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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.35 no.2 Lisboa jul. 2012

 

Pesticidas e abelhas

Pesticides and honey bees

Pedro Amaro[1] e Joana Godinho[2]

 

[1] Professor catedrático jubilado do Instituto Superior de Agronomia

[2] INIAV, Posto Apícola, Tapada da Ajuda. E-mail: joana.godinho@iniav.pt

 

RESUMO

Após a análise dos critérios de classificação toxicológica (CT) dos pesticidas para as abelhas e da evolução da CT e da legislação específica deste tema, em Portugal, evidencia-se como a ausência de rigor da Autoridade Fitossanitária Nacional (AFN) e das empresas de pesticidas contribui para a muito elevada probabilidade de mortalidade das abelhas pelos pesticidas e conclui-se com propostas de optimização das perspectivas de modificação da actual situação.

Palavras-chave: Abelha, AFN, CT, empresa, mortalidade, pesticida.

 

ABSTRACT

After the analysis of the criterion of toxicological classification (TC) of pesticides to honeybees and of the evolution of TC and of legislation related to the theme, in Portugal, it is demonstrated how the absence of rigor of the Portuguese Pesticide Regulation Authority (AFN) and of the pesticides suppliers contribute to the very high probability of mortality of honeybees by pesticides and finally are presented proposals for the optimization of perspectives to modify the actual situation.

Keywords: AFN, CT, honeybee, mortality, pesticide, supplier.

 

INTRODUÇÃO

Nos últimos 15 anos, registou-se, em vários países, elevada mortalidade de abelhas, e, por vezes, o abandono das colónias pela maioria das abelhas, atribuído ao Sindroma do desaparecimento das colónias (Colony Collapse Disorder-CCD). A investigação foi intensificada, mas desconhece-se, ainda, a principal causa, referindo-se, entre outras: varroa, fungos, bactérias, deficiências de nutrição, variações climáticas, pesticidas e vários stresses (3,4,6).

São conhecidas as insuficiências dos actuais critérios de classificação toxicológica dos pesticidas para as abelhas, por vezes, com única referência à toxidade aguda e menos ao quociente de perigo. Infelizmente, a conclusão da revisão, pela European Food Safety Authority (EFSA), das Regras da Ecotoxicologia Terrestre, prevista para fins de 2011, só ocorrerá em 2012 ou até em 2013/14 (9). Poderão ficar, assim, adiadas as perspectivas de atribuir a devida importância à toxidade crónica, aos efeitos nas larvas das abelhas, no comportamento das abelhas e na sobrevivência e no desenvolvimento das colónias e até aos efeitos sub-letais dos pesticidas.

Vários trabalhos, desde 2009 (3–13), evidenciam, em Portugal, graves deficiências na classificação toxicológica dos pesticidas para as abelhas e nas frases de segurança adoptadas oficialmente e nos rótulos e nas fichas de dados de segurança, contribuindo para elevada probabilidade de mortalidade das abelhas pelos pesticidas.

 

OS CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO TOXICOLÓGICA DOS PESTICIDAS PARA AS ABELHAS

As características dos actuais métodos de classificação toxicológica dos pesticidas para as abelhas

A descoberta e a grande expansão dos pesticidas organossintéticos, desde os anos 40, teve rápidas consequências na elevada mortalidade de abelhas causada por insecticidas. A classificação toxicológica de 102 insecticidas esclarecida em ensaios biológicos de laboratório e de campo na Califórnia, entre 1950 e 1966, foi: Highly Toxic:41%; Moderately Toxic:21% e Relatively Nontoxic:38% (9,14).

Estes valores correspondem ao perigo relativo à toxidade aguda, expressa por LD50 oral ou de contacto ao fim de 24 horas, também adoptados, na década de 80, pela International Commission for Bee Botany (ICBB) (incluindo Extremamente Perigoso) e pela Environmental Protection Agency (EPA) (6,9).

Na UE, as exigências da Directiva 91/414/CEE, referidas no seu Anexo VI (os Princípios uniformes) (Decreto-Lei 341/98), abrangem, além da toxidade aguda, a exposição em condições de campo, isto é a avaliação do risco, a curto e longo prazo, a que as abelhas são expostas pelo uso do pesticida, e que é esclarecida na base:

    • do quociente de perigo, arazão entre a dose máxima de aplicação, em g/ha de s.a., e o LD50 oral ou por contacto, em µg de s.a./ abelha, respectivamente Qpo e Qpc;

    • dos efeitos nas larvas das abelhas, o comportamento das abelhas e a sobrevivência e o desenvolvimento das colónias após o uso dos pesticidas (6,9).

