e Halimium alyssoides), e duas espécies constantes na Directiva Habitats (R. aculeatus e S. salviifolia).

Os habitats amostrados são povoamentos de pinheiro-bravo que apresentam bastante regeneração natural de carvalho-alvarinho (Quercus robur) e medronheiro (Arbutus unedo). Fora dos limites da propriedade existe uma área onde o pinheiro-bravo (Pinus pinaster) diminui a sua dominância, aumentando a dominância de carvalhais com sub-coberto de medronhal (9230pt1 – Carvalhais de Q. robur e 5330pt3 – Medronhais). Apesar de fora da área de amostragem, fez-se a avaliação desta área como forma de caracterizar a vegetação natural característica da área de estudo.

Norte

Foram avaliadas 5 quintas (Figura 2) que se encontram respectivamente no Superdistrito Altibeirense, Duriense, Duriense e Terra-Quente, Miniense Litoral e Subsector Miniense.

Quinta da Ervamoira

A Quinta da Ervamoira localiza-se no concelho de Vila Nova de Foz Côa e abrange cerca de 200 ha, entre os 110 m e os 340 m de altitude. Tem 150 ha de vinha (plantação vertical), sendo os restantes constituídos por olivais, linhas de água (ribeira de Piscos e rio Côa) e matos baixos. Pretende-se fazer a transição de cerca de 30 ha de modo de produção biológico, a serem certificados como parcelas pedagógicas. A quinta tem todo o seu limite Este delimitado pelo rio Côa. Na quinta predominam os solos do tipo xisto com pH neutro, existindo bastantes problemas de perda de solo por erosão. Esta propriedade encontra-se abrangida pela ZPE do Vale do Côa – PTZPE0039.

Foram identificadas 55 espécies vegetais, das quais duas são endemismos Europeu (Cytisus multiflorus e A. bellidifolium). Foram também registadas 42 espécies de aves, 4 de mamíferos, 1 de réptil e 1 de anfíbio. É de realçar a importância da presença da Cegonha-preta (Ciconia nigra), classificada como “Vulnerável” (VU); da Águia-real (Aquila chrysaetos), classificada como “Em Perigo de Extinção” e do Chasco-preto (Oenanthe leucura), classificado como “Criticamente em Perigo” (CR) no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. Para todas as espécies mencionadas, é muito importante realizar campanhas nacionais de sensibilização e educação ambiental da população rural.

Identificaram-se comunidades arbóreas de salgueiros, choupos e freixos nas margens do rio Côa (91B0 – Freixiais termófilos de F. angustifolia; 92A0 – Florestas-galerias de Salix alba e Populus alba; 92D0pt3 – Matagais de Flueggea tinctoria associados a leitos de estiagem inundados no Inverno e 5330pt2 – Piornais de Retama sphaerocarpa). São comunidades importantes por possuírem a estrutura física que permite o abrigo de diferentes espécies de avifauna e que permitem, entre outras funções, regularizar o ciclo hidrológico da água bem como a estabilização de margens e taludes.

Quinta da Roêda

Localiza-se em Pinhão e abrange cerca de 105 ha. Tem 77 ha de vinha (vinha em patamares e ao alto), sendo os restantes constituídos por olivais e matorrais. A quinta a SE e a SW contacta com o rio Douro, encontrando-se implantada em solos xistosos. A Quinta da Roêda apresenta 3 modos de produção de vinho - biológico, convencional e sustentável.

Apenas se realizaram levantamentos em áreas adjacentes ao modo de produção sustentável como forma de obter resultados comparativos em relação aos dois outros modos de produção, uma vez que a finalidade é aliar um modo de gestão que tenha o mínimo de impactes na natureza e ao mesmo tempo que do ponto de vista económico seja gerador de riqueza. Esta propriedade não se encontra abrangida por nenhuma área protegida da RN2000. Os levantamentos florísticos realizados evidenciam uma diversidade vegetal de 59 espécies, sendo uma endemismo Europeu (A. bellidifolium). Foram registadas 29 espécies de aves, 1 de mamífero, 1 de réptil e 4 de Lepidopteros. Estas espécies de fauna correspondem a espécies não ameaçadas, comuns e de distribuição ampla.

