SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.21 número3-4Hydrogen, the ultimate clean fuelOs Escoriais de Moncorvo índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Ciência & Tecnologia dos Materiais

versão impressa ISSN 0870-8312

C.Tecn. Mat. v.21 n.3-4 Lisboa jul. 2009

 

Os Materiais & os Instrumentos Musicais

I – O Violino– A sublimação da madeira

 

Armando A. de Sousa e Britoa, Andrea Suzana de Sousa e Britob

 

aSociedade Portuguesa dos Materiais

Instituto de Ciência e Engenharia de Materiais e Superfícies – IST

aasousabrito@gmail.com

bPsicóloga, estudante de Mestrado –  ISPA

andreasb@net.sapo.pt

 

É com o violino (e em outros instrumentos da sua “família”), que a madeira atinge a apoteose da sua utilização. Diferentes espécies de madeiras são necessárias para executar as cerca de oitenta peças que compõem o instrumento. Mas dentro de cada espécie, só as de origens muito específicas são adequadas para lhe conferir a qualidade acústica que o instrumento exige. Outros diferentes materiais também são utilizados: marfim, aço e crina de cavalo. Falar-se-á disso tudo, mas é para os autores impossível fazê-lo sem falar também na sublime arte que esses materiais tornam possível e nos virtuosos que a concretizam, fabricando ou utilizando esses instrumentos.

 

“Fazer violinos é um acto de amor”

António Capela

 

1 - INTRODUÇÃO

 A madeira é sem dúvida o mais versátil de todos os materiais, e por isso ao longo de milénios o homem vem-lhe dando as mais diversas aplicações, em grande parte das quais poderá haver materiais alternativos. Mas de todas essas inumeráveis aplicações é no violino que a madeira se torna insubstituível e atinge a apoteose!

O violino é um instrumento musical pertencente à classe de cordofones friccionados, à qual também pertencem outros três membros da mesma “família” – a viola de arco, o violoncelo e o contrabaixo1. O violino produz o som mais agudo de todos, correspondente a soprano, tornando sucessivamente mais grave nos restantes. É um instrumento de extrema sensibilidade no qual se pode reproduzir os mais delicados cambiantes de sonoridade e intensidade. As suas  quatro cordas, afinadas por quintas, correspondem às notas Mi-Lá-Ré-Sol.

A sua utilização mais comum é na música erudita, sendo o mais importante instrumento da orquestra sinfónica, onde figura em grande número. Aliás a orquestra sinfónica resultou da evolução dos quartetos de cordas. É também utilizado na música folclórica, no jazz, etc.

O fascínio e o poder emocional que o violino exerce devem-se tanto à sua incomparável sonoridade como à beleza das suas formas e mesmo à elegância que requer ao ser tocado. Da conjugação desses factores emana uma certa magia que envolve e emociona os seus ouvintes. Mais que magia, há mesmo uma sensação de esoterismo, bem patentes em algumas obras, como os geniais “24 Caprichos” de PAGANINI. E se ainda o executante for uma mulher, a tudo isso se junta uma perturbante sensualidade. Só escutando ao vivo um concerto deste instrumento se pode ter a total percepção desses factos. (Convida-se então o leitor, se tiver oportunidade, a escutar um dos Caprichos, por exemplo o extremamente belo Capricho nº 24, enquanto prossegue a leitura deste artigo…).

Nicolo PAGANINI (1782-1840) (fig.1-a), além de notável compositor foi um exímio executante, O seu nome surge como o grande, senão o maior, e mais sensacional representante do virtuosismo do violino de todos os tempos, quer pela sua inexcedível mestria, quer sobretudo pela aura de magia e mistério a que, no seu tempo, foi associado. As gravuras, algo caricaturadas, representando Paganini a tocar (fig.1-b), traduzem bem esse facto. E a isso está sem dúvida ligado o esoterismo e a magia que emanavam do instrumento que tocava, aliado à extraordinária aparência do virtuoso (talvez algo exibicionista), e aos escandalosos rumores que corriam sobre as suas aventuras, amorosas e outras. Os seus contemporâneos suspeitavam de que tivesse um misterioso pacto com o diabo, que lhe conferia a genialidade aparentemente inumana, e diziam que fumos sulfurosos emanavam da sua cabeça quando executava os difíceis e inauditos efeitos (pizzicatos, harmónicos, acordes, cordas duplas, golpes de arco, etc.), sempre presentes nas suas composições.

 

Fig.1 – Retrato de Paganini e uma das inúmeras imagens caricaturadas que pretendiam simbolizar os rumores que sobre ele corriam

 

Antes de Paganini, já Giuseppe TARTINI (1692- 1770), outro compositor e violinista italiano, tinha sido alvo de idêntica suspeita. Compusera o famoso “Il Trillo del Diavolo” que dada a extrema dificuldade de execução, dizia-se ter sido inspirado em sonhos pelo próprio diabo …

 

2 - HISTÓRIA DO VIOLINO – OS GRANDES “LUTHIERS”

Embora os antecedentes do violino se situam nas antigas culturas do Médio-Oriente, Egipto e Grécia, os seus antecessores imediatos terão sido instrumentos medievais de corda friccionada como a rebeca, a lira de braccio, e a viela renascentista. Todos eles apresentam afinidades com o violino tanto na sua forma, como no modo como o executante o segura ao tocá-lo.