A avaliação do risco é efectuada, de forma sequencial, em: ensaios laboratoriais do efeito, nas obreiras, dos resíduos na cultura; ensaios em gaiola (semi-campo) e de campo do comportamento das abelhas e da sua sobrevivência e das colónias; e ensaios em túnel do impacto, nas abelhas, da alimentação com néctar ou flores poluídas (9).

No Processo de decisão, os Princípios uniformes determinam que, se existir a possibilidade de exposição de abelhas, a autorização não será concedida se os quocientes de perigo relativos à exposição oral ou por contacto de abelhas excederem 50, salvo se, através da avaliação de risco for demonstrado que o uso do pesticida, nas condições propostas, não tem impacto inaceitável nas larvas das abelhas, no comportamento das abelhas e no desenvolvimento das colónias. Para quocientes de perigo <50, o risco é aceitável e não se exigem os restantes ensaios, mas para Q> 50 é indispensável a sua realização (6,9).

Os insecticidas sistémicos (e os seus metabolitos, por vezes tão ou mais tóxicos do que a s.a.) translocados nos vasos (floema e xilema) e nas células das plantas (culturas e infestantes), deixam resíduos, em partes da planta não pulverizadas, com doses tóxicas para as pragas que se alimentam das plantas ou para as abelhas. Também há recente evidência destes resíduos em exsudações de fluidos xilémicos através dos hidátodos, em jovens plantas de milho e de outros cereais. Esta gutação disponibiliza fluidos açucarados em concentrações (>15%) atractivas para as abelhas, constituindo importante factor de risco (23). Em aplicações ao solo (ex: grânulos) ou com sementes tratadas com insecticidas sistémicos (ex: Gaúcho à base de imidaclopride), podem ocorrer resíduos nas flores, no pólen e néctar de plantas, com efeitos nas abelhas de doses sub-letais de pesticidas, no pólen e no néctar (6,9)

A eficácia dos actuais métodos

A OCDE realizou, em Março de 2009, um Inquérito com resposta de 17 países, não incluindo Portugal. O Relatório deste Inquérito foi divulgado em 12/5/10 (20).

Os critérios mais frequentes, nos 17 países, são a toxidade aguda por contacto (100%) e oral (94%). Os ensaios de campo são exigidos por 59%. Dados da toxidade de resíduos ocorrem:no pólen e néctar em 47% e nas folhas em 24% dos países.

Os actuais métodos são considerados úteis para avaliar os riscos dos pesticidas para as abelhas (adultos e larvas) por 47% dos países. Os efeitos sub-letais nos adultos e nas larvas não são avaliados com rigor pelas actuais exigências, segundo 73% de 15 países. Também 71% dos países refere que a redução dos riscos dos pesticidas se obtém por restrições nos rótulos, em vez de práticas voluntárias. Só em 56% dos países, os riscos da toxidade dos pesticidas para as abelhas são considerados nas acções de formação.

A eficácia das medidas para reduzir os impactos negativos dos pesticidas nas abelhas foi referida por 41% dos países, mas 53% têm dúvidas. Os bons resultados foram atribuídos: à aplicação dos pesticidas quando não há floração ou actividade das abelhas; e também à eficácia dos impactos das acções de formação, na Alemanha, Dinamarca, Eslováquia e Eslovénia.

A revisão dos métodos e a nova legislação em defesa das abelhas

Os métodos adoptados, em 2002 pela UE (9), em estreita colaboração com a Organização Europeia de Protecção das Plantas (OEPP), estão em revisão (12), pelo Bee Protection Group da International Commission for Plant-Bee Relationships (ICPBR). Os resultados da investigação, já realizada e analisada por três Grupos de trabalho, foram submetidos a debate e transmitidos à OEPP e à EFSA que procedem, desde 2009, á revisão dos Métodos de 2002, no âmbito do Terrestrial Ecotoxicology Guidance Document, que abrange também a problemática Pesticidas/Abelhas (9,11),