Apenas foi identificado um habitat da Directiva Habitats (5330pt3 – Medronhais). Trata-se de um medronhal denso com enorme variedade de espécies que o acompanham tais como: Cistus albidus, C. ladanifer, C. salvifolius, Erica sp., Cytisus sp., P. angustifolia, Thapsia villosa, Osyris alba, Juniperus oxycedrus, Lavandula pedunculata, Pistacia terebinthus, e R. sphaerocarpa, entre outras.

Quinta de Malvedos

A Quinta de Malvedos localiza-se em Pinhão e abrange cerca de 108 ha. Tem 70 ha de vinha, sendo os restantes constituídos por olivais e linhas de água. A quinta a SE contacta com o rio Douro e a SW com o rio Tua e encontra-se implantada em solos xistosos, sendo aqui produzidos vinhos de categoria “A”, classificação atribuída pela entidade reguladora dos vinhos do Douro. Esta propriedade não é abrangida por nenhuma área protegida da RN2000. Foram identificadas 83 espécies vegetais, 32 espécies de aves, 3 espécies de mamíferos e 2 espécies de répteis. Em relação às espécies com interesse para a conservação, destacam-se os 3 endemismos Europeus de flora (A. bellidifolium, Verbascum virgatum e Centaurea aristata subsp. langeana), a espécie do anexo V da Directiva Habitats, a gilbardeira (R. aculeatus) e o tartaranhão-caçador (C. pygargus), classificado como “Em perigo de Extinção” (EN) – no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal.

A grande maioria dos levantamentos ecológicos foi realizada junto ao rio Douro e Côa, tendo sido identificado um habitat figurativo da Directiva Habitats, os freixiais de F. angustifolia (91B0 – Freixiais termófilos de F. angustifolia). São freixiais mediterrânicos ocidentais, hidrófilos, próprios de solos profundos e com nível freático elevado que formam bosques fechados.

Quinta das Arcas

Quinta localizada no concelho de Valongo com cerca de 40 ha, não abrangida por qualquer área protegida da RN2000.

Os valores naturais aqui amostrados evidenciam a presença de 51 espécies (33 de flora, 17 de aves e um mamífero). Apenas a flora apresenta espécies com especial interesse para a conservação: 3 endemismos Europeus (T. scorodonia, Pterospartum tridentatum e C. striatus).

Trata-se da quinta amostrada que apresenta menor biodiversidade de espécies e de habitats naturais, sendo por isso, importante recuperar áreas adjacentes às áreas de produção agrícola através da recriação de habitats e sebes de compartimentação. Deverá promover-se a cobertura arbustiva das margens de modo a potenciar a existência de abrigos para a fauna. O adensamento com espécies arbustivas por forma a incentivar o estado sucessional da vegetação deverá ser uma das principais medidas de gestão.

Quinta de Azevedos

A Quinta de Azevedo tem 40 ha e localiza-se no concelho de Barcelos. Contigua à Quinta de Azevedo, encontra-se a Quinta da Covilhã, a qual também foi avaliada, tendo sido considerada como o segundo ponto de amostragem. Esta propriedade não é abrangida por qualquer área classificada da RN2000.

Os resultados obtidos evidenciam a presença de 57 espécies florísticas, 3 das quais endemismos Europeus (C. striatus, P. tridentatum e C. psilosepalus), 21 de aves, 3 de mamíferos e 1 réptil. É de destacar o noitibó-cinzento (Caprimulgus europaeus), classificado como Vulnerável (VU), que é uma ave crepuscular e nocturna insectívora. Faz-se notar principalmente pelo seu canto que parece o de uma cigarra. Estão presentes manchas de pinho (P. pinaster) com algum subcoberto de matos baixos. Nos limites da quinta, junto da parte murada, desenvolvem-se núcleos de carvalho-americano (Quercus rubra) sem sub-coberto e núcleos de carvalho-alvarinho (Q. robur), estes últimos em maior expressão fora da quinta, já no terreno vizinho (9230pt1 – Carvalhal de Q. robur). Muito interessante é ainda a presença de comunidades que se desenvolvem em solos hidromórficos, na margem de povoamentos de pinho, com urzais (Erica tetralix) e tojais (Ulex sp.) e várias gramíneas sob solos profundos e fofos, com algum nível de humidade. Estes habitats são considerados prioritários para a conservação, segundo a Directiva Habitats (4020* – Charnecas húmidas atlânticas temperadas de Erica ciliaris e E. tetralix).