Mas não se sabe bem quando nasceu este instrumento, havendo sobre isso uma grande obscuridade. O violino foi inicialmente um instrumento popular, sem posição social nem prestígio, tocado por profissionais para ganhar a vida acompanhando cantigas ou danças. Todos o conheciam realmente, mas por isso mesmo ninguém achou necessário fazer qualquer registo documental, nem tentar o desenvolvimento técnico, por os considerar irrelevantes. Os eruditos davam mais atenção ao alaúde e à viola de gamba.

Porém os primórdios da sua história estão ligados inseparavelmente às obras do artista italiano Gaudênzio FERRARI (1480-1546). Efectivamente nas pinturas e esculturas deste artista surgem representações do violino que são consideradas as primeiras alusões ao novo instrumento, e consequentemente prova irrefutável da sua existência à data da produção das obras. Na igreja de S. Cristóvão, em Verselli encontra-se “La Madonna degli Aranci”, pintada cerca de 1529, em óleo sobre madeira, nela figurando um anjo tocando um instrumento muito semelhante ao actual violino. Outras obras do artista, entre as quais um fresco na catedral de Soronno, datado de 1535, e várias esculturas de datas ligeiramente posteriores, também documentam irrefutavelmente a existência do violino por essa altura. Por sinal, além de pintor e escultor, Ferrari foi também construtor de instrumentos musicais e notável executante, o que decerto não deixa dúvidas quanto ao rigor das suas representações.

A partir da conjugação das características dos instrumentos atrás citados, o violino foi sofrendo uma lenta evolução. Nos finais do séc. XVI, Gasparo de Saló (1540-1609), de Bréscia, é tido como o primeiro fabricante a obter êxito. Foi porém em Cremona2 que Nicolo AMATI (1596-1684) e seus familiares, melhorando o modelo de Saló, estabeleceram a forma clássica do violino.  Entretanto verificou-se que a musica barroca coadunava com as capacidades do violino, dando ao instrumento oportunidade da escalada que o conduziu para a fama.

Nos séc. XVII e XVIII  a construção do violino atingia o seu ápice. As duas escolas de construtores desenvolvidas, em Bréscia e em Cremona adquiriram grande nomeada, passando os seus instrumentos a serem muito procurados e altamente cotados. O saber de uma e de outra foi legado a outros construtores, especialmente os GUARNIERI (Andrea e seu neto Giuseppe), Paolo GRANCINNO, Giovampaolo MAGGINI, Jacob STAINER, etc.

Mas o expoente máximo dessa sucessão de grandes luthiers3 foi incontestavelmente o mestre Antonio Giacomo STRADIVARI (1644-1737) que iniciando-se como discípulo dos Amati, cedo estabeleceu-se por conta própria, atingindo o auge da sua arte entre 1700 e 1725, tendo construído instrumentos de corda – violinos, violetas e violoncelos – de qualidade sonora insuperável associada a grande beleza estética. Os mais afamados são os seus violinos, na construção dos quais o artista dedicou particular esmero.

Stradivari teve uma vida longa o que lhe permitiu experimentar e aperfeiçoar continuamente a sua técnica. Com os seus filhos construiu mais de mil instrumentos, dos quais ainda existem cerca de 600, sendo 450 violinos e 40 violoncelos,  naturalmente hoje avaliados em quantias astronómicas, batendo recordes de vendas em leilões4. A maior parte figura em museus, em instituições ou nas mãos de grandes virtuosos, tornando-se motivo de desejo ou de inveja de todos os aspirantes ao mesmo estatuto. O violinista inglês Nigel KENNEDI afirma com certa ironia – “sem um Stradivarius ninguém consegue iniciar uma carreira internacional de concertista, mas se não tiver essa carreira não consegue adquirir um Stradivarius”!

Os instrumentos existentes são conhecidos pela data de execução e/ou o nome que lhe foi atribuído. O mais famoso dos Stradivarius é o “Messias” hoje na posse do Museu Ashmolean de Oxford.

Os Stradivarius, tornando-se símbolos de perfeição e requinte, são frequentemente associados à beleza feminina. Recorde-se a célebre obra do fotógrafo norte-americano Man Rey, em que sobre as costas desnudas de uma mulher de uma pintura de Ingres o artista acrescentou o desenho das aberturas do tampo de um violino (os “ff), intitulando-a “Violon d’Ingres”. Também o cineasta francês Claude Chabrol , apreciando, em 1987, a beleza e a interpretação da protagonista de um dos seus filmes (Matilda May), exclamou elogiosamente “Ela é um Stradivarius”.

Há inúmeras histórias à volta desses monumentos da arte. Enumeram-se duas, uma feliz e outra bastante trágica: O violinista russo Philip Quint ofereceu um concerto exclusivo a motoristas de táxis do aeroporto de Nova York, por um deles ter-lhe devolvido um Stradivarius de 1723, que havia sido esquecido no táxi. Em 27 de Outubro de 1949 um avião da Air France despenhou-se perto dos Açores. Nele seguia, acompanhada do irmão, a jovem mas promissora violinista francesa Ginette Neveau.5 Quando o corpo da infeliz foi encontrado, abraçava o seu Stradivarius, naturalmente danificado.

Como é de prever, não faltam inumeráveis fraudes, concretizadas por tentativas de imitação, troca ou reprodução das etiquetas, etc. Há centenas de falsos Stradivarius espalhados pelo mundo, alguns difíceis de serem identificados6.