A sensibilização do Parlamento, da Comissão e do Conselho Europeus contribuiu para a inclusão de Medidas de defesa das abelhas da toxidade dos pesticidas no Regulamento (CE) 1107/2009 -Colocação no Mercado dos Produtos Fitofarmacêuticos, de 21/10/09, aplicável desde 14/6/11. A evolução do conhecimento,em revisão, irá contribuir para a melhor concretização do Regulamento 1107/2009, que determina (Anexo II, 3.8.3): a “aprovação de um pesticida só ocorrerá se, em resultado de uma avaliação adequada do risco com base nas orientações para a realização de testes, acordadas a nível comunitário ou internacional, se estabelecer que a utilização nas condições de utilização propostas para o pesticida (3,4,5,9,10):

    • representará uma exposição desprezível para as abelhas ou;

    não tem efeitos inaceitáveis agudos ou crónicos na sobrevivência e no desenvolvimento da colónia, tendo em conta os efeitos nas larvas das abelhas ou no comportamento das abelhas”.

 

A EVOLUÇÃO DA CLASSIFICAÇÃO TOXICOLÓGICA DOS PESTICIDAS PARA AS ABELHAS, EM PORTUGAL

Já em 1951, o Professor Baeta Neves alertava: Pode-se dizer que foi a Apicultura a primeira a levantar objecções ao emprego desses insecticidas (DDT e outros insecticidas orgânicos sintéticos). A recomendação de que não se deve aplicar DDT em culturas em floração, durante o voo das abelhas, deve ser sempre respeitada. À medida que vamos progredindo na escala das novidades da Fitofarmácia, vai aumentando o perigo para as abelhas (9,12). Também Vasco Paixão, em 1993 (42 anos após Baeta Neves), alertou para os riscos dos pesticidas para as abelhas (22).

Em Portugal, em 1967 (ano do início da Homologação dos produtos fitofarmacêuticos, pelo Decreto-Lei 47 802), estavam comercializados 66 insecticidas e acaricidas específicos, sendo 40 insecticidas simples, com 80% tóxicos para abelhas: Muito Perigosos (MP) 20% (carbaril, dinosebe, DNOC, endrina, fentião, mevinfos, paratião e tiometão);e Perigosos (P) 60%; havia, ainda, mais 8 Sem classificação (S) e 18 misturas e 8 acaricidas específicos, sendo 3 P e 23 S (18). Em 2011, só são ainda comercializadas 2 destas s.a. (5%): dimetoato (P) e óleo de Verão (S) (21).

A defesa das abelhas da toxidade dos pesticidas esteve sempre presente com ênfase nas Listas divulgadas pelo Laboratório de Fitofarmacologia e pela DGPPA, até 1984, ao referir em ALGUMAS CONSIDERAÇÕES DE NATUREZA TOXICOLÓGICA: Não efectue aplicações na época de floração. Procure fazer as aplicações de manhã cedo ou ao fim do dia (2,19).

Admite-se que os dados da AFN são inferiores à realidade, por se ignorar a classificação da EFSA, o que é evidenciado pelo total de s.a. perigosas para abelhas, referido em dados de 1/3/11, em que no total de 74 s.a., foram classificados com toxidade para abelhas: 44 (60%): 1 EP, 13 MP e 30 P (13).

A classificação toxicológica, entre 1970 e 2009, referida na Fig. 1 e Quadro 1 revela o claro predomínio de pesticidas P em relação a MP, em 1970 e 1980; só a ligeira diferença favorável a P, em 1990 e 2000; e a ultrapassagem, em 2009, de P por MP+EP (Extremamente Perigoso) (6).

 

 

 

 

Entre 1970 e 2008, foram retirados da comercialização 83 s.a. com toxidade para as abelhas, com 15-16 s.a. em cada uma das três primeiras décadas e 37 s.a., entre 2000 e 2008 (efeito Directiva 91/414/CEE). O número de s.a. com toxidade para as abelhas variou, entre 1970 e 1990, de 52 a 60 e em 2009 caiu a 33 s.a, (Fig 2) (4), mas, em 1/3/11, eram 44(11). Nas 83 s.a. predominava P (61%), com MP (33%) e N (6%) (6).