A quinta possui as infraestruturas ecológicas necessárias à protecção da área agrícola, com taludes naturais que funcionam como descontinuidades da parte produtiva.

 

CONCLUSÕES

A partir dos levantamentos de campo efectuados, ao longo de 2011, em propriedades sob gestão agro-florestal, salienta-se:

    • A gestão agro-florestal deve ter em conta a protecção e gestão de áreas de conservação e de espécies com estatuto de protecção;

    • A Biodiversidade Natural assegura o desempenho das funções ecológicas (regulação de pragas e doenças, criação de nichos com microclimas específicos, fonte de alimento para a fauna, redução no uso de produtos químicos, aumento da fertilidade do solo); quando falta a regulação promovida por estes elementos naturais, as funções ecológicas não se processam e o ecossistema entra em desequilíbrio; na tentativa de repor o equilíbrio nos ecossistemas é necessária a intervenção humana, através da realização de acções de restauro ecológico de áreas degradadas;

    • Os PAC são, sem dúvida, uma excelente ferramenta para os proprietários agro-florestais, que têm assim identificadas, mapeadas e reconhecidas as áreas de conservação e espécies com estatuto de conservação, para concretizarem medidas de gestão para cada valor de conservação identificado;

    • Os PAC são a forma de diferenciar estas quintas no mercado de vinhos ou de fruta, através da sinergia entre a componente ecológica e o desenvolvimento sustentável; depois de realizado o diagnóstico junto do proprietário para identificação de problemas existentes, foram identificadas as áreas prioritárias de intervenção, nomeadamente a ausência de infra-estruturas ecológicas ou a invasão por espécies exóticas;

    • Os resultados apresentados são parte de resultados mais amplos obtidos, limitando-se à referência às espécies e habitats com alto valor de conservação.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Askew, R.R. (2004) - The dragonflies of Europe. Colchester, England, Harley Books.         [ Links ]

BirdLife International. (2004) - Birds in Europe. In: BirdLide International (em linha) (Acesso em 2008). Disponível em http://www.birdlife.org        [ Links ]

Braun-Blanquet, J. (1979) - Fitossociologia – Bases para el estudio de las comunidades vegetales. Madrid, H. Blume ediciones.         [ Links ]

Brown, R.W.; M.J. Lawrence e J. Pope. (1992) -. Animals - Tracks, trails and signs. London, Hamlyn.         [ Links ]

Bruun, B e H. Delin, L. S. (2002). Guia FAPAS - Aves de Portugal Continental. Porto, FAPAS.         [ Links ]

Cabral, M. J.; Almeida, J.; Almeida, P. R.; Delinger, T.; Ferrand de Almeida, N.; Oliveira, M. E.; Palmeirim, J. M.; Queiroz, A. I.; Rogado, L. e M. Santos-Reis (2006). Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. 2ª ed. Lisboa, Instituto da Conservação da Natureza/Assírio e Alvim.         [ Links ]

Castroviejo, S. et. al. (Eds.) (1986-1997) - Flora Iberica. Madrid, Real Jardín Botánico de Madrid, vol. 1, 2, 3, 4, 5, 8.         [ Links ]

Muñoz Garmendia, F. e Navarro, C. (eds.) (1998) - Flora Iberica. Madrid, Real Jardín Botánico de Madrid, vol. 6.         [ Links ]

Costa, J.C.; Aguiar, C.; Capelo, J.H.; Lousã, M. e Neto, C. (1998) - Biogeografia de Portugal Continental. Quercetea, 0: 5-56.         [ Links ]

Costa, L. M. (2003) - Zonas Importantes para as Aves em Portugal. Lisboa, Sociedade para o Estudo das Aves.         [ Links ]

Coutinho, A.X. (1939) - Flora de Portugal. Lisboa, Bertrand.         [ Links ]

Ferrand de Almeida, N. e P. Ferrand de Almeida, H. G. (2001) - Guia Fapas - Anfíbios e Répteis de Portugal. Porto, FAPAS.         [ Links ]