Muitos cientistas e peritos em instrumentos musicais têm sido levados a tentar descobrir o segredo da insuperável qualidade sonora dos Stradivarius – a origem e qualidade das madeiras, o seu tratamento, a composição do verniz, etc. Tem-se realizados ensaios químicos, testes dendrológicos, tomografias, ressonâncias magnéticas, espectroscopias por infravermelhos, etc. O que mais dificulta os estudos tem sido a natural relutância dos proprietários desses valiosos exemplares em permitir ensaios sobre eles, que por isso, só puderam ser realizados sobre pequenas lascas de madeira colhidas durante a manutenção e reparação dos instrumentos.

Surgiram as mais diversas hipóteses, nenhuma inteiramente confirmada: i) a época do plantio e desenvolvimento das árvores respectivas terá correspondido a uma mini-era glaciar, período de redução da actividade solar e menor amplitude de variações de temperatura do que resultaria um crescimento mais lento das árvores e consequentemente uma madeira mais dura e homogénea; ii) a qualidade do verniz com a presença de sal e de cobre, como agentes de oxidação; iii) presença de cinzas vulcânicas no verniz; iv) foi até sugerido que a madeira utilizada, teria sido recuperada de velhos navios, impregnada de sal que lhe dava a dureza ideal. Talvez o segredo nunca venha a ser revelado.

Entretanto além dos citados, também outros luthiers tem-se destacado. Fora da Itália notabilizaram-se centros de construção em França, Áustria, Inglaterra etc. No nosso país notabilizaram-se no séc. XVIII e XIX os construtores Joaquim José Galrão, em Lisboa e A. Sanhudo, no Porto.

 

3 - ACTUAL “LUTHERIE” EM PORTUGAL

O ofício de “luthier” é muito específico, só exercido, e mesmo conhecido, por bem poucos. O seu trabalho é artesanal, requerendo, além de muito saber, extrema delicadeza e paciência, num processo longo, desde a escolha e preparação das madeiras adequadas, até à execução, uma a uma, e com ferramentas muito específicas, das cerca de oitenta peças que compõem o instrumento, sua posterior montagem e acabamento final. Demora-se assim semanas ou meses a construir um único violino ou um arco. Mas são nos seus ateliers que os grandes músicos procuram os instrumentos.

Há em contrapartida fábricas que graças a pantógrafos e robôs produzem industrialmente centenas de instrumentos por mês, como por exemplo a japonesa “Suzuki”. Naturalmente não se comparam a qualidade e consequentemente os preços dos instrumentos produzidos de um e de outro modo.

Em Portugal destaca-se há três gerações a família CAPELA, em Anta, Espinho, cujos instrumentos tem atingido grande projecção nacional e internacional. O primeiro membro desta notável dinastia de artistas foi Domingos Ferreira CAPELA (1904-1976). Saído da escola primária, começou a contactar com o trabalho de madeira como tanoeiro, na oficina de seu pai, e depois marceneiro em Gaia, mostrando grande sensibilidade e sentido artístico. Tendo fundado em 1924 um grupo musical, abalançou-se a construir o seu próprio violino. Afortunadamente teve entretanto contacto com Nicolino Milano, um violinista italiano que actuava em Espinho e que lhe encomendou uma reparação do seu instrumento. Milano ficou encantado com o trabalho do jovem e a partir daí deu-se início a uma carreira fulgurante de “luthier”, tendo trabalhado para a Sinfónica do Porto e tomando contacto com grandes músicos, nacionais e estrangeiros como Guilhermina Suggia e muitos outros. O auge da sua carreira é alcançado em 1972, num concurso de lutiers realizado em Poznan, Polónia, ao conquistarem, ele e o seu filho António, cada um com dois violinos, o 1º, o 2º, o 3º, e o 4º prémios e 2 medalhas de ouro!

Seguindo a esteira de seu pai, António CAPELA (nascido em 1932) (fig. 2-a) obteve em 1961 e 1964 bolsas da Gulbenkian estagiando em Paris na afamada casa Etienne Vatelot e na Escola de Construção de Cremona, Itália. Já construiu inúmeros violinos, que se encontram espalhados pelo mundo. Além dos prémios atrás citados, recebidos com seu pai, tem obtido muitos outros. Foi convidado como membro dos júris de concursos internacionais de construtores de violinos, em Liége (Bélgica), Cremona (Itália), Poznan (Polónia) Sofia (Bulgária), Kralové (Rep. Checa), Miterwald (Alemanha), Sevilha (Espanha), Paris (França), e Moscovo (Rússia), este por duas vezes, a última em 2007. É membro da Associação Internacional de Construtores de Violinos e Arcos. e fundador e vice-presidente da Associação Europeia de Construtores de Violinos e Arcos.

 

Fig 2 a) António Capela e b) Thibaut Dumas

 

A terceira geração da dinastia é representada por Joaquim António Capela, filho do anterior. Nascido em 1966, prossegue a carreira do pai e do avô, frequentando cursos no estrangeiro e participando em concursos internacionais conquistando também lugares cimeiros, muitas vezes o primeiro.

O atelier destes artistas tem sido visitado por diversos músicos internacionais, entre os quais o grande violoncelista e maestro russo Mstislav ROSTROPOVITCH, falecido em 2007.

O primeiro autor deste artigo teve recentemente o privilégio de ser recebido no seu atelier por António Capela, que com extrema simpatia e gentileza lhe prestou inúmeras informações e esclarecimentos sobre a sua arte, permitindo captar fotografias, algumas das quais são aqui apresentadas.