 

 

Nos anos 60, o critério de classificação toxicológica para abelhas, adoptado em Portugal, era a toxidade aguda e parece ter-se mantido pela CATPF até 2003, pois o único critério divulgado pela AFN ocorreu em 2/6/03, através de uma Circular (6,9):

    Muito Tóxico para abelhas: LD50 < 2µg s.a./abelha;

    Tóxico para abelhas: 2 µg < LD50 < 11 µg s.a./abelha.

 

A LEGISLAÇÃO NACIONAL DE DEFESA DAS ABELHAS DA TOXIDADE DOS PESTICIDAS

Pelo Despacho 4685/99 de 19/2/99, foi proibido o uso do imidaclopride em sementes de girassol (o que ainda se mantém em vigor, segundo a Circular da AFN - 3/DG/2010), em consequência da “Crise do Gaúcho” em França (elevada mortalidade de abelhas e redução da produção de mel atribuída ao neonicotinóide imidaclopride em sementes de girassol e de milho, desde 1994, com consequente proibição deste pesticida, desde Janeiro de 1999, que ainda se mantém actualmente, em França).

De acordo com a Directiva 2010/21/UE, de 12/3/10 e do Decreto-Lei 106/2010, a elevada mortalidade de abelhas registada, desde 2008, na Alemanha, Itália e Eslovénia, teve como principal causa a baixa qualidade do revestimento da semente tratada,provocando alibertação de pó com resíduos de neonicotinóides e do fipronil.Deste modo, é OBRIGATÓRIA a adopção de Medidas de redução do risco. É também essencial aprática de Programas de MONITORIZAÇÃO destinados a verificar a exposição real das abelhas à clotianidina, fipronil, imidaclopride e tiametoxame nas zonas utilizadas por abelhas obreiras ou pelos apicultores.

O Dec.-Lei 173/2005(art.13 2c) exige: a notificação prévia do uso de pesticidas perigosos para abelhas aos agricultores vizinhos da área de aplicação para permitir aos interessados a tomada das medidas necessárias para protecção dos seus enxames.

Perante estes 3 diplomas, alguém tem conhecimento de informação oficial ou privada sobre alguma consequência positiva? Infelizmente,parece não ter ocorrido a monitorização, por incapacidade legal da AFN e a inoperância de outras entidades.

AUSÊNCIA DE RIGOR DA AFN E DAS EMPRESA DE PESTICIDAS NO BINÁRIO PESTICIDAS/ABELHAS

Entre os rigorosos conhecimentos da maior importância para atenuar a nocividade dos pesticidas para as abelhas em agricultura em Portugal, destacam-se: a classificação toxicológica dos pesticidas para as abelhas, que condiciona a correcta selecção dos pesticidas; e as medidas de segurança (ex: SPe8). É muito preocupante verificar, na série de trabalhos sobre pesticidas e abelhas, realizados desde 2009 (3-13), numerosos e, por vezes, incríveis exemplos de ausência de rigor em relação a (6,11,12,13):

    diversidade de classificação toxicológica e de frases de segurança dos pesticidasentre: os 3 Guias da AFN; a EFSA e a AFN; e as empresas de pesticidas e a AFN;

    ausência,nos rótulos e nas fichas de dados de segurança (FDS) dos pesticidas (da responsabilidade das empresas de pesticidas, com acordo ou indiferença da AFN), de rigorosa informação sobre classificação toxicológica e frases de segurança (FS)(em especial nas rubricas: 2/3 - Identificação dos perigos e 12 - Ecotoxidade).

Alguns EXEMPLOS, entre os muito numerosos, em trabalhos publicados (3-13).

I - A diversidade da classificação toxicológica em 3 Guias da AFN, entre 2005 e 2010, é muito frequente nos conjuntos de 21 s.a. EP e MP e 23 s.a. P, N e S (3.4,6,10,11). É sistemática, em 2008, 2009 e 2010, a diferença entre o Guia “Amarelo” (Sem informação (S), ignorando R57-Tóxico para as abelhas), e o Guia da Internet com EP, MP, P e N. É ainda mais caótica a informação do Guia GCTE de 2005, com diversa classificação em vários produtos formulados da mesma s.a. [ex.IMIDACLOPRIDE (MP pela EFSA (16))com2 P e 2 S !!, a par de EP no Guia da Internet e CIPERMETRINA com 2 MP e 2 P, a par desempre MP no Guia “Amarelo” em 2005-2007 e no Guia Internet em 2009 e 2010]. Tudo agravado pela ausência de classificação toxicológica de pesticidas para abelhas, como também acontece com os ausentes CMR (Canccerígeno, Mutagénico, Tóxico para a Reprodução) nas Regras de protecção integrada de pomóideas, de 2011(15) (certamente sem interesse em protecção integrada!).