Flegg, J. et al. (1990) - Field Guide to theBirds of Britain and Europe. London, New Holland Publishers.         [ Links ]

Franco, J.A. (1971-1984) - Nova Flora de Portugal (Continente e Açores). Lisboa, Edição do autor, vol. I e II.         [ Links ]

Franco, J.A. e Rocha Afonso, M.L. (1994-1998-2003) - Nova Flora de Portugal (Continente e Açores). Edição dirigida e Processamento de texto de Maria Teresa Vasconcelos. Lisboa, Escolar Editora, vol. III, fasc. 1, 2, 3.         [ Links ]

García-Barros, E., Munguira, M.L., Martín Cano, J., Romo Benito, H., Garcia-Pereira, P. e Maravalhas, E. (2004) - Atlas de las mariposas diurnas de la Península Ibérica e Islas Baleares. Atlas of the butterflies of the Iberian Peninsula and Balearic Islands (Lepidoptera: Papilionoidea & Hesperioidea). Monografías S.E.A., 11. Zaragoza. 228 pp.         [ Links ]

Géhu, J.M. e Rivas-Martínez, S. (1981) - Notions fondamentales de Phytosociologie in Syntaxonomie. J. Cramer. Vaduz.         [ Links ]

MacDonald, D. e Barret, P. (1993) - Guia FAPAS - Mamíferos de Portugal e Europa. Porto, FAPAS.         [ Links ]

Maravalhas, E. (2003) - As Borboletas de Portugal. Porto,Vento Norte.         [ Links ]

Lengyel, S., Kobler, A., Kutnar, L., Framstad, E., Henry, P., Babij, V., Gruber, B., Schmeller, D. e Henle, K. (2008) - A review and a framework for the integration of biodiversity monitoring at the habitat level. Biodiversity Conservation, 17: 3341-3356.         [ Links ]

Loidi, J. (1994) - Phytosociology applied to nature conservation and land management. In: Song, Y.; Dierschke, H. e Wang, X. (Eds.) – Applied Vegetation Ecology. Proceedings 35th Symposium IAVS, p. 17-30.         [ Links ]

Mullarney, K.; Svensson, L.; Zetterstrom, D.e Grant, P.J. (1999) - Bird Guide. London, Harper Collins.         [ Links ]

Pereira, M. e Costa, J.C. (2004) - Sintaxonomia das classes fitossociológicas em Portugal Continental. Évora, Universidade de Évora.         [ Links ]

Pollard, E. e Yates, T.J. (1993) - Monitoring butterflies for ecology and conservation. London, Chapman and Hall.         [ Links ]

Potts, S.; Petanidoub, T.; Roberts, S.; Toolec, C.; Hulbertd, A. e Willmerd, P. (2006) - Plant-pollinator biodiversity and pollination services in a complex Mediterranean landscape. Biological Conservation, 129: 519-529        [ Links ]

Rivas-Martínez, S.; Fernandéz-González, F.; Loidi, J.; Lousã, M. e Penas, A. (2001) - Syntaxonomical checklist of Vascular Plant Communities of Spain and Portugal to association level. Itinera Geobotanica, 14: 5-341.         [ Links ]

Rivas-Martínez, S.; Diaz, T.E.; Fernandéz-González, F.; Izco, J.; Loidi, J.; Lousã, M. e Penas, A. (2002) - Syntaxonomical checklist (2001) of Vascular Plant Communities of Spain and Portugal to association level. Itinera Geobotanica, 15,1: 5-341; 15, 2: 5-922.         [ Links ]

Robineau, R. (2007) - Guide des papillons nocturnes de France. Les Guides du Naturaliste. Delachaux et Niestlé        [ Links ]

Tolman, T. e Lewington, R. (1997) Collins Field Guide - Butterflies Britain and Europe. London, Harper Collins Publishers.         [ Links ]

Van Swaay, C. e Warren, M. (1999) - Red Data Book of European Butterflies (Rhopalocera). Nature and Environment, Nº 99. Council of Europe Publishing.         [ Links ]

Zarco, C. Romero (1990). Claves para la identificacion de los generos de Gramineas de la Peninsula Iberica e Islas Baleares. Lagascalia, 15, 2: 223-261.         [ Links ]

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License