Outra referência importante no nosso meio musical, é o jovem “luthier” francês Thibaut Dumas, de cerca de 30 anos (fig 2 b), radicado em Lisboa, tendo sido discípulo de outro grande mestre, Chistian Bayon também fixado em Portugal. Dumas vem assegurando a manutenção dos instrumentos do Conservatório de Música de Lisboa e de muitos componentes das orquestras nacionais. Os autores deste artigo já tiveram a oportunidade de visitar o seu atelier 7, onde também foram recebidos com grande gentileza.

 

4 - CONSTITUIÇÃO DO VIOLINO

A constituição do violino (fig. 3) compreende cerca de 80 componentes, (84 segundo informação de António Capela), sendo a quase totalidade de madeira, de diversas espécies e provenientes de origens muito específicas, meticulosamente seleccionada segundo padrões quase universais:

 

Fig. 3 Constituição básica do violino

 

O órgão principal é a caixa de ressonância, cuja parte superior constitui o tampo (1) e a inferior as costas ou o fundo (2); essas duas peças são unidas perifericamente pelas ilhargas (3). A dimensão longitudinal da caixa está estandardizada em 35,5 cm. Tem dois enfranques a meio – os cc (cês) (4) – que tornam possível o arco friccionar isoladamente as cordas extremas. No tampo existem duas aberturas de forma característica – os ff (éfes), ouvidos ou aberturas acústicas (5) – que transmitem para o exterior a vibração do ar do interior da caixa de ressonância.

Em determinados pontos do interior das ilhargas, reforçando-as, nomeadamente onde se fixa o braço, são colados seis peças de madeira, os blocos (6). Igualmente como reforço, são coladas em todo o perímetro das ilhargas, em cima e em baixo tiras, também de madeira, designadas contra-ilhargas.

Dentro da caixa de ressonância estão localizadas duas peças adicionais que desempenham fundamental papel acústico:

- a alma, pequena peça cilíndrica colocada sob pressão (não colada), ligando perpendicularmente o tampo ao fundo e transmitindo entre ambos as vibrações que, atingindo todo o instrumento, melhora e potencia a qualidade sonora. O próprio nome da peça já mostra a sua importância. O posicionamento desta peça no interior da caixa requer extrema precisão, virtualmente sem margem a erro: o construtor procura por tentativas o ponto ideal, servindo-se de uma pequena ferramenta que introduz no interior da caixa através de um dos ff.

- a barra harmónica (7), tira de madeira colada longitudinalmente ao interior do tampo, ocupando cerca de dois terços do seu comprimento,  mas ligeiramente descentrada, ficando sob o pé esquerdo do cavalete (ver adiante);  tem também funções acústicas importantes, de aumento da qualidade sonora dos sons mais graves, e simultaneamente de reforço mecânico do tampo, impedindo-o de flectir.

À caixa de ressonância está ligado o braço (10), feito de uma só peça, ao longo do qual se estendem as quatro cordas (9). A  parte final deste órgão, onde se fixam as cordas chama-se cravelhame que termina com uma forma geralmente em espiral, a voluta, (15) que é uma peça escultórica, cuja forma artística varia consoante o construtor, podendo considera-se como a sua marca pessoal. As quatro cordas são retesadas e afinadas pelas cravelhas, naturalmente também em número de quatro (14), montadas em orifícios abertos lateralmente no cravelhame.

Cobrindo o braço existe uma peça que se projecta sob as cordas, chamada ponto ou escala (8). As cordas estão presas numa peça aproximadamente triangular, fixa ao tampo, chamada estandarte (11), e apoiando-se num cavalete , estendem-se ao longo do braço até ao extremo, no qual assentam de novo numa peça designada pestana, sendo finalmente presas  pelas referidas cravelhas. Estas tem a haste ligeiramente tronco-cónica permitindo o aperto nos respectivos furos.

O cavalete (12) fica assente em posição vertical sobre dois pés no tampo superior, entre os dois ff. Tem uma função importante transmitindo a vibração das 4 cordas nele apoiadas, ao corpo do violino através do tampo. Na parte superior o cavalete apresenta uma suave curvatura, o bastante para que as cordas, que passam por pequenos sulcos nela abertos, não fiquem no mesmo plano, permitindo que sejam friccionadas isoladamente Fig. 4. Do mesmo modo que a alma, esta peça não é colada, sendo segura pela tensão das cordas e o seu posicionamento exige uma grande precisão.

 

Fig. 4 – Duas vistas parciais do violino. À esquerda mostra-se o tampo com uma das aberturas ff, o estandarte, o cavalete e as cordas. À direita, a parte terminal do braço mostrando a voluta, o cravelhame e as respectivas cravelhas

 

O estandarte, já atrás referido (11), é fixado a uma pequena peça, o botão, por meio da presilha e movida por um parafuso. A pestana é uma pequena barra colocada transversalmente na extremidade da escala, levemente elevada em relação ao plano deste, e com pequenos sulcos onde se apoiam as cordas, antes de serem fixadas às cravelhas. Há ainda um pequenos acessórios fixos, metálicos, presos ao estandate que permitem uma afinação de precisão das cordas.

Por último refira-se a um acessório ergonómico designado mentonnière, fixado ao tampo no sítio em que o executante encosta o queixo, de modo a segurar o instrumento entre este e o ombro.

 

5 -CARACTERÍSTICAS DO ARCO

As cordas do violino são postas em vibração por meio de um arco (fig.5), peça que constitui também uma estrutura extremamente delicada, cuja construção e mesmo a manutenção requerem cuidados muito específicos.