II – A diversidade de classificação toxicológica entre AFN e EFSAé bem evidenciada pela BIFENTRINA, classificada pela EFSA de “Highly Toxic” = Muito Perigosa (MP) para abelhas (17). Na UK, no Guia do BCPC, a bifentrina foi MP, entre 1990 e 1995, e Extremamente Perigosa (EP), desde 1997. Em PORTUGAL, a AFN, desde 1991, classifica a bifentrina de N = Não Perigosa(1,13)!!! Parece que esta opção da AFN resulta da avaliação do risco para as abelhas evidenciar ser nulo o risco, por a bifentrina ser autorizada para culturas ornamentais (ignoradas pelas abelhas!). Esta “verdade” muito discutível esquece que os Guias “Amarelos” da AFN esclarecem que, além de 5 produtos fitofarmacêuticos (p.f.) da SCOTTS com bifentrina, autorizados, entre 2006 e 2011, para ornamentais,foram autorizados, desde 1991 até 2011 (durante 20 anos!), 4 p.f. de bifentrina: TALSTAR/ICI-Valagro em 6 culturas (1991-1993); TALSTAR/Zeneca em 6 culturas (1994-2002); TALSTAR/FMC em 12 culturas (2002-2011; e TALSTRINA/Selectis em 8 culturas (2009-2011) (Quadro 2). Pobres abelhas!

 

 

III – A diversidade de classificação toxicológica entre AFN e Empresas de pesticidasé impressionante e são muito frequentes os exemplos (13):

    • a AFN atribue EP, no Guia Internet, a 16 p.f. de IMIDACLOPRIDE eas empresas optam por P em 11 rótulos e em 3 FDS e por S em 6 FDS;

    • a AFN classifica, no Guia Internet, de MP 42 p.f. de 11 s.a. e as empresas optam em 22 rótulos (aprovados pela AFN) por 3 MP, 13 P e 6 S e em 29 FDS, por 6 MP, 8 LD50 correspondentes a MP, 9 P e 6 S.

    • Para aumentar a confusão, também ocorre o contrário: perante ausência de informação (S) no Guia Internet da AFN, 8 empresas classificam, nos rótulos, 8 s.a.: com MP, a alfa-cipermetrina; e com P 7 s.a. (beta-ciflutrina, clotianidina, deltametrina, fosmete+teflubenzurão, indoxacarbe, spinosade e spirodiclofena). Mas nas 10 FDS acessíveis na Internet, só em 2 s.a. surge P e num p.f. de spinosade indica-se o LD50=0,05µg=MP.

IV – A ausência ou escassez de frases de segurança (FS)nos rótulos e FDS, por decisão das empresas e indiferença da AFN, é excessivamente frequente (13):

    • a ausência de FS ocorreu em: 21% de 56 rótulos; 66%de 65 FDS; 88% das rubricas 12; e 100% das rubricas 2 de 65 FDS;

    • a importante FS SPe8 (há mais de 7 anos no Decreto-Lei 22/2004 e jamais referida nos 3 Guias da AFN!!!) nunca ocorreu nos rótulos e nas rubricas 2 e 12 das FDS e só foi referida na rubrica 15 de 11% das FDS;

    • o importante objectivo de evitar o uso de pesticidas nas culturas com infestantes em floraçãoé visado em 3 FS, incluindo SPe8, que só ocorreramem 0-4% dos 56 rótulos e 0-11% das 65 FDS.

 

A CLASSIFICAÇÃO TOXICOLÓGICA E ECOTOXICOLÓGICA DE 29 PESTICIDAS CITADOS NO TEXTO DESTE PAINEL

Neste texto são citados 29 pesticidas, dos quais 13 (45%) já retirados do mercado, entre 1973 (DDT) e 2011 (bifentrina), incluindo 4 CMR, 4 T+, 8 T, 5 Xn e 1 Xi e, ainda, 11 N e 11 R50/53. Quanto à toxidade para as abelhas 8 são MP e 5 P (Quadro 3).

 

 

Os 16 pesticidas incluidos no Anexo I da Directiva 91/414/CEE, e, portanto, com venda autorizada, abrangem: 3 CMR com 2 R40 (spirodiclofena e teflubenzurão) e 1 R63, o penconazol; 1 T+ e 5 T; 8 Xn, 4 Xi e 2 R48. A toxidade para o ambiente (N) e para os organismos aquáticos, do mais elevado nível (R50/53), ocorre em 13 s.a. (81%). A toxidade para abelhas evidencia:1 EP (imidaclopride), 3MP (alfa-cipermetrina, cipermetrina e fenamifos) e 10 P,além de 2 Sem classificação, mas exigindo medidas de segurança ( Quadro 3).

COMO AJUDAR, NO FUTURO, A DEFESA DAS ABELHAS DA TOXIDADE DOS PESTICIDAS

As favoráveis perspectivas, na UE, de concretização de inovações na revisão dos critérios de classificação toxicológica dos pesticidas para as abelhas, a concluir pela EFSA talvez ainda em 2011, viabilizando os objectivos de mais adequada avaliação do risco dos pesticidas, previstos no Regulamento (CE) 1107/2009, reforçadas pela frequente intervenção do Parlamento Europeu no apoio ao sector da apicultura e ao melhor esclarecimento das causas do Sindroma do desaparecimento das abelhas, poderão optimizar as iniciativas a adoptar, em Portugal, para reduzir a mortalidade das abelhas pelos pesticidas. Essas iniciativas deveriam abranger:

    • Conhecimento rigoroso da realidade, através da intensificação do diagnóstico do cumprimento da regulamentação pelas entidades oficiais (em especial a AFN), pelos agricultores e apicultores e suas organizações e pelas empresas de pesticidas;

    • Análise da situação actual da investigação e da formação e das perspectivas da sua melhoria, em temas relativos ao binário abelhas/pesticidas;

    • Inventário das instituições e dos docentes, investigadores e técnicos com capacidade para participar em projectos visando concretizar a defesa das abelhas da toxidade dos pesticidas e a obtenção de meios para a elaboração e execução de projectos.

Os alarmantes exemplos de falta de rigor da AFN e das empresas de pesticidas, referidos atrás em I a IV,e a caótica diversidade e lamentável nível de degradação da informação, realçadosnas Conclusõesda “Análise de 66 rótulos e 80 fichas de dados de segurança”, publicada em 2011(13) evidenciamser muito elevada a probabilidade de mortalidade das abelhas pelos pesticidas.

Perante esta realidade, aparentemente nada mudou desde 2009 na INDIFERENÇA de entidades oficiais dos Ministérios responsáveis por Agricultura (em especial AFN e Serviço de Avisos) e Ambiente (e Saúde) (e a CATPF?) e dos responsáveis pelos Programas Apícolas Nacionais e também entidades privadas como a FNAP, Associações de agricultores e empresas de pesticidas (3,4,11,12). Também tem sido difícil ultrapassar o facto de jamais, em Portugal, ter sido realizada actividade experimental sobre a toxidade de pesticidas nas abelhas, o que contribuirá para a ausência de projectos.

Perante tão sistemática e até surpreendente indiferença pela problemática abelhas/pesticidas, causa de profundas controvérsias em vários países e mesmo no Parlamento Europeu, julga-se que o fomento do DEBATE poderá ajudar a analisar as características da nossa realidade e a natureza das iniciativas, nos domínios da formação, da investigação ou de outras actividades, a abordar em projectos a financiar por entidades nacionais ou internacionais. Será certamente útil e desejável o regular e mais amplo funcionamento do Grupo de Trabalho Abelhas e Pesticidas (GTAP), iniciado em 2011, por iniciativa de docentes e investigadores do ISA, ESAS e INRB, com objectivos nas áreas referidas.

Seria também muito importante a decisão de eliminação da ilegalidade do não funcionamento, desde 19/7/05, já há 6 ANOS, da Comissão de Avaliação Toxicológica dos Produtos Fitofarmacêuticos (CATPF) e o regresso, também para defesa das abelhas,das duas representantes do AMBIENTE, para ajudar a eliminar o actual caos da informação sobre CT e FS dos pesticidas relativos às abelhas.

 

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