 

Fig. 5 – Arco, vendo-se a curvatura convexa da vara, o talão com o sistema de tensionamento e a ponta.

 

É constituído por uma vara de madeira, cujo comprimento varia entre 74 a 75 centímetros, ligeiramente encurvada. Nela estão fixados cerca de 150 cerdas (crinas de cavalo), que friccionando as cordas adequadamente, produzem o efeito sonoro pretendido. A extremidade por onde o executante segura o arco designa-se por talão e a outra, ponta.

A evolução do arco processou-se muito depois da do próprio violino. Inicialmente a sua forma era côncava em relação às cerdas, e o talão era fixo. Mas por volta de 1780 o arco sofreu uma alteração profunda graças ao construtor francês Francois Xavier TOUTE (1747-1835), de colaboração com o virtuoso Giovanni Battista VIOTTI (1755-1824), facto que mudou a história desse instrumento. O inglês John DODD (1753-1835), também é tido com tendo dado alguma contribuição para a evolução do arco.

A principal alteração foi passar a ter curvatura convexa. Alterou-se também a forma da ponta, o talão deixou de ser fixo, podendo ser posicionado por um sistema mecânico constituído por um parafuso sem fim. Outra alteração importante foi a do  tipo de madeira utilizada (a que adiante se fará referência).

O francês Jean-Baptiste Vuillaume (1798- 1875), grande construtor de violinos e também de arcos, deu nova contribuição estabelecendo a espessura da vara, o seu peso e curvatura. Talvez por isso, parecem ser os franceses que detêm actualmente a vanguarda da técnica da sua construção.

 

6 - MATERIAIS E SEQUÊNCIA DE CONSTRUÇÃO

A fabricação do violino é, como se conclui do anteriormente dito, uma arte extremamente complexa, que desde o aparecimento do instrumento tem trazido indiscutível fama aos grandes fabricantes.

Como também já se frisou, a quase totalidade dos componentes é de madeira de várias tipos e origens, de acordo com a função desse componente. As principais espécies dessas madeiras são:

§         Epícia – usada no tampo, na alma, na barra, nos blocos e nas contra-ilhargas. É uma madeira resinosa de baixa densidade; a variedade de maior preferência é a pícea excelsa ou picea abies. As suas principais características são: fibras direitas, densidade 0,4 a 0,5 g/cm3; boa resistência à deformação; módulo de elasticidade bastante elevado no sentido das fibras, e finalmente grande velocidade de propagação do som, entre 5 a 6 mil metros por sergundo. Isso confere-lhe qualidades únicas de ressonância. Provém dos Alpes Franceses e Alpes Italianos.

§         Ácer –  usado nas costas, nas ilhargas, no braço e no cavalete. As variedades mais apreciadas são o ácer plano (acer platanoides) e o ácer sicómoro (pseudo-platanus). As suas principais características são densidade média da ordem de 0,6 a 0,8 g/cm3, grande resistência à deformação, baixo módulo de elasticidade e baixa velocidade de propagação do som, entre 3 a 4 mil m/s.Provém dos Balcãs – Hungria, Bulgária, Roménia e Boémia.

§          Ébano de Ceilão,  (diospyros ebenun) –  emprega-se no estandarte, no botão, na escala e nas cravelhas, peças que requerem densidade e dureza. É uma madeira negra, caracterizada pela grande densidade e extrema dureza, e grão muito homogénio. É proveniente de Sri Lanka e da Índia.

§         Pau-brasil de Pernanbuco para a vara encurvada do arco.

§         Faia no filete mais claro, sendo os outros dois filetes de ébano.

§         Pau-preto, substituindo por vezes o ébano em algumas peças.

Além da madeira, outros materiais são empregues, obrigatoriamente ou não: o marfim, por exemplo nas extremidades do arco, ou substituindo por vezes o ébano na pestana. O aço é empregue nas cordas e partes mecânicas, o nylon, igualmente nas cordas. Estas eram inicialmente de tripa de carneiro, são agora também de aço ou de nylon, de diâmetro adequado. Todos esses tipos sofrem determinadas preparações, nomeadamente na regularização do diâmetro e envolvimento de uma fieira metálica, que se dispensa aqui de pormenorizar.

O melhor material para as cerdas é a crina de cavalo importadas da Mongólia. Encontram-se de outras origens mas de qualidade inferior.

Voltando às madeiras – a sua escolha é extremamente selectiva, uma vez que só algumas árvores produzem a madeira de qualidade exigida de acordo com a homogeneidade e a densidade dos veios. Para a epícia as melhores árvores são as que se encontram em climas temperados, terrenos siliciosos, a altitudes entre 1000 a 1500 m e vertentes expostas ao sol.

Segundo o “luthier” António Capela, ele próprio desloca-se propositadamente aos Alpes Italianos e aos Balcãs para a escolha e compra das madeiras que necessita.

O abate das árvores deverá processar-se em época própria, ou seja no Inverno, sendo os troncos sujeitos depois a diversos cortes com dimensões e sentido apropriados, de modo a obter-se a disposição mais desejável para as fibras. Assim obtém-se primeiramente troços de cerca de 40 a 50 cm. Estes troços são seguidamente rachados radialmente ao machado, obtendo-se pranchas em forma de gomo. Essas pranchas radiais deverão então apresentar as fibras dos anéis de crescimento da árvore na perpendicular. Devem depois serem secas durante cerca de seis anos em ambiente seco e arejado. Tentativas de secagem artificial mostraram-se inadequadas.

Depois de devidamente seca, pode-se dar incio à construção dos componentes. A sequência de construção, que requer extremos cuidados comprende: i)  corte dos contornos; ii) desbaste para dar as formas, curvaturas e espessuras exigidas;  iii) posicionamento e colagem das peças; iv) acabamento e envernizamento. Far-se-á seguidamente uma descrição resumida dessa sequência (ver fig.6).

 

Fig. 6 - Fotos obtidas no atelier de António Capela, em Anta, Espinho, em Julho de 2009.

As quatro primeiras fotos apresentam fases sequenciais da construção do violino: execução do tampo e fundo; caixa de ressonância e braço prontos a serem ligados; colagem do braço e da escala; ao lado desta última foto, o “tuthier” com uma das suas obras-primas; na última fila, diversos cavaletes, violino acabado e diversos violinos e violoncelos; a fotografia que se vê ao fundo da sala é da visita ao atelier do violoncelista russo Rostropovitch.

 

O tampo e o fundo são obtidos a partir da justaposição de duas pranchas de perfil triangular isósceles, coladas pela face correspondente à base do triângulo, ou seja da periferia da árvore. Assim as fibras mais densas e rectilíneas ficarão localizadas na zona central da peça. Por vezes executa-se o fundo de uma só prancha.

Essas duas peças são ligeiramente abauladas, cerca de 14 a 20 mm mais elevadas no centro. Por outro lado, a sua espessura não é uniforme, sendo de cerca de 2mm na periferia e mais espessas no centro, cerca de 4mm, diferenças que dependem das características da peça de madeira, do instrumento a construir e até certo ponto do próprio construtor. Há então que proceder ao desbaste, depois de se desenhar o contorno das peças. Ao construtor exige-se cuidados especiais no constante controlo das espessuras das placas. Depois de acabado o tampo leva, ao longo do seu contorno, três filetes, dois escuros e um claro, de madeiras diferentes, embutidos por mancheteria,. A sua função é essencialmente decorativa.

Para a execução das ilhargas usa-se uma matriz, previamente preparada. Colam-se os blocos de reforço no interior e fechase a caixa de ressonância. O braço, previamente executado com a sua voluta, é depois colado à caixa ficando ligeiramente inclinado em relação ao plano desta. Fixam-se por último as peças adicionais, estandarte, escala, pestana e outras.

Um vasto conjunto de ferramentas específicas faz parte do equipamento do atelier: goivas, raspadeiras, graminhos, formões, serrinhas, lâminas, facas de precisão, mini-plainas de lâmina arqueada, lixas, grampos, etc. A cola usada é preparada especialmente pelo artista.

Montadas as partes de madeira, procede-se ao envernizamento, geralmente com um verniz preparado pelo próprio luthier, constituindo um dos seus segredos, transmitidos de geração em geração, uma vez que, mais que um mero acabamento com fins decorativos e de protecção, o verniz tem um papel fundamental na qualidade da acústica do instrumento, moldando de modo acentuado a sua sonoridade. Deve então possuir certas características como elasticidade, flexibilidade, resistência, transparência, brilho, etc. A aplicação do verniz compreende sucessivas demãos, que podem chegar a vinte, intervaladas dos tempos de secagem. Como as madeiras utilizadas são em geral de cores claras, o verniz dá-lhes a tonalidade de madeiras preciosas.

O “acer ondulado” (fig. 7) utilizado por António Capela, apresenta uma estrutura nervurada em ondulações. Em resultado da justaposição das tábuas do fundo as nervuras ficam dispostas simetricamente, dando um extraordinário efeito decorativo, pois devido a essa ondulação das fibras, a incidência da luz produz por polarização zonas alternadas de tons diferentes (fig.7, em baixo)

 

Fig. 7 – Estrutura da madeira de “acer ondulado” e efeito produzido

 

O cavalete não é envernizado, ficando “em branco”. Também não é colado, sendo mantido na posição correcta pela tensão das cordas.

Todos os instrumentos levam uma identificação por uma etiqueta, colada ao fundo, no interior da caixa, mas visível através das aberturas ff. Ela identifica o construtor, local e data de fabrico A falsificação de instrumentos referida no capítulo 2 leva evidentemente à falsificação dessas etiquetas.

 

7 - ACTUAÇÃO E REPERTÓRIO DO VIOLINO

Não seria natural se, falando do violino e da beleza e magia que produz, não se fizesse referência a algumas das obras onde essas capacidades se manifestam, seus compositores e executantes.

O violino toca-se segurando o instrumento entre o ombro esquerdo e o queixo do executante apoiado no mentonnière. O arco é seguro pelo talão, com a mão direita. A sonoridade, o colorido e a dinâmica musical do violino estão inteiramente ligados à condução do arco com a mão direita, e à pressão dos movimentos da mão esquerda sobre as cordas interceptandoas com os dedos, alterando portanto o comprimento da parte vibrante (fig.8). Por vezes executam-se certos efeitos como, por exemplo, o “pizzicato”, no qual as cordas são beliscadas com o dedo ou o “col legno”, onde as cordas são friccionadas pela própria vara do arco.

 

Fig. 8 – Modo de execução do violino

 

O volume e qualidade do reportório para violino ao longo dos três últimos séculos é extensíssimo. Dificilmente encontramos um compositor que não tenha composto para esse instrumento, patenteando bem o seu êxito. Resumidamente citam-se alguns nomes:

No séc. XVIII, Tartini, Vivaldi, Viotti, Paganini, entre outros, dedicam-se intensamente a obras para Violino. São de Bach as mais célebres do reportório solista de violino. Surgem depois com o mesmo interesse Haydn, Mozart e Beethoven, este último já na transição para o século seguinte, no qual se destacaram obras para violino de Schubert, Schumann, César Frank , Mendelssohn, Gabriel Fauré, Saint Saens e Grieg. Já no séc. XX , surgem importantes obras de Debussy, Bela Bartok, Darius Milhaud, Lalo, Dvorak, Roussel, Prokofiev, Maurice Ravel, Khachaturian, Schoenberg, Benjamim Briten, Vaughan Williams, Kurt Weill.

Os autores deste artigo gostariam de recomendar ao leitor a audição de obras de alguns desses compositores. Mas sobretudo porque eles próprios também não conhecem grande parte delas, limitam-se a sugerir então algumas das que mais apreciam, começando pelos “24 Caprichos” de Paganini (a que já se referiu no inicio deste artigo), especialmente o último, deveras empolgante. De entre os “Concertos para Violino e Orquestra” (onde o diálogo entre o violino e a orquestra sempre nos maravilha), além dos famosos 4 concertos de Vivaldi, incluídos genericamente sob o nome de “As Quatro Estações”8, os autores não podem deixar de recomendar: o de Beethoven, o de Mendelssohn, talvez o mais popular, o de Tchaikovski e o de Sibelius, entre outros.

De entre os grandes virtuosos da execução, surgem os nomes: primeiro de todos, e mais uma vez, Paganini. Mas também Rodolph Kreutzer (francês), a quem Beethoven dedicou a célebre “Sonata a Kreutzer”, Pablo de Sarasate (espanhol), Fritz Kreisler (austríaco), Georges Enesco (romeno), Isac Stern (russo naturalizado americano), David Oistrakh (russo), Yehudi Menuhin (russo naturalizado americano, também reputado como pedagogo, falecido em 1999) e Anne Sophie Muther (alemã) de quem apareceu recentemente um CD comemorando o bicentenário do compositor Felix Mendelssohn.

 

8 - OUTROS MEMBROS DA FAMÍLIA DO VIOLINO

Outros membros da família do violino são a viola (também designada viola de arco), o violoncelo e o contra-baixo, que tendo idêntica configuração, diferem do violino, pelas dimensões de cada um (sucessivamente crescentes) e particularidades acústicas, como a afinação, sendo o som  sucessivamente mais grave. Também há diferenças  na posição do instrumento na execução – a viola, como o violino, apoiado no ombro do executante, e os dois últimos apoiados no chão.

 Falar-se-á somente breves referências ao Violoncelo, o mais importante a seguir ao violino. É o barítono da familia.

O Violoncelo surgiu no séc XVI, como um mero instrumento de conjunto e só no século seguinte, quase no final do Barroco, se iniciou a sua carreira a solo, quando as suas características dimensionais foram estabelecidas por Stradivari e Amati. Destacaram-se também outros fabricantes. O mais famoso violoncelo parece ser o “Davidoff” de 1712. Um discípulo de Stradivari, Doménico Montagnana, foi o criador de alguns dos mais famosos violoncelos, entre os quais um que pertenceu à grande violoncelista portuguesa Guilhermina Suggia.

O violoncelo é tocado com o executante sentado, mantendo o instrumento entre as suas pernas, apoiado no chão através de um espigão de altura regulável, e com o braço sobre o ombro esquerdo do executante (fig.9).

 

Fig.9 – Madalena, neta e filha dos autores deste artigo e aluna de violoncelo do Conservatório de Música de Lisboa, actuando numa autição naquela instituição.

 

Diversos compositores escreveram para este instrumento, de Bach, Vivaldi, Boccherini, a Schumann, Saint Saens, Tchaikovsky,  Dvorak,  Saint-Saens,  Elgar,  Britten, Bela Bartok,  Lalo. Os autores destas linhas destacam algumas peças de sua preferência: as “6 Suites para Violoncelo Solo” de Back, a “Partita  em ré m, para violino solo” com a monumental Chacone, do mesmo autor, a “Sonata Op 19” de Rachmaninov, o “Concerto para Violoncelo” de Dvorak e sobretudo as “Variações sobre um tema Rococó” de Tchaikovsky (estas com magistral interpretação de Rostropovitch).

De entre os grandes executantes do violoncelo citam-se os nomes do espanhol Pablo CASALS (1876-1973), do russo dissidente Mstislav ROSTROPOVITCH (1927-2007), e particularmente da portuguesa Guilhermina SUGGIA. Actualmente destaca-se, entre outros, a violoncelista Yo Yo Ma.

A nossa compatriota Guilhermina Suggia nasceu em 1888 no Porto, mais propriamente em Matosinhos, onde também morreu em 1950. Apresentou-se pela primeira vez em público aos sete anos de idade o que lhe veio a proporcionar uma bolsa com a qual estudou na Alemanha, em Leipzig, fazendo aos 17 anos, a primeira apresentação internacional com a famosa orquestra Gewandhaus, com retumbante êxito, dando início à sua brilhante carreira internacional.  Actuou nos principais meios musicais de toda a Europa, nomeadamente na Inglaterra9. Entre os seus instrumentos contava-se um Stradivarius, mas o da sua de eleição foi um “Montagnana”10. Guilhermina era particularmente afeiçoada à cidade do Porto, corporizando esse afecto no Conservatório de Música, cujo projecto acompanhou e ao qual deixou grande parte do seu legado, na Orquestra Sinfónica da cidade e no Teatro Rivoli, sua sala dilecta 11

Os instrumentos de corda ocupam um lugar de destaque na orquestra sinfónica, sendo o violino, como atrás se referiu, o mais importante. A orquestra sinfónica surgiu na Áustria em meados do séc. XVIII, evoluindo a partir daí em tamanho e complexidade, geralmente em função de obras de grandes compositores, Haydn, Beethoven, Wagner, Stravinsky. O número de executantes não é naturalmente fixo. Os violinos, que figuram em maior número, estão distribuídos por dois naipes: primeiros violinos e segundos violinos, residindo a diferença no facto dos últimos representarem a voz de contraalto. Seguem-se as violas, os violoncelos e os contrabaixos. Atrás dos instrumentos de corda perfilam-se os de sopro e de percussão, como mostra a fig. 10 – Orquestra Metropolitana de Lisboa.

 

Fig.10 Orquestra Metropolitana de Lisboa

Em arco de círculo distribuem-se, em frente ao maestro, da esquerda para a direita, os naipes de primeiros e segundos violinos, as violas, os violoncelos e os contrabaixos.

 

Agradecimentos

Os autores expressam os seus agradecimentos aos “luthiers” António Capela, de Anta, Espinho, e Thibaut Dumas, de Lisboa pelos úteis esclarecimentos que gentilmente forneceram.

 

1 A actual classificação dos instrumentos musicais baseia-se na peça do instrumento que produz o som; cordofones (corda tensa, ex: violino, guitarra),  aerofones (massa de ar, ex: flauta, trompete ), membranofones (membrana esticada, ex: tambor, tímbales) e idiofones (o próprio instrumento  de materiais elástico, mas sem nenhuma tensão: castanholas, berimbau). Todas essas classes possuem várias sub-classe.No caso dos cordofones temos a subdivisão segundo o modo de provocar a vibração das cordas:  friccionadas (violino), beliscadas  (guitarra), e percutidas (piano).

2 Cremona era também a cidade natal do grande compositor Cláudio Monteverd (1567-1643), um dos criadores da ópera.

3 Construtores de instrumentos de corda e caixa de ressonância, ou seja de violinos e outros instrumentos da sua “família”. O termo, que é francês, deriva do luth que significa alaúde.

4 Em Novembro de 1990 um Stradivarius de 1720 foi vendido por 1,7 milhões de dólares; em 2006 na leiloeira Christie’s outro instrumento datado de 1729 atingiu 3,5 milhões.  Noutro leilão em Londres, em 2008 um violino de 1720  foi arrematado por 1,3 milhões de dólares.. 

5 Neste desastre pereceu também o campeão de boxe francês Marcel Cerdan, e a tragédia ficou mais conhecida por este facto do que pela morte da jóvem Ginette Neveau..

6 Basta ver na Internet a profusão de vendedores de pretensos Stradivarius.

7 Sito na rua do Borja.,  que bordeia a Tapada das Necessidades;

8 Cada um dos 4 Concertos refere-se a uma Estação. Infelizmente as emissoras de rádio persistem em transmitir repetidamente a “Primavera” que assim se tornou muito popular em detrimento das outras. O autor considera o concerto “Inverno” muito mais bonito. A primeira até se ouve sistemática e irritantemente em quase todos os telefones de instituições, enquanto se espera o atendimento, tornando-se cansativo!!!

9 Na Tate Gallery de Londres pode-se contemplar um seu retrato de autoria do pintor Augustos John, e datado de 1923

10 Esse “Montagnana” foi avaliado pela Sotheby de Londres em três milhões de euros; mas segundo notícia de um jornal lisboeta de há alguns meses, corria o risco de se degradar irreversivelmente. Depois de ter estado fechado durante três anos no Museu Soares dos Reis, do Porto, foi transferido para o Museu Romântico da mesma cidade. Alguns músicos portugueses, tem tentado recuperar o instrumento para que seja tocado regularmente por violoncelistas portugueses e estrangeiros. Assim vai a cultura portuguesa! Felizmente a actual ministra da Cultura é de formação artística musical sendo portanto de esperar que esse campo não seja esquecido.

11 O nome dessa famosa executante e as instituições acima citadas que ela amava, seriam suficientes para a cidade do Porto se orgulhar; não precisando necessariamente de um clube de futebol. Mas saberão todos os portistas quem foi Guilhermina Suggia?

 

BIBLIOGRAFIA

– Henrique, Luís – Instrumentos Musicais, Ed. Gulbenkian, Lisboa, 1988        [ Links ]

– Moreno, António F. – Mi Primero Libro deMusica, Ed. Real Musical, Madrid, 1991

– Oling, B. e Wallish, H. – Enciclopedia dos Instrumentos Musicais, Ed. Livros e Livros, Lisboa, 2003

– Gallaway, James – A Música no Tempo, Ed. C.L. Lisboa, 1983

– Sousa e Brito, Andrêa Suzana – O Violino, Trabalho Escolar, 2000

– Collier’s Encyclopedia, USA, 1968

– Goffi, Bruno – Magie du Bois, Flamarion, Paris, 2001

– Hough, Romain B. – The Woodbook, Tachen, USA, 